PCE - 0602550-56.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 21/03/2024 às 09:30

VOTO

A unidade técnica verificou as seguintes irregularidades nas contas:

a) recebimento de recursos de origem não identificada no valor de R$ 33.050,00, constatados a partir da emissão de 2 (duas) notas fiscais não declaradas nas contas e que foram pagas com recursos que não transitaram na conta bancária de campanha (item 3.1 do parecer conclusivo, ID 45523034);

b) realização de 3 gastos irregulares, no total de R$ 99.007,94, com recursos procedentes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), uma vez que não foram apresentados documento fiscais comprobatórios das despesas de R$ 15.000,00 na contratação da militante Nívea Camila Pereira, e de R$ 83.000,00 junto ao fornecedor TL Vídeo Produções Ltda., e que houve aquisição de combustível no montante de R$ 1.007,94, sem registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia (itens 4.1.1 e 4.1.2 do parecer conclusivo, ID 45523034);

c) declaração de despesa de R$ 44.200,00 com serviços advocatícios prestados por Madsen Hanisch – Sociedade Individual de Advocacia, custeada com recursos procedentes do FEFC, sem apresentação do contrato de prestação de serviço, mas tão somente de nota fiscal com a descrição, “Serviços advocatícios para campanha eleitoral 2022”, na qual não consta a descrição detalhada do trabalho ajustado, com a descrição qualitativa e quantitativa dos serviços prestados e/ou documento adicional de forma a comprovar a prestação efetiva do serviço, tais como locais de trabalho, horas trabalhadas, especificação das atividades executadas, justificativa do preço pago (item 4.1.1 do parecer conclusivo, ID 45523034).

Passo à análise das irregularidades:

 

a) Recebimento de recursos de origem não identificada

Apontou-se a emissão de 2 (duas) notas fiscais eletrônicas contra o CNPJ da candidatura, no montante total de R$ 33.050,00. Contudo, não há valores correspondentes a essa transação nas contas de campanha, fator que impossibilita a verificação da origem dos recursos e do seu adimplemento (item 3.1 do parecer conclusivo).

Além disso, os documentos fiscais não restaram cancelados junto ao órgão tributário correspondente, conforme exige o art. 59 da Resolução TSE n. 23.607/19, nem há prova de que o prestador de contas tenha realizado esforço para corrigir as notas fiscais junto ao fisco.

Nesse sentido, anoto que esta Corte firmou o entendimento de que, “havendo o registro do gasto nos órgãos fazendários, o ônus de comprovar que a despesa eleitoral não ocorreu ou que ocorreu de forma irregular é do prestador de contas” (TRE-RS, Prestação de Contas Eleitoral n. 0602944-63.2022.6.21.0000, Relatora Desembargadora Eleitoral Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, publicado em sessão em 01/12/2022).

Ao mesmo passo, a quitação do débito não transitou em conta bancária registrada nesta prestação de contas.

Logo, efetivou-se o pagamento destas faturas por meio diverso das contas registradas para a campanha, devendo os valores de R$ 33.050,00 (trinta e três mil e cinquenta reais) serem recolhidos ao Tesouro Nacional, por caracterização de recebimento de recursos de origem não identificada, na forma do art. 32, § 1º, incs. IV e VI, § 2º, art. 79, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19.

b) Aplicação irregular de recursos do FEFC

A falha referente à aplicação irregular do FEFC a ser analisada neste item “b” relaciona-se à irregularidade quanto a 3 pagamentos, nos valores de R$ 15.000,00, R$ 83.000,00 e R$ 1.007,94.

Inicialmente, verifica-se a ausência do contrato de prestação de serviços de militância que teria sido firmado entre a candidata e Nívea Camila Pereira, no valor de R$ 15.000,00, em desatenção ao art. 35, § 12º, da Resolução TSE n. 23.607/19 (item 4.1.1 do parecer conclusivo).

Com isso, o pagamento realizado torna-se irregular, pois a ausência do documento obrigatório impede que a Justiça Eleitoral verifique a descrição qualitativa e quantitativa dos serviços prestados, de forma a comprovar a prestação efetiva do serviço, os locais de trabalho, as horas trabalhadas, a especificação das atividades executadas, a justificativa do preço pago, tudo em conformidade com o art. 60 e o § 12, do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Desse modo, o gasto não está devidamente comprovado, e o valor irregular de R$ 15.000,00 deve ser recolhido ao erário, nos termos do art. 79, § 1°, da Resolução TSE n. 23.607/19.

De outra senda, houve pagamento de R$ 83.000,00 para a empresa TL Vídeo Produções Ltda. sem a documentação fiscal correspondente, na forma exigida no art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Embora tenha sido apresentado o contrato firmado com a empresa e o pagamento conste em transferências bancárias (ID 45279178), não foi apresentada a nota fiscal que deveria acompanhar obrigatoriamente a transação, tornando o gasto irregular.

Por fim, observou-se, em 3 oportunidades, gastos com combustível nos valores de R$ 617,62, R$ 300,00 e R$ 90,32, no total de R$ 1.007,94, sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, contrariando-se o art. 35, § 11, da Resolução TSE n. 23.607/19 (notas fiscais, ID 45279170, 45279169 e 45279171; tabela item 4.1.2 do parecer conclusivo).

A unidade técnica apontou que as despesas não guardam o correspondente vínculo, identificação do CNPJ da candidata ou dos veículos utilizados na campanha, sendo manifestamente irregulares.

A ausência da documentação exigida impede a fiscalização da Justiça Eleitoral sobre a despesa, uma vez que impossibilita a verificação da lisura dos gastos com recursos públicos, em desacordo com as normas de transparência sobre a contabilidade eleitoral.

Portanto, considero irregular a utilização da quantia

Por conseguinte, na forma do art. 79, § 1°, da Resolução TSE n. 23.607/19, as irregularidades nos valores de R$ 15.000,00, R$ 83.000,00 e de R$ 1.007,94 devem ser recolhidas ao erário, no total de R$ 99.007,04.

c) Aplicação do FEFC para adimplemento de honorários advocatícios

Quanto à glosa referente à contratação de serviços de advocacia de Madsen Hanisch – Sociedade Individual de Advocacia no valor de R$ 44.200,00, a unidade técnica entendeu insuficiente a nota fiscal apresentada em razão de lhe faltar descrição qualitativa e quantitativa dos serviços prestados e/ou documento adicional de forma a comprovar a prestação efetiva do serviço, apontado violação ao art. 60 e § 12, do art. 35, da Resolução TSE 23.607/19.

Observa-se que há nota fiscal nos autos e o valor encontra-se devidamente contabilizado (nota fiscal, ID 45279172; demonstrativo de despesas com advogado, ID 45279128 e 45097416).

Destaco ainda que o advogado em questão, Lucas Matheus Madsen Hanisch, atua no presente feito como procurador da candidata.

Nesse ponto, ressalto que esta colenda Corte, na análise de prestações de contas eleitorais, tem entendido que a nota fiscal é suficiente para atestar o serviço de advocacia, em especial quando, como no presente caso, o advogado patrocina a ação de prestação de contas:

PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. ELEIÇÕES 2020. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. (...)

(…)

3. Falta de comprovação de gastos eleitorais, relativamente à realização das atividades contratadas.

(...)

3.2. Falha decorrente de despesa com serviços advocatícios meramente formal, apta a comprovar a efetiva execução do serviço. Na hipótese, a nota fiscal acostada faz prova suficiente da contratação e da natureza dos serviços prestados. Inexiste dúvidas sobre a efetiva prestação do serviço, uma vez que o advogado atua, inclusive, nas próprias contas sob análise.

(…)

8. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE/RS – PCE nº 060041372, Relator Desembargador Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, Publicação: DJE, Tomo 49, Data 20/03/2023)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2020. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. OMISSÃO DE GASTOS. DIVERGÊNCIA ENTRE AS NOTAS FISCAIS ENCONTRADAS E AS CONSTANTES NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. IMPOSSIBILIDADE DE VERIFICAÇÃO DA REGULARIDADE DOS DOCUMENTOS FISCAIS. DESPESA COM SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS COMPROVADA PELAS NOTAS FISCAIS. IRREGULARIDADE AFASTADA. AUSÊNCIA DE APLICAÇÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO NAS COTAS DE GÊNERO E DE RAÇA. VALOR EXCLUÍDO DO CÁLCULO DE RECOLHIMENTO. FALHAS GRAVES. INAPLICABILIDADE DOS POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

(...)

3. A despesa com serviço advocatício nos valores registrados está de acordo com as notas fiscais lançadas no Relatório de Despesas Efetuadas. Dessa forma, a descrição está condizente com a função exercida pelo advogado. Irregularidade esclarecida. Montante que deve ser subtraído do valor a ser recolhido ao erário.

(...)

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº 060041979, Acórdão, Relator(a) Des. GERSON FISCHMANN, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 244, Data: 29/11/2022)(Grifou-se.)

 

Portanto, embora passível de ressalva a falha formal relativa à ausência de juntada do respectivo contrato, na forma dos precedentes desta Casa, afasto o dever de recolhimento do valor de R$ 44.200,00 ao erário, mantendo, contudo, a contabilização da glosa para o exame do mérito das contas (aprovação com ressalvas ou desaprovação), uma vez que o contrato é documento obrigatório segundo o § 12, do art. 35, da Resolução TSE 23.607/2019.

 

d) Conclusões

Dessarte, o total das irregularidades soma o montante de R$ 176.257,94 (R$ 33.050,00 + R$ 15.000,00 + R$ 83.000,00 + R$ 1.007,94 + R$ 44.200,00), equivalente a 55,08%, do total de recursos recebidos pela candidata em sua campanha (R$ 320.000,00), e extrapola os parâmetros fixados na jurisprudência desta Justiça Especializada, de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade para formar juízo de aprovação com ressalvas da contabilidade (inferior a 10% da arrecadação financeira, menor que R$ 1.064,10).

Nos termos da fundamentação, o valor total a ser recolhido ao erário é de R$ 132.057,94, sendo R$ 33.050,00 referente ao recebimento de recursos de origem não identificada e R$ 99.007,94 relativo aos recurso do FEFC sem comprovação (R$ 15.000,00 + R$ 83.000,00 + R$ 1.007,94), merecendo ser ressaltado que a falha formal de R$ 44.200,00 não será objeto de determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme já explicitado.

Dessa forma, em linha com o entendimento da Procuraria Regional Eleitoral (ID 45546072), impõe-se a desaprovação das contas, na forma do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Ante o exposto, VOTO pela desaprovação das contas relativas ao pleito de 2022 apresentadas por JUSSARA MARIA DA SILVA, candidata ao cargo de deputada estadual, e pelo recolhimento ao Tesouros Nacional de R$ 132.057,94 (cento e trinta e dois mil e cinquenta e sete reais e noventa e quatro centavos), acrescidos de juros e de correção monetária, sendo R$ 99.007,94 relativos à aplicação irregular do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e R$ 33.050,00 referentes ao recebimento de recursos de origem não identificadas.