PCE - 0602925-57.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/03/2024 às 14:00

VOTO

Cuida-se de prestação de contas apresentada por CARLOS EDUARDO BLUM, candidato que alcançou a suplência para para o cargo de deputado estadual pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às Eleições Gerais de 2022.

Em informação, a Secretaria de Auditoria Interna apontou persistirem vícios relativos ao uso de recursos de origem não identificada (RONI) e à malversação de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), motivo pelo qual recomendou a desaprovação das contas.

Do uso de recursos de origem não identifica (RONI)

No que diz respeito à utilização de verbas sem demonstração de origem, a falha vem consubstanciada na omissão de despesa junto a empresa JESSICA SCHREINER DE QUADROS KAISER, CNPJ n. 36.263.892/0001-60, no valor de R$ 558,70, a indicar a utilização de recursos de origem não identificada (RONI) para o pagamento do débito.

A vedação ao uso de tais recursos vem estampada no art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

 

Com efeito, em acesso ao sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais desta Justiça Especializada, consta a emissão da nota fiscal n. 42562241 contra o CNPJ de campanha do prestador, entretanto não há, nos extratos eletrônicos, a saída equivalente ao respectivo dispêndio (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2022/2040602022/RS/210001649799/nfes. Acesso em 16.01.2024).

O prestador, conquanto tenha apresentado contabilidade retificadora, não trouxe ao feito novos fatos/provas de forma a elidir a mácula, de sorte que os indícios apontam para o adimplemento da aludida despesa com recursos de origem não identificada, os quais dever ser recolhidos ao erário, nos termos do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Segue jurisprudência desta Casa na mesma linha:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA. DEPUTADA ESTADUAL. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA – RONI. BAIXO PERCENTUAL. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas apresentada por candidata não eleita ao cargo de deputada estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022.

2. Recurso de origem não identificada. Identificada emissão de notas fiscais eletrônicas contra o CNPJ de campanha, cujos pagamentos não foram escriturados na prestação de contas. Ausência de comprovação da origem dos recursos utilizados na campanha. Recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional, conforme os arts. 14 e 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

3. A irregularidade representa 0,25% do total da receita declarada, viabilizando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

4. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS. PCE n. 0603068-46.2022.6.21.0000. Relatora Desa. Eleitoral PATRICIA DA SILVEIRA OLIVEIRA. Julgado em 21.11.2023. Publicado em 23.11.2023 - DJE/TRE-RS, edição n. 213/2023)
 

Da malversação das verbas do FEFC

A falha aqui tratada diz respeito à contratação da empresa GENTE EDITORA DE REVISTAS LTDA. para a realização dos serviços assessoria de comunicação e marketing de campanha eleitoral, produção da estratégia, peças gráficas, vídeos, lives e gerenciamento de redes sociais, pelo valor de R$ 9.200,00, dos quais R$ 5.285,00 foram quitados com verbas do FEFC e R$ 4.015,00 com valores provenientes da conta “Outros Recursos”.

Quanto ao ponto, saliento que a soma dos recursos vertidos ultrapassa em R$ 100,00 a cifra constante no documento fiscal de ID 45539746, ou seja, o valor que saiu das contas bancárias perfaz R$ 9.300,00, enquanto o declarado é de R$ 9.200,00.

Nesse norte, como bem delineado pela Procuradoria Regional Eleitoral, a análise quanto ao item recairá apenas sobre a verba do FEFC, na casa de R$ 5.285,00:

Considerando que o valor pago com recursos do FEFC se limita a R$ 5.285,00, e que não é possível identificar se a origem do pagamento em valor superior àquele registrado na nota fiscal (R$100,00) a irregularidade deve se limitar ao montante de recursos pagos com a conta FEFC.

 

No que respeita ao registro fiscal carreado ao feito, ele não ostenta o detalhamento necessário à contratação dos serviços pretendidos, uma vez que não especifica quantitativamente e qualitativamente as atividades e não foram apresentados elementos probatórios adicionais que comprovem efetiva realização dos préstimos contratados, de maneira que não atendido o comando do art. 60, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço. (grifei)

 

Nesse cenário, tendo o prestador tão somente juntado a nota fiscal sem a descrição pormenorizada dos serviços, ainda que declarada a despesa, resta inviável a aferição da finalidade da verba pública, de sorte que o montante irregular deve ser recolhido ao Tesouro Nacional.

Sobre o tema, esta Colenda Corte tem entendimento consolidado pela necessidade de comprovação dos dispêndios com recursos do FEFC, por meio de documento fiscal emitido pelo respectivo fornecedor, com descrição detalhada do serviço ou material, sob pena de configuração de irregularidade na aplicação de verbas públicas:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2020. PARTIDO POLÍTICO. FUSÃO PARTIDÁRIA. DIRETÓRIO ESTADUAL. PRELIMINAR. AUSÊNCIA DE REGULARIZAÇÃO DE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. PARECER PELA DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). AUSÊNCIA DE REGISTRO DE DOAÇÃO ESTIMÁVEL EM DINHEIRO. GASTOS NÃO ELEITORAIS. CONTRATAÇÕES NÃO COMPROVADAS. AUSÊNCIA DE DOCUMENTO FISCAL IDÔNEO. RECURSOS DO FEFC TRANSFERIDOS A CANDIDATOS APÓS A DATA DAS ELEIÇÕES. NÃO COMPROVADA CAPACIDADE OPERACIONAL E TÉCNICA DE EMPRESA CONTRATADA. SERVIÇOS DE ADVOCACIA SEM FINALIDADE ELEITORAL. OMISSÃO DE NOTAS FISCAIS. CARACTERIZAÇÃO DE RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. PERDA DO DIREITO AO RECEBIMENTO DE QUOTA DO FUNDO PARTIDÁRIO. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. 1. Prestação de contas de diretório estadual de partido político, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições 2020. Ocorrência de fusão partidária durante o processamento da contabilidade, dando origem a novo partido, que sucedeu o prestador de contas originário na autuação. 2. Preliminar. Ausência de regularização de representação processual. Transcorrido in albis o prazo concedido para que o partido resultante da fusão constituísse procurador. Entretanto, estando representados nos autos os dirigentes de um dos partidos à época da prestação de contas, resta autorizada a realização do julgamento. Ademais, considerando que o exame do mérito da prestação de contas é mais favorável à agremiação do que a declaração de omissão, a qual deve ser evitada sempre que possível, o defeito na representação processual não configuraria nulidade, na hipótese. Prosseguimento do exame. 3. Aplicação irregular do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), cujo montante somente pode ser utilizado para custear gastos de campanha. A redação do § 11 do art. 16–C da Lei n. 9.504/97 determina que os “recursos provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha que não forem utilizados nas campanhas eleitorais deverão ser devolvidos ao Tesouro Nacional, integralmente, no momento da apresentação da respectiva prestação de contas”. Existência de recursos que permaneceram nas contas de campanha dos candidatos após a data das eleições, não tendo sido utilizados para quitar as obrigações por eles contraídas no período eleitoral. Ainda que o § 1º do art. 33 da resolução de regência permita que partidos políticos arrecadem recursos, após o dia da eleição, exclusivamente para a quitação de despesas já contraídas e não pagas até o pleito, a permissão não abrange os recursos do FEFC repassados com infringência ao § 5ºdo art. 50 da Resolução TSE n. 23.607/19, os quais deveriam ter sido recolhidos ao Tesouro Nacional. 4. Ausência de registro de doações estimáveis em dinheiro para diretórios municipais em relação a gastos com pagamento de locação de imóveis. A dispensa de emissão de recibos não afasta a obrigatoriedade do referido registro na prestação de contas dos doadores e de seus beneficiários. Demonstrado que o lapso temporal da campanha eleitoral não foi observado, bem como a destinação, em vários casos, não é específica para campanha, de forma que as despesas não poderiam ter sido pagas com recursos do FEFC. Falta de comprovação da “atividade de caráter eleitoral” das contratações. Configurado gastos não eleitorais. 5. Gastos irregulares com recursos do FEFC em razão da ausência ou desconformidade de documentos que comprovariam contratações. Pagamento de reembolso de despesas arcadas por candidato, com divergência de identidade entre o beneficiário do pagamento e o fornecedor constante dos documentos fiscais juntados. Descumprimento dos arts. 38 e 53, inc. II, c e § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Não evidenciados vínculos com a atividade eleitoral. Ausência de documento fiscal de pessoa jurídica apto a comprovar o gasto, bem como falta de detalhamento do serviço prestado. Impossibilitada a verificação do gasto pelo Justiça Eleitoral. 6. Irregularidades na comprovação dos gastos com alimentação (almoços) de pessoal, pagos com recursos do FEFC. A comprovação do gasto eleitoral demanda a juntada de documento fiscal idôneo com descrição detalhada da contratação (art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19), o que não foi observado pelo prestador. Impossibilidade de atestar a vinculação do gasto com a campanha eleitoral. 7. Recursos oriundos do FEFC transferidos a candidatos após a data das eleições. Matéria regulamentada pelo art. 33 da Resolução TSE n. 23.607/19. Inexistência de permissão para que partidos disponham, mediante doação ou transferência, de recursos públicos que detenham e que não tenham sido destinados oportunamente. Os saldos não utilizados do FEFC não constituem sobras de campanha e devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional integralmente por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU) no momento da prestação de contas (art. 50 e § 5º da Resolução TSE n. 23.607/19). Nesse sentido, jurisprudência deste Tribunal. Caracterizado o descumprimento da norma incidente. 8. Não comprovada capacidade operacional e técnica de empresa contratada. Inexistência de elementos que autorizem reconhecer que dispusesse de pessoal, em número suficiente e com a qualificação adequada, para levar a cabo o registro de todos os candidatos do partido prestador de contas no Estado. Gasto não comprovado adequadamente, em razão da ausência de prova da prestação efetiva do serviço. 9. Contratação de serviços de advocacia. 9.1. Considerado gastos eleitorais a prestação de serviços de advocacia contenciosa, possibilitando a utilização de recursos do FEFC. Este Tribunal Regional Eleitoral entendeu recentemente pela regularidade da utilização de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC para custeio de honorários por serviços advocatícios ao examinar processo relativo às Eleições 2022 (PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº 060249508, Acórdão, Relator (a) Des. KALIN COGO RODRIGUES, Publicação: PSESS – Publicado em Sessão, Data 15/12/2022). Na hipótese, possível irregularidade quanto às atividades prévias ao período eleitoral não serem gastos eleitorais não comprometem toda a despesa. Afastado o apontamento. 9.2. Contratação de serviço de advocacia sem finalidade eleitoral. O contrato afasta a possibilidade de prestação do serviço em prol de diretórios municipais e candidatos. A contratação não poderia ter sido custeada com recursos do FEFC, porque o gasto não se deu em favor da campanha eleitoral, mas na gestão financeira do partido político. Afronta ao art. 26 da Lei n. 9.504/97 e ao art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19. 10. Omissão de gasto eleitoral decorrente de nota fiscal emitida contra o CNPJ de campanha. Infringência ao disposto no art. 53, inc. I, al. g, da Resolução TSE n. 23.607/19. Documento fiscal não cancelado pela prestadora. Os valores não transitaram pelas contas bancárias da campanha como determina a legislação, o que configura recursos de origem não identificada. 11. O total das irregularidades representa 13,27% dos recursos recebidos. Fixação de perda do direito ao recebimento de quota do Fundo Partidário. Determinação de recolhimento dos valores irregulares ao Tesouro Nacional. O partido político resultante da fusão será responsável pelas obrigações impostas. 12. Desaprovação.

(TRE-RS - PCE: 06004076520206210000 PORTO ALEGRE - RS, Relator: Des. VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK, Data de Julgamento: 22/05/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 97, Data 01/06/2023 ) (Grifei.)

 

Portanto, insuficientes as informações de que trata o art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, é adequado o recolhimento da quantia de R$ 5.285,00 ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Em síntese, os vícios totalizam R$ 5.843,70 (RONI - R$ 558,70 + R$ 5.285,00 - FEFC) e representam 32,82% do total auferido em campanha (R$ 17.805,00), devendo a contabilidade ser desaprovada, na esteira do entendimento desta Corte, porquanto inviável a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, visando mitigar o juízo reprobatório das contas.

Assim, o montante irregular de R$ 5.843,70, porque aplicado indevidamente, deve ser recolhido ao erário, nos moldes do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Diante do exposto, acolho o parecer ministerial e VOTO pela desaprovação das contas de CARLOS EDUARDO BLUM, com base no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e determino o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 5.843,70, nos seguintes termos:

a) R$ 558,70 – Recursos de origem não identificada; e

b) R$ 5.285,00 – Fundo Especial de Financiamento de Campanha.