ED no(a) REl - 0600116-79.2022.6.21.0005 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/04/2024 00:00 a 18/04/2024 23:59

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

Inicialmente, cumpre consignar que os embargos de declaração só podem ser opostos com o objetivo específico de esclarecer obscuridade ou contradição, sanar omissão ou corrigir erro material existente na decisão judicial, conforme expressamente estabelece o art. 1.022 do Código de Processo Civil.

É entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça que “a boa técnica dos embargos declaratórios visa a escoimar o relatório, os fundamentos e o acórdão de incoerências internas, capaz de ameaçarem sua inteireza” e, portanto, não é o meio adequado para o embargante “obter o reexame da matéria versada nos autos, na busca de decisão que lhe seja favorável” (STJ, EDcl no REsp 440.106/RJ, 6a Turma, Rel. Min. Celso Limongi, DJe 23.8.2010).

No caso dos autos, ou a mera leitura do acórdão embargado afasta as alegações de vício, ou as exigências de esclarecimento refogem à seara eleitoral.

Explico.

1. No que diz respeito à alegação de que “é necessário que seja aclarado de que forma poderia ter sido cancelada as notas em duplicidade”, convém salientar que se trata de procedimento afeito à seara do direito tributário, em informações que devem ser obtidas perante o órgão arrecadador correspondente (por exemplo, a Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul). As operações de cancelamento – e aqui a referência é feita apenas a título de argumento por se tratar de conhecimento bastante comum entre os operadores do direito e das ciências contábeis - são geralmente simples, muito embora exijam, de fato, a obediência de prazo hábil, sob pena de inviabilidade do cancelamento.

Ou seja, em verdade, nos presentes embargos, o embargante requer o esclarecimento de alegado vício, porque ele mesmo deixou escoar o prazo de cancelamento de nota fiscal – ônus que lhe cabe na condição de prestador de contas. Das máximas de experiência decorrentes da atuação desta Corte, é possível assentar que, com frequência, partidos e candidatos operam o cancelamento de notas fiscais que eventualmente não correspondam à realidade de uma operação financeira, com alguma facilidade.

Contudo, para tanto, basta que sejam diligentes em relação aos ônus naturais do funcionamento de um partido político. Não cabe a esta Justiça Eleitoral orientar acerca do cancelamento de notas fiscais. A prestação de contas é procedimento declaratório, e uma vez constatada irregularidade em alguma operação, e a mera alegação de que ela não ocorrera não pode, obviamente, ser levada em consideração para fins de reversão de mérito da causa.

Em resumo: o procedimento de cancelamento de nota fiscal cabe ao partido político, no tempo hábil. Não tendo havido o cancelamento, o processo de prestação de contas apenas constata a irregularidade, não cabendo à Justiça Eleitoral qualquer esclarecimento procedimental de cancelamento de nota fiscal, situação típica da seara do direito tributário. Em resumo, o embargante alega não ter “culpa”, mas na realidade a possui, na modalidade de negligência. O juízo em prestação de contas não pode ser tomado apenas sobre alegada “coincidência”, como deseja o embargante.

Afasto a alegação de obscuridade.

2. No tocante a alegações sobre os valores de R$1.895,00, R$100,00, R$41,00, R$248,00, R$200,00 e R$1.000,00, que totalizam R$3.484,00, igualmente não há obscuridade a ser sanada.

A emissão de nota fiscal não é apenas um direito do comprador – no caso do partido político -, é uma obrigação decorrente da prestação de contas, pois as agremiações partidárias recebem recursos públicos. É insólita a argumentação de que, por “facilidades” de pagamento comuns nos dias atuais, a “(…) mercadoria é entregue, o pagamento realizado e depois o consumidor fica correndo atrás das notas fiscais após as eleições”.

O partido político não deve “correr atrás” de notas fiscais após as eleições; deve exigir, no momento de cada transação, o documento fiscal respectivo, porque é seu dever diante da legislação de regência eleitoral.

Aqui, igualmente, não há obscuridade. Há, novamente, a tentativa do embargante de atribuir responsabilidades a outrem (prestadores de serviço, posto de gasolina, este Tribunal), quando na realidade não se desvencilhou de ônus que lhe competiam. Insignificantes ou não, os valores devem se submeter à legislação. Pessoas leigas ou inexperientes devem se cercar de profissionais, caso desejem compor diretoria de partido político, pois manejam verbas públicas. Não há “dependência do fornecedor”, e não cabe inércia ao dirigente partidário nas situações versadas nos presentes autos.

Nas circunstâncias, a pretensão recursal possui o intento de rediscutir a matéria decidida pelo Tribunal, o que é incabível em âmbito de embargos declaratórios, uma vez que "a omissão apta a ser suprida pelos declaratórios é aquela advinda do próprio julgamento e prejudicial à compreensão da causa, não aquela deduzida com o fito de provocar o rejulgamento da demanda ou modificar o entendimento manifestado pelo julgador" (TSE, ED-AgR-AI 10.804, Rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJE de 1º.02.2011).

De todo modo, considerando a disciplina do art. 1.025 do CPC, os elementos que a parte suscitou nos embargos de declaração serão considerados como prequestionados mesmo com sua rejeição, desde que tribunal superior considere que houve erro, omissão, contradição ou obscuridade.

 

Diante do exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.