REl - 0600031-70.2022.6.21.0142 - Voto Relator(a) - Sessão: 08/02/2024 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, trata-se de recurso interposto pelo DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (PSOL) de Bagé contra a sentença que desaprovou suas contas referentes ao exercício de 2021 e lhe impôs o recolhimento ao erário de R$ 500,00, com acréscimo de 20%, a título de multa (ID 45518312 ).

Na origem, a unidade técnica, em seu parecer conclusivo (ID 45518303), consignou que o órgão partidário apresentou declaração de ausência de movimentação de recursos financeiros, o que restou corroborado pelos extratos bancários eletrônicos disponibilizados pelo TSE.

Outrossim, foi informado que “junto ao sistema SPCA consta requisição de emissão de faixa de recibos de doação no período do exercício de 2021 e foram encontrados registros de utilização de recibos de doação. Por fim, não há registros de repasse ou distribuição de recursos do Fundo Partidário”.

Na sentença, o Magistrado a quo, ressaltando que a agremiação não buscou “realizar sequer a correção dos lançamentos no sistema SPCA” e que “deveria ter feito a exclusão do recibo, conforme determina o art. 11, § 6º, da Resolução TSE nº 23.604/2019”, não acolheu a versão defensiva, de ocorrência de erro, “pois a declaração de ausência de movimentação não condiz com a realidade fática, cumprindo desaprovar as contas, em razão do que determina o art. 45, III, "c", da Resolução TSE nº 23.604/2019” (ID 45518312).

Deveras, conforme preceitua o art. 11, § 6º, da Resolução TSE n. 23.604/19, quando verificado erro na emissão do recibo, o partido deve promover seu cancelamento, verbis:

Art. 11. Os órgãos partidários de qualquer esfera devem emitir, no prazo máximo de 5 (cinco) dias contados do crédito na conta bancária, recibo de doação para:

[…]

§ 5º Os partidos políticos podem recusar doação identificável que seja creditada em suas contas bancárias indevidamente, promovendo o estorno do valor para o doador identificado até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito, ressalvado o disposto no art. 13.

§ 6º Na hipótese do § 5º ou quando verificado erro, o partido político deve promover o cancelamento do respectivo recibo e, conforme o caso, emitir um novo para o ajuste dos dados, especificando a operação em nota explicativa no momento da apresentação da prestação de contas.

§ 7º Eventuais divergências entre o valor estimado da doação ou da cessão temporária podem ser verificadas na fase de diligências da análise da prestação de contas.

Entrementes, a previsão normativa não significa que a falta de cancelamento do recibo, por si só, deva ser considerada, para todos os efeitos, como se a doação tivesse sido efetivamente realizada, não se levando em consideração outros elementos, tais como extratos bancários e esclarecimentos do órgão partidário.

A tal respeito, a Procuradoria Regional Eleitoral, com lucidez, assim se pronunciou (ID 45558488):

No caso concreto, tem-se a emissão de recibo eleitoral pelo diretório municipal (ID 45518293), sem a contrapartida da doação do recurso pelo diretório estadual, assentando a irregularidade na ausência de cancelamento do recibo no sistema, o que redundou na inconsistência observada na prestação de contas do exercício 2021.

[...]

Nada obstante, a ausência de cancelamento do recibo eleitoral não representou óbice ao controle das finanças partidárias, pois constatada a ausência de movimentação financeira no exercício 2021, o que findou comprovado pelos extratos bancários disponibilizados pelo TSE, como bem referiu a unidade técnica.

Notadamente quanto à suposta doação, o órgão municipal esclareceu que, apesar do cadastro no SPCA, não foi operacionalizada a doação de R$ 500,00 oriunda do Diretório Estadual do PSOL (ID 45518307), informação confirmada no parecer conclusivo, sendo forçoso concluir, portanto, que a falha não comprometeu a análise das contas prestadas, em especial a constatação de que não foram movimentados recursos pelo diretório municipal.

Tem-se, portanto, irregularidade formal, na linha da manifestação exarada pelo Ministério Público Eleitoral [...]

Nesse contexto, em que o prestador de contas alega erro no lançamento do recibo de doação e não se detecta o respectivo aporte financeiro em suas contas bancárias, nem se verifica registro de repasse de recursos do órgão partidário doador ao donatário, há de se concluir, inexoravelmente, pela existência de equívoco, que consubstancia mera falha formal, sem possibilidade de ensejar a desaprovação do ajuste contábil, menos ainda a ordem de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

Ademais, cabe assinalar que o comando de recolhimento ao Tesouro Nacional somente tem espaço, nos feitos de prestação de contas, nas hipóteses de recebimento de recursos de origem não identificada ou de fonte vedada e de malversação de recursos públicos ou falta de comprovação de sua regular utilização, na linha da jurisprudência do egrégio TSE:

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO FEDERAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. OMISSÃO. DESPESAS. AUSÊNCIA. RECURSOS DE FONTE VEDADA. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. USO INDEVIDO DE VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO OU DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). RECOLHIMENTO. TESOURO NACIONAL. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME. FATOS E PROVAS. SÚMULA 24/TSE. NEGATIVA DE PROVIMENTO.

1. No decisum monocrático, manteve–se aresto do TRE/MA, em sede de contas de campanha de candidato ao cargo de deputado federal nas Eleições 2018, no sentido de não se determinar a devolução de recursos ao Tesouro Nacional.

2. O recolhimento de valores ao erário nos casos previstos nos arts. 34 e 82 da Res.–TSE 23.553/2017 – recursos de fonte vedada, de origem não identificada e uso indevido de verbas do Fundo Partidário ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) – não se aplica de modo automático quando omitidas despesas no ajuste contábil, exigindo-se prova efetiva da ocorrência de uma dessas hipóteses. Precedentes, dentre eles o AgR–REspEl 0602233-06/MA, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJE de 27/11/2020.

3. Na espécie, o TRE/MA limitou–se a assentar a omissão de despesas pelo candidato, ausentes provas da incidência de uma das hipóteses contidas nos arts. 34 e 82 da Res.–TSE 23.553/2017.

4. Conclusão em sentido diverso demandaria reexame de fatos e provas, providência inviável em sede extraordinária, nos termos da Súmula 24/TSE.5. Não se conhece do pedido para se desaprovar o ajuste contábil, que não foi objeto do recurso especial, tratando–se de indevida inovação de tese. Precedentes.6. Agravo interno a que se nega provimento.

(RECURSO ESPECIAL ELEITORAL n. 060161124, Acórdão, Relator(a) Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE, Tomo 43, Data: 10.3.2021.) (Grifei.)

 

No caso concreto, não se observou nenhuma das hipóteses referidas acima, uma vez que não houve movimentação financeira entre as diferentes instâncias partidárias.

Assim, em linha com o parecer ministerial, deve a sentença ser reformada, aprovando-se com ressalvas as contas e arredando-se a determinação de recolhimento aos cofres públicos e a imposição de multa.

 

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso, para que as contas do DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (PSOL) de Bagé sejam aprovadas com ressalvas, afastando-se a multa e a determinação de recolhimento de R$ 500,00 ao Tesouro Nacional.