PCE - 0602947-18.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 22/02/2024 às 14:00

VOTO

ELOIR DE OLIVEIRA, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, apresenta prestação de contas relativa às eleições gerais de 2022.

Após a realização de exame inicial da contabilidade, o prestador foi intimado e apresentou esclarecimentos.

Sobreveio, então, parecer conclusivo da Secretaria de Auditoria Interna. O órgão técnico apontou diversas irregularidades remanescentes quanto à aplicação e à comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, conforme tabela e legenda que seguem:



B – Não foi apresentado documento fiscal comprovando a despesa, conforme artigo 60 da Resolução TSE 23.607, de 2019.

C – Não foi apresentado recibo comprovando a totalidade dos valores pagos aos prestadores de serviço, conforme artigo 60, § 2º, da Resolução TSE 23.607, de 2019

D - A documentação apresentada é insuficiente para a comprovação dos gastos. Necessária a apresentação de elementos probatórios adicionais que comprovem a entrega dos produtos contratados ou a efetiva prestação dos serviços declarados, nos termos do § 3º do artigo 60 da Resolução TSE 23.607, de 2019.

E – Não foi apresentada documentação de comprovação dos gastos com pessoal com a integralidade dos detalhes previstos no § 12 do artigo 35 da Resolução TSE 23.607, de 2019, tais como locais de trabalho, horas trabalhadas, especificação das atividades executadas e justificativa do preço contratado.

F - Despesas realizadas com combustíveis sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos ou publicidade com carro de som ou de geradores de energia, em desacordo com o artigo 35, § 11, inciso II, alínea “a”, da Resolução 23.607, de 2019.

 

À análise.

1. Despesas realizadas com alimentação sem apresentação de documentos fiscais

A unidade técnica verificou o apontamento de seis gastos com alimentação sem o respaldo de notas fiscais, nos valores de R$ 240,00, R$ 112,90, R$ 99,75, R$ 92,00 e R$ 84,00, os quais totalizam R$ 728,65.

O prestador, em nota explicativa, disse se tratar de pessoa indígena e ter realizado campanha junto às aldeias do Estado do Rio Grande do Sul. Aduziu ter extraviado "uma pasta com Notas Fiscais, principalmente de combustível e alimentação”, e que “teve o cuidado de ter feito TODOS OS PAGAMENTOS VIA PIX, EXIGINDO A CHAVE TIPO CNPJ, para o fim exclusivo de tornar plenamente identificável a classificação das despesas feitas, a empresa ou o proprietário e os recebedores dos valores (que foram sempre o proprietário. Não há, em todas as despesas, um só pagamento a terceiro)”.

De fato, em análise à documentação juntada (ID 45470450), verifica-se a existência de comprovantes "Pix", destinados aos beneficiários listados; contudo, uma vez ausentes as notas fiscais, os pagamentos restam destituídos da comprovação de vínculo com o gasto indicado pelo prestador, de forma que não é possível acolher os argumentos esposados – trata-se de mera declaração, sem respaldo documental, e sua aceitação configuraria privilégio injustificável ao prestador de contas, sobremodo em relação aos demais candidatos que com ele concorreram a cargo eletivo, os quais tiveram que se submeter às regras de prestação de contas contidas na legislação de regência.

Portanto, o montante de R$ 728,65 configura gasto irregular.

2. Gastos com pessoal realizados sem recibos e sem detalhamento contratual

Por meio de consulta aos extratos bancários disponibilizados, o órgão técnico contábil verificou transferências entre contas em benefício de Luana Silva, de R$ 400,00 e R$ 300,00, e de Rodrigo Martins, de R$ 300,00.

Não há qualquer documentação adicional.

Em resposta ao relatório preliminar, o prestador alegou que os documentos estariam anexados à manifestação; no entanto, não se encontram recibos ou contratos dos referidos prestadores, apenas comprovantes Pix, em nome de Luana e Rodrigo, e uma anotação, mais uma vez unilateral, relativa a Rodrigo Martins: “Contrato e Recibo elaborados e assinados, mas extraviado.” (ID 45470449, página 36).

Registro que a comprovação dos gastos eleitorais referentes à contratação de pessoal para atividades de campanha deve ser realizada por meio de documentação que atenda aos requisitos específicos do art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…)

§ 12. As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.

Igualmente no presente tópico, uma vez ausentes os documentos exigidos pela legislação de regência para comprovação das despesas, a irregularidade na importância de R$ 1.000,00 deve ser reconhecida.

3. Contratação de publicidade de materiais impressos sem comprovação da entrega

O relatório conclusivo apontou despesa com materiais impressos junto ao fornecedor RML Gráfica, cuja Nota Fiscal n. 2022/849, na quantia de R$ 754,00, está presente nos autos. Todavia, o órgão técnico entendeu que a documentação ofertada é insuficiente para a comprovação dos gastos, sendo necessária a apresentação de elementos adicionais que demonstrem a entrega dos produtos contratados ou a efetiva prestação dos serviços declarados, nos termos do § 3º do art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19. No ponto, o prestador sustenta que “foi apresentada a NF na PC com descrição detalhada do produto. ADESIVO DE PEITO, e o documento fiscal discrimina o serviço prestado como “10.000 Adesivos brlilho, 4x0 cor, estampado, vl. unit: 0,0377, 754,00”.

Destaco que, dentre as imagens publicitárias elaboradas para a campanha e reproduzidas nas notas explicativas (ID 45470450, pg. 4), verifica-se (embora sem identificação) a imagem de uma propaganda circular, em formato próprio de adesivo de peito (medida indicada na nota fiscal – 4 cm).

Entendo que, no caso posto, é aplicável o precedente vertido pelo e. Tribunal Superior Eleitoral por ocasião do julgamento do processo PC n. 0601825-28, de relatoria do Min. Benedito Gonçalves, em que aquela Corte se posicionou no sentido de que, não havendo motivo para questionar a idoneidade do documento fiscal, é incabível a exigência de provas adicionais. Transcrevo a ementa, no ponto de interesse:

PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DIRETÓRIO NACIONAL. PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB). 1. Trata-se de prestação de contas do Diretório Nacional do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) referente ao exercício financeiro de 2016. EXAME. RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. REGRA GERAL. EXIGÊNCIA. DOCUMENTO FISCAL IDÔNEO E DETALHADO. DESNECESSIDADE. OUTRAS PROVAS. RES.-TSE 23.464/2015. JURISPRUDÊNCIA. NECESSIDADE. DESBUROCRATIZAÇÃO. SEGURANÇA JURÍDICA. (...) 3. O art. 18, caput, da Res.-TSE 23.464/2015 estabelece que a prova dos gastos "deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço". Já o § 1º prevê que, além da nota fiscal, a Justiça Eleitoral "pode admitir, para fins de comprovação de gasto, qualquer meio idôneo de prova, inclusive outros documentos", a exemplo do contrato, do comprovante de entrega do material ou do serviço prestado, do demonstrativo bancário de pagamento e da Guia de Recolhimento do FGTS e de Informações da Previdência Social. 4. Na linha da jurisprudência desta Corte, a leitura conjugada do art. 18, caput e § 1º, da Res.-TSE 23.464/2015 permite concluir que se o partido político apresenta nota fiscal formalmente regular, contendo todos os detalhes da contratação - com destaque para o serviço prestado ou o material fornecido -, não cabe em regra exigir provas adicionais, exceto no caso de dúvida sobre a idoneidade do documento ou a execução do objeto. (...)

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº 060182528, Acórdão, Relator Min. Benedito Gonçalves, DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 112, Data: 17/06/2022.) (Grifei.)

 

Consigno, ainda, que o extrato bancário registra o fornecedor emitente da nota fiscal como o beneficiário da transferência da quantia em questão, e considero regular o gasto de R$ 754,00.

4. Despesas com combustíveis sem registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou geradores de energia

A análise técnica identificou 13 gastos com combustível que, somados, alcançam a quantia de R$ 2.422,30, conforme tabela reproduzida acima.

Contudo, os gastos da espécie estão sujeitos ao art. 35, § 11, incs. I, II e III, da Resolução 23.607/19:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:

I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;

II - veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que:

a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e

b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim; e

III - geradores de energia, decorrentes da locação ou cessão temporária devidamente comprovada na prestação de contas, com a apresentação de relatório final do qual conste o volume e valor dos combustíveis adquiridos em na campanha para este fim.

 

O prestador de contas, em nota explicativa, aduziu que “os combustíveis foram gastos nos veículos referentes aos Contratos de Transportes firmados e constantes da Presente Manifestação e Juntada de Documentos, visto que foi firmado que o fornecimento seria pelo Contratante (candidato)”.

Acostou Contratos de Prestação de Serviço de Transporte (ID 40470450, páginas 15 e 17), nos quais os contratados são Marlon A. Z. Silva e Alvise Stieven, proprietários (respectivamente) dos veículos Volkswagen Fox, cor cinza, Placa IVC2G48, e Chevrolet Onix Plus, cor vermelho, Placa JAP0C18. Tais contratos possuem como objeto o “transporte do candidato, de cabos eleitorais e material de campanha e coleta de assinaturas em contratos e recibos na região metropolitana e interior do Estado do Rio Grande do Sul”, nos quais constam que o “contratado se responsabiliza pela disponibilização de motorista devidamente habilitado” para a condução do veículo, e que “o contratante fornecerá o combustível”.

Ainda que pareçam razoáveis os argumentos do prestador, não houve a observância dos requisitos específicos para os gastos na espécie. As notas fiscais apresentadas para despesas contratadas junto aos fornecedores ABASTECEDORA DE COMB. SAUGO LTDA. (R$ 230,00), POSTO DE COMBUSTIVEIS CANQUERINI (R$ 200,00 e R$ R$ 184,00) e HANAUER COM. COMBUSTIVEL LTDA. (R$ 71,00), bem como os demais documentos fiscais localizados mediante o uso das chaves de acesso disponíveis no DivulgaCand (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2022/2040602022/RS/210001598503/nfes), em pesquisa no site da Fazenda da Receita Estadual (https://www.sefaz.rs.gov.br/dfe/Consultas/ConsultaPublicaDfe?), não apontam os veículos abastecidos, o que possibilitaria o cotejo com aqueles declarados na prestação de contas e, por consequência, a vinculação com a atividade de campanha. Ainda, não há relatório do volume e valor dos combustíveis adquiridos semanalmente, conforme determinado nos dispositivos citados. Transcrevo ementa:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. DEPUTADA FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. EXISTÊNCIA DE DESPESAS IRREGULARES RELATIVAS À UTILIZAÇÃO DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. FALHAS QUE REPRESENTAM ELEVADO PERCENTUAL. DEVER DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL DESAPROVAÇÃO. 1. Prestação de contas apresentada por candidata ao cargo de deputada federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas Eleições Gerais de 2022. 2. Despesas irregulares relativas à utilização de recursos oriundos do FEFC. 2.1 Gastos com combustíveis sem comprovação, uma vez que não houve a apresentação do demonstrativo de pagamento, bem como de cupom fiscal e/ou nota fiscal contendo o CPNJ da campanha e da identificação (placa) do veículo que foi abastecido. 2.2. Aquisição de um notebook sem a apresentação de documentos de sua alienação, nem o comprovante de recolhimento do valor, por meio de “GRU”, à União, conforme §§ 6º e 7º do art. 50 da Resolução TSE n. 23.607/19. Os esclarecimentos não alteram as falhas apontadas, já que a prestadora admite que o bem não foi alienado, nem seu valor recolhido por meio de GRU. 2.3. Compra de 02 pares de tênis e 03 pares de meias em desacordo com o rol de despesas permitidas com recursos do FEFC. Falha mantida. 2.4. Inconsistências pagas com recursos do FEFC, contrariando o que dispõem os arts. 35, 53, inc. II, al. “c”, e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19. 3. A soma das falhas corresponde a 66,86% da receita declarada pela candidata. Imperativas a desaprovação das contas e a determinação de recolhimento das quantias irregulares ao Tesouro Nacional. 4. Desaprovação. Determinado o recolhimento do valor irregular ao Tesouro Nacional.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº 060297753, Acórdão, Relator(a) Des. Candido Alfredo Silva Leal Junior, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 175, Data: 25/09/2023.) (Grifei.)

 

Nessa senda, deve ser considerada irregular a quantia de R$ 2.422,30.

Em linha de conclusão, no concernente às penalidades, destaco que a realização de gasto não comprovado com verbas do FEFC (R$ 4.150,95) impõe o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, e ressalto que a soma das irregularidades alcança R$ 4.150,95 (R$ 1.000,00 + R$ 728,65 + R$ 2.422,30), quantia que representa 12,19% das receitas declaradas na prestação, R$ 40.247,49, situação que impede, na linha de entendimento pacificado deste Tribunal, o juízo de aprovação com ressalvas mediante a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Diante do exposto, VOTO pela desaprovação das contas de ELOIR DE OLIVEIRA, candidato ao cargo de deputado estadual, e determino o recolhimento do valor de R$ 4.150,95 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.