PCE - 0602015-30.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 22/02/2024 às 14:00

VOTO

Cuida-se de analisar as contas prestadas por ABRÃO FERNANDES GODOIS, suplente ao cargo de deputado federal, relativas às Eleições Gerais de 2022.

Ao analisar as contas apresentadas, a unidade técnica apontou a existência de irregularidade na utilização de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), consistente na aquisição de um PNEU 175/70R13, da marca GOODYER, na empresa COOP. TRIT. REG. SAOLUIZENSE LTDA. (CNPJ: 97.078.463/00058-43), no valor de R$ 347,00 (trezentos e quarenta e sete reais).

Conforme parecer conclusivo (ID 45525759), a aquisição do pneu enquadra-se como despesa “de natureza pessoal”, uma vez que se destina à manutenção do veículo automotor utilizado pelo próprio candidato (art. 35, § 6º, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19), não podendo ser considerado gasto eleitoral, nem sujeitar-se à prestação de contas e ao pagamento com recursos da campanha.

A compra do pneu e a utilização de recursos oriundos do FEFC para o pagamento de tal despesa restaram incontroversas nos autos, podendo ainda ser confirmadas pela nota fiscal, pelo comprovante de transferência e pelo extrato da conta bancária utilizada pelo candidato (ID 45268094 e 45268107, p. 7).

Em sua defesa, o prestador de contas informou ter realizado a locação de um veículo para utilizar durante a campanha eleitoral e que no contrato firmado havia cláusula estabelecendo que o automóvel deveria ser devolvido em perfeitas condições. Alegou que durante o período de locação do veículo foi necessário substituir um pneu avariado (“furado”), razão pela qual adquiriu o bem apontado pela unidade técnica. Ainda, defendeu que o gasto enquadra-se como “despesas com transporte ou deslocamento de candidata ou de candidato e de pessoal a serviço das candidaturas” (art. 35, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.607/19), sendo inaplicável ao presente caso o disposto no § 6º do art. 35 da citada Resolução (ID 45436965).

Sem razão o candidato em sua manifestação.

Com efeito, o art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, repetindo o disposto no art. 26 da Lei n. 9.504/97, elenca as despesas consideradas “gastos eleitorais”, sujeitos a registro na prestação de contas de campanha e à observância dos limites legais. Além disso, em seu § 6º, estabelece hipóteses de despesas de natureza pessoal, as quais não são consideradas gastos eleitorais, não podendo, portanto, ser pagas com recursos da campanha, incluindo em sua al. “a” as despesas com combustível e manutenção de veículo automotor usado pela candidata ou pelo candidato na campanha eleitoral.

Registra-se que o inc. IV do art. 26 da Lei n. 9.504/97, ao prever como gastos eleitorais as “despesas com transporte ou deslocamento de candidato e de pessoal a serviço das candidaturas”, ressalva expressamente as exceções previstas no § 3º do art., que não considera gastos eleitorais, dentre outros, as despesas de natureza pessoal do candidato com combustível para manutenção de veículo automotor utilizado na campanha eleitoral.

Assim, em uma interpretação sistemática e lógica da Lei das Eleições, conclui-se que as despesas com transporte ou deslocamento somente enquadram-se como “gastos eleitorais” quando diversas daquelas descritas no § 3º do art. 26 da Lei n. 9.504/97, citando-se, a título exemplificativo, os gastos com passagens, com táxis ou aplicativos de locomoção.

No caso em apreço, restou incontroverso que o pneu adquirido por ABRÃO FERNANDES GODOIS foi instalado no veículo locado pelo candidato, enquadrando-se, portanto, como despesa de manutenção de veículo automotor utilizado pelo candidato durante a campanha eleitoral, a qual não se considera gasto eleitoral, nos termos do art. 35, § 6º, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, conforme muito bem ressaltado pela unidade técnica e pela Procuradoria Regional Eleitoral, considera-se irregular a utilização de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) para o pagamento de gastos de natureza pessoal do candidato, devendo o valor ser recolhido ao Tesouro Nacional.

Em semelhante sentido, assim já se manifestou este Tribunal:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA ELEITA SUPLENTE. DEPUTADA ESTADUAL. ELEIÇÕES 2022. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DE VALORES DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. PAGAMENTO DE SERVIÇOS DE MANUTENÇÃO DE VEÍCULOS AUTOMOTORES. IRREGULARIDADE CARACTERIZADA. BAIXO PERCENTUAL. INCIDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Prestação de contas apresentada por candidata eleita suplente ao cargo de deputada estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022. 2. Uso indevido de valores do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) para o pagamento de serviços de manutenção de veículos automotores, consistente na aquisição de um pneu. Afronta ao disposto no art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, que veda despesas com veículos automotores. 3. A irregularidade não ultrapassa os parâmetros utilizados por esta Corte para, mediante aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, aprovar as contas com ressalvas, na medida em que a falha representa 0,79% do montante percebido pela candidata, ainda que necessário o recolhimento da quantia indevida ao erário. 4. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº 060238946, Acórdão, Relator(a) Des. ELAINE MARIA CANTO DA FONSECA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 148, Data: 15/08/2023.)

 

A irregularidade quanto à aplicação de recursos procedentes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) incide sobre o valor de R$ 347,00 (trezentos e quarenta e sete reais), que representa 1,03% do total de recursos recebidos pelo candidato em sua campanha (R$ 33.673,43), enquadrando-se, portanto, nos parâmetros fixados na jurisprudência desta Justiça Especializada de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade, para formar juízo de aprovação com ressalvas da contabilidade (ou seja, montante inferior a R$ 1.064,10 e não excedente a 10% da arrecadação financeira), na forma do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Ante o exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas relativas ao pleito de 2022 apresentadas por ABRÃO FERNANDES GODOIS, suplente ao cargo de deputado federal, e determino o recolhimento, com juros e correção monetária, ao Tesouro Nacional, de R$ 347,00 (trezentos e quarenta e sete reais), referentes à aplicação irregular de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.