REl - 0600090-08.2021.6.21.0073 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/03/2024 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo e, presentes todos os pressupostos de admissibilidade, está a merecer conhecimento.

Cuida-se de recurso interposto pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES de São Leopoldo contra a sentença do Juízo da 73ª Zona Eleitoral, que aprovou com ressalvas as contas do exercício financeiro 2020.

A sentença acolheu o parecer técnico contábil e constatou o recebimento de doação de fonte vedada de LUCIMAR LOPES PEDROSO, pessoa física com cargo público de livre nomeação e exoneração, sem filiação partidária, no montante de R$ 1.860,00, em afronta à vedação prevista no art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, regulamentado pelo Tribunal Superior Eleitoral na Resolução TSE n. 23.604/19, art. 12, inc. IV e § 1º:

Lei 9.096/1995:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de: (…)

V - pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

 

Resolução TSE n. 23.604/2019:

Das Fontes Vedadas

Art. 12. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(...)

IV - autoridades públicas.

§ 1º Consideram-se autoridades públicas, para fins do inciso IV do caput, pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

(…)

 

Em suas razões, o partido sustenta que a doadora é filiada ao Partido dos Trabalhadores. Aduz que a filiação partidária é o vinculo estabelecido entre o filiado e o partido. Apresenta, a fim de comprovar a filiação, ficha de preenchimento no âmbito da agremiação, declaração de Lucimar e fotos, ou seja, documentos despidos de aptidão para comprovar o vínculo pretendido, pois exclusivamente de produção unilateral.

Contudo, observo que, em consulta aos sistemas ELO e FILIA, ambos desta Justiça Especializada,  constatou-se que Lucimar Lopes Pedroso não registra filiação partidária, conforme certidão e relatórios gerados, IDs 45538407, 45538408, 45538409 e 45538406.

Ademais, não há amparo legal ou jurisprudencial às alegações da grei, no sentido de que a informação da filiação partidária à Justiça Eleitoral é “mera formalidade”. A prova de filiação deve ser validada pela Justiça Eleitoral, ou seja, deve ser feita por meio de certidões expedidas pela página do Tribunal Superior Eleitoral – TSE, na internet, com informações extraídas do Sistema FILIA, cuja atualização é incumbência do partido, pois, “deferido internamente o pedido de filiação, o partido político, por seus órgãos de direção municipais, regionais ou nacional, deverá inserir os dados do filiado no sistema eletrônico da Justiça Eleitoral, que automaticamente enviará aos juízes eleitorais, para arquivamento, publicação e cumprimento dos prazos de filiação partidária”, consoante art. 19 da Lei n. 9.096/95. Dito de outro modo, a ação da Justiça eleitoral é fundamental para dar caráter público e formal ao vínculo de filiação.

Este Tribunal já julgou a matéria, convindo destacar os seguintes julgados:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO 2018. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. RECEITAS DE FONTE VEDADA. DOAÇÕES DE AUTORIDADES PÚBLICAS. PRELIMINAR. TEMPESTIVIDADE. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 55-D DA LEI N. 9.096/95, INCLUÍDO PELA LEI N. 13.831/19. FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. COMPROVAÇÃO. DOCUMENTO UNILATERAL. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA TSE N. 20. FALHAS DE ELEVADO PERCENTUAL. DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. DOSIMETRIA DAS SANÇÕES. MULTA E SUSPENSÃO DE QUOTAS REDUZIDAS. PROVIMENTO PARCIAL.

1. O Diretório Municipal teve suas contas do exercício de 2018 desaprovadas em razão do recebimento de valores de fontes vedadas, consistentes em doações realizadas por detentores de cargos demissíveis ad nutum, de chefia e de direção, tendo sido determinado o recolhimento do valor irregular, acrescido de multa de 10% (dez por cento), bem como a suspensão do recebimento de quotas oriundas do Fundo Partidário pelo prazo de 1 (um) ano.

2. Preliminar. Entende-se como tempestivo o recurso, sobretudo ante a ausência de dados precisos acerca da intimação do recorrente da decisão relativa aos embargos de declaração. O conjunto de circunstâncias não pode prejudicar a análise do recurso, mormente para que não ocorra injustificável prejuízo à parte.

3. Incontroverso que as doações foram oriundas de autoridades públicas, assenta-se o debate na caracterização das doadoras na condição de filiadas ao partido político. O Tribunal Superior Eleitoral, a fim de dirimir conflitos relativos a esta questão específica, editou o enunciado da Súmula n. 20. Na mesma linha é a jurisprudência desta Corte, no sentido de que o registro da filiação no banco de dados do Tribunal Superior Eleitoral é que confere caráter público e formaliza a vinculação dos cidadãos aos partidos políticos.

4. No caso dos autos, não há nenhum elemento com reconhecimento público ou comprovadamente produzido em data anterior ao ajuizamento da prestação de contas que comprove a tese de que as doadoras já estavam filiadas à agremiação no exercício de 2018, de modo que as contribuições recebidas configuram recursos oriundos de fontes vedadas.

5. O recorrente pleiteia a aplicação do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, o qual prevê concessão de anistia. O Plenário desta Corte, em sessão de julgamento no ano de 2019, declarou a inconstitucionalidade desse dispositivo e, ante a ausência da indicação de outros elementos hábeis a justificar a revogação do precedente, cabe manter a jurisprudência estável, íntegra e coerente, bem como observar a orientação do plenário do órgão.

6. O recebimento de recursos de fontes vedadas equivale a 32,47% da arrecadação, cabendo manter a desaprovação das contas, a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional e a suspensão de repasse de verbas do Fundo Partidário.

Redução da multa para o patamar de 7% e readequação da suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para o período de 4 (quatro) meses.

7. Parcial provimento do recurso.

(Recurso Eleitoral nº 060004047, Acórdão, Relator(a) Des. OYAMA ASSIS BRASIL DE MORAES, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE)

(Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DOS RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. RECEBIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO DE FONTES VEDADAS. APORTE DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. NÃO DESTINAÇÃO DE PERCENTUAL DA VERBA PÚBLICA A PROGRAMAS DE INCENTIVO À PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DAS MULHERES. FALHA DE VALOR INFERIOR A 10% DOS RECURSOS AUFERIDOS NO PERÍODO EM EXAME. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APLICAÇÃO DE RECURSOS EM AÇÕES DE FOMENTO À INTEGRAÇÃO FEMININA, NO EXERCÍCIO SUBSEQUENTE. INVIABILIDADE DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO.

1. Prestação de contas de diretório estadual de partido político, referente ao exercício financeiro de 2019. Parecer conclusivo pela desaprovação e pelo recolhimento de valores ao Tesouro Nacional. Irregularidades atinentes à aplicação inadequada de verbas do Fundo Partidário, ao recebimento de contribuições de fonte vedada, ao ingresso de recursos de origem não identificada e à falta de destinação de parcela de receita advinda do Fundo Partidário a programas de promoção da participação feminina na política. Parecer ministerial, igualmente, pela rejeição das contas.

2. Despesas indevidas com verbas do Fundo Partidário. a) Falta de comprovação dos serviços prestados por advogado ao partido. Juntados aos autos documentos idôneos, como procurações outorgando poderes ao profissional, recibos de transferências bancárias e notas fiscais eletrônicas. Inegável a atuação do procurador no feito. Mácula sanada. b) Gastos irregulares junto a empresas comerciais. Falta de correspondência entre os dados constantes nos extratos bancários e nos recibos de prestação de serviço, sem evidência do efetivo cumprimento do acordado e do vínculo do trabalho com a atividade partidária. Desatendimento ao art. 18 da Resolução TSE n. 23.546/17. Não demonstrada a necessária triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, que permite a aferição da regularidade na aplicação de recursos públicos. Reconhecida a falha apontada. c) Assinalado o recebimento de verba pública, repassada pelo diretório municipal do partido, na conta destinada a ¿outros recursos¿, em contrariedade ao art. 6º da Resolução TSE n. 23.546/17, impossibilitando a conferência do direcionamento da receita. Demonstrada nos autos a origem dos valores na conta bancária destinada ao Fundo Partidário na esfera municipal e sua posterior transferência à sede regional para atendimento de despesas com locação de imóvel, fim válido e adequado, nos termos do art. 44, inc. X, da Lei n. 9.096/95. Operação amparada por contrato devidamente assinado pelas partes e reconhecido em cartório, revestido de requisitos suficientes à sua convalidação. Falha sanada.

3. Recebimento de valores de fonte vedada. Existência de contribuições de não filiados ao partido politico, exercentes de função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, e de pessoa jurídica, incorrendo na proibição disposta no art. 12, incs. II e IV, da Resolução TSE n. 23.546/17. Malograda a intenção do partido de enquadrar as doações na exceção disposta no § 1º do art. 12 da Resolução TSE n. 23.546/17 ao juntar aos autos ficha de filiação dos supostos colaboradores, pois as peças não fazem prova do alegado, visto tratar-se de documento unilateral, desprovido de fé pública. Confirmada, no entanto, no sistema da Justiça Eleitoral, a filiação de um dos doadores ao partido. Exclusão do contribuinte comprovadamente filiado à agremiação. Restituição dos valores oriundos das fontes vedadas remanescentes.

4. Recursos de origem não identificada ¿ RONI. Doação identificada com o CNPJ do próprio diretório estadual, inviabilizando a conferência da fonte originária da receita. Reconhecida a irregularidade e o dever de recolhimento.

5. Ausência de aplicação dos recursos do Fundo Partidário no fomento à participação feminina na política, conforme a previsão do art. 22 da Resolução TSE n. 23.546/17. Omissão na abertura de conta bancária específica para os recursos públicos destinados à ATM ¿ Ação da Mulher Trabalhista. Não comprovado o alegado investimento do percentual mínimo legal de 5% (cinco por cento) das verbas do Fundo Partidário na criação ou manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres. Obrigatoriedade de aplicação desses valores no exercício subsequente, vedada sua utilização para finalidade diversa, nos termos do art. 22, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.546/17.

6. Falhas em montante inferior a 10% da arrecadação, tornando possível o juízo de aprovação com ressalvas por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Imposição de recolhimento dos valores irregulares ao erário. Determinação de emprego dos repasses do Fundo Partidário na conta destinada aos programas de incentivo à participação política feminina, no exercício subsequente ao trânsito em julgado da presente decisão. Diretriz jurisprudencial deste Regional, alinhada ao entendimento do TSE, assentando que, em se tratando de aprovação com ressalvas, não incide a pena de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário prevista no art. 36 da Lei n. 9.096/95.

7. Aprovação com ressalvas.

(Prestação de Contas nº 060019714, Acórdão, Relator(a) Des. AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data: 23/09/2022.)

(Grifei.)

Nesse norte, configurado o recebimento e a utilização de recursos de fonte vedada, impõe-se a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 1.860,00, nos termos do art. 14, §1º, da Resolução TSE n. 23.604/19, como bem aplicado na sentença.

Ante o exposto, VOTO para  negar provimento do recurso, mantendo a sentença recorrida.