PCE - 0603226-04.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/04/2024 00:00 a 25/04/2024 23:59

VOTO

Eminentes colegas.

CLAUDIOMIRO PIAZZA RODRIGUES, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual nas Eleições 2022, apresentou sua prestação de contas referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha.

Processados os documentos nos termos da Resolução TSE n. 23.607/19, o órgão técnico considerou integralmente sanadas as impropriedades apontadas no parecer conclusivo e parcialmente sanadas as falhas pertinentes à ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. Ao final, opinou pela desaprovação das contas e pelo recolhimento de R$ 64.802,47 (sessenta e quatro mil oitocentos e dois reais e quarenta e sete centavos) ao Tesouro Nacional (ID 45564052), posição compartilhada pela Procuradoria Regional Eleitoral no parecer de ID 45565793.

Antes de passar à análise das irregularidades apontadas, cumpre afirmar a regularidade das intimações realizadas nestes autos.

A procuradora do candidato afirma “que continua não recebendo as notas de expediente, se observa na aba expedientes que somente foram publicadas as decisões desse processo no Diário Oficial em Nome de Claudiomiro”.

No entanto, a consulta às edições do Diário da Justiça Eletrônico do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul – DJE/TRE-RS demonstra que o nome da advogada, seu número de inscrição na OAB-RS e os dados do processo foram corretamente indicados em todas as publicações.

Menciono, por oportuno, duas delas:

 

Logo, ficou demonstrado que as intimações realizadas nestes autos foram regulares.

Passo à análise dos apontamentos técnicos na prestação de contas.

 

Dos Recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC

A examinadora de contas considerou parcialmente sanadas as falhas pertinentes à ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, mantendo as irregularidades referentes às despesas realizadas com os fornecedores Francisco Javier Machado, CNPJ: 35.265.240/0001-00, e Kátia Regina Pintos Flores da Rosa, CNPJ: 16.888.452/0001-91, valor total de R$ 62.498,00 (sessenta e dois mil quatrocentos e noventa e oito reais), conforme tabela abaixo (ID 45564052):

Compulsando os autos, constato que, de fato, não obstante tenha sido oportunizado o contraditório e a ampla defesa ao prestador de contas, somente parte das falhas foram sanadas mediante a juntada, intempestiva, dos documentos de ID 45522582, subsistindo as irregularidades apontadas pela unidade técnica.

No caso, as despesas realizadas com os fornecedores Francisco Javier Machado, CNPJ: 35.265.240/0001-00, e Kátia Regina Pintos Flores da Rosa, CNPJ: 16.888.452/0001-91, valor total de R$ 62.498,00 (sessenta e dois mil quatrocentos e noventa e oito reais) não observaram o disposto no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, que regulamenta a forma de pagamento dos gastos eleitorais, na medida em que não há identificação da contraparte beneficiária nos extratos bancários. Confira-se o teor do dispositivo, in verbis:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ da beneficiária ou do beneficiário;

III - débito em conta;

IV - cartão de débito da conta bancária; ou

V - PIX, somente se a chave utilizada for o CPF ou o CNPJ.

 

Com efeito, o pagamento realizado de forma diversa da prescrita na legislação de regência inviabiliza o sistema instituído pela Justiça Eleitoral para conferir transparência e publicidade às receitas e aos gastos de campanha, pois impede o controle e a fiscalização da destinação dos recursos públicos.

Em circunstâncias como as dos presentes autos, este Tribunal Regional Eleitoral sufragou o entendimento de que os pagamentos por meio de recursos públicos devem ser demonstrados por documentos idôneos e que permitam a rastreabilidade dos valores e a vinculação do crédito com o fornecedor declarado, sob pena de recolhimento do equivalente ao Tesouro Nacional, conforme ementa que reproduzo:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATOS. PREFEITO E VICE. DESAPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE GASTO ELEITORAL. DESPESAS EM DESACORDO COM A REGRA PREVISTA NO ART. 38, INC. I, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. PAGAMENTO DE GASTO ELEITORAL COM RECURSO PRIVADO, EM DESACORDO COM A NORMA DE REGÊNCIA. ALTO PERCENTUAL. MANTIDO O DEVER DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas relativas às eleições de 2020, com fundamento no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, determinando o recolhimento do montante irregular ao Tesouro Nacional.

2. Ausência de comprovação de gasto eleitoral. Detectada a emissão de nota fiscal, não declarada à Justiça Eleitoral, contra o CNPJ do candidato. O lançamento de nota fiscal sem a correspondente contabilização na prestação de contas revela indícios de omissão de gastos eleitorais, em violação ao art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19. A omissão de despesa paga com verbas que não transitaram nas contas específicas de campanha configura utilização de recurso de origem não identificada, impondo o dever de recolhimento aos cofres do Tesouro Nacional, consoante o previsto no art. 32, § 1º, inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

3. Comprovação de despesa com recursos do FEFC, em desacordo com o art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19. Na espécie, não foi possível verificar se o sacador do documento de crédito foi aquele apontado como fornecedor dos bens ou serviços, de modo a comprovar o ciclo do gasto em todas as suas fases. Ademais, os documentos unilaterais, como é o caso dos recibos e do contrato de prestação de serviços acostados aos autos, não devem ser considerados isoladamente para suprir a ausência do cheque nominal e cruzado. Nessa linha, esta Corte sufragou o entendimento de que os pagamentos por meio de recursos públicos devem ser demonstrados por documentos que permitam a rastreabilidade dos valores e a vinculação do crédito com o fornecedor declarado, sob pena de recolhimento do equivalente ao Tesouro Nacional.

4. Pagamento de gasto eleitoral com recursos privados, em desacordo com o art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19. Despesas pagas com o manejo de recursos privados e a utilização de cheque nominal, porém não cruzado. A alegação de que a exigência da norma impediria a contratação de “pessoas mais humildes” para as atividades em campanha não enseja a mitigação da regra, pois a sua finalidade é impor que a movimentação dos recursos ocorra por meio do sistema bancário, garantindo maior transparência às transações.

5. A totalidade das falhas apontadas representa, aproximadamente, 20,34% das receitas declaradas pelos candidatos, comprometendo o controle e a fiscalização dos recursos utilizados na campanha. Mantidas a desaprovação das contas e a ordem de recolhimento ao Tesouro Nacional. 6. Desprovimento. (Recurso Eleitoral n 060051796, ACÓRDÃO de 07/12/2021, Relator FRANCISCO JOSÉ MOESCH, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE.) (Grifei.)
 

Na mesma linha é o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (ID 45565793), cujas considerações acolho como razões de decidir:

Deve remanescer o apontamento referente à fornecedora Katia Regina Pinto Flores da Rosa, visto que não identificado nos extratos bancários a contraparte dos pagamentos.

Cumpre ressaltar que os meios de pagamento previstos no art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/2019 são os únicos que permitem identificar exatamente a pessoa, física ou jurídica, que recebeu o valor depositado na conta de campanha, constituindo, assim, um mínimo necessário para efeito de comprovação do real destinatário dos recursos e, por consequência, da veracidade do gasto correspondente.

Acerca dos apontamentos relativos ao fornecedor Francisco Javier Machado (inconsistência B - documento fiscal sem as dimensões do material impresso produzido), ainda que se possa haver o afastamento da glosa relativa à produção de colinhas, na esteira da jurisprudência dessa Egrégia Corte, identificou-se nos extratos bancários que tais despesas também foram pagas sem a observância dos critérios do art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/2019, ou seja, não se identifica nos extratos bancários a contraparte beneficiária de tais despesas.

Identificou-se, ademais, o pagamento em duplicidade em favor de Francisco Javier Machado, no valor de R$7.500,00.

 

Ainda, em relação aos gastos realizados com o fornecedor Francisco Javier Machado, CNPJ: 35.265.240/0001-00, além de haver pagamento em duplicidade no valor de R$ 7.500,00, verifica-se que as Notas Fiscais foram emitidas sem a descrição da dimensão do material impresso (ID 45522582).

A legislação eleitoral estipula que a comprovação de gastos de campanha com material impresso demanda a indicação, no corpo do documento fiscal, das dimensões do produto, conforme preceitua o art. 60, caput, c/c os §§ 3º e 8º, da Resolução TSE n. 23.607/19:

 

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das(os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

[…]

§ 3º A Justiça Eleitoral poderá exigir a apresentação de elementos probatórios adicionais que comprovem a entrega dos produtos contratados ou a efetiva prestação dos serviços declarados.

[...]

§ 8º A comprovação dos gastos eleitorais com material de campanha impresso deve indicar no corpo do documento fiscal as dimensões do material produzido.

 

A simples informação, pelo próprio prestador, a respeito do tipo de material produzido não teria o condão de substituir os dados que deveriam constar na nota fiscal, não sendo apta, portanto, para afastar falha.

Ausente a indicação no corpo do documento fiscal das dimensões do material produzido, o gasto eleitoral deixou de ser adequadamente comprovado.

Logo, remanescem as irregularidades dos gastos realizados com recursos do FEFC no montante de R$ 62.498,00, valor que deve ser restituído ao Tesouro Nacional em razão da ausência de comprovação segura de sua utilização regular, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

O parecer da unidade técnica também indicou divergência entre os valores repassados à empresa Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. e aqueles constantes no documento fiscal emitido pelo fornecedor.

O prestador de contas efetuou pagamento no valor total de R$ 7.667,00 ao fornecedor de serviços (por intermédio da DLOCAL A SERVIÇOS DE FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE DO BRASIL LTDA), referente à prestação de serviços de impulsionamento de conteúdo na internet, e a empresa lançou nota fiscal no valor de R$ 5.362,53, não tendo sido identificada a devolução da diferença (saldo) no valor de R$ 2.304,47, que deveria ter sido recolhida ao Tesouro Nacional.

Intimado para manifestar-se sobre a falha, o prestador de contas silenciou.

Em se tratando de despesa paga com verbas do FEFC para serviço de impulsionamento de conteúdos, eventual crédito contratado e não utilizado até o final da campanha deve ser registrado como sobra de campanha e recolhido à conta do Tesouro Nacional.

Esta Corte firmou posição no sentido de que é de responsabilidade do candidato a gestão dos recursos e o recolhimento de eventuais sobras de valores públicos, os quais devem retornar ao erário, na forma do art. 35, § 2º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19. Nesse sentido: Prestação de Contas Eleitorais n. 060316716, Relatora Desa. Eleitoral Elaine Maria Canto da Fonseca, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 111, Data: 22.6.2023.

Logo, não comprovado o recolhimento dos valores referentes aos créditos de impulsionamento não utilizados, é de ser reconhecida a falha, uma vez que os requisitos normativos não foram atendidos no caso em tela, estando ausente a prova da regularidade de parte da despesa.

Via de consequência, considero irregular o gasto, cabendo a determinação do recolhimento da diferença de R$ 2.304,47 ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Ante o exposto, em consonância com os pareceres da unidade técnica e da Procuradoria Regional Eleitoral, deve ser recolhida ao Tesouro Nacional a quantia total de R$ 64.802,47 (sessenta e quatro mil oitocentos e dois reais e quarenta e sete centavos), nos termos da fundamentação supra.

Considerando que as falhas, no valor total de R$ 64.802,47 (sessenta e quatro mil oitocentos e dois reais e quarenta e sete centavos), representam 49,46% do total de receitas arrecadadas (R$ 131.000,00), inviável a aplicação dos princípios da proporcionalidade ou razoabilidade, ou valor módico (até R$ 1.064,10), motivos pelos quais as contas devem ser desaprovadas.

 

ANTE O EXPOSTO, voto por desaprovar as contas de campanha de CLAUDIOMIRO PIAZZA RODRIGUES, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual nas Eleições Gerais de 2022, nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e por determinar a devolução de R$ 64.802,47 (sessenta e quatro mil oitocentos e dois reais e quarenta e sete centavos) ao Tesouro Nacional.

É o voto.