PCE - 0602752-33.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 14/03/2024 às 09:30

VOTO

Eminentes colegas.

ITACIR PEGORARO, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual nas Eleições 2022, apresentou sua prestação de contas referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha.

Primeiramente, ressalto que a prestação de contas não atende à legislação em vigor, conforme apontamentos da Secretaria de Auditoria Interna – SAI, nos seguintes termos (ID 45460103):

1.1 Não foram apresentadas as seguintes peças obrigatórias que devem integrar a prestação de contas (art. 53 da Resolução TSE nº 23.607/2019):

Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de recursos do Fundo Partidário, se houver;

Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), se houver;

Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de Outros Recursos;

Documentos fiscais que comprovem a regularidade dos gastos eleitorais realizados com recursos do Fundo Partidário;

Documentos fiscais que comprovem a regularidade dos gastos eleitorais realizados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

 

A ausência de documentos obrigatórios impede a fiscalização da movimentação financeira pela Justiça Eleitoral e, por si só, pode levar à desaprovação das contas.

O candidato também recebeu a quantia de R$ 45.000,00, oriundos de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC, repassados pelo também candidato Lasier Costa Martins, na conta destinada à movimentação do Fundo Partidário, quando deveria ter sido na conta destinada à movimentação de recursos do FEFC.

De qualquer sorte, conforme ressaltado pela unidade técnica, tal falha não acarretou confusão contábil porque não houve recebimento de recursos do Fundo Partidário pelo candidato tratando-se, pois, de falha meramente formal.

Não bastasse, a Secretaria de Auditoria Interna – SAI apontou irregularidades consistentes na utilização de Recurso de Origem Não Identificada – RONI e ausência de comprovação de despesas realizadas com recursos do FEFC, que serão adiante analisados.

 

Da utilização de Recursos de Origem Não Identificada – RONI

Foi detectado pelo órgão técnico, mediante confronto com notas fiscais eletrônicas emitidas em nome do candidato e disponibilizadas no DivulgaCandContas, despesas não arroladas na prestação de contas, no montante de R$ 1.186,56, relacionadas na tabela abaixo (ID 45460103):

O prestador, devidamente intimado, deixou precluir a oportunidade de apresentar esclarecimentos e de, eventualmente, retificar as contas (certidão ID 45437153), fato que, em tese, torna a matéria incontroversa.

Tendo sido constatado, pelo cruzamento de informações realizado por esta Justiça especializada, que esses gastos foram vinculados ao CNPJ da campanha, resta caracterizada a omissão de registro de despesas, infringindo o disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual impõe que a prestação de contas deva ser composta com as informações relativas a todos os gastos eleitorais devidamente especificados.

Nesse sentido, menciono julgado, relativo às Eleições 2022, semelhante ao caso que ora se examina:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA ELEITA. DEPUTADA ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. ATRASO NA ENTREGA DOS RELATÓRIOS FINANCEIROS. MERA IMPROPRIEDADE. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADAS ¿ RONI. NOTAS FISCAIS NÃO DECLARADAS. OMISSÃO DO REGISTRO DE DESPESA. INFRAÇÃO AO DISPOSTO NO ART. 53, INC. I, AL. "G", DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. MONTANTE INSIGNIFICANTE. REGULARIDADE DAS CONTAS NÃO COMPROMETIDA. BAIXA REPRESENTATIVIDADE DAS FALHAS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas apresentada por candidata eleita ao cargo de deputada estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

[...]

3. Recursos de origem não identificada. Notas fiscais não declaradas relacionadas ao abastecimento de combustíveis. O DANFE não é, não substitui, e não se confunde com uma nota fiscal eletrônica. A existência de outras despesas contratadas com o mesmo fornecedor impede que se realize o batimento dos gastos para verificação de perfeita coincidência entre o valor das despesas e os pagamentos efetuados. A emissão de nota fiscal para o CNPJ de campanha gera a presunção de existência da despesa, nos termos do art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19. Havendo o registro da transação comercial nos órgãos fazendários, o ônus de comprovar que o gasto eleitoral não ocorreu ou que ocorreu de forma irregular é do prestador de contas, que deve laborar para o cancelamento da nota fiscal, conforme previsto nos arts. 59 e 92, §§ 5º e 6º, da Resolução mencionada. Os elementos constantes nos autos não são aptos a sanar as irregularidades relativas à duplicidade de emissão de registros por fornecedor de combustíveis. Caracterizada a omissão de registro de despesas, infringindo o disposto no art. 53, inc. I, al. "g", da Resolução TSE n. 23.607/19, que impõe que a prestação de contas deva ser composta das informações relativas a todos os gastos eleitorais, devidamente especificados.

4. As despesas resultantes das notas fiscais omitidas e cujo cancelamento não foi devidamente comprovado implicam sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação do gasto de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal da candidata. Caracterizados os recursos como de origem não identificada, cujo montante deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

5. A soma das falhas corresponde a 0,93% da receita declarada e se mostra insignificante diante dos valores totais geridos pela candidata em sua campanha eleitoral. Assim, como as incorreções não têm aptidão para comprometer a regularidade das contas, em homenagem aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, é caso de aprovação com ressalvas da contabilidade.

6. Aprovação com ressalvas. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº 060311180, Acórdão, Relator(a) Des. DES. VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 12/12/2022) (Grifei.)

 

Na mesma linha do precedente, as despesas resultantes das notas fiscais omitidas implicam, por consequência, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação do gasto de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal do candidato, caracterizando o recurso como de origem não identificada, do qual o montante (R$ 1.186,56) deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Da ausência de comprovação de despesas realizadas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC

No item 4.1 do parecer conclusivo, a unidade técnica apontou irregularidades referentes às despesas pagas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC, no valor de R$ 53.267,82, correspondente a 100% do total movimentado com recursos da referida rubrica. As despesas estão indicadas na seguinte tabela (ID 45460103):

Para melhor análise das irregularidades, esclareço que as inconsistências relacionadas à letra “A” dizem respeito a “Débito bancário sem identificação do fornecedor beneficiário do pagamento, não consta CPF/CNPJ no extrato bancário eletrônico disponibilizado pelo TSE, ou CPF/CNPJ diverso ao do fornecedor declarado pelo prestador de contas; assim como não foi apresentada documentação bancária comprovando o destinatário dos recursos, conforme art. 38 da resolução TSE 23.607/2019”. Já a letra “B” identifica a “ausência de documento fiscal comprovando a despesa, em afronta ao art.53, II e de forma a comprovar os art. 35 e 60 da Resolução TSE 23.607/2019” e a letra “C”, “despesas realizadas com combustíveis sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia”.

O prestador de contas não juntou aos autos qualquer nota fiscal ou comprovante das contratações realizadas e pagas com recursos públicos.

Não obstante a ausência de esclarecimentos por parte do candidato, foi possível, graças à diligência do próprio órgão técnico, localizar pelo menos duas notas fiscais – a n. 716, no valor de R$ 4.750,00 e a n. 7056, no valor de R$ 1.050,00 – disponibilizadas no DivulgaCandContas e, com isso, reduzir o valor dos apontamentos em R$ 5.800,00, restando irregular a quantia de R$ 47.467,82.

A diligente Procuradoria Regional Eleitoral realizou minuciosa análise das despesas, consignando em seu parecer (ID 45513986) que:

Com efeito, o débito bancário relativo ao fornecedor ANDRE LUIZ DOS SANTOS VIEIRA MEI, no valor de R$ 5.900,00, realizado em 19/09/2022, não consta o CPF/CNPJ da contraparte no extrato bancário eletrônico disponibilizado no DivulgaCandContas. Já o débito relativo ao valor de R$ 5.900,01, a contraparte é pessoa diversa (LIZANDRA FATIMA PEGORARO LTDA – CNPJ nº 37.157.134/0001-20) do fornecedor declarado. Ou seja, tais gastos não seguiram os critérios estabelecidos pelo artigo 38 da Resolução TSE 23.607/2019.

De igual forma, não constam nos extratos bancários as contrapartes relativas aos gastos com os fornecedores GELSO CARVALHO DE SOUZA (R$ 4.899,99), CLEONARA SOARES DE OLIVEIRA (R$ 2.000,00), JAIR ALFREDO DE ABREU (R$ 1.800,00), GELSO CARVALHO DE SOUZA (R$ 1.700,00), ALEX SANDRO DE LIMA MONTEIRO (R$ 1.500,00), JULIANO GODOI PEREIRA (R$ 1.500,00), MARCELO BRUM (R$ 1.200,00), ELIAS DE SOUSA (R$ 1.200,00) NELCI ABREU TEIXEIRA (R$ 1.000,00), IVONETE JESUS PEDROSO DA ROCHA (R$ 1.000,00), NILCEIA DE JESUS ABREU (R$1.000,00), FRANCIELE ABREU TEIXEIRA (R$ 1.000,00), VERONI ANTONIO DOS SANTOS (R$ 1.000,00), KARINE MANTOVANI DA SILVA (R$ 600,00), KELI DE LIMA (R$ 600,00), NATALINA LAZAROTO DOS S SANTOS (R$ 1.317,82), ALEX SANDRO DE LIMA MONTEIRO (R$ 600,00), JUCELEI DE JESUS (R$ 600,00), RAFAEL CAMARGO (R$ 600,00), KARINE MANTOVANI DA SILVA (R$ 600,00) e JUCELEI DE JESUS (R$ 600,00), gastos cujos documentos fiscais comprobatórios também não foram apresentados, conforme preconiza o artigo 60 da Resolução TSE nº 23.607/2019.

[…]

As despesas com os fornecedores JOZIMAR BARBOSA DOS SANTOS (R$ 1.000,00) e JULIANO GODOI PEREIRA (R$ 600,00), ainda que constem corretamente nos extratos bancários, não foram comprovadas mediante a apresentação de documentos fiscais idôneos.

A nota fiscal relativa ao fornecedor JH SEBEN COM MAT CONST LTDA, no valor de R$2.400,00, tem como descrição a aquisição de “Eletroduto ¾. Mangueira”, gasto que, diante da ausência de justificativa pelo prestador, deve ser considerado como “não eleitoral”.

Deveras, os recursos provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, como a própria designação indica, apenas podem ser empregados para custear gastos de campanha, que são elencados no art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, não havendo, portanto, justificativa para o custeio de material de construção com valores destinados ao custeio de campanha eleitoral.

As aquisições de combustíveis junto ao fornecedor CAPOANI E RECH COM DE COMB LTDA, no valor de R$ 4.000,00 (NFs 19433 e 19333), por sua vez, foram realizados sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, em descumprimento ao artigo 35, § 11, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Como bem observado, em relação aos pagamentos realizados a JOZIMAR BARBOSA DOS SANTOS, no valor de R$ 1.000,00, e a JULIANO GODOI PEREIRA, no valor de R$ 600,00, a única irregularidade, que de qualquer forma é grave consiste na ausência de documento fiscal.

Os dois pagamentos realizados à empresa CAPOANI E RECH COM DE COMB LTDA, nos valores de R$ 2.000,00 cada, além de não terem sido comprovados com o devido documento fiscal, não estão associados a nenhum registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, o que torna o desembolso irregular.

A disciplina normativa sobre o uso de veículo na campanha encontra-se no art. 35, § 11, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução:

[…]

§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:

I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;

II - veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que: a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim; e

III - geradores de energia, decorrentes da locação ou cessão temporária devidamente comprovada na prestação de contas, com a apresentação de relatório final do qual conste o volume e valor dos combustíveis adquiridos em na campanha para este fim.

[...]

O candidato foi devidamente intimado e deixou precluir a oportunidade de, se fosse o caso, retificar as contas e apresentar esclarecimentos.

De qualquer forma, analisando-se a documentação apresentada, verifica-se no Extrato de Prestação de Contas Final (ID 45307320) que os campos destinados a informações referentes à cessão ou locação de veículos (item 2.33), publicidade por carros de som (item 2.7) e despesas com geradores de energia (item 2.44) estão zerados, assim como os respectivos demonstrativos, ao passo que o campo destinado ao registro de combustíveis e lubrificantes (item 2.11) apresenta a despesa de R$ 4.000,00.

Ocorre que, de acordo com as regras do § 11 do art. 35, já citadas, o candidato poderia ter se valido de veículo próprio ou de familiar até o terceiro grau para uso pessoal na campanha – desde que registrado nas contas – sem necessidade de cessão do bem, mas nesse caso o respectivo combustível não poderia ser pago com recursos financeiros da campanha eleitoral (art. o art. 60, § 4º, inc. III).

Poderia, por outro lado, utilizar recursos de campanha no custeio de combustíveis para abastecimento de veículo locado ou cedido, realização de publicidade com carro de som ou para uso em geradores de energia, situações não verificadas no caso concreto.

De qualquer sorte, o prestador não se movimentou no sentido de, ao menos, tentar sanar a falha, tendo permanecido inerte após a regular intimação acerca do relatório exarado pelo órgão técnico, restando nítida, portanto, a configuração da irregularidade, devendo a glosa ser mantida, tudo em conformidade com o já decidido por este Tribunal em processo de minha relatoria:

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO NÃO ELEITO. DEPUTADO ESTADUAL. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL. PANFLETAGEM. EQUIPE DE MOBILIZAÇÃO DE RUA. RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC) E DO FUNDO PARTIDÁRIO (FP). FALTA DE DETALHAMENTO. INOBSERVÂNCIA DO ART. 35, § 12, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. FALHA FORMAL. NÃO PREJUDICADA A FISCALIZAÇÃO DA JUSTIÇA ELEITORAL. PAGAMENTO DE GASTOS COM COMBUSTÍVEIS COM VERBA DO FUNDO PARTIDÁRIO. AUSENTE INSTRUMENTO DE CESSÃO DE VEÍCULO. IRREGULARIDADE CARACTERIZADA. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas de candidato não eleito ao cargo de deputado estadual referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições de 2022.

(...)

3. Emprego de verbas do Fundo Partidário para pagamento de gastos com combustíveis sem o correspondente registro de locação, cessão de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia. Descumprimento ao art. 35, § 11, da Resolução TSE n. 23.607/19. Documentos apresentados inábeis para comprovar a cessão temporária de veículos em favor do prestador, pois ausente o instrumento de cessão. Irregularidade caracterizada. Determinação de recolhimento dos valores irregulares ao Tesouro Nacional.

4. A irregularidade não superada representa 8,61% do total das receitas declaradas na campanha, sendo adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas com ressalvas, na linha do que vem decidindo este Tribunal Regional e o Tribunal Superior Eleitoral.

5. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº 060303034, Acórdão, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 123, Data: 10/07/2023.)

 

Quanto aos demais pagamentos, além de repetirem a falha referente à ausência de documento fiscal apto a comprovar a respectiva despesa, foram efetuados sem identificação da contraparte.

Com efeito, analisando-se o extrato bancário disponibilizado no DivulgaCandContas, verifica-se que a maioria dos saques foi feita na modalidade “CHEQUE TERCEIROS POR CAIXA”. A título de ilustração, faço o seguinte recorte:


 

Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos da Resolução TSE n. 23.607/19, só podem ser pagos por meio de cheque nominal cruzado, transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ da beneficiária ou do beneficiário, débito em conta, cartão de débito da conta bancária ou PIX. No caso de Pix, há a obrigatoriedade de que a chave utilizada seja o CPF ou o CNPJ.

Todo e qualquer pagamento efetuado a pessoas físicas ou jurídicas que não atenda a essa exigência legal impede a verificação da efetiva destinação das quantias aos fornecedores declarados, o que compromete a confiabilidade e a fiscalização das contas.

Por fim, a Procuradoria Regional Eleitoral identificou outra nota fiscal que não havia sido localizada pelo órgão técnico, no valor de R$ 1.350,00, emitida pela empresa TRAMPU S SERIGRAFIA LTDA, e opinou pelo afastamento da falha também em relação a essa despesa.

Considerando a verificação, no extrato bancário da campanha (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2022/2040602022/RS/210001596156/extratos), da existência de cheque compensado por TRAMPU'S SERIGRAFIA LTDA., em valor superior a esta despesa, a glosa pode ser afastada.

Em conclusão, as falhas na comprovação de gastos no valor de R$ 46.117,85 (R$ 47.467,82 – R$ 1.350,00) ganham ainda mais relevo por se tratar de verba pública, oriunda do FEFC, devendo a quantia glosada ser devolvida, na sua totalidade, ao Tesouro Nacional. Friso que o candidato, devidamente intimado, deixou precluir a oportunidade de retificar as contas e fazer os devidos esclarecimentos

Na hipótese, este Tribunal Regional sufragou o entendimento de que os pagamentos por meio de recursos públicos devem ser demonstrados por documentos que permitam a rastreabilidade dos valores e a vinculação do crédito com o fornecedor declarado, sob pena de recolhimento do equivalente ao Tesouro Nacional, conforme ementa de julgado da relatoria do eminente Desembargador Eleitoral Francisco José Moesch, a qual reproduzo:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATOS. PREFEITO E VICE. DESAPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE GASTO ELEITORAL. DESPESAS EM DESACORDO COM A REGRA PREVISTA NO ART. 38, INC. I, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. PAGAMENTO DE GASTO ELEITORAL COM RECURSO PRIVADO, EM DESACORDO COM A NORMA DE REGÊNCIA. ALTO PERCENTUAL. MANTIDO O DEVER DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas relativas às eleições de 2020, com fundamento no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, determinando o recolhimento do montante irregular ao Tesouro Nacional.

2. Ausência de comprovação de gasto eleitoral. Detectada a emissão de nota fiscal, não declarada à Justiça Eleitoral, contra o CNPJ do candidato. O lançamento de nota fiscal sem a correspondente contabilização na prestação de contas revela indícios de omissão de gastos eleitorais, em violação ao art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19. A omissão de despesa paga com verbas que não transitaram nas contas específicas de campanha configura utilização de recurso de origem não identificada, impondo o dever de recolhimento aos cofres do Tesouro Nacional, consoante o previsto no art. 32, § 1º, inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

3. Comprovação de despesa com recursos do FEFC, em desacordo com o art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19. Na espécie, não foi possível verificar se o sacador do documento de crédito foi aquele apontado como fornecedor dos bens ou serviços, de modo a comprovar o ciclo do gasto em todas as suas fases. Ademais, os documentos unilaterais, como é o caso dos recibos e do contrato de prestação de serviços acostados aos autos, não devem ser considerados isoladamente para suprir a ausência do cheque nominal e cruzado. Nessa linha, esta Corte sufragou o entendimento de que os pagamentos por meio de recursos públicos devem ser demonstrados por documentos que permitam a rastreabilidade dos valores e a vinculação do crédito com o fornecedor declarado, sob pena de recolhimento do equivalente ao Tesouro Nacional.

4. Pagamento de gasto eleitoral com recursos privados, em desacordo com o art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19. Despesas pagas com o manejo de recursos privados e a utilização de cheque nominal, porém não cruzado. A alegação de que a exigência da norma impediria a contratação de “pessoas mais humildes” para as atividades em campanha não enseja a mitigação da regra, pois a sua finalidade é impor que a movimentação dos recursos ocorra por meio do sistema bancário, garantindo maior transparência às transações.

5. A totalidade das falhas apontadas representa, aproximadamente, 20,34% das receitas declaradas pelos candidatos, comprometendo o controle e a fiscalização dos recursos utilizados na campanha. Mantidas a desaprovação das contas e a ordem de recolhimento ao Tesouro Nacional.

6. Desprovimento.

(Recurso Eleitoral n 060051796, ACÓRDÃO de 07/12/2021, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE ) (Grifei.)

Por todo o exposto, é de se entender que os gastos, no total de R$ 46.117,82, não foram comprovados, pois não observado o disposto no art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, devendo a quantia ser restituída ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, deve ser recolhida ao Tesouro Nacional a quantia de R$ 47.304,38, sendo R$ 1.186,56 correspondente ao pagamento de despesas com Recursos de Origem Não Identificada e R$ 46.117,82 relativo à ausência de comprovação de gastos pagos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha.

As falhas, correspondentes a 88,80% da receita total declarada pelo candidato (R$ 53.267,82), impõem, também, a desaprovação das contas.

 

ANTE O EXPOSTO, acolho o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral e voto por desaprovar as contas de campanha de ITACIR PEGORARO, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual nas Eleições Gerais de 2022, nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e por determinar a devolução de R$ 47.304,38 (quarenta e sete mil trezentos e quatro reais e trinta e oito centavos) ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.

Ainda, de acordo com o art. 81 da citada Resolução, determino a abertura de vista à Procuradoria Regional Eleitoral para, se entender cabível, remeter cópia dos autos ao Ministério Público Eleitoral com atuação no primeiro grau para apuração de eventual malversação de recursos públicos.

É o voto.