PCE - 0602891-82.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 07/03/2024 às 14:00

VOTO

Trata-se de prestação de contas apresentada por ROBERTO CARLOS SARTURI, candidato ao cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas Eleições Gerais de 2022.

A Secretaria de Auditoria Interna (SAI), examinando a contabilidade, apontou a existência de dívida de campanha sem a documentação pertinente e falta de comprovação de correta utilização de recursos recebidos do FEFC.

Passo à análise das falhas relatadas.

I – Das Dívidas de Campanha sem a Documentação Necessária

A unidade técnica, em seu parecer conclusivo, consoante fragmento abaixo reproduzido, apontou a existência de dívidas de campanha declaradas, no montante de R$ 1.152,80, sem a apresentação dos documentos exigidos pelas normas de regência (ID 45520500):

3.1 Há dívidas de campanha declaradas na prestação de contas decorrentes do não pagamento de despesas contraídas na campanha, no montante de R$ 1.152,80, não tendo sido apresentados os seguintes documentos, conforme dispõe o art. 33, §§ 2° e 3°, da Resolução TSE nº 23.607/2019:

 

. autorização do órgão nacional para assunção da dívida pelo órgão partidário da respectiva circunscrição;

 

. acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência do credor;

 

. cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo e indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

 

O candidato não exerceu seu direito de manifestação como previsto no §1º, do art. 69 da Resolução TSE 23.607/2019, não apresentou esclarecimentos e comprovantes no PJe – Processo Judicial Eletrônico que alterem as falhas anteriormente apontadas.

 

Assim, por não comprovação da origem dos recursos utilizados na campanha, considera-se irregular o montante de R$ 1.152,80, passível de recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme o art. 32 da Resolução TSE 23.607/2019.

 

Com efeito, apesar da dívida de campanha não quitada, não foram apresentados nenhum dos documentos elencados no art. 33, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 33. Partidos políticos e candidatas ou candidatos podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.

[...].

§ 2º Eventuais débitos de campanha não quitados até a data fixada para a apresentação da prestação de contas podem ser assumidos pelo partido político (Lei nº 9.504/1997, art. 29, § 3º ; e Código Civil, art. 299) .

§ 3º A assunção da dívida de campanha somente é possível por decisão do órgão nacional de direção partidária, com apresentação, no ato da prestação de contas final, de:

I - acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência da pessoa credora;

II - cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo;

III - indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

 

Nesse cenário, nos termos do art. 34 da Resolução TSE n. 23.607/19, a existência de débitos de campanha não assumidos pelo partido será tomada em consideração por ocasião do julgamento e poderá ser considerada motivo para rejeição do ajuste contábil.

Cabe ressaltar que, tal como indicado no parecer ministerial, não há de ser comandado o recolhimento dos respectivos valores ao erário, pois as dívidas de campanha não quitadas e não assumidas pela agremiação consistem em categoria com regulamentação específica, capaz de influenciar no julgamento de mérito das contas, mas sem a imposição de outras sanções, não havendo espaço para, interpretando-se extensivamente o art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19, determinar-se o ressarcimento da quantia ao Tesouro Nacional a título de recurso de origem não identificada.

Nesse sentido, destaco recentes julgados do TSE:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CARGO DE DEPUTADO FEDERAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DESAPROVAÇÃO NA INSTÂNCIA DE ORIGEM. REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE PRESENTES. AGRAVO PROVIDO. DÍVIDA DE CAMPANHA. ASSUNÇÃO PELO PARTIDO. IRREGULARIDADE NO PROCEDIMENTO. EQUIPARAÇÃO A RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE RESPALDO NORMATIVO. PRECEDENTE. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

[...].

3. Não há "[...] respaldo normativo para determinar o recolhimento de dívida de campanha ao Tesouro Nacional como se de recursos de origem não identificada se tratasse" (REspEl nº 0601205–46/MS, rel. designado Min. Luís Roberto Barroso, julgado em 8.2.2022, DJe de 30.3.2022).

4. Recurso especial parcialmente provido tão somente para afastar a determinação de devolução de R$ 4.048,00 ao Tesouro Nacional, mantida a desaprovação das contas.

(AREspE n. 0608511-76.2018.6.26.0000/SP, Acórdão, Relator: Min. Mauro Campbell Marques, Publicação: DJE, Tomo 175, Data: 09.9.2022) (Grifei.)

 

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEPUTADO ESTADUAL. ELEIÇÕES 2018. DESAPROVAÇÃO. OMISSÃO DE DESPESAS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. IRREGULARIDADE GRAVE. SÚMULA 24/TSE. IRREGULARIDADES. PERCENTUAL E VALOR ABSOLUTO ELEVADOS. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. INAPLICÁVEIS. DÍVIDA DE CAMPANHA. RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. NÃO CABIMENTO. REDUÇÃO DO MONTANTE A SER RESTITUÍDO. PARCIAL PROVIMENTO.

(...).

7. Este Tribunal, no julgamento do REspEl 0601205–46/MS, sessão de 8/2/2022, redator para acórdão Min. Luís Roberto Barroso, decidiu ser incabível determinar–se o recolhimento ao erário dos valores de dívida de campanha não paga, por inexistir respaldo normativo para se presumir que o débito será pago em momento futuro com recursos de origem não identificada.

8. Desse modo, impõe–se descontar do valor a ser recolhido ao Erário, fixado em R$ 70.324,67 pelo TRE/SP, a quantia de R$ 48.105,80, que, de acordo com o aresto regional, corresponde a dívida de campanha não quitada. (…).

(AgR-REspEl n. 0605340-14.2018.6.26.0000/SP, Relator: Min. Benedito Gonçalves, Data de Julgamento: 10.3.2022, Data de Publicação: DJE, Tomo 55, Data: 29.3.2022) (Grifei.).

 

Trata-se também de posicionamento já sedimentado neste Tribunal para as Eleições de 2022, consoante exemplificam os julgamentos da PCE n. 0603217-42.2022.6.21.0000, Relator Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, em 09.12.2022, e da PCE n. 0602320-14.2022.6.21.0000, Relator Des. Eleitoral Afif Jorge Simões Neto, em 17.10.2023.

Portanto, está caracterizada a irregularidade, no importe de R$ 1.152,80, descabendo, porém, a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

 

II – Da Falta de Comprovação de Regular Utilização de Recursos do FEFC

A unidade técnica, nos itens 4.1.1, 4.1.2 e 4.1.3 de seu parecer conclusivo, analisando despesas quitadas com verbas do FEFC, no total de R$ 5.758,55, entendeu que os gastos não foram suficientemente comprovados (ID 45520500), de acordo com os subitens que seguem.

II.1. Dos Gastos com Combustível – 4.1.1 do Parecer Conclusivo

Segundo o trecho do parecer conclusivo abaixo transcrito, houve gastos irregulares, no valor de R$ 684,55, com aquisição de combustível sem a correspondente utilização de veículo em campanha:

4.1.1 Existem despesas pagas com recursos do FEFC no valor de R$ 684,55 realizadas com combustíveis sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, situação que deve ser esclarecida pelo prestador de contas (art. 53 da Resolução TSE nº 23.607/2019):

O candidato não exerceu seu direito de manifestação como previsto no §1º, do art. 69 da Resolução TSE 23.607/2019, não apresentou esclarecimentos e comprovantes no PJe – Processo Judicial Eletrônico que alterem as falhas anteriormente apontadas, limitando-se a reapresentar, na prestação de contas retificadora, a mesma documentação já apreciada quando da emissão do relatório de Exame de Contas. Assim, permanece irregular a aplicação de FEFC no valor de R$ 684,55.

 

A respeito dos gastos com combustível, dispõe o art. 35, § 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

[...].

§ 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal da candidata ou do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pela candidata ou pelo candidato na campanha;

[...].

§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:

I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;

II - veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que:

a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e

b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim; e

III - geradores de energia, decorrentes da locação ou cessão temporária devidamente comprovada na prestação de contas, com a apresentação de relatório final do qual conste o volume e valor dos combustíveis adquiridos em na campanha para este fim.

 

Vale dizer, acaso não atendidos estritamente os pressupostos elencados no art. 35, § 11, da Resolução TSE 23.607/19, o gasto não pode ser considerado eleitoral e não pode ser pago com recursos de campanha, sobretudo com verbas públicas.

No caso sub examine, foram apresentados os documentos fiscais relacionados às despesas, nos importes de R$ 200,00, em 16.9.2022 (ID 45503368); R$ 175,65, em 28.9.2022 (ID 45503370); e R$ 308,90, em 16.9.2022 (ID 45503372), resultando no somatório de R$ 684,55, todos emitidos contra o CNPJ de campanha.

Anoto, ainda, que os respectivos débitos ocorreram em favor dos correspondentes fornecedores, mediante transferências eletrônicas, conforme observa-se do extrato eletrônico da conta para movimentação de recursos do FEFC, disponível no sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais.

Igualmente, foram os dispêndios declarados no Relatório de Despesas Efetuadas (ID 45503349, fls. 18, 16/17 e 9), constando do Extrato da Prestação de Contas Final Retificadora (ID 45503335, item 2.11), bem como foi apresentado o “relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim”, por meio do Demonstrativo de Despesas com Combustíveis Semanal (ID 45503346).

Entrementes, não houve atendimento ao requisito constante do art. 35, § 11, inc. II, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19, porquanto os veículos supostamente abastecidos não foram “declarados originariamente na prestação de contas”, conforme exige a dicção normativa.

Veja-se que, do Extrato da Prestação de Contas Final Retificadora (ID 45503335), não se verifica qualquer receita financeira ou estimável em dinheiro, salvo os recursos financeiros oriundos do FEFC, e a despesa relacionada ao item “2.33 - Cessão ou locação de veículos” encontra-se zerada.

Somente após o parecer técnico conclusivo, o prestador procedeu à juntada do “termo de cessão estimável em dinheiro por período determinado” (ID 45529259), atinente à cessão do automóvel “Nissan/Frontier”, de placas “PFF-8H65” em prol da campanha.

A referida placa, porém, não possui correspondência com nenhuma daquelas inicialmente indicadas pelo prestador em seu Demonstrativo de Despesas com Combustíveis Semanal (ID 45503346), quais sejam: IQQ8274, IJZ6I32 e DTQ3257.

Do mesmo modo, trata-se de placa distinta daquelas que constaram inscritas nas notas fiscais eletrônicas de gastos com combustíveis: DTQ3257 (ID 45503368) e IJZ6I32 (ID 45503372).

Logo, o termo de cessão apresentado não tem aptidão mínima para sanar a falha.

De seu turno, os veículos que teriam sido efetivamente abastecidos não foram declarados na prestação de contas, seja em operações de cessão ou locação, bem como inexiste informação sobre as respectivas espécies e propriedades dos bens, impondo-se o reconhecimento da irregularidade.

Nesse sentido, colaciono precedente do TSE:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. GASTOS COM COMBUSTÍVEL. GASTO ELEITORAL. VEÍCULO NÃO DECLARADO ORIGINARIAMENTE. IRREGULARIDADE GRAVE. INCIDÊNCIA DO VERBETE SUMULAR 26 DO TSE.

1. O Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe, por unanimidade, manteve a sentença que julgou desaprovadas as contas de campanha do ora agravante, relativas às Eleições 2020, em razão de declaração de despesas realizadas com combustível sem apresentação do correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, nos termos do art. 35, § 11, inciso II, alínea a, da Res.–TSE 23.607.

[...].

6. A Norma Eleitoral estabelece, como regra, ser facultativa a emissão do recibo eleitoral no caso de cessão de automóvel de propriedade da candidata ou do candidato, de cônjuge e de seus parentes até o terceiro grau para seu uso pessoal durante a campanha (art. 7°, III, § 6°, da Res.–TSE 23.607), de modo que, nessa hipótese, os gastos com combustível são considerados despesas de caráter pessoal, não podendo nem mesmo ser utilizados recursos de campanha para essa finalidade, não se sujeitando tais gastos à prestação de contas (art. 35, § 6°, a, da Res.–TSE 23.607).

7. Na espécie, o candidato efetivamente declarou como "gasto eleitoral" a despesa realizada com combustível, utilizando–se de recursos do fundo especial de financiamento de campanha para essa finalidade, de modo que não se aplica nessa hipótese a mencionada regra que dispensa a contabilidade ou o registro da cessão do veículo, mas, sim, o disposto no art. 35, § 11, da Res.–TSE 23.607, que estabelece regras específicas para que veículos sejam excepcionalmente abastecidos com combustível pago com recursos de campanha.

8. Ou o gasto com combustível é tratado via de regra como "gasto de natureza pessoal" – de modo que não pode ser utilizado recurso de campanha para essa finalidade, dispensando–se inclusive a sua contabilidade e a emissão de recibo da cessão de veículo do cônjuge (arts. 7°, § 6°, III, e 35, § 6°, a, todos da Res.–TSE 23.607); ou, caso efetivamente seja o caso de "gasto eleitoral", deve–se obedecer às exigências do art. 35, § 11, da Res.–TSE 23.607, dentre as quais a de que o veículo seja originalmente declarado na prestação de contas.

CONCLUSÃO

Agravo regimental não conhecido.

(TSE, AgR-REspEl n. 0600624-16.2020.6.25.0027/SE, Relator Min. Sergio Silveira Banhos, Acórdão de 23.3.2023, DJE n. 60, de 04.4.2023) (Grifei.)

 

Além disso, o instrumento de cessão não está acompanhado do comprovante de propriedade do bem cedido, descumprindo a exigência expressa do art. 58, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Destarte, devem ser glosados os gastos em referência, determinando-se o ressarcimento de R$ 684,55 aos cofres públicos, de acordo com o art. 79, § 1º, da referida Resolução.

II.2. Da Ausência de Comprovação de Gastos – 4.1.2 do Parecer Conclusivo

O parecer conclusivo indicou que não foram comprovados gastos no valor de R$ 4.724,00, consoante o seguinte fragmento (ID 45520500):

Após a entrega da prestação de contas retificadora ID 4550334 a ID 45503554, foi realizado exame das despesas complementares (documentos e comprovantes) declaradas pelo candidato na retificação das contas, restando irregularidades na comprovação dos gastos com o Fundo Especial de Financiamento de Campanha no valor de R$ 4.724,00, conforme tabela:

Detalhamento da inconsistência observada na tabela:

A - Débito bancário sem identificação do fornecedor beneficiário do pagamento, não consta CPF ou CNPJ no extrato bancário eletrônico disponibilizado pelo TSE, assim como não foi apresentada documentação bancária comprovando o destinatário dos recursos, conforme art. 38 da Resolução TSE 23.607/2019.

C – Não foi apresentado documento fiscal comprovando a despesa, em conformidade ao art.53, II e de forma a comprovar os art. 35 e 60 da Resolução TSE 23.607/2019.

E – A documentação de comprovação dos gastos com pessoal não apresenta a integralidade dos detalhes previstos no §12 do art. 35 da Resolução TSE 23607/2019, tais como locais de trabalho, horas trabalhadas, especificação das atividades executadas e justificativa do preço contratado.

 

Examinando o primeiro gasto, no importe de R$ 2.000,00, efetuado com FERRAGEM E VIDRAÇARIA GIRARDI, CNPJ n. 29.652.665/0001-61, em 12.9.2022, cuja falha seria a falta de apresentação de documento fiscal, há que se sublinhar que o concorrente acostou, após o parecer conclusivo, a Nota Fiscal eletrônica n. 48441204 (ID 45529260), emitida em 09.8.2023, ao CPF do candidato.

Essa nota fiscal detalhou devidamente os materiais adquiridos, consistentes em “tinta piso hidronort cinza”, “rolo de pintura c/ garfo”, “tinta acrílica 18 lts bca visual”, “thinner 900 ml” e “tinta acrílica azul oceano 18 lts”.

Nos termos do art. 35, inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19, são gastos eleitorais as “despesas de instalação, organização e funcionamento de comitês de campanha e serviços necessários às eleições”.

De fato, houve a regular locação de imóvel comercial para a instalação de comitê de campanha, a qual prevê, na cláusula oitiva do instrumento contratual, a obrigação de manutenção e pintura do imóvel (ID 45503543).

Logo, não se controverte a licitude de a despesa com pintura do local ser arcada com verbas de campanha, inclusive tendo sido dispêndio similar reputado regular pela área técnica, como se observa da despesa declarada abaixo, que não foi glosada no parecer conclusivo (ID 45503349, fl. 1):

No tocante a esse tópico, o candidato esclareceu que houve a seguinte falha (ID 45529258):

A empresa recebeu o valor, porém acabou por não emitir a nota e o candidato não cobrou na época e, por isso, solicitou a emissão de nota fiscal competente. Porém, como o CNPJ do candidato já foi extinto, a empresa não consegue fazer essa emissão em nome da campanha, apenas no nome da pessoa física do candidato.

 

Para isso, estamos juntando a competente nota fiscal e solicitando que a mesma seja aceita como justificativa para a despesa que foi lançada na conta bancária, porém, por erro, não foi emitida a nota fiscal em tempo.

 

Segundo a Procuradoria Regional Eleitoral, apesar dos esclarecimentos prestados, a nota fiscal “emitida após a data da eleição (em 09.08.2023), afronta a regra do art. 33 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual estabelece que ‘os partidos políticos e candidatos ou candidatas podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição” (ID 45543834).

Nada obstante, em consulta ao extrato eletrônico, constata-se que a despesa foi paga em 29.9.2022, ou seja, antes da data do pleito, por meio de transferência bancária, e que a nota fiscal em apreço registrou, em informações complementares: “ESTA NOTA E REFERENTE AO PAGAMENTO PELA CAMPANHA DO CANDIDATO ROBERTO CARLOS SARTURI - CONFORME CNPJ DA CAMPANHA 47.574.749/0001-06. - O PAGAMENTO DA NOTA FOI EFETUADO EM 29/09/2022” (ID 45529260).

A situação em exame não envolve a concretização de obrigação após a eleição, pois o fornecimento do produto e o seu pagamento ocorreram durante a campanha, como evidencia o extrato bancário e a nota fiscal. O que houve foi a emissão tardia do documento fiscal pelo fornecedor, após o pleito.

Considerando que a despesa foi declarada na prestação de contas como sendo realizada em 12.9.2022 (ID 45503349), quitada mediante transferência bancária ao fornecedor em 29.9.2022, e o documento fiscal apresentado confirma que o correlato pagamento ocorreu em 29.9.2022 ao candidato em situação de campanha, havendo, ainda, outra despesa similar não questionada pelo órgão técnico, tenho que o gasto se mostra suficientemente comprovado nos autos.

Assim, existe uma mera falha formal em relação à formalização da nota fiscal, ensejando a aposição de ressalvas sobre o ponto, sem a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

Relativamente ao segundo dispêndio, de R$ 1.165,00, sobre atividades de militância e mobilização de rua, contratadas com LUIS FELIPE BICCA DA SILVA, CPF n. 601.197.430-94, em 10.9.2022, foi indicado que “a documentação de comprovação dos gastos com pessoal não apresenta a integralidade dos detalhes previstos no §12 do art. 35 da Resolução TSE 23607/2019, tais como locais de trabalho, horas trabalhadas, especificação das atividades executadas e justificativa do preço contratado”.

O candidato apresentou em suas contas finais recibo (ID 45282612), renovado com a retificadora (ID 45503528), o qual não contém o valor dos serviços e nem tampouco assinatura de quaisquer das partes contratantes, o que o torna imprestável como meio de comprovação.

Dessa maneira, ante a inidoneidade dos documentos acostados para comprovar o gasto, deve o valor de R$ 1.165,00 ser ressarcido ao Tesouro Nacional, com fundamento no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Relativamente ao terceiro gasto glosado pelo órgão técnico, de R$ 1.150,00, atinente a atividades de militância e mobilização de rua, pactuado com CRISTINA RODRIGUES MENDES, CPF n. 364.155.370-91, a irregularidade consistiria também na falta de detalhamento previsto no art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Nos demonstrativos, a despesa foi declarada como “atividade de militância”, com a descrição de “publicidade, divulgação, marketing e merchandisin”, pago via operações de pix nos valores de R$ 150,00, em 14.9.2022; R$ 500,00, em 16.9.2022; e R$ 500,00, em 23.9.2022 (ID 45503349).

No curso da instrução, o candidato apresentou um único recibo assinado pela fornecedora, datado de 28.10.2022, referente à “prestação de serviços de publicidade, divulgação, marketing e merchandising durante o interregno lícito do pleito/2022”, e extratos bancários (ID 45503377, fl. 3).

Contudo, não houve a apresentação de instrumento contratual, e o recibo oferecido apresenta um espaço em branco relativamente à quantia total recebida.

Desse modo, a documentação apresentada não se mostra suficiente e idônea para a comprovação do gasto, nos termos exigidos pelos arts. 35, § 12, e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, cabendo a restituição de R$ 1.150,00 ao Tesouro Nacional, na forma do 79, § 1º, da mesma Resolução.

Concernente ao quarto gasto, de R$ 409,00, com a contratação de MONIQUE GONÇALVES DE AFONSO, para o fornecimento de serviços de publicidade e militância, houve apontamento de que a comprovação apresentada não traz todos os detalhes previstos no § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19 e que o débito bancário não foi direcionado em favor da prestadora de serviços, em afronta ao art. 38 do mencionado estatuto regulamentar.

Contudo, quanto a suposta falta de detalhamento previsto no art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, nos comprovantes juntados sob ID 45503537, observo que o contrato de prestação de serviços e os recibos são idênticos, em suas cláusulas e termos, a outros documentos utilizados para evidenciar gastos com pessoal, os quais não foram objeto de qualquer crítica pela área contábil, como, a título exemplificativo, os pertinentes a MILTON PAULO DA SILVA SOARES (ID 45503536) e ROBERTO CARLOS CORREA (ID 45503538).

De todo modo, ainda que se percebam lacunas no instrumento contratual (ID 45503537, fls. 1 e 2), os recibos apresentados estão completos e foram emitidos para cada uma das três frações de pagamentos realizadas (ID 45503537, fls. 3 a 5), sendo fidedignos e aptos como prova complementar do gasto.

Com efeito, de acordo com o art. 60, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, a Justiça Eleitoral poderá admitir, para fins de comprovação de gastos, qualquer meio idôneo de prova, inclusive documentos como “comprovante bancário de pagamento” e, quando dispensada a emissão de nota fiscal, “recibo”. Nesse sentido, cito o seguinte julgado:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO INTERNO EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. CANDIDATO AO CARGO DE VEREADOR. CONTAS APROVADAS COM RESSALVAS NA ORIGEM. CHEQUE CRUZADO. AUSÊNCIA. PROVAS. ORIGEM. RECURSOS. EXISTÊNCIA. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. RECIBO DE PAGAMENTO. CÓPIA DO CHEQUE. ART. 60, §§ 1º e 2º, DA RES.-TSE Nº 23.607/2019. ENUNCIADOS NºS 24 E 30 DA SÚMULA DO TSE. NEGADO PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO.

[...].

2. O art. 60, §§ 1º e 2º, da Res.-TSE nº 23.607/2019 ratifica que, também nas eleições de 2020, a comprovação de despesas pode ser realizada por qualquer meio adequado de prova, desde que seja possível a eficaz fiscalização das contas, preservadas sua transparência e confiabilidade. No caso, foram apresentados: o contrato de prestação de serviço com quem recebeu o cheque; o respectivo recibo de pagamento; e cópia do cheque nominal à prestadora do serviço, os quais comprovaram a origem dos gastos realizados com os recursos do FEFC.

3. A fiscalização exercida por esta Justiça Eleitoral tem por fim assegurar a correta identificação do destinatário da verba pública, sendo possível ao prestador comprovar a origem e o destino do dinheiro público por qualquer documento, desde que idôneo para esse fim.

[...].

(TSE; AREspEl n. 060017123, Acórdão, Min. Raul Araujo Filho, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 15/12/2022) (Grifei.)

 

Na hipótese, o contrato com MONIQUE prevê a “prestação de serviços de publicidade, divulgação, marketing e merchandising” e, igualmente, os recibos acostados anotam a “prestação de serviços de merchandising e divulgação durante a campanha”.

Nesse quadro, em que a despesa com pessoal encerra serviços rotineiros no âmbito da campanha eleitoral, cujas atividades típicas notoriamente consistem em tremular bandeiras com propaganda eleitoral nas ruas, entregar impressos com publicidade a eleitores e acompanhar o candidato em eventos, tenho que estão suficientemente especificadas as atividades executadas.

Do mesmo modo, a ausência de indicação das horas trabalhadas também não deve impedir que, nas circunstâncias do presente caso, o gasto seja reputado regular, uma vez que a quitação foi fracionada, a indicar pagamentos por jornada, ou seja, à medida que os trabalhos iam sendo desempenhados.

Além disso, em vista de não haver necessidade de especialização pela contratada, que laborou com remuneração bastante módica, ainda que considerada uma ou duas diárias para cada pagamento, em 23.9.2022 (R$ 131,60); 26.9.2022 (R$ 167,40) e 28.9.2022 (R$ 110,00), torna-se despicienda a justificativa do preço contratado.

Igualmente, o detalhamento dos locais de trabalho revela-se irrelevante à hipótese, pois o contrato e os recibos registram terem sido firmados no Município de Viamão, também local de residência do candidato (ID 45108490) e onde ocorreram a totalidade das contratações com militância e propaganda.

Em julgamento de caso análogo, este Tribunal considerou que, tratando-se de disputa para deputado federal, em sendo “consignada ao menos a cidade ou região em que a pessoa trabalharia”, está minimamente atendida a exigência normativa do art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19 (TRE-RS - PCE: 0603069-31/RS, Relatora: Desa. Eleitoral Kalin Cogo Rodrigues, Data de Julgamento: 29/11/2022).

Ademais, não há indício algum de que a contratação seja irregular e, conforme leciona Rodrigo López Zilio, as disposições previstas no art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19 preveem detalhamento consistente em "uma manifestação meramente declaratória do prestador de contas" (Direito Eleitoral. 8. ed. São Paulo: Editora Juspodivm, 2022, p. 570), o que permite seu suprimento pelo demais elementos extraídos dos autos.

Noutro vértice, sobre a irregularidade consubstanciada em “débito bancário sem identificação do fornecedor beneficiário do pagamento, não consta CPF ou CNPJ no extrato bancário eletrônico disponibilizado pelo TSE, assim como não foi apresentada documentação bancária comprovando o destinatário dos recursos, conforme art. 38 da Resolução TSE 23.607/2019”, registro que localizei, no extrato bancário, a realização de três transferências bancárias em favor de “PANELA DE FERRO”, CNPJ n. 29.618.009/0001-42, nos dias 23.9.2022 (R$ 131,60); 26.9.2022 (ID 167,40); e 28.9.2022 (R$ 110,00), exatamente nos mesmos valores e datas dos recibos carreados aos autos (ID 45503537).

Consoante consulta ao sítio na internet do portal REDESIM do Governo Federal, cuja imagem segue abaixo, verifico que “PANELA DE FERRO” se trata de nome de fantasia da empresária individual MONIQUE GONCALVES DE AFONSO PANELA DE FERRO:

De acordo com a jurisprudência, “a empresa individual é mera ficção jurídica que permite à pessoa natural atuar no mercado com vantagens próprias da pessoa jurídica, sem que a titularidade implique distinção patrimonial entre o empresário individual e a pessoa natural titular da firma individual” e de que “não há distinção entre pessoa física e jurídica, para os fins de direito, inclusive no tange ao patrimônio de ambos” (STJ - REsp: 1682989/RS, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 19/09/2017,  SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/10/2017).

Nesse passo, não subsiste o examinado indício de falha, pois o pagamento foi segura e inequivocamente direcionado a MONIQUE GONCALVES DE AFONSO.

Portanto, do conjunto de quatro operações examinadas no tópico, reconheço a irregularidade tão somente em relação às despesas com CRISTINA RODRIGUES MENDES e LUIS FELIPE BICCA DA SILVA, insuficientemente comprovadas, cujos valores devem ser ressarcidos ao Tesouro Nacional, com fundamento no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

II.3. Das Sobras de FEFC Não Recolhidas ao Tesouro Nacional – 4.1.3 do Parecer Conclusivo

A SAI apontou que houve valores não utilizados do FEFC, os quais não foram devolvidos ao erário (ID 45520500):

4.1.3 - O prestador de contas declarou como sobras de campanha o valor abaixo (Extrato da Prestação de Contas – ID 45503335), sem a comprovação de recolhimento ao Tesouro Nacional dos recursos do FEFC, desatendendo a previsão do §5º, do art. 50 da Resolução TSE nº 23.607/2019:

Assim, por não comprovação dos gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, considera-se irregular o montante de R$ 5.758,55 (itens 4.1.1; 4.1.2 e 4.1.3) passível de devolução ao Tesouro Nacional, conforme o art. 79, §1º da Resolução TSE 23.607/2019.

 

Com efeito, segundo o art. 50, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/19, os valores provenientes do FEFC não empregados na campanha devem, no instante da apresentação das contas, ser devolvidos aos cofres públicos:

Art. 50 (...).

§ 5º Os valores do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) eventualmente não utilizados não constituem sobras de campanha e devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional integralmente por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU) no momento da prestação de contas.

 

Tal providência não foi realizada, de modo que restou configurada a falha, devendo a importância de R$ 350,00 ser transferida ao Tesouro Nacional, conforme determina o art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

III – Do Julgamento das Contas

Assim, em face de as irregularidades, que atingem R$ 4.502,35 (R$ 1.152,80 + R$ 684,55 + R$ 1.165,00 + R$ 1.150,00 + R$ 350,00), serem equivalentes a 17% do total arrecadado (R$ 25.017,70), resta inviabilizada a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade como meio de atenuar a gravidade das máculas sobre o conjunto das contas, sendo, portanto, mandatória a desaprovação.

Ainda, deve o candidato efetuar o recolhimento de R$ 3.349,55 (R$ 684,55 + R$ 1.165,00 + R$ 1. 150,00 + R$ 350,00) aos cofres públicos, com fundamento no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela desaprovação das contas de ROBERTO CARLOS SARTURI, relativas ao pleito de 2022, com esteio no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e pela determinação de recolhimento de R$ 3.349,55 ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, do mesmo diploma normativo.