REl - 0600116-79.2022.6.21.0005 - Voto Relator(a) - Sessão: 14/03/2024 às 09:30

VOTO

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

O DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO LIBERAL – PL de Alegrete interpõe Recurso contra a sentença do Juízo da 5ª Zona Eleitoral de Alegrete/RS, a qual desaprovou as contas relativas à campanha eleitoral, em virtude de inconsistências relativas à 1) utilização de recursos de origem não identificada – RONI; 2) não assunção de dívida de campanha de forma correta.

Sustenta o recorrente que a quantia de R$ 2.133,24 diz respeito ao “cupom fiscal gerado, no ato do abastecimento, foi devidamente registrado em nome do partido em debate e no final da campanha, novamente, em duplicidade, foi gerada a nota fiscal de nº 705”. Aduz ainda que “não é crível, que seja uma mera coincidência, que a soma de 23 (vinte e três) cupons fiscais somados dariam, exatamente, incluindo os centavos, o mesmo valor da nota fiscal nº 705, ou seja, R$2.133,24 (dois mil cento e trinta e três reais e vinte a quatro centavos)”. Afirma ainda que não é possível excluir ou anular a nota em duplicidade, juntando em grau recursal declaração dos proprietários do estabelecimento (ID 45478020).

No item sob exame, acolho o posicionamento firmado pela d. Procuradoria Regional Eleitoral e, com o fito de evitar desnecessária repetição, adoto expressamente como razões de decidir o trecho abaixo transcrito:

Ressalta-se que, diante da suposta duplicidade na emissão de notas fiscais, caberia ao partido providenciar o cancelamento e comprová-lo à Justiça Eleitoral, nos termos dos artigos 59 e 92, § 6º, da Resolução TSE nº 23.607/2019. Ainda que ultrapassado o prazo para tanto, como referido no recurso, seria possível o estorno da nota fiscal supostamente repetida, nos termos da Instrução Normativa 98/2011 da Subsecretaria da Receita Estadual do Rio Grande do Sul. Nenhuma dessas providências, contudo, foi adotada.

Assim, na falta de cancelamento ou estorno das notas fiscais, tem-se que as despesas a elas relativas foram paga com valores que não transitaram pela conta bancária da campanha, configurando recursos de origem não identificada, cujos valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, conforme art. 32, caput e § 1º, inciso VI, da Resolução TSE 23.607/2019.

Nesse sentido, indico que esta Corte firmou o entendimento de que, “havendo o registro do gasto nos órgãos fazendários, o ônus de comprovar que a despesa eleitoral não ocorreu ou que ocorreu de forma irregular é do prestador de contas” (TRE-RS, Prestação de Contas Eleitoral n. 0602944-63.2022.6.21.0000, Relatora Desembargadora Eleitoral Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, publicado em sessão em 01.12.2022).

Em relação aos valores de R$ 1.895,00, R$ 100,00, R$ 41,00, R$ 248,00, R$ 200,00 e R$ 1.000,00, que totalizam R$ 3.484,00, o prestador afirma que “não se tem muito para argumentar, pois o cheques juntado e PIX comprovam a data do efetivo pagamento, dentro do prazo, contudo as notas fiscais foram geradas fora dos prazos, situação esta que foge ao controle dos recorrentes.”

Ora, o argumento não se sustenta - é direito do pagador exigir a imediata emissão do respectivo documento fiscal correspondente à operação, há a irregularidade grave no relativo à ausência de lançamento de informações no sistema SPCE, omissão que afeta a confiabilidade das contas de campanha.

Por fim, o órgão técnico contábil verificou dívida de campanha (declarada na prestação de contas) decorrente do não pagamento de despesas contraídas, no montante de R$ 207,60, consignou que a impossibilidade de rastrear a origem dos recursos utilizados para pagamento de tais dívidas configura-os como recursos de origem não identificada - RONI, e opinou pelo recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional.

A disciplina da assunção de eventuais dívidas de campanha não pagas até a apresentação das contas está estabelecida no art. 33, §§ 2° e 3°, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 33. Partidos políticos e candidatas ou candidatos podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.

§ 1º Após o prazo fixado no caput, é permitida a arrecadação de recursos exclusivamente para a quitação de despesas já contraídas e não pagas até o dia da eleição, as quais deverão estar integralmente quitadas até o prazo de entrega da prestação de contas à Justiça Eleitoral.

§ 2º Eventuais débitos de campanha não quitados até a data fixada para a apresentação da prestação de contas podem ser assumidos pelo partido político (Lei nº 9.504/1997, art. 29, § 3º ; e Código Civil, art. 299) .

§ 3º A assunção da dívida de campanha somente é possível por decisão do órgão nacional de direção partidária, com apresentação, no ato da prestação de contas final, de:

I - acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência da pessoa credora;

II - cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo;

III - indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

§ 4º No caso do disposto no § 3º deste artigo, o órgão partidário da respectiva circunscrição eleitoral passa a responder solidariamente com a candidata ou o candidato por todas as dívidas, hipótese em que a existência do débito não pode ser considerada como causa para a rejeição das contas da candidata ou do candidato (Lei nº 9.504/1997, art. 29, § 4º) .

No ponto, o prestador ateve-se a declarar que “não havia saldo na conta do partido, por esta razão os valores ainda não fora pagos”.

O Parquet argumenta, em seu parecer, que, “de acordo com o entendimento do TSE, a irregularidade em questão, embora deva ser considerada para o juízo de aprovação ou desaprovação das contas, não gera dever de recolhimento".

Com razão.

Ainda que a falha esteja configurada, o recolhimento não deve ser determinado por falta de amparo normativo, conforme entendimento desta Corte, esposado exemplificativamente no processo 0600604-54.20206210021, rel. Des. Federal Luis Alberto Dazevedo Aurvalle, julgado em 07.3.2023, em linha ao posicionamento do TSE firmado no acórdão do RESPE n. 0601205-46.2018.6.12.000, redator designado o Ministro Luís Roberto Barroso.

No entanto, a despeito de ser incabível a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional, resta considerar a irregularidade de R$ 207,60 para análise de aprovação, ressalvas ou desaprovação das contas.

As irregularidades apuradas nestes autos perfazem o somatório de R$ 5.824,84 (R$ 207,60/dívida de campanha + R$ 5.617,24/RONI), que equivalem a 11,24% do total de receitas declaradas (R$ 51.834,00), de modo a inviabilizar um juízo de aprovação com ressalvas mediante a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso, para afastar o recolhimento de R$ 207,60 e determinar o recolhimento de R$ 5.617,24 ao Tesouro Nacional, mantendo a desaprovação das contas.