PCE - 0602174-70.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/04/2024 00:00 a 25/04/2024 23:59

VOTO

Trata-se de prestação de contas de CINTIA REGINA FREITAS ROCKENBACH, candidata não eleita ao cargo de deputada federal pelo PODEMOS, relativa às Eleições de 2022.

No item 4.1.1 do parecer conclusivo (ID 45554733) estão relatadas irregularidades na comprovação de despesas com a utilização de recursos públicos do FEFC pela candidata, assim discriminadas:

Detalhamento da inconsistência observada na tabela:

H – A documentação apresentada não traz a comprovação de que o doador/fornecedor seja proprietária(o) do bem, conforme previsto no inciso II, do art. 21 da Resolução 23.607/2019.

 

De regra, a comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo, podendo a Justiça Eleitoral admitir outros meios de prova, como contrato, comprovante de entrega do material ou da prestação efetiva do serviço, dentre outros, nos termos do art. 60, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19. E, ainda, conforme § 3º do mesmo dispositivo, poder-se-á exigir a apresentação de elementos probatórios adicionais que comprovem a efetiva prestação do serviço declarado.

No caso em examine, em que pese a legislação eleitoral exigir a comprovação da propriedade do bem somente em casos de doação estimável em dinheiro (arts. 21, inc. II, e 58, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19), o que não é o caso dos autos, a jurisprudência tem exigido tal comprovação, por se tratar de gastos custeados com recursos públicos, cuja transparência deve ser a regra, consistindo em providência indispensável para verificar a efetiva prestação do serviço e a correta utilização dos recursos públicos.

Nessa linha estão os seguintes julgados desta Corte:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA. DEPUTADA ESTADUAL. RECEBIMENTO DE RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA - RONI. NOTA FISCAL PAGA COM VALORES QUE NÃO TRANSITARAM EM CONTA BANCÁRIA. INCONSISTÊNCIAS NAS DESPESAS PAGAS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA PROPRIEDADE DE VEÍCULO. FALHAS DE BAIXA REPRESENTATIVIDADE. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas de campanha realizada por candidata ao cargo de deputada estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022.

[...].

3. Inconsistências nas despesas pagas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC. Ausência de apresentação de certificado de registro de veículo. Impossibilidade de aferição da propriedade do veículo, conforme disciplinado no art. 21, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19. Inexistência nos autos de prova de vínculo jurídico entre o cedente e o bem cedido. Ainda, o automóvel não foi declarado originariamente, nos termos do art. 35, § 11, inc. II, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19, exigência que pretende prevenir “regularizações”; posteriores, como no caso em apreço, em que juntado o termo de cessão sem firma reconhecida, impedindo a verificação da data. Inexistindo prova da regularidade do gasto, deve a quantia correspondente ser recolhida ao Tesouro Nacional, na forma do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

4. A soma das irregularidades identificadas representa 5,83% da receita declarada pela candidata. Percentual inferior ao limite utilizado pela Justiça Eleitoral (10%) como critério para aprovação das contas com ressalvas.

5. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS; PCE n. 060287968, Acórdão, Des. RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 06/03/2024.) (Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO NÃO ELEITO. CARGO DE DEPUTADO FEDERAL. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE VALORES DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. PAGAMENTO DE LOCAÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. AUSÊNCIA DE DOCUMENTAÇÃO COMPROBATÓRIA. IRREGULARIDADE CARACTERIZADA. BAIXO PERCENTUAL. INCIDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas apresentada por candidato não eleito ao cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022.

2. Uso indevido de valores do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. Gasto com aluguel de automóvel sem a apresentação de documento indicando sua propriedade. A Resolução TSE n. 23.607/19, em seu art. 60, § 4º, inc. III, dispensa a comprovação, no caderno contábil de campanha, quando se tratar de cessão de automóvel de propriedade do candidato. Todavia, a demanda cinge-se à locação de terceiro. No caso, o prestador não trouxe aos autos documento comprovando a propriedade do veículo locado. Irregularidade caracterizada.

3. A irregularidade não ultrapassa os parâmetros utilizados por esta Corte para, mediante aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, aprovar as contas com ressalvas, na medida em que a falha representa 6,52% do montante percebido pelo candidato, ainda que necessário o recolhimento da quantia indevida ao erário.

4. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS; PCE n. 060214265, Acórdão, Relator(a) Des. ELAINE MARIA CANTO DA FONSECA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 146, Data: 10/08/2023.) (Grifei.)

 

Assim, no relatório preliminar de exame (ID 45541131), o órgão técnico instou a candidata à apresentação de documento de propriedade dos veículos, culminando na manifestação de ID 45543979 e seguintes, consoante passo a analisar.

 

a) Das despesas realizadas em favor de FABIANO SILVEIRA DA COSTA, valores de R$ 650,00 e R$ 464,30:

A candidata juntou aos autos cópia de “autorização para transferência de propriedade de veículo automotor”, com firmas reconhecidas em tabelionado (ID 45543988).

Consta no documento a alienação do veículo para Fabiano Silveira da Costa, datada de 19.8.2022, a qual, no entanto, ainda não foi levada a registro perante o Detran.

Porém, no caso, considera-se provada a propriedade do bem transferido para Fabiano, uma vez que, em se tratando de bem móvel, a propriedade se transfere pela tradição, conforme o art. 1.267 do Código Civil.

O registro do veículo junto ao Detran não condiciona a validade de compra e venda, sendo apenas uma exigência que visa ao controle administrativo sobre os veículos e proprietários, não interferindo na validade do negócio particular e na transferência do bem.

Assim, devem ser consideradas regulares as despesas no somatório de R$ 1.114,30 com locação de veículo de Fabiano Silveira da Costa.

 

b) Das despesas realizadas em favor de JONATA PRESTES CARDOSO, valores de R$ 650,00 e R$ 464,30:

Consta, no certificado de registro e licenciamento de veículo juntado aos autos, como proprietária do veículo locado a pessoa de Michelle Franco Almirante, ou seja, pessoa diversa do locador declarado, Jonata Prestes Cardoso (ID 45543986).

A candidata juntou, ainda, termo de cessão sobre uso do veículo em favor de Jonata, cuja cedente é Michele, efetiva proprietária do veículo (ID 45543986, fl. 7).

Contudo, o termo de cessão apresentado não especifica sequer se a referida “cessão” seria gratuita ou retribuída, bem como não registra a data em que o instrumento foi assinado pelas partes.

Além disso, há uma incongruência material entre o contrato de locação e o termo de cessão entre terceiros, consoante bem explicitou a examinadora técnica de contas (ID 45554733, fl. 5):

Da análise dos documentos apresentados, verifica-se que a proprietária do veículo é Michele Franco Almirante. Assim, o Contrato de Locação de Bem Móvel com Motorista firmado entre a candidata e o fornecedor não refletem os dados constantes nas provas e documentos juntados aos autos, pois, na cláusula primeira do referido contrato, o fornecedor Jonata Prestes Cardoso declara que: “... o LOCATÁRIO declara ser de sua propriedade, anexando ao CONTRATO cópia do CRVL- Certidão de Registro Licenciamento de Veículo”.

 

Dessa forma, entendo que, no caso concreto, os documentos apresentados não se prestam para comprovar a despesa com recursos públicos e esclarecer devidamente a relação do suposto locador com o veículo empregado.

Logo, comprometida a confiabilidade e transparência dos gastos, está caracterizada a irregularidade, devendo o valor de R$ 1.114,30 ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

c) Das despesas realizadas em favor de TIAGO EVANGELISTA, valores de R$ 650,00 e R$ 464,30:

O proprietário constante no certificado de registro e licenciamento do veículo juntado aos autos é Adão Oliveira Viana, ou seja, pessoa diversa do locador declarado, Tiago Evangelista (ID 45543983).

Nenhum outro documento adicional foi acostado em relação às despesas em questão.

Portanto, não esclarecida a propriedade do bem locado em relação ao fornecedor, estão configuradas as irregularidades por comprometimento da confiabilidade dos gastos, devendo o valor de R$ 1.114,30 ser recolhido ao Tesouro Nacional, com fulcro no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

d) Das despesas realizadas em favor de VILMAR DA SILVA, valores de R$ 1.450,00, R$ 1.450,00 e R$ 1.035,70:

De acordo com o certificado de registro e licenciamento de veículo juntado aos autos, Jossana Luciane Geyer é a proprietária do veículo locado à candidata por Vilmar da Silva (ID 45543982).

Em acréscimo, a candidata juntou termo de cessão sobre uso do veículo em favor de Vilmar, cuja cedente é Jossana Luciane Geyer (ID 45543982, fl. 4).

Tal como considerado em relação ao fornecedor Jonata Prestes Cardoso, o termo de cessão apresentado não especifica se a referida “cessão” seria gratuita ou retribuída, bem como não registra a data em que o instrumento foi assinado pelas partes.

Outrossim, no instrumento contratual de locação, “o locatário declara ser de sua propriedade” o bem locado, o que não se compatibiliza com o certificado de registro e licenciamento e com o termo de cessão temporária apresentados.

Logo, tendo em conta que os documentos apresentados não se prestam para demonstrar a confiabilidade das informações fornecidas, deve o valor de R$ 3.935,70 ser recolhido ao Tesouro Nacional, na forma do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19

Dessa maneira, a quantia apurada como irregular na presente prestação de contas totaliza R$ 6.164,30, percentual equivalente a 1,26% do total da receita declarada pela candidata (R$ 486.666,87), o que enseja a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade a fim de aprovar as contas com ressalvas.

Ademais, em virtude da irregularidade na aplicação de recursos do FEFC, na forma do art. 79, §1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, a devolução dos valores ao Tesouro Nacional é medida que se impõe.

 

Ante o exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas de CINTIA REGINA FREITAS ROCKENBACH, nos termos do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, e pela determinação do recolhimento de R$ 6.164,30 ao Tesouro Nacional, com fundamento no art. 79, §1º, da mesma Resolução.