PCE - 0602006-68.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/04/2024 00:00 a 25/04/2024 23:59

VOTO

Eminentes colegas.

VIVIA CORREA DE QUADROS, candidata não eleita ao cargo de deputada federal nas Eleições 2022, apresentou sua prestação de contas referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha.

Processados os documentos nos termos da Resolução TSE n. 23.607/19, foi elaborado parecer conclusivo em que o órgão técnico apontou as seguintes falhas: a) utilização de Recursos de Origem Não identificada – RONI, no montante R$ 235,00 (duzentos e trinta e cinco reais) e b) irregularidades na comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, no valor de R$ 54.435,00 (cinquenta e quatro mil quatrocentos e trinta e cinco reais). Ao final, foi recomendada a desaprovação das contas e o recolhimento de R$ 54.670,00 (cinquenta e quatro mil seiscentos e setenta reais) ao Tesouro Nacional (ID 45512247).

A Procuradoria Regional Eleitoral, em análise, apontou que os gastos com serviços advocatícios, no montante de R$ 26.500,00, não foram devidamente justificados pela candidata (ID 45515846).

Passo à análise das irregularidades apontadas.

 

Da utilização de Recursos de Origem Não Identificada – RONI

Foi detectada pelo órgão técnico, mediante circularização e/ou informações voluntárias de campanha e/ou confronto com notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais, a omissão de gastos de campanha no valor de R$ 235,00 (duzentos e trinta e cinco reais), conforme tabela abaixo (ID 45512247):

 

Intimada a manifestar-se quanto ao ponto, a prestadora de contas quedou-se inerte (ID 45504430).

Na hipótese, os gastos estão relacionados à aquisição de serviços de internet e de combustível, respectivamente, com os fornecedores LOCAWEB SERVICOS DE INTERNET S/A e COMERCIO DE COMBUSTIVEIS FRIDERICHS LTDA., nos valores de R$ 120,00 e R$ 115,00.

Com efeito, tais gastos, identificados por meio da emissão dessas duas notas fiscais, vinculados ao CNPJ da campanha, não declarados na prestação de contas, caracterizam omissão de registro de despesas, infringindo o disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual determina que a prestação de contas deve ser composta das informações relativas a todos os gastos eleitorais, devidamente especificados.

Esse é o entendimento desta Corte sobre o tema. Confira-se:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA ELEITA. DEPUTADA ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. ATRASO NA ENTREGA DOS RELATÓRIOS FINANCEIROS. MERA IMPROPRIEDADE. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADAS - RONI. NOTAS FISCAIS NÃO DECLARADAS. OMISSÃO DO REGISTRO DE DESPESA. INFRAÇÃO AO DISPOSTO NO ART. 53, INC. I, AL. "G", DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. MONTANTE INSIGNIFICANTE. REGULARIDADE DAS CONTAS NÃO COMPROMETIDA. BAIXA REPRESENTATIVIDADE DAS FALHAS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas apresentada por candidata eleita ao cargo de deputada estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

[...]

3. Recursos de origem não identificada. Notas fiscais não declaradas relacionadas ao abastecimento de combustíveis. O DANFE não é, não substitui, e não se confunde com uma nota fiscal eletrônica. A existência de outras despesas contratadas com o mesmo fornecedor impede que se realize o batimento dos gastos para verificação de perfeita coincidência entre o valor das despesas e os pagamentos efetuados. A emissão de nota fiscal para o CNPJ de campanha gera a presunção de existência da despesa, nos termos do art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19. Havendo o registro da transação comercial nos órgãos fazendários, o ônus de comprovar que o gasto eleitoral não ocorreu ou que ocorreu de forma irregular é do prestador de contas, que deve laborar para o cancelamento da nota fiscal, conforme previsto nos arts. 59 e 92, §§ 5º e 6º, da Resolução mencionada. Os elementos constantes nos autos não são aptos a sanar as irregularidades relativas à duplicidade de emissão de registros por fornecedor de combustíveis. Caracterizada a omissão de registro de despesas, infringindo o disposto no art. 53, inc. I, al. "g", da Resolução TSE n. 23.607/19, que impõe que a prestação de contas deva ser composta das informações relativas a todos os gastos eleitorais, devidamente especificados.

4. As despesas resultantes das notas fiscais omitidas e cujo cancelamento não foi devidamente comprovado implicam sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação do gasto de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal da candidata. Caracterizados os recursos como de origem não identificada, cujo montante deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

5. A soma das falhas corresponde a 0,93% da receita declarada e se mostra insignificante diante dos valores totais geridos pela candidata em sua campanha eleitoral. Assim, como as incorreções não têm aptidão para comprometer a regularidade das contas, em homenagem aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, é caso de aprovação com ressalvas da contabilidade.

6. Aprovação com ressalvas. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº 060311180, Acórdão, Relatora DESA. VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data: 12/12/2022.) (Grifei.)

 

Na mesma linha do precedente, as despesas resultantes dos documentos fiscais omitidos, nos valores de R$ 120,00 e R$ 115,00, no montante de R$ 235,00 (duzentos e trinta e cinco reais), implicam, por consequência, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação dos gastos de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal da candidata, caracterizando o recurso como de origem não identificada, devendo o montante ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Dos Recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC

A examinadora de contas identificou irregularidades na comprovação dos gastos realizados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, no montante de R$ 54.435,00 (cinquenta e quatro mil quatrocentos e trinta e cinco reais), em razão da documentação apresentada não conter a integralidade das informações previstas no art. 35, § 12, e no art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, conforme tabela abaixo (ID 45512247):


 

Compulsando os autos, constato que, de fato, a prestadora de contas não juntou aos autos os respectivos instrumentos contratuais com detalhamento dos prestadores de serviço, locais de trabalho, horas trabalhadas, especificação das atividades e justificativas dos preços contratados das despesas com pessoal constantes na tabela supra, conforme determina o § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 35 (…)

§ 12. As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.

 

A candidata não se manifestou acerca do exame preliminar. Porém, após o parecer conclusivo, tendo em vista nova intimação sobre mais uma falha nas contas, a qual foi identificada pelo Ministério Público Eleitoral, a prestadora apresentou petição sobre os serviços contratados em relação a Clarice Machado de Lima e Andressa Martins Saraiva (ID 45522237), na qual sustenta:

 

CLARISSE MACHADO DE LIMA fora contratada para sortePor outro prisma, em relação a prestação de serviço de coordenação geral de campanha política para deputado federal, quais sem: Coordenar a produção de conteúdo (texto, arte e vídeo) sendo a única responsável pela aprovação ou delegando para uma coordenadora de comunicação, identificar oportunidades de pautas e divulgação para uma imprensa, fazer atendimento para jornalistas, em parceria com uma pessoa responsável pela assessoria de imprensa, gerenciar relações com fornecedores, conferir relatórios com indicadores de desempenho tanto das ferramentas de comunicação, como índice de visitas ao site, número de seguidores, interação nas redes sociais e cobertura na imprensa; como também de quantidade de rodas de conversa ou outros temas que podem ser quantificáveis em toda a campanha política, no litoral norte e demais regiões do Rio Grande do Sul. As despesas de transporte, combustível e alimentação que por ventura tenha ocorrido, foram de inteira responsabilidade da contratada. A referida prestação se iniciou na data 15.08.2022 e com o término previsto para o dia 30.09.2022.

Por outro prisma, em relação a ANDRESSA MARTINS SARAIVA fora contratada para prestação de serviço de coordenação financeira de campanha política para deputado federal, QUE INCLUI DENTRE OUTRAS FUNÇÕES, A DE ORÇAMENTOS PARA AQUISIÇÃO DE MATERIAL DE CAMPANHA, PRODUTOS E PRESTAÇÃO DE SEVIÇOES, COORDENAÇÃDE CUSTOS DE NOVAS FRENTES DE TRABALHO DE PANFLETAGENS, E CABOS ELEITORAIS EM TODO PERIODO DE CAMPANHA POLÍTIVCA, NO LITORAL NORTE E DEMAIS REGIÕES DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. As despesas de transporte, combustível e alimentação que por ventura ocorreu, foram de inteira responsabilidade da contratada. A referida prestação se iniciou na data 15.08.2022 e com o término previsto para o dia 30.09.2022.

Os contratos de prestação de serviços, em sua totalidade foram de acordo com a as regras que regeram o pleito eleitoral de 2022, em especial o art. 100 da Lei 9.504/97.

Portanto, a prestação de contas foi legítima, transparente e uma campanha dentro da realidade financeira oportunizada pelo partido. Por derradeiro, imperioso esclarecer que a candidata cumpriu integralmente as regras vigentes, devendo a prestação de contas ser declarada como completa, não devendo esclarecer nada mais do que já está na prestação de contas, principalmente em relação aos contratos em apreço, uma vez que todos legítimos e nos ditames legais.

 

Ocorre que os argumentos deduzidos não elidem as falhas apontadas e são insuficientes para comprovar as despesas pagas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, sobretudo porque a natureza pública dos recursos impõe maior rigor na observância das normas que regulamentam a comprovação dos gastos eleitorais.

Ademais, toda esta documentação identificada com irregularidades na comprovação dos gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC foi detidamente examinada pela Procuradoria Regional Eleitoral (ID 45515846). Logo, a fim de evitar tautologia, reitero na íntegra o conteúdo da manifestação do Parquet, por entender ter sido minuciosamente analisado o objeto dos documentos, adotando-o como razões de decidir, a concluir que outro não poderia ser o resultado do presente exame, litteris:

 

[…]

Sinteticamente, tem-se dois grupos de inconsistências que comprometem a regularidade das Prestação De Contas Eleitorais, conforme elencado na tabela do parecer conclusivo (ID 45512247, p.4).

(b.1) O primeiro grupo de inconsistências se funda na ausência de documentação com descrição detalhada da operação, sendo necessária a descrição qualitativa e quantitativa dos serviços prestados e ou documento adicional de forma a comprovar a prestação efetiva do serviço, em conformidade com art. 60 da Resolução TSE 23.607/2019.

Nessa situação estão aos gastos realizados com fornecedor PESSOA JURÍDICA -TEREZA MARIA MARTINS (CNPJ 47.736.584/0001-21), com atividades de militância e mobilização de rua, no valor total de R$ 6.935,00, cabendo referir que também foram realizadas despesas com a fornecedora pessoa física TEREZA MARIA MARTINS.

Para comprovar o gasto com recursos do FEFC, a prestadora juntou nota fiscal de serviços eletrônica, contendo a descrição genérica de “prestação de serviço de cabo eleitoral e panfletagem”, o que é insuficiente para aferir a regularidade do gasto (IDs 45163894, 45163892 e 45163872).

Refira-se, ainda, que a pessoa jurídica teve existência apenas no período da campanha eleitoral, aberta em 26/08/2022 e baixada em 30/09/2022 (https://www.econodata.com.br/consulta-empresa/47736584000121-TEREZA-MARIA- MARTINS-SARAIVA).

Nesse contexto, para certificar a regularidade do gasto, essencial o detalhamento da operação, com a descrição qualitativa e quantitativa dos serviços prestados, bem como a apresentação de documento adicional hábil a comprovar o efetivo fornecimento do serviço e sob que condições teria sido prestado, como bem indicou a unidade técnica.

Ademais, intimada, a candidata não se desincumbiu do ônus de comprovar a regularidade dos gastos que realizou com recursos públicos.

Desse modo, deve ser mantida a irregularidade apontada pela unidade técnica em relação ao fornecedor PESSOA JURÍDICA - TEREZA MARIA MARTINS (CNPJ 47.736.584/0001-21), no valor total de R$ 6.935,00, por não observar o disposto no art. 60 da Resolução TSE nº 23.607/2019, impondo-se a obrigação de recolhimento de igual montante ao Tesouro Nacional.

(b.2) O segundo grupo de inconsistências atinge um conjunto de despesas com irregularidades pertinentes à documentação comprobatória de gastos com pessoal, pois não apresenta a integralidade dos detalhes previstos no §12 do art. 35 da Resolução TSE nº 23.607/2019, como o local de trabalho, as horas trabalhadas, as atividades executadas e a justificativa do preço pago.

Nessa situação estão os fornecedores TEREZA MARIA MARTINS (pessoa física), no valor de R$1.500,00, CLARISSE MACHADO DE LIMA, no valor de R$ 23.000,00 e ANDRESSA MARTINS SARAIVA, no valor de R$ 23.000,00.

De fato, a documentação apresentada não se presta à adequada comprovação do conjunto de gastos apontados, no montante de R$ 54.435,00, porquanto não satisfazem as exigências do art. 60 c/c o art. 35, §12, da Resolução TSE nº 23.607/2019.

No que tange à fornecedora TEREZA MARIA MARTINS, a prestadora juntou “Recibo de Pagamento de Honorários” referindo serviço de “cabo eleitoral da campanha política de 2022 (ID 45163865), o que não é um contrato e não se presta a comprovar o gasto.

Na mesma linha, para justificar as despesas com pessoal realizadas com as fornecedoras CLARISSE MACHADO DE LIMA e ANDRESSA MARTINS SARAIVA, a prestadors juntou “Recibo de Pagamento de Honorários” referindo serviço de “coordenação da campanha política de 2022 (ID 45163875) e “Recibo de Pagamento de Honorários” referindo serviço de “coordenação financeira de campanha política de 2022 (ID 45163879), o que se mostra insuficiente para comprovar o efetivo fornecimento do serviço pelas nominadas.

Nesse contexto, essa Procuradoria Regional Eleitoral não logrou localizar nos autos outros documentos que pudessem, minimamente, embasar as despesas realizadas com os fornecedores, de modo que, embora o pagamento tenha sido realizado com recursos da conta FEFC, não há comprovação do gasto eleitoral.

A existência de pagamentos sem a apresentação dos respectivos instrumentos contratuais impede a verificação da natureza dos serviços prestados, ao passo que a apresentação de contratos sem o detalhamento exigido pela legislação eleitoral, notadamente em relação às informações relativas às condições de trabalho, como local das atividades, horas trabalhadas, atividades executadas e justificativa do preço contratado, impossibilita a fiscalização da correta utilização dos recursos públicos oriundos do FEFC.

O total dos pagamentos irregulares, pois sem lastro contratual compatível com as despesas de pessoal e de militância, atinge o valor de R$ 47.500,00, o qual deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE nº 23.607/19.

Cabe observar, a título de registro, que as fornecedoras Clarisse Machado de Lima e ANDRESSA MARTINS SARAIVA eram Assessoras Parlamentares lotadas no gabinete da vereadora Vivia Correa de Quadros, ora prestadora, como se constata no site da Câmara Municipal (https://sapl.xangrila.rs.leg.br/norma/3437 e https://sapl.xangrila.rs.leg.br/media/sapl/public/normajuridica/2021/3199/portaria_24-2021- _nomeacao_clarisse_machado_de_lima.pdf).

Além disso, merece destaque o valor individual das despesas com coordenação e militância (incluídos os pagamentos à pessoa física e jurídica de TEREZA MARIA MARTINS, CLARISSE e ANDRESSA), pois o dispêndio com apenas três fornecedoras atingiu o montante de R$ 54.435,00, o que representa 54,88% do total de despesas contratadas para a campanha (R$ 99.195,43). (Grifei.)

 

A consulta ao Portal da Transparência da Câmara de Vereadores de Xangri-lá (https://xangrila.msgestaopublica.com.br:8079/transparencia_cm/Default.aspx?AcessoIndividual=LnkServidores) também permite concluir que Clarisse Machado de Lima e Andressa Martins Saraiva, enquanto supostamente desenvolviam atividades remuneradas pela campanha eleitoral, também cumpriam expediente na Câmara de Vereadores no período eleitoral, percebendo remuneração para tanto, o que retira a credibilidade da alegação de realização dos serviços descritos nos contratos juntados aos autos.

Portanto, permanece a ausência de comprovação das despesas, visto que não foi atendido o disposto na legislação eleitoral, na linha do que vem decidindo este Tribunal Regional Eleitoral. Colaciono precedente ilustrativo do posicionamento da Corte:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO ELEITO. 3º SUPLENTE. DEPUTADO FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. UTILIZAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE GASTOS. DESPESAS COM IMPULSIONAMENTO JUNTO AO FACEBOOK PARCIALMENTE SANADAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DAS DESPESAS COM SISTEMA DE ALARME E MONITORAMENTO DE IMÓVEL LOCADO. IRREGULARIDADE MANTIDA. GASTOS COM PESSOAL EM DESACORDO COM O DISPOSTO NO ART. 35, § 12, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. IRREGULARIDADES QUE REPRESENTAM ELEVADO VALOR. PRECEDENTES. DESAPROVAÇÃO.

1. Prestação de contas apresentada por candidato eleito ao cargo de 3º suplente de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

[...]

4. Despesas com pessoal sem observância do disposto no art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, que determina que essas “devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado”. Os recibos trazidos não são aptos a comprovar os gastos, visto que não atendem aos requisitos exigidos pela norma. Igualmente sem utilidade como prova a planilha elaborada pelo prestador, pois se trata de declaração unilateral.

5. As falhas apuradas na prestação de contas representam 10,23% da arrecadação, o que impõe a desaprovação das contas em razão do comprometimento de sua regularidade. Percentual superior ao que este Tribunal Regional Eleitoral e o Tribunal Superior Eleitoral vêm decidindo para admitir a aprovação com ressalvas. A superação do limite percentual, mesmo que ligeiramente, atrai a desaprovação da contabilidade, como se verifica nos precedentes em que foram constatadas falhas que totalizaram 10,89%, 11,13% e 10,48% (TSE, Agravo em Recurso Especial Eleitoral n. 060756859, Acórdão, Relator Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 44, Data 15.03.2022; Agravo de Instrumento n. 060542330, Acórdão, Relator Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 204, Data 13.10.2020; Prestação de Contas n. 98742, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 106, Data 06.06.2019, Página 21/23). Determinado o recolhimento dos valores irregulares ao Tesouro Nacional, com fundamento no § 1º do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

6. Desaprovação, com esteio no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19. Determinado o recolhimento do valor irregular ao Tesouro Nacional.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº 060205342, Acórdão, Relator(a) Des. VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 253, Data: 03/12/2022.) (Grifei.)

 

Destarte, em consonância com o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, deve ser recolhida ao Tesouro Nacional a quantia de R$ 54.435,00 (cinquenta e quatro mil quatrocentos e trinta e cinco reais), na forma do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, uma vez que os gastos realizados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC não foram regularmente comprovados nos autos, nos termos da fundamentação supra.

 

Dos gastos com serviços advocatícios

Além das falhas apontadas pelo órgão técnico, a Procuradoria Regional Eleitoral, em seu parecer, identificou nova irregularidade, consubstanciada na ausência de comprovação e justificativa do preço relativo a gastos com serviços advocatícios, no valor de R$ 26.500,00, considerando estarem em montante superior aos dispêndios comumente observados nas prestações de contas de campanhas com semelhante dimensão de despesas contratadas.

O apontamento em questão diz respeito aos seguintes documentos:

- Demonstrativo de despesa com advogado – – R$ 15.000,00 (ID 45079721);

- Demonstrativo de despesa com advogado – R$ 15.000,00 (ID 45163839),

- Recibo de pagamento de honorários, datado de 23.08.2022) – R$ 1.000,00 (ID 45163869);

- Recibo de pagamento de honorários, datado de 09.09.2022 – R$ 1.000,00 (ID 45163864);

- Recibo de pagamento de honorários, datado de 01.09.2022 – R$ 1.000,00 (ID 45163862);

- Recibo de pagamento de honorários, datado de 22.09.2022 – R$ 8.500,00 (ID 45163858);

- Petição de habilitação e procuração de José Diogo Langort Fagundes Júnior nos autos, juntada em 28.10.2022 (ID 45172588 e ID 45172589)

- Contrato de Prestação de Serviços Advocatícios, datado de 15.08.2022 (ID 45522240).

 

Faz-se necessário, aqui, pontuar que a candidata restou devidamente intimada acerca do novo apontamento trazido no parecer ministerial, nos termos dos arts. 72 e 73, parágrafo único, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Contudo, embora tenha exercido o direito de manifestação para esclarecer a falha indicada, ao se pronunciar sobre o questionamento, a prestadora apresentou uma tese defensiva frágil ao argumentar que “cobrar menos do que estabelecido em contrato, seria aviltar o valor dos honorários, além de ferir o estatuto da OAB, que determina valores mínimos, sem teto máximo. Sendo assim, não há irregularidade alguma, ou ausência de comprovação adequada como alegou o MP, em relação ao lastro contratual compatível. Por fim, a prestação de serviços ocorreu, nos moldes do contrato de honorários, não sendo crível, o Ministério Público colocar preço nos serviços jurídicos contratados”.

Cumpre destacar que os honorários advocatícios são considerados gastos eleitorais e, cumprida a normatização, podem ser pagos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e do Fundo Partidário (FP), nos termos do art. 26, § 4º, da Lei n. 9.504/97, bem como do art. 35, § 3º, e art. 36, ambos da Resolução TSE n. 23.607/19.

Por pertinente, arrolo os dispositivos legais que tratam da matéria, isto é, o art. 26, §§ 4º e 5º, da Lei n. 9.504/97, bem como o art. 35, §§ 3º e 4º, e o art. 36, ambos da Resolução TSE n. 23.607/19.

Sobre a questão, andou bem a percuciente análise ministerial ao explicitar que “o gasto representa 26,71% do total de despesas contratadas para a campanha (R$ 99.195,43), repise-se, com apenas um fornecedor em Capão da Canoa, RS”.

Assim, como foi devidamente destacado pelo Ministério Público Eleitoral, no caso concreto, em “relação ao fornecedor JOSE DIOGO LANGORT FAGUNDES JUNIOR, na mesma linha usada para justificar as despesas com pessoal realizadas com as fornecedoras CLARISSE MACHADO DE LIMA e ANDRESSA MARTINS SARAIVA, a prestadora juntou “Recibo de Pagamento de Honorários” referindo serviço de “assessoria jurídica de campanha política de 2022 (ID 45163858 e seguintes) o que se mostra insuficiente para comprovar o efetivo fornecimento do serviço pelas nominadas”.

Ressalto que, por meio do próprio contrato de honorário ou mesmo pela procuração juntada a estes autos, não é possível comprovar a efetiva prestação de serviços à campanha eleitoral.

Ainda que assim não fosse, seria de todo relevante que fosse demonstrada na presente prestação de contas a atuação do advogado Dr. José Diogo Langort Fagundes Júnior nas lides da campanha eleitoral da candidata.

Caso tivessem sido trazidos elementos sobre a prestação de serviços do contrato de honorários, ao menos seria possível mensurar o impacto dos serviços no valor do contrato. Entretanto, em relação a essa contratação, encontra-se ausente o detalhamento dos serviços para justificar o gasto e a respectiva vinculação à campanha eleitoral.

Nesse sentido, o Tribunal Superior Eleitoral já decidiu (ainda que examinando prestação de contas de exercício) que a descrição genérica de “honorários advocatícios” é inadequada, sendo viável a exigência de comprovação da prestação dos serviços, em especial, com a juntada de planilha de processos e relatórios em ações em que o procurador atuou ou mesmo cópias de peças produzidas, tudo para verificar se as atividades desempenhadas guardaram relação com a campanha eleitoral. Confira-se:

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DIRETÓRIO NACIONAL. PARTIDO LIBERAL (PL). APROVAÇÃO COM RESSALVAS. VÍCIOS. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. RECOLHIMENTO. ERÁRIO. RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. POSSIBILIDADE. ESCLARECIMENTOS. ACOLHIMENTO PARCIAL.

1. No aresto que se embarga, esta Corte Superior, por unanimidade, aprovou com ressalvas as contas do Diretório Nacional do Partido Liberal (PL) relativas ao exercício de 2017, determinando o recolhimento ao erário de R$ 875.759,79.

2. Assentou-se de modo claro que a glosa da despesa de R$ 528.323,20 com serviços advocatícios decorreu dos seguintes fatores: a) "os documentos fiscais contêm [...] descrição genérica: ¿honorários advocatícios'"; b) "na planilha apresentada pela grei constam processos nos quais nem sequer é possível inferir vínculo com a atividade partidária, tais como investigação criminal e reclamação trabalhista"; c) "exige-se a apresentação de relatórios dos processos em que os causídicos atuaram, ou cópias de peças judiciais, de modo a aferir a vinculação das despesas com serviços advocatícios às atividades do partido", o que a grei deixou de diligenciar nesse sentido; d) o contrato abrange o "acompanhamento e defesa dos membros do Diretório Nacional do Partido Liberal e dos membros da Bancada do Partido Liberal no Congresso Nacional"; e) "consta do termo aditivo que o objeto do contrato inclui a assistência jurídica ao Instituto Álvaro Valle, o que, a toda evidência, é inadmissível, pois os gastos do partido não se confundem com os do instituto".

3. No caso, as ações indicadas pelo partido em planilha nem sequer foram ajuizadas no exercício de 2017.

4. A existência de processos em nome do causídico não basta para atestar a despesa com serviços advocatícios, sendo imprescindível a apresentação de documentos que corroborem quais atividades foram prestadas para cada exercício financeiro.

5. Em resumo, reitera-se que a planilha não contém esclarecimentos específicos e suficientes acerca dos processos nos quais em tese o advogado atuou, não sendo possível correlacionar o gasto com a atividade partidária.

6. Conforme esta Corte Superior, como regra, a restituição de valores ao erário deve ocorrer por meio de recursos próprios do partido. De todo modo, é possível o uso de verbas do Fundo Partidário para recompor os cofres públicos em prestações de contas, circunstância que, porém, há de ser examinada na fase de cumprimento do julgado.

7. Embargos de declaração parcialmente acolhidos apenas para prestar esclarecimentos.

Embargos de Declaração em Prestação de Contas nº060042894, Acórdão, Min. Benedito Gonçalves, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 19/06/2023. (grifei)

 

Logo, tendo em consideração que o uso dos recursos públicos exige sua aplicação integral na campanha eleitoral, o que no caso não ficou comprovado, tenho que é razoável e proporcional glosar toda a contratação em virtude da controvérsia sobre tal item.

Por conseguinte, na esteira da manifestação ministerial, impõe-se o reconhecimento e a manutenção da irregularidade identificada pelo Ministério Público Eleitoral, não podendo ser afastada diante da debilidade probatória trazida pela prestadora quanto aos requisitos exigidos para sua descaracterização.

Tal prestação de serviços, portanto, não foi devidamente comprovada, devendo o montante de R$ 26.500,00 ser recolhido ao Tesouro Nacional, na forma prescrita pelo art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Em conclusão, considerando que as falhas, no valor R$ 81.170,00 (R$ 235,00 + R$ 54.435,00 + R$ 26.500,00), representam 81% do total de receitas arrecadadas (R$ 100.208,00), é inviável a aplicação dos princípios da proporcionalidade ou razoabilidade, ou valor módico (até R$ 1.064,10), motivos pelos quais as contas devem ser desaprovadas.

 

ANTE O EXPOSTO, acolho o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral e voto por desaprovar as contas de campanha de VIVIA CORREA DE QUADROS, candidata não eleita ao cargo de deputada federal nas Eleições Gerais de 2022, nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e por determinar a devolução de R$ 81.170,00 (oitenta e um mil cento e setenta reais) ao Tesouro Nacional.

É o voto.