ED no(a) REl - 0600051-61.2022.6.21.0045 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/02/2024 às 14:00

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

Inicialmente, cumpre consignar que os embargos de declaração só podem ser opostos com o objetivo específico de esclarecer obscuridade ou contradição, sanar omissão ou corrigir erro material existente na decisão judicial, conforme expressamente estabelece o art. 1.022 do Código de Processo Civil.

É entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça que “a boa técnica dos embargos declaratórios visa a escoimar o relatório, os fundamentos e o acórdão de incoerências internas, capaz de ameaçarem sua inteireza” e, portanto, não é o meio adequado para o embargante “obter o reexame da matéria versada nos autos, na busca de decisão que lhe seja favorável” (STJ, EDcl no REsp 440.106/RJ, 6a Turma, Rel. Min. Celso Limongi, DJe 23.8.2010).

No caso dos autos, a suposta contradição aventada reside no fato de o embargante discordar da análise de um elemento de prova, a nota fiscal de ID 45553450.

O partido considera que o documento fiscal apresentado, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), possui a devida discriminação e identificação da origem e destinação do recurso, porque consta a observação de que “os valores atinentes ao serviço foram repassados pelo tesoureiro da agremiação, Rodrigo Flores, em nome do partido”. Para isso, o tesoureiro fez transferências a si mesmo, para sacar os recursos e quitar as obrigações do partido.

Conforme se pode verificar, a nota fiscal não foi emitida em favor do prestador do serviço declarado no SPCA. Ademais, o pagamento dos honorários advocatícios não foi realizado consoante uma das formas previstas no art. 18 da Resolução TSE n. 23.604/19 (PIX, TED, cheque nominal e cruzado), impossibilitando a identificação do respectivo beneficiário.

Por fim, as dificuldades alegadas pelo tesoureiro com relação ao uso do pix para justificar o repasse, não prosperam, pois, de igual modo, como realizou transferências para si, poderia ter feito transferência do partido diretamente para o efetivo fornecedor do serviço.

Ao contrário do alegado pelo embargante, não há nos autos elementos de rastreabilidade suficientes para suprir a falha com relação ao descumprimento da forma estabelecida, comprometendo a confiabilidade e transparência sobre a origem e destinação do recurso.

A questão jurídica foi enfrentada à exaustão, conforme se constata no trecho do acórdão que reproduzo (ID 45599982 – p.291):

(...)

A irregularidade consistiu em gastos quitados com verbas provenientes da conta do Fundo Partidário, em desacordo com o art. 18, § 4º, da Resolução TSE n. 23.604/19, pois as despesas partidárias não foram pagas mediante a emissão de cheque nominativo cruzado ou por transação bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário.

As irregularidades totalizam R$ 49.800,00, sendo R$ 40.000,00 em transferências para Rodrigo Thomas Flores, R$ 2.800,00 em cheque para César Augusto Meira dos Santos, R$ 7.000,00 em cheque para César Augusto Meira dos Santos e R$ 87,40 com tarifas bancárias.

Ademais, a unidade técnica apontou divergência entre os beneficiários dos pagamentos, Rodrigo Thomas Flores e César Augusto Meira dos Santos, e os efetivos prestadores de serviço enumerados no SPCA: R$ 18.000,00 - Antônio Augusto Mayer dos Santos; R$ 10.000,00 - Meirelles e Correa Adv. Associados; R$ 12.000,00 - Rogério Colpo Callegaro; R$ 7.000,00 - Meirelles e Correa Adv. Associados e R$ 2.800,00 - Iloni Dreilich.

O prestador sustenta que os gastos foram devidamente comprovados por meio de documentação idônea, na forma do art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.604/19. Junta contratos e recibos (IDs 113596719, 113596721, 113596722, 113596723, 113596734 e 113596736), a fim de comprovar as referidas despesas, demonstrar o efetivo valor do serviço prestado, assim como o detalhamento e a execução do objeto das prestações de serviços. Alega que o tesoureiro Rodrigo Thomas Flores teve problemas na operacionalização do PIX, por essa razão realizou transferências para si próprio, com o intuito de sacar os recursos e quitar as obrigações do partido. E que César Augusto Meira dos Santos foi intermediário dos pagamentos, sacando e repassando os valores a título de aluguel para Iloni Dreilich, que necessitava receber os valores em espécie pelo fato de ser cego.

Conforme descrito pela unidade técnica no parecer conclusivo, os gastos no total de R$ 40.000,00 consistiram em 08 transferências entre contas, no valor de R$ 5.000,00 cada, para Rodrigo Thomas Flores, em desacordo com o art. 18 e art. 29, inc. V, combinados com o art. 36 § 2º, todos da Resolução TSE n. 23.604/19.

A legislação exige que os gastos sejam pagos mediante a emissão de cheque nominativo cruzado ou por transação bancária que identifique o CPF ou o CNPJ do beneficiário, justamente para evitar o procedimento adotado pela agremiação, ou seja, que se verifique um beneficiário que não corresponda ao efetivo executor da prestação do serviço. Conforme documentação juntada pelo prestador, consta como beneficiário Rodrigo Thomas Flores; contudo, seriam os efetivos credores:

-Antonio Augusto Mayer dos Santos: juntados contrato e recibos (documentos iguais) no ID 113596721; ID 115463981; ID 115463984; ID 115463987; ID 115463989; ID 117141694; ID 117141697; ID 117141700 e ID 117141702;

- Rogerio Colpo Callegaro: contrato e recibo (documentos iguais) no ID 113596722; ID 115463985; ID 115463988; ID 115463990; ID 115463999; ID 117141698; ID 117141701; ID 117141703; 117142062;

- Meirelles e Correa Adv Associados: Nota Fiscal eletrônica (documentos iguais) no ID 113596723; ID 115463983; ID 115463993; ID 115464000; ID 117141696; ID 117141706; ID 117142063.

 

Embora tenha realizado a juntada dos comprovantes, a falta de confiabilidade e de transparência sobre a origem e destinação dos recursos não restou afastada, pois o art. 18 da Resolução TSE n. 23.604/19 expressamente determina que a comprovação dos gastos somente poderá ser realizada pelos meios ali elencados.

Art. 18. A comprovação dos gastos deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo, sem emendas ou rasuras, devendo dele constar a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou pela razão social, o CPF ou o CNPJ e o endereço, e registrados na prestação de contas de forma concomitante à sua realização, com a inclusão da respectiva documentação comprobatória.

§ 1º Além do documento fiscal a que se refere o caput, a Justiça Eleitoral pode admitir, para fins de comprovação de gasto, qualquer meio idôneo de prova, inclusive outros documentos, tais como:

I - contrato;

II - comprovante de entrega de material ou de prestação efetiva do serviço;

III - comprovante bancário de pagamento; ou

IV - Guia de Recolhimento do FGTS e de Informações da Previdência Social (GFIP) ou por declaração ou formulário obtido no Sistema de Escrituração Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (eSocial).

§ 2º Quando dispensada a emissão de documento fiscal, na forma da legislação aplicável, a comprovação da despesa pode ser realizada por meio de documentação que contenha a data de emissão, a descrição e o valor da operação ou da prestação, a identificação do destinatário e do emitente pelo nome ou pela razão social, o CPF ou o CNPJ e o endereço.

§ 3º Os documentos relativos aos gastos com a criação ou a manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres devem evidenciar a efetiva execução e manutenção dos referidos programas, nos termos do inciso V do art. 44 da Lei nº 9.096/95 , não sendo admissível mero provisionamento contábil.

§ 4º Os gastos devem ser pagos mediante a emissão de cheque nominativo cruzado ou por transação bancária que identifique o CPF ou o CNPJ do beneficiário, ressalvado o disposto no art. 19.

§ 5º O pagamento de gasto, na forma prevista no caput, pode envolver mais de uma operação, desde que o beneficiário do pagamento seja a mesma pessoa física ou jurídica.

§ 6º Nos serviços contratados com a finalidade de locação de mão de obra, é exigida a apresentação da relação do pessoal alocado para a prestação dos serviços, com a indicação do respectivo nome e CPF, além dos documentos previstos no art. 18, § 1º, inciso IV, relativos ao pessoal alocado para a prestação de serviços.

§ 7º Os comprovantes de gastos devem conter descrição detalhada, observando-se que:

I - nos gastos com publicidade, consultoria e pesquisa de opinião, os respectivos documentos fiscais devem identificar, no seu corpo ou em relação anexa, o nome de terceiros contratados ou subcontratados e devem ser acompanhados de prova material da contratação;

II - os gastos com passagens aéreas serão comprovados mediante apresentação de fatura ou duplicata emitida por agência de viagem, quando for o caso, e os beneficiários deverão atender ao interesse da respectiva agremiação e, nos casos de congressos, reuniões, convenções, palestras, poderão ser emitidas independentemente de filiação partidária segundo critérios interna corporis, vedada a exigência de apresentação de qualquer outro documento para esse fim (art. 37, § 10, da Lei nº 9.096/95) ; e

III - a comprovação de gastos relativos à hospedagem deve ser realizada mediante a apresentação de nota fiscal emitida pelo estabelecimento hoteleiro com identificação do hóspede.

§ 8º Além das provas documentais constantes do § 1º deste artigo, a Justiça Eleitoral poderá exigir a apresentação de elementos probatórios que comprovem a entrega dos produtos contratados ou a efetiva prestação dos serviços declarados.

 

 

Posto isso, o pedido de extração da multa do valor referente a nota fiscal no montante de R$ 10.000,00 não prospera. Ademais, o próprio documento confessa que o valor não foi pago diretamente aos reais beneficiários, demonstrando a intermediação realizada pelo tesoureiro.

Ademais, a argumentação intentada diz com o mérito do feito.

Dessa forma, se o embargante não concorda com o resultado do julgamento, deve manejar o recurso próprio objetivando a reforma da decisão, não sendo os embargos de declaração o instrumento cabível para o revolvimento da matéria já decidida ou alteração da conclusão do Tribunal.

Diante do exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.