PCE - 0602905-66.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 22/04/2024 às 14:00

VOTO

O parecer conclusivo aponta as seguintes falhas:

a) irregularidades na aplicação de recursos procedentes do Fundo Especial de Financiamento de campanha (FEFC) no total de R$ 12.156,32, em razão: a1) da ausência de contrato de R$ 11.000,00 firmado com a militante Vanessa Cristina Lopes Alves; a2) do pagamento de R$ 48,00 em alimentação da própria candidata; a3) da falta de recolhimento do saldo de R$ 1.108,32, relativo à sobra de créditos de impulsionamento de conteúdo de internet não utilizados (itens 4.1.1 e 4.1.2 do relatório preliminar e do parecer conclusivo, ID 45495943 e 45512436);

b) impropriedade contábil na movimentação financeira de R$ 1.226,60, proveniente de “outros recursos”, pois a quantia privada foi movimentada na conta bancária específica para utilização de recursos do FEFC (item 1.1 do relatório preliminar e do parecer conclusivo, ID 45495943 e 45512436).

Passo à análise das irregularidades:

 

a1) Ausência de juntada de contrato firmado com Vanessa Cristina Lopes Alves

Quanto ao apontamento de ausência de documentação da contratação de Vanessa Cristina Lopes Alves por R$ 11.000,00, o órgão técnico consignou que a documentação de comprovação dos gastos com pessoal não apresenta a integralidade dos detalhes previstos no §12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23607/19, tais como locais de trabalho, horas trabalhadas, especificação das atividades executadas e justificativa do preço contratado.

Referiu que não foi juntado nenhum documento comprobatório da despesa, mesmo após a intimação da prestadora.

Após a emissão do parecer conclusivo, a candidata juntou aos autos um relatório descrevendo os dados questionados, no qual afirma que a beneficiária do pagamento teria sido uma assessora de políticas da campanha, mas o documento se trata de peça unilateral, e está desacompanhado de contrato assinado pelas partes (ID 45543363).

De fato, do exame dos autos não se verifica cópia do contrato com a militante Vanessa Cristina Lopes Alves, no valor de R$ 11.000,00 (onze mil reais), em desatenção às exigências dos arts. 35, § 12, 53, inc. II, al. "c" e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19 (item 4.1.1 do parecer conclusivo, ID 45512436).

De igual modo, a Procuradoria Regional Eleitoral refere que “não logrou localizar nos autos documentos fiscais ou contratuais pertinentes ao fornecedor que embasem o pagamento, restando, pois, sem comprovação o gasto realizado com recursos do FEFC”, e também concluiu que o relatório elaborado de forma unilateral não tem o condão de afastar a irregularidade identificada (ID 45548683):

Portanto, à vista da ausência das informações seguras de que trata os arts. 35, § 12, 53, inc. II, al. “c”, e 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19, fator que culmina na impossibilidade de fiscalização e transparência sobre o conteúdo e os requisitos legais dessa prestação de serviço, considera-se irregular a utilização de recursos originados do FEFC na quantia de R$ 11.000,00 (onze mil reais), a qual deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, consoante dispõe o § 1° do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

a2) Falha no pagamento de despesas de natureza pessoal com alimentação, art. 35, § 6º, al. “c”, da Resolução TSE n. 23.607/19

A glosa relativa ao pagamento de natureza pessoal da candidata foi apontada devido ao gasto de R$ 48,00 com recursos do FEFC na Padaria e Confeitaria Haiti Ltda. para alimentação própria.

A candidata não se manifestou sobre a falha, e o pagamento da despesa tem caráter pessoal, conforme informações constantes da nota fiscal de ID 45258188.

Assim, não são consideradas gastos eleitorais e não podem ser pagas com recursos públicos da campanha as despesas de natureza pessoal da candidata com alimentação, por força de disposição expressa do art. 35, § 6º, al. “c”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Logo, mantenho esse apontamento técnico, devendo ser recolhido ao erário o valor de R$ 48,00 (quarenta e oito reais), na forma do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

a3) Falta de comprovação dos gastos com impulsionamento de conteúdo de internet (art. 35, §2º, da Resolução TSE n. 23.607/19):

Ao examinar as contas, a unidade técnica verificou a aquisição de créditos de impulsionamento de conteúdo de internet no valor total de R$ 6.600,00 através da empresa Dlocal Ltda., a serviço de Facebook Serviços Online do Brasil Ltda., com recursos procedentes do FEFC.

Do total contratado, houve somente comprovação da destinação da quantia de R$ 5.491,68 para o serviço em questão, mediante emissão de notas fiscais, resultando em diferença (saldo) do valor de R$ 1.108,32, a qual não foi recolhida ao Tesouro Nacional, contrariando o disposto no art. 35, § 2º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19 (item 4.1.2 do parecer conclusivo, 45512436; comprovantes de depósito, IDs 45258193, 45258197 e 45258199).

Intimada, a candidata permaneceu silente sobre esse ponto.

Dessa forma, não há justificativa para afastar a falha constatada, pois a candidata encerrou sua campanha com créditos não utilizados junto ao Facebook oriundos de recursos do FEFC, os quais deveriam obrigatoriamente ter sido devolvidos pela empresa fornecedora, pois não houve contraprestação de serviços, e restituídos ao Tesouro Nacional, conforme estabelece o art. 35, § 2º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Eventual dificuldade do prestador na obtenção do respectivo ressarcimento junto à empresa ou do comprovante fiscal deve ser dirimida na via processual própria, pois a jurisprudência desta Corte está consolidada no sentido de que a responsabilidade pela gestão dos valores destinados à campanha eleitoral cabe exclusivamente aos candidatos, às candidatas e aos respectivos partidos políticos, não sendo legítima a transferência de responsabilidade a terceiros (nesse sentido: TRE/RS – PCE n. 060237477, Relatora Desembargadora Eleitoral Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, Publicação: DJE, Tomo 273, 16/12/2022; TRE-RS – PCE n. 0603167-16, Relatora: Desembargadora Eleitoral Elaine Maria Canto da Fonseca, Julgamento: 19/06/2023, Publicação: DJE, Edição 111/2023, em 22/06/2023).

Com efeito, o § 10 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõe que: “O pagamento dos gastos eleitorais contraídos pelas candidatas ou pelos candidatos será de sua responsabilidade”.

Destarte, a sobra financeira de R$ 1.108,32 deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, consoante dispõe o inc. I, § 2º, do art. 35, c/c o § 1° do art. 79, ambos da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

b) impropriedade na movimentação financeira.

Houve apontamento sobre impropriedade de movimentação financeira de R$ 1.226,60 proveniente de outros recursos na conta bancária destinada especificamente ao fundo financiamento de campanha (item 1.1 do relatório preliminar e do parecer conclusivo, ID 45495943 e 45512436).

A candidata, intimada, manteve-se inerte.

Embora o parecer técnico assevere a inexistência de afetação na identificação da origem das receitas e da destinação das despesas, acolho o requerimento da Procuradoria Regional Eleitoral pela manutenção da impropriedade para aferição do juízo de reprovabilidade das contas, sem recolhimento de valores, em razão de descumprimento da norma prevista no § 2º do art. 9º da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Conclusões

Deste modo, as irregularidades somadas representam R$ 13.382,92 (R$ 11.000,00 + R$ 48,00 + R$ 1.108,32 + R$ 1.226,60), equivalendo a 13,22% do total de recursos recebidos pela candidata em sua campanha (R$ 101.226,60), e extrapolam os parâmetros fixados na jurisprudência desta Justiça Especializada de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade, para formar juízo de aprovação com ressalvas da contabilidade (ou seja, montante superior a R$ 1.064,10 e excedente a 10% da arrecadação financeira).

Todavia, nos termos da fundamentação, deixo de determinar o recolhimento da quantia de R$ 1.226,60 ao erário, uma vez que, embora deva ser mantida a falha, foi possível identificar a procedência e destinação do valor.

Dessa forma, em linha com o entendimento da Procuraria Regional Eleitoral (ID 45548683), impõe-se a desaprovação das contas, na forma do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/2019.

 

Em face do exposto, VOTO pela desaprovação das contas de LIZIANE CRISTINE OLIVEIRA SOARES, determinando o recolhimento, com juros e com correção monetária, da quantia de R$ 12.156,32 (doze mil cento e cinquenta e seis reais e trinta e dois centavos) ao Tesouro Nacional, referente à aplicação irregular de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, com fundamento no § 1° do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.