PCE - 0603238-18.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 22/04/2024 às 14:00

VOTO

Eminentes colegas.

MARCIO CRISTIANO PRADO DE FREITAS, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual nas Eleições 2022, apresentou sua prestação de contas referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha.

A Secretaria de Auditoria Interna - SAI, examinando a contabilidade, apontou como não superada parte das irregularidades relativas a gastos pagos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC.

Passo à análise dos apontamentos.

Segundo detectado pelo órgão técnico, o prestador efetuou o pagamento de despesas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC, no total de R$ 17.250,00, as quais não restaram devidamente comprovadas:

Para melhor análise, trago aos autos prints da tabela elaborada pelo órgão técnico, seccionada por tipo de irregularidade:

As primeiras irregularidades, relativas aos gastos contratados com Wilson Talavitz Junior, dizem respeito à aquisição de bens permanentes com recursos públicos, os quais foram alienados ao final da campanha sem comprovação de que a soma obtida tenha sido transferida para o Tesouro Nacional, conforme determina o art. 50, § 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

As três primeiras notas (números 42424664, 42.374.026 e 42399508) referem-se à aquisição de três caixas de som veicular (cada documento) para publicidade e a última (número 42503511) refere-se a uma unidade, ao custo de R$ 2.500,00 cada, totalizando a quantia de R$ 25.000,000.

Ao final da campanha, os bens foram alienados no estado em que se encontravam - com parafusos faltantes e defeitos de "desinstalação" - por apenas R$ 6.500,00, para a empresa Carrasco Auto Center (mesma empresa que forneceu os produtos, conforme se verifica no extrato bancário), de acordo com o Termo de Alienação ID 45514826, o qual também indica que o equipamento seria "personalizado", o que demonstra, no mínimo, falta de zelo do prestador com os recursos públicos.

Entretanto, a análise técnica não glosou essa aquisição, recaindo o apontamento tão somente na ausência de comprovação do recolhimento do montante da alienação - R$ 6.500,00 - ao Tesouro Nacional.

O comprovante de ID 45514826 (pág. 4) demonstra que o valor foi repassado para a conta particular do candidato.

Além disso, em que pesem as informações fornecidas por meio do despacho ID 45515159, inclusive com o respectivo link e código para a emissão da Guia, o prestador não comprovou o recolhimento do valor obtido com a alienação, ao Tesouro Nacional, o qual deveria ter sido feito imediata e espontaneamente, sem necessidade de intimação ou marcação de prazo.

Assim, impõe-se a determinação de recolhimento da quantia de R$ 6.500,00 ao erário.

A despesa contratada com Gilnei de O. Januario & Cia Ltda., no valor de R$ 4.800,00, diz respeito à contratação de locação de veículo (locação de ônibus com motorista). A contratação da pessoa jurídica foi inadequadamente demonstrada com recibo, quando deveria o prestador ter exigido do fornecedor - e juntado aos autos - a respectiva nota fiscal, nos termos do art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, verbis:

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das(os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

Com efeito, em se tratando de pessoa jurídica, devidamente inscrita nos órgãos fiscais competentes, o recibo não se presta à comprovação do gasto que, além do mais, pode ser indicativo de sonegação de imposto pelo fornecedor.

Confira-se, a respeito, precedente desta Corte:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA. DEPUTADO FEDERAL. ELEIÇÕES 2018. SEGUNDA APRESENTAÇÃO PARA JULGAMENTO. INCONSISTÊNCIA REFERENTE À SITUAÇÃO FISCAL DE FORNECEDORES. AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS DE DESPESAS REALIZADAS COM

RECURSOS PÚBLICOS. ALTO PERCENTUAL DAS FALHAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. Os autos foram anteriormente apresentados para julgamento, contudo, tendo em vista o surgimento de controvérsia entre os membros da Corte acerca da idoneidade dos comprovantes de gastos com combustíveis e daqueles realizados com pessoas jurídicas, os quais não constaram explicitamente examinados no parecer conclusivo, o Pleno decidiu, por unanimidade, converter o julgamento em diligência, com o retorno dos autos à unidade técnica e antecedente abertura de prazo para manifestação da candidata sobre a questão específica. Observadas as diligências determinadas e reavaliados os documentos apresentados pela prestadora de contas, retornam os autos para julgamento.

2. Inconsistência identificada pelo órgão técnico referente à situação fiscal de dois fornecedores, pessoas jurídicas, contratados durante a campanha, cujos números de CNPJ estão baixados junto à Receita Federal, sem prova da capacidade operacional das empresas. No primeiro caso, a candidata, ao contratar, não tinha meios de aferir a inidoneidade fiscal da fornecedora, que restou encoberta pela nota fiscal aparentemente regular, induzindo-a a erro, não havendo como atribuir à prestadora eventuais consequências da falha. Quanto ao segundo caso, a despesa foi demonstrada por meio de um simples recibo de pedido de serviço, sem valor fiscal, comprometendo a confiabilidade e a fiscalização do gasto informado. No ponto, tratando-se de contratação com pessoa jurídica, exige-se a comprovação por documentos fiscais idôneos, na forma do art. 63, caput, da Resolução TSE n. 23.553/17, não se admitindo a mera apresentação de contratos ou recibos. Portanto, configurado o descumprimento da norma.

3. Ausência de documentos comprobatórios, quais sejam, cópia do cheque nominal ou demonstrativo de transferência bancária, relativos ao pagamento de despesas realizadas com recursos do FEFC, para os quais os extratos eletrônicos não identificam a contraparte beneficiária da operação. Evidenciada a inobservância das formas de pagamento para realização dos gastos eleitorais prescritas pelo art. 40 da Resolução TSE n. 23.553/17.

4. O valor total das falhas representa 28,74% das despesas realizadas durante a campanha, o que inviabiliza a aplicação dos princípios da proporcionalidade ou razoabilidade para atenuar a importância das máculas sobre a regularidade e transparência do conjunto das contas. A desaprovação das contas é medida que se impõe, assim como a determinação de recolhimento das quantias irregulares ao Tesouro Nacional.

5. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 20.515,48.

(Prestação de Contas nº 060341096, Acórdão, Relator(a) Des. DES. ELEITORAL SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE.) (Grifei.)

 

Portanto, ausente prova idônea da despesa, a determinação de recolhimento do valor de R$ 4.800,00 para o Tesouro Nacional é medida que se impõe.

As demais irregularidades relativas à comprovação de gastos dizem respeito a locações de imóveis de Luísa Nunes, Fiovarante Roberto Pereira, Marcia Andrea da Cunha Miranda e Marelinda de Fatima Bettanzos Medeiros.

Em relação a essas despesas, o órgão técnico apontou que, embora apresentada declaração do locador dando conta de que o imóvel não possui escritura pública e ou documento comprovando que a área do imóvel é do município, tecnicamente, permanece a falha visto que não foi apresentada documentação de propriedade do bem em nome do fornecedor.

Quanto ao imóvel locado de Luísa Nunes, localizado no Bairro Guajuviras, em Canoas, ao custo de R$ 2.400,00 pelo período de um mês, foi apresentada declaração da locadora de que o imóvel está em processo de regularização, bem ainda que "a conta de luz sob o código de instalação nº 3092812211, que o código do imóvel junto a CORSAN é 22259422". Todavia, a declaração não é suficiente para comprovar a propriedade do imóvel locado (ID 45514819).

O imóvel locado de Fioravante Roberto Pereira, no valor de R$ 2.250,00, pelo período de um dia, trata-se, na verdade, da sublocação da sede do Centro de Tradições Gaúchas "Raízes da tradição", no bairro Harmonia, em Canoas, para realização de treinamento de colaboradores e simpatizantes do candidato, conforme declaração assinada pelo sublocador, na qual esclareceu que o bem não tem matrícula ou registro (ID 45514820).

Ocorre que o CTG em questão é registrado como pessoa jurídica e inscrito no CNPJ n. 93.542.934/0001-36, conforme pesquisa realizada junto à base de dados da Receita Federal. Logo, se Fioravante detinha, de alguma forma, a posse do imóvel a título de economato, por exemplo, deveria o prestador ter apresentado o respectivo contrato.

O gasto realizado com a locação do imóvel de Marcia Andrea da Cunha Miranda, localizado na Ilha da Pintada, em Porto Alegre, ao custo de R$ 800,00, também não veio comprovado por documento de propriedade.

Relativamente ao imóvel locado de Marelinda de Fatima Bettanzos Medeiros, uma garagem no Bairro Rio Branco, em Canoas, pelo valor de R$ 500,00, foi juntada declaração da locadora informando que o imóvel está em processo de regularização, acompanhada de Boletim de Cadastramento Imobiliário emitido pela Prefeitura de Canoas (ID 45514823). Todavia, mencionado boletim não apresenta nenhum dado que vincule ao menos a posse do bem à locadora, como nome e/ou CPF, por exemplo. Da mesma forma, os demais documentos juntados não comprovam a propriedade do imóvel.

Ainda que, em alguns casos, este Tribunal Regional Eleitoral admita outros documentos, que não a matrícula do registro de imóveis, para comprovar a propriedade dos imóveis locados a candidatos, a ocorrência de várias dessas situações em uma única campanha não recomenda que os requisitos para demonstração do gasto custeado com recursos públicos sejam flexibilizados.

Conclui-se que, em relação a tais contratos, os quais somam a quantia de R$ 5.950,00, deve ser mantida a glosa do órgão técnico e determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79. § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Por fim, a unidade técnica glosou o pagamento de despesa referente a impulsionamento de conteúdo na rede social Facebook, no valor de R$ 2.000,00, sem a apresentação de nota fiscal ou comprovante de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor referente aos créditos contratados e não utilizados, nos termos do art. 35, §2º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

O órgão técnico, em confronto com as notas fiscais eletrônicas, por meio do sistema Fiscaliza JE - SPCEWEB, acessou duas notas fiscais, no total de R$ 236,53, que reduzem o valor da irregularidade.

O candidato afirmou (ID 45514802) que

teve sua conta desativada, não sendo possível ter utilizado os serviços contratados em sua plenitude a no período de campanha eleitoral. Consigamos muitos e frequentes são os problemas nas eleições com a referida plataforma "FACEBOOK" - o que aqui foi o caso -, pois não foi permitido o uso dos créditos contratados pelo candidato, e mais, o candidato não teve os recursos devolvidos, conforme se comprova a conta está desativada e os recursos estão lá, impossibilitados de serem resgatados.

[…]

Diante de toda a evidencia, nobre examinadora, o candidato está com sua conta desativada, impossibilitado pela plataforma de buscar a devolução dos recursos empenhados na contratação dos serviços junto a plataforma.

Neste sentido, o candidato reafirma seu compromisso em tentar solucionar o problema imposto pela plataforma, e está tentando o efetivo resgate dos valores para faça a devida devolução, e consequente recolhimento ao tesouro nacional no exato valor de R$ 1.763,47, em conformidade com o previsto no art.53, II e de forma a comprovar os art. 35 e 60 da Resolução TSE 23.607/2019.

 

Ocorre que esta Corte tem firme posicionamento no sentido de que a "responsabilidade pela gestão dos valores destinados à campanha eleitoral cabe direta e exclusivamente ao candidato, a qual não é mitigada pela omissão de fornecedor no ressarcimento dos valores", no que diz respeito especificamente ao Facebook (Prestação De Contas Eleitorais n. 060313426, Acórdão, Des. CAETANO CUERVO LO PUMO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 29/01/2024).

Em se tratando de despesa paga com verbas do FEFC para serviço de impulsionamento de conteúdos, eventual crédito contratado e não utilizado até o final da campanha deve ser registrado como sobra de campanha e recolhido à conta do Tesouro Nacional, nos termos adiantados da análise técnica.

Logo, não comprovado o recolhimento dos valores referentes aos créditos de impulsionamento não utilizados, é de ser reconhecida a falha, uma vez que os requisitos normativos não foram atendidos no caso em tela, estando ausente a prova da regularidade de parte da despesa.

Via de consequência, considero irregular o gasto, cabendo a determinação do recolhimento da diferença de R$ 1.763,47 ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

O total das irregularidades, no valor de R$ 19.013,47 (R$ 17.250,00 + R$ 1.763,47), deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 79.(...)

§ 1º Verificada a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou a sua utilização indevida, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional no prazo de 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado, sob pena de remessa dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União, para fins de cobrança.

 

Em conclusão, e adotando integralmente o parecer ministerial, considerando-se que o total das irregularidades representa 2,28% do montante de recursos recebidos pelo candidato, de R$ 833.340,00, é possível a aprovação das contas com ressalvas, a qual não dispensa a restituição dos valores glosados.

 

ANTE O EXPOSTO, voto por aprovar com ressalvas as contas de campanha de MÁRCIO CRISTIANO PRADO DE FREITAS, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual nas Eleições Gerais de 2022, nos termos do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, e por determinar a devolução de R$ 19.013,47 (dezenove mil, treze reais e quarenta e sete centavos) ao Tesouro Nacional.

É o voto.