REl - 0600053-30.2022.6.21.0110 - Voto Relator(a) - Sessão: 07/03/2024 às 14:00

VOTO

Admissibilidade.

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, está a comportar conhecimento.

 

Da preliminar de nulidade da sentença

Eminentes colegas.

A Procuradoria Regional Eleitoral, em seu parecer, argui nulidade da sentença, em decorrência da falta de composição adequada do polo passivo da relação processual, porquanto deveria ter sido intimado para apresentação das contas o UNIÃO BRASIL, e não o PARTIDO SOCIAL LIBERAL - PSL de Tramandaí (ora recorrente), que se encontrava extinto em decorrência de fusão partidária. O parecer refere que o PARTIDO SOCIAL LIBERAL fundiu-se com o DEMOCRATAS, dando origem ao UNIÃO BRASIL, consoante registro aprovado pelo TSE em fevereiro de 2022 (proc. n. 0600266-31.2020.6.00.0000).

Diante desta circunstância, sustenta o Ministério Público Eleitoral perante esta instância que

“Nesse sentido, a procuração outorgada pelo PSL em maio de 2023 à advogada que, por sua vez, substabeleceu ao signatário do recurso (IDs 45519897 e seguintes), não tem validade jurídica, pois a agremiação partidária não mais existia quando da prática do ato. Ademais, de acordo com as informações disponibilizadas pelo módulo consulta do SGIP/TSE, não há órgão partidário do PARTIDO SOCIAL LIBERAL vigente em Tramandaí desde fevereiro de 2022, mas há registro de diretório municipal do UNIÃO BRASIL desde 27.03.2022”.

Tal circunstância, em princípio, implicaria o não conhecimento do recurso. Entretanto, verifica-se, diante da tramitação do feito perante a 0110ª Zona Eleitoral do Rio Grande do Sul, a existência de questão prévia, a importar na nulidade da sentença, por falta de composição adequada do polo passivo da demanda.

De fato, após o registro de inadimplência (ID 45519718), foi certificada a expedição de carta de intimação endereçada à Comissão Provisória do PSL e a seus dirigentes (IDs 45519720 – 45519720), bem como o envio de mensagem de WhatsApp para o ex-tesoureiro da extinta agremiação (ID 45519724). Das três intimações enviadas por correio, uma não foi recebida (ID 45519882), uma foi recebida por pessoa não identificada (ID 45519878) e outra foi recebida por pessoa que não figura no rol de ex dirigentes da Comissão Provisória do PSL (ID 45519880), conforme consta no SGIP. É possível identificar apenas a intimação do ex-tesoureiro do partido, por mensagem de WhatsApp.

Após a emissão de “PARECER TÉCNICO DE NÃO PRESTAÇÃO DE CONTAS” (ID 45519888), no qual foi destacado que “Infrutíferas as tentativas de intimação via postal, porém o diretório foi devidamente intimado para regularizar a representação processual no WhatsApp (certidão doc id nº 116068327), fornecido no Sistema de Gestão de Informações Partidárias – SGIP e no Cadastro Eleitoral, e ainda assim não apresentou procurações” (ID 45531081), o Juízo a quo, ouvido o MPE, proferiu sentença que julgou as contas como não prestadas.

Ocorre que, nos termos do art. 62 da Resolução TSE nº 23.604/2019, “Na hipótese de incorporação ou fusão de partidos, o partido político incorporador ou o derivado da fusão deve prestar contas daquele incorporado ou daqueles fundidos, em todos os seus níveis de direção partidária, nos termos desta resolução, no prazo de 90 (noventa) dias, a contar da data de averbação do novo estatuto partidário no TSE.” Assim, constatada a omissão em prestar contas, deveria ter sido intimado o UNIÃO BRASIL, e não o PSL, que se encontrava extinto em decorrência da fusão.

De qualquer modo, as contas, embora intempestivas, foram prestadas no SPCA, com declaração de ausência de movimentação financeira. Portanto, juntado o parecer técnico, deveria ter sido aberto prazo à agremiação e a seus responsáveis, para o oferecimento de razões finais, nos termos do art. 40, I, da Resolução TSE nº 23.604/2019, sendo relevante registrar que o UNIÃO BRASIL já possuía, então, diretório municipal vigente em Tramandaí.

Nesse contexto, não tendo sido realizada notificação/intimação do partido responsável pela prestação de contas, faz-se necessária a anulação do feito, desde seu início, a fim de que seja adotado trâmite processual em que se observe a correta comunicação dos atos processuais aos responsáveis pelas contas do PSL no exercício de 2021.

 

Assiste razão à Procuradoria Regional Eleitoral.

De fato, o Tribunal Superior Eleitoral, na sessão de julgamento de 08.02.2022, deferiu o pedido de fusão do DEMOCRATAS e do PARTIDO SOCIAL LIBERAL - PSL, com a formação do UNIÃO BRASIL - UNIÃO (processo REGISTRO DE PARTIDO POLÍTICO N. 0600641-95.2021.6.00.0000 - BRASÍLIA - DISTRITO FEDERAL), que sucedeu o prestador de contas originário nestes autos.

Anoto que a presente ação foi inaugurada em 07.7.2022, com a Declaração de Inadimplência referente ao exercício de 2021 (ID 45519718), portanto em data posterior à criação do UNIÃO BRASIL e extinção do PARTIDO SOCIAL LIBERAL – PSL.

A norma disciplinadora da matéria encontra-se no art. 62 da Resolução TSE n. 23.604/2019, verbis:

DA PRESTAÇÃO DE CONTAS DECORRENTE DA FUSÃO, DA INCORPORAÇÃO E DA EXTINÇÃO DE PARTIDOS POLÍTICOS

Art. 62. Na hipótese de incorporação ou fusão de partidos, o partido político incorporador ou o derivado da fusão deve prestar contas daquele incorporado ou daqueles fundidos, em todos os seus níveis de direção partidária, nos termos desta resolução, no prazo de 90 (noventa) dias, a contar da data de averbação do novo estatuto partidário no TSE.

Logo, é atribuição do partido que resultar de fusão ou incorporação a responsabilidade pelas obrigações impostas ao partido fusionado ou incorporado, uma vez que a norma afasta a responsabilidade do partido extinto em razão de tal pessoa jurídica não mais existir, ocorrendo sucessão de seus direitos e responsabilidades.

Tangente a questão, cabe ressaltar que, nos termos do art. 31 da Resolução TSE n. 23.604/19 devem ser integrados a prestação de contas os atuais e os antigos dirigentes, tendo em vista que prossegue a responsabilidade dos dirigentes partidários no período a que se refere a prestação de contas pelas eventuais irregularidades que tenham ocorrido na administração dos recursos destinados ao financiamento do partido.

Nessa conjuntura, deveria ter sido o UNIÃO BRASIL integrado ao processo, com regularização de sua representação processual, bem como caberia a determinação de exclusão do registro do Diretório Municipal do PARTIDO SOCIAL LIBERAL da autuação.

Por consequência, como bem salientado no supracitado parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral, da lavra do Dr. José Osmar Pumes, na presente demanda, resta configurada a falta de composição adequada do polo passivo e, em virtude disto, desde já antecipo que, a fim de evitar tautologia, adoto como razões de decidir os fundamentos expostos no parecer ministerial acima reproduzido, que bem descreve que, em nenhum momento, o UNIÃO BRASIL foi notificado para apresentação das contas ou mesmo teve ciência da tramitação deste processo.

Ademais, em consulta ao SGIP (https://www.tse.jus.br/partidos/partidos-registrados-no-tse/informacoes-partidarias/modulo-consulta-sgip3) é possível verificar que há registro de constituição de diretório municipal do UNIÃO BRASIL em Tramandaí com vigência de 27.3.2022 até 27.3.2027.

No mesmo sentido da nulidade do julgamento de omissão de prestação de contas nos casos em que o partido sucessor não tenha integrado a relação processual, menciono precedentes dos Tribunais Regionais Eleitorais de Minas Gerais e do Paraná:

 

RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. ÓRGÃO MUNICIPAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. OMISSÃO. FUSÃO DE PARTIDOS. CONTAS JULGADAS NÃO PRESTADAS. DETERMINAÇÃO DE SUSPENSÃO DO REPASSE DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO E DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA. Objeto do recurso consubstanciado em nulidade do processo, em razão da ausência de notificação dos ex–gestores e do indeferimento de diligências. Não observância do disposto no art. 30, I, "b", da Resolução TSE nº 23.604/2019, de cientificação do presidente e do tesoureiro ou daqueles que desempenharam funções equivalentes e eventuais substitutos no período das contas, quanto à omissão da apresentação das contas da agremiação municipal. Não cumprimento de diligência determinada pelo Juízo e reiterada pela parte, relativa à juntada dos extratos bancários, conforme art. 30, IV, "a", da Resolução TSE n° 23.604/2019. Notificação expedida por meio eletrônico ao órgão regional do UNIÃO BRASIL, partido derivado da fusão entre o DEM e o PSL. Ausência de assunto na mensagem de notificação/citação encaminhada por e–mail. Ausência de confirmação de seu recebimento. Vício insanável. Reconhecimento de prejuízo à defesa, contrariando os princípios fundamentais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. RECURSO PROVIDO. NULIDADE DO PROCESSO, A PARTIR DA NOTIFICAÇÃO/CITAÇÃO. RETORNO À ORIGEM PARA REGULAR PROCESSAMENTO.

(TRE-MG, RECURSO ELEITORAL nº 060007405, Acórdão, Relator(a) Des. Flavia Birchal De Moura, Publicação: DJEMG - Diário de Justiça Eletrônico-TREMG, Tomo 181, Data: 06/10/2023)

 

RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS PARTIDÁRIAS. SENTENÇA PELO JULGAMENTO DAS CONTAS COMO NÃO PRESTADAS. FUSÃO PARTIDÁRIA. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DO PARTIDO DERIVADO. CITAÇÃO DO ÓRGÃO PARTIDÁRIO JÁ EXTINTO PELA FUSÃO. NULIDADE DECRETADA DE OFÍCIO. RECURSO PREJUDICADO. 1. Na hipótese de fusão, o partido derivado deve prestar contas daqueles fundidos, em todos os seus níveis de direção partidária, no prazo de 90 (noventa) dias, nos termos do artigo 62 da Resolução TSE nº. 23.604. 2. Não havendo prestação de contas pelo órgão partidário extinto, deve ser notificado, além dos dirigentes responsáveis, o partido derivado da fusão. 3. Nulidade decretada de ofício. 4. Recurso conhecido e prejudicado.

(TRE-PR, REl: 06000130520226160040 SERTANÓPOLIS - PR 060001305, Relator: Des. Claudia Cristina Cristofani, Data de Julgamento: 21/10/2022, Data de Publicação: 26/10/2022) (Grifei.)

 

Assim sendo, mostra-se imperioso o reconhecimento da nulidade da sentença, uma vez que não integrado no polo passivo da demanda o órgão partidário do UNIÃO BRASIL, nos termos do art. 62 da Resolução TSE n. 23.604/19, devendo o feito retornar à origem para que seja realizada a notificação e dado seguimento ao regular processamento, nos termos da fundamentação acima.

Logo, acolho a preliminar suscitada pelo d. Procurador Regional Eleitoral, para anular o feito, determinando-se o retorno dos autos à origem para regular processamento, nos termos da fundamentação.

DESTACO.

 

No mérito

Trata-se de recurso interposto pelo DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO SOCIAL LIBERAL - PSL de TRAMANDAÍ, ALZIRA LUIZA DA SILVA AGUIAR e VALDENIR GOMES BATISTA contra a sentença (ID 45519891) do Juízo da 110ª Zona Eleitoral, sediada em Tramandaí, que julgou não prestadas as contas da agremiação relativas ao exercício financeiro de 2021.

Nas razões recursais (ID 45519898), os recorrentes aduzem que a falta de procuração não pode ser motivo de julgamento de contas não apresentadas ou seu indeferimento.

Na hipótese, observo constarem do parecer técnico (ID 45519888) as seguintes informações:

 

A prestação de contas não foi apresentada pelo órgão partidário, tendo sido autuada automaticamente pelo Sistema de Prestação de Contas Eleitorais junto ao sistema de Processo Judicial Eletrônico - PJE. O Partido apresentou, intempestivamente, Declaração de ausência de movimentação financeira.

Foi certificado nos autos a inexistência de extratos bancários nem distribuição de recursos público ao diretório partidário (doc id 117272376).

Infrutíferas as tentativas de intimação via postal, porém o diretório foi devidamente intimado para regularizar a representação processual no WhatsApp (certidão doc id nº 116068327), fornecido no Sistema de Gestão de Informações Partidárias – SGIP e no Cadastro Eleitoral, e ainda assim não apresentou procurações.

Não foram identificados nos autos instrumento de procuração para os advogados apresentados nos autos.

Nos termos do inciso XX do art. 29 da Resolução TSE nº 23.546/2019, tendo em vista a não apresentação de procuração dos representantes e do diretório municipal, manifesta-se este analista pelo julgamento de NÃO PRESTAÇÃO DAS PRESENTES CONTAS.

 

Conforme se verifica, o partido apresentou, embora intempestivamente, declaração de ausência de movimentação financeira. Ainda, o parecer fez consignar que “Nos termos do inciso XX do art. 29 da Resolução TSE nº 23.546/2019, tendo em vista a não apresentação de procuração dos representantes e do diretório municipal, manifesta-se este analista pelo julgamento de NÃO PRESTAÇÃO DAS PRESENTES CONTAS”.

Ocorre que a Resolução TSE n. 23.546/17 regula as prestações de contas dos partidos políticos relativas aos exercícios 2018 e 2019. Em se tratando do exercício de 2021, a resolução de regência é a de n. 23.604/19.

O regulamento aplicável, por sua vez, prevê que “ausência parcial dos documentos e das informações de que trata o art. 29, §§ 1º e 2º, não enseja o julgamento das contas como não prestadas se do processo constarem elementos mínimos que permitam a análise da prestação de contas”. Confira-se:

 

Art. 45. Compete à Justiça Eleitoral decidir sobre a regularidade das contas partidárias, julgando:

[...]

IV - pela não prestação, quando:

a) depois de intimados na forma do art. 30, o órgão partidário e os responsáveis permanecerem omissos ou as suas justificativas não forem aceitas; ou

b) os documentos e as informações de que trata o art. 29, §§ 1º e 2º, não forem apresentados, ou o órgão partidário deixar de atender às diligências determinadas para suprir a ausência que impeça a análise da movimentação dos seus recursos financeiros.

§ 1º A ausência parcial dos documentos e das informações de que trata o art. 29, §§ 1º e 2º, não enseja o julgamento das contas como não prestadas se do processo constarem elementos mínimos que permitam a análise da prestação de contas.

§ 2º Na hipótese do § 1º, a autoridade judiciária deve examinar se a ausência verificada é relevante e compromete a regularidade das contas para efeito de sua aprovação com ressalvas ou de sua desaprovação.

§ 3º Erros formais ou materiais que, no conjunto da prestação de contas, não comprometam o conhecimento da origem das receitas nem a destinação das despesas não acarretarão a desaprovação das contas (art. 37, § 12, da Lei nº 9.096/95) .

 

Dentre os documentos elencados no § 2º do art. 29 está o “instrumento de mandato outorgado pelo partido e pelos dirigentes partidários responsáveis para constituição de advogado para a prestação de contas”.

Logo, assiste razão aos recorrentes.

Os autos, portanto, devem retornar ao primeiro grau para que se verifique a existência de elementos contábeis mínimos que permitam a análise da prestação de contas.

 

Ante o exposto, VOTO por acolher a preliminar suscitada pela d. Procuradoria Regional Eleitoral para anular o feito, determinando-se o retorno dos autos à origem a fim de que seja efetuada a notificação do partido sucessor para apresentação das contas do exercício 2021 do Diretório Municipal do PARTIDO SOCIAL LIBERAL – PSL de Tramandaí.

É o voto.