PCE - 0603147-25.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 12/06/2024 às 14:00

VOTO

Como já posto no relatório, cuida-se de prestação de contas apresentada por ANDRÉIA PINHEIRO VAGHETTI, candidata que alcançou a suplência para o cargo de deputado estadual pelo partido UNIÃO BRASIL, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às Eleições Gerais de 2022.

Após exame da contabilidade e manifestação da candidata, a Secretaria de Auditoria Interna do TRE-RS (SAI) opinou pela desaprovação das contas, na medida em que persistentes falhas quanto ao uso de valores do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

No caso, os vícios remanescentes consistem na ausência de documento fiscal relativo à contratação de pessoa jurídica e à devolução de sobras financeiras decorrentes da não utilização de créditos de impulsionamento de conteúdo durante o pleito.

A primeira mácula diz com a contratação de Lukas Santos Dias, CNPJ 46.450.067/0001-29, no valor de R$ 10.000,00, para realização de assessoria de campanha e mídia.

A candidata, visando sanar a falha, sustenta que os documentos carreados aos autos – contrato, comprovante de transferência PIX e extrato bancário (ID 45536434) - fazem prova suficiente da escorreita utilização da verba pública, o que enfatizou em sua última manifestação no autos (espécie de memoriais, (ID 45609249).

Sem razão, todavia, a prestadora.

O entendimento trazido no art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19 indica que, tratando-se de serviço prestado por pessoa jurídica, é fundamental a emissão de nota fiscal, visto que a comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome do contratante, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

Sobre o tema, esta Colenda Corte tem entendimento consolidado pela necessidade de comprovação dos dispêndios com recursos do FEFC (Fundo Especial de financiamento de Campanha) por meio de documento fiscal emitido pela respectiva pessoa jurídica, sob pena de configuração de irregularidade na aplicação de verbas públicas. À guisa de exemplo, cito os lapidares precedentes:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. DEPUTADO FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA – RONI. IDENTIFICADAS NOTAS FISCAIS NÃO DECLARADAS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXISTÊNCIA DE DÍVIDAS DE CAMPANHA DECLARADAS PELO PRESTADOR E NÃO ASSUMIDAS PELO PARTIDO. IMPOSSIBILIDADE DE RASTREIO DA ORIGEM DOS RECURSOS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DESPESAS PAGAS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. UTILIZAÇÃO DE VERBA EM GASTO NÃO ELEITORAL. DESPESA COM HOSPEDAGEM. EXPRESSAMENTE VEDADA PELA LEGISLAÇÃO. IRREGULARIDADES QUE REPRESENTAM ELEVADO PERCENTUAL. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. 1. Prestação de contas apresentada por candidato ao cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022. 2. Identificadas notas fiscais, dentre as informações disponíveis no banco de dados da Justiça Eleitoral, não informadas na contabilidade apresentada. A omissão afronta o art. 53, inc. I, al. "g", da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual determina a especificação das receitas e despesas na prestação de contas. Ainda, não foram apresentadas as notas fiscais emitidas contra o CNPJ da campanha, tampouco demonstrado o respectivo cancelamento ou estorno. Portanto, os documentos não podem ser desconsiderados, em clara ilegalidade, pois se conclui que a quitação das dívidas ocorreu com o uso de valores que – nitidamente – não transitaram pelas contas bancárias declaradas, a caracterizar RONI – recurso de origem não identificada, passível de recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos dos arts. 14 e 32 da Resolução TSE n. 23.607/19. 3. Existência de dívidas de campanha declaradas pelo prestador e não assumidas pelo partido, de forma a impossibilitar o rastreio da origem dos recursos usados para a respectiva quitação. Todavia, o valor apontado como irregular não está sujeito a recolhimento ao Tesouro Nacional, porquanto ausente previsão normativa expressa. 4. Aplicação de receitas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. 4.1 Ausência de comprovação, por meio de documento fiscal, de despesas pagas com recursos públicos. Desatendimento à legislação, pois a movimentação financeira integral deve compor a prestação de contas, e a comprovação dos gastos exige “documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos”. 4.2. Utilização de verba pública em gasto não eleitoral. Despesa com hospedagem, expressamente vedada pelo art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, que descreve os tipos de gastos eleitorais admitidos em campanhas. 5. As irregularidades somadas representam 104,9% das receitas declaradas na prestação, de modo a impor o juízo de desaprovação das contas. 6. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional. (TRE-RS. PCE n. 0602918-65.2022.6.21.0000. Relator Des. Eleitoral Volnei dos Santos Coelho. Julgada em 29.02.2024. Publicação em 04.03.2024 -DJE/TRE-RS, edição n. 038/2024.) (Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. ASSUNÇÃO DE DÍVIDA PELO PARTIDO. CONTRARIADAS AS DETERMINAÇÕES DO § 3º DO ART. 33 DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. AUSÊNCIA DE AMPARO NORMATIVO. PRECEDENTES. MALVERSAÇÃO DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS FISCAIS. IRREGULARIDADE CARACTERIZADA. FALHAS QUE REPRESENTAM ELEVADO PERCENTUAL. INAPLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DEVER DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. 1. Prestação de contas apresentada por candidato ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022. 2. Impropriedades quanto à assunção de dívidas de campanha pela agremiação. Conquanto a falha não tenha afetado a transparência da movimentação financeira, restaram contrariadas as determinações do § 3º do art. 33 da Resolução TSE n. 23.607/19, que impõe a apresentação de peças formalizando o acolhimento do débito pela grei. Todavia, ainda que ressalvada a impropriedade, deve ser afastado o dever de recolhimento ao erário da importância equivalente à dívida, por falta de amparo normativo. Precedentes. 3. Malversação de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, devido à falta de apresentação de documentos fiscais comprovando as despesas, conforme estabelecido nos arts. 35 e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19. Abatimento de parte dos valores irregulares, porquanto comprovadas as despesas por meio do sistema da Justiça Eleitoral de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais. Por outro lado, devem ser mantidas as glosas quanto aos demais dispêndios considerados irregulares, na medida em que desacompanhados de documentos fiscais ou esclarecimentos a justificá-los, devendo o montante ser recolhido ao Tesouro Nacional, de acordo com o art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19. 4. O total das irregularidades equivale a 16,55% dos recursos recebidos pelo candidato em sua campanha, montante que extrapola os parâmetros fixados na jurisprudência desta Justiça Especializada, quando da aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, para formar juízo de aprovação com ressalvas da contabilidade (abaixo de R$ 1.064,10 e inferior a 10% da arrecadação financeira). 5. Desaprovação. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional. (TRE-RS. PCE n. 0602262-11.2022.6.21.0000. Relator Des. Eleitoral José Luiz John dos Santos. Julgado em 13.12.2023. Publicado em 15.12.2023 - DJE/TRE-RS, edição n.228/2023.) (Grifei.)

Nessa linha, ausente o comprovante fiscal a lastrear despesa quitada com verba pública, o valor irregular de R$ 10.000,00 deve ser recolhido ao Tesouro Nacional.

Passo à questão envolvendo impulsionamento de campanha.

Foi destinada a importância de R$ 450,00 proveniente do FEFC para impulsionamento de conteúdo, através da empresa ADYEN BR LTDA, junto ao Facebook Serviços Online do Brasil.

A empresa, entretanto, emitiu duas notas fiscais nos valores de R$ 17,04 e R$ 40,00, conforme ID 45536432. Ou seja, uma diferença de R$ 392,60 não foi utilizada, tampouco ressarcida ao erário.

O art. 35, § 2º, inc. I, dispõe que os valores destinados ao impulsionamento e não utilizados devem ser transferidos ao Tesouro Nacional a título de sobras de campanha:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução:

[...]

§ 2º Os gastos de impulsionamento a que se refere o inciso XII deste artigo são aqueles efetivamente prestados, devendo eventuais créditos contratados e não utilizados até o final da campanha serem transferidos como sobras de campanha:

I - ao Tesouro Nacional, na hipótese de pagamento com recursos do FEFC; e

 

A jurisprudência desta Corte, em casos similares, sinaliza a necessidade de recolhimento do montante irregular:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA. DEPUTADA FEDERAL. IRREGULARIDADES NA UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO. FACEBOOK. SOBRAS NÃO RECOLHIDAS. AQUISIÇÃO DE MATERIAL IMPRESSO EM DESACORDO COM A NORMA. FALHA SANADA NO PONTO. BAIXO PERCENTUAL. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Prestação de contas apresentada por candidata ao cargo de deputada federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022. 2. Pagamento de impulsionamento de conteúdo de internet, com recursos do FEFC, sem comprovação de recolhimento do saldo, conforme disposto no art. 35, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Eventual dificuldade da prestadora na obtenção do respectivo ressarcimento junto à empresa deve ser dirimida na via processual própria, pois a jurisprudência desta Corte está consolidada no sentido de que a responsabilidade pela gestão dos valores destinados à campanha eleitoral cabe exclusivamente aos candidatos, candidatas e respectivos partidos políticos, não sendo legítima a transferência de responsabilidade a terceiros. Determinado o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional. 3. Aquisição de material impresso, sem a apresentação de nota fiscal indicando as dimensões do material produzido, em desacordo com o § 8º do art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19. Falha sanada pela candidata. Afastado o apontamento. 4. A irregularidade remanescente representa 5% do montante de recursos recebidos na campanha. Aplicados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para formar o juízo de aprovação com ressalvas das contas. 5. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional. (TRE-RS - PCE: 0602257-86.2022.6.21.0000 PORTO ALEGRE - RS 060225786, Relator: Patricia Da Silveira Oliveira, Data de Julgamento: 15/01/2024, Data de Publicação: Diário de Justiça Eletrônico - DJE 12, data: 23/01/2024.) (Grifei.)

 

Em suma, a diferença não utilizada no valor de R$ 392,60, deve, a meu ver, ser recolhida ao Tesouro Nacional.

Por fim, somados os recursos envolvendo irregularidades, temos o valor de R$ 10.392,60, cifra que perfaz 14,49% do total auferido pela candidata durante a campanha eleitoral (R$ 71.721,05), e que ultrapassa os parâmetros utilizados por esta Corte para, aplicados os postulados da razoabilidade e proporcionalidade, mitigar o juízo de desaprovação das contas (R$ 1.064,10 ou 10% do total percebido).

Diante do exposto, VOTO pela desaprovação das contas de ANDRÉIA PINHEIRO VAGHETTI, nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e, via de consequência, determinar o recolhimento de R$ 10.392,60, a título de valores malversados do FEFC, ao Tesouro Nacional.