PCE - 0603109-13.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 07/02/2024 às 14:00

VOTO

Trata-se da prestação de contas de FABIANA DOS REIS DEUS, candidata ao cargo de deputada federal pelo PSC, relativa às Eleições Gerais de 2022.

Efetuado o exame técnico, a Secretaria de Auditoria Interna do TRE-RS identificou irregularidades relativas ao uso de recursos de origem não identificada (RONI) e à malversação de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

No que toca à utilização de valores sem demonstração de sua origem, foi identificada a omissão de gasto realizado pela candidata na Abastecedora de Combustíveis Salim Ltda., CNPJ n. 88.226.840/0006-22, em 02.9.2022, no valor de R$ 100,00, quitado com recursos sem prévio trânsito pelo sistema bancário nacional.

O adimplemento de gastos não declarados com valores provenientes de fontes não identificadas configura a prática vedada pelo art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19, de sorte que, ausente manifestação quanto ao ponto, a cifra deve ser recolhida ao erário.

Na mesma linha, orientação firmada nesta Corte:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA. DEPUTADA ESTADUAL. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA – RONI. BAIXO PERCENTUAL. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas apresentada por candidata não eleita ao cargo de deputada estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022.

2. Recurso de origem não identificada. Identificada emissão de notas fiscais eletrônicas contra o CNPJ de campanha, cujos pagamentos não foram escriturados na prestação de contas. Ausência de comprovação da origem dos recursos utilizados na campanha. Recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional, conforme os arts. 14 e 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

3. A irregularidade representa 0,25% do total da receita declarada, viabilizando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

4. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS. PCE n. 0603068-46.2022.6.21.0000. Relatora Desa. Eleitoral Patricia da Silveira Oliveira. Publicação em 23.11.2023 - DJE/TRE-RS, edição n. 213/2023) (Grifei.)

 

Passo à análise dos vícios envolvendo recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), os quais somam R$ 13.326,00.

De início, constam 6 contratos de prestação de serviços, no total de R$ 2.450,00, desprovidos de dados obrigatórios do candidato/contratante, em afronta ao art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, com os seguintes prestadores:

-  MARGARIDA ROSELAINE MARQUE PONEY, CPF n. 014.561.010-13, R$ 1.000,00 - atividades de militância e mobilização de rua;

- JOAO ADIR MEIREL DA SILVA, CPF n. 474.370.900-82, R$ 500,00 - serviços próprios prestados por terceiros;

- SERGIO ANTONIO DOS SANTOS, CPF n. 527.929.430-68, R$ 300,00 - atividades de militância e mobilização de rua;

- DANIELA MELO DE ALBUQUERQUE DE SOUZA, CPF n. 015.891.670-07, R$ 300,00 - atividades de militância e mobilização de rua;

- SUSANA REGINA DAVID, CPF n. 882.770.540-68, R$ 200,00 - serviços prestados por terceiros; e

- ANA CARINE ROMERO MELO, CPF n. 873.008.770-87, R$ 150,00 - serviços prestados por terceiros.

 

Ausente manifestação da prestadora quanto à falha, a cifra de R$ 2.450,00 deve ser destinada ao Tesouro Nacional.

A próxima irregularidade refere-se ao adimplemento de gastos desacompanhados dos respectivos documentos fiscais a atestá-los, no importe de R$ 4.500,00.

No caso, não foi colacionada ao feito nota fiscal ou contrato de locação de automóvel relativo à despesa de R$ 4.300,00, vinculada à AUTO LOCADORA LINCK E MELLO LTDA., CNPJ n. 09.146.749/0001-16.

A falha, em ato contínuo, acaba por inviabilizar a realização de despesas com combustível, adquirido no valor de R$ 200,00, pois, conquanto as notas fiscais de abastecimento constem do DivulgaCand, sem o registro de locação veicular ou demais hipóteses vertidas no art. 35, § 11, da Resolução TSE n. 23.607/19 a autorizá-las, os gastos desta espécie são irregulares.

Seguem ementas de arestos desta Corte sobre a inviabilidade do dispêndio quando não demonstrada atenção ao art. 35 acima referido:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA. DEPUTADA ESTADUAL. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSO DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. BAIXO PERCENTUAL. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1.Prestação de contas apresentada por candidata não eleita ao cargo de deputada estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022. 2. Irregularidades na comprovação e utilização de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). Identificada a aquisição de combustível, sem o correspondente registro de locações, de cessões de veículos, de publicidade com carro de som ou de despesa com geradores de energia, em violação ao disposto nos arts. 35, § 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Embora regularmente intimada, a prestadora não forneceu documentos, tampouco esclarecimentos aptos a afastar o apontamento. 3. A falha equivale a 3,91% do montante de recursos recebidos na campanha, e se enquadra em parâmetros, fixados na jurisprudência desta Corte para aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade. 4. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS - PCE: 06030883720226210000 PORTO ALEGRE - RS, Relator: Des. Patricia Da Silveira Oliveira, Data de Julgamento: 22/09/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 175, Data 25/09/2023 )

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. VEREADOR. DESAPROVADAS. DESPESA COM COMBUSTÍVEL SEM O CORRESPONDENTE REGISTRO. IRREGULARIDADE MANTIDA. INCABÍVEL A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO ERÁRIO NESTA INSTÂNCIA. VALOR MÓDICO. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas de candidato, relativas ao pleito de 2020, sem determinação de recolhimento de valores ao erário. 2. Realização de despesa com combustível sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, conforme estabelece o § 11 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19. Intimado, o candidato não se manifestou. Ausência de comprovação sobre a utilização de combustível adquirido com os recursos de campanha. Irregularidade mantida. Incabível a determinação de recolhimento ao erário nesta instância. 3. A irregularidade representa 7,02% do total de receitas declaradas, e de valor inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 que a disciplina normativa das contas considera módico, possibilitando a aprovação das contas com ressalvas, em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 4. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS - REl: 06004054020206210083 SARANDI - RS, Relator: Des. KALIN COGO RODRIGUES, Data de Julgamento: 30/01/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 18, Data: 01/02/2023.)

 

Nesse trilhar, o montante de R$ 4.500,00 deve ser direcionado ao erário.

Há, também, 6 contratações desacompanhadas dos acordos firmados entre o fornecedor e a candidata, os quais são passíveis de aferição no sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, na soma de R$ 1.376,00. São eles:

- ALVINO SOUZA DA CONCEIÇÃO, CPF n. 807.926.930-00, R$ 500,00 - serviços prestados por terceiros;

- GILDOMAR NUNES, CPF n. 786.680.420-68, R$ 250,00 -atividades de militância e mobilização de rua;

- ANDERSON DEUS DOS SANTOS, CPF n. 037.984.940-29, R$ 250,00 - atividades de militância e mobilização de rua;

- ALICIA CAAMRGO DE SOUZA, CPF n. 039.606.220-23, R$ 150,00 - atividades de militância e mobilização de rua;

- TABITA LUANA DEUS DA SILA, CPF n. 850.720.520-87, R$ 126,00 - atividades de militância e mobilização de rua; e

- DANIELA MELO DE ALBUQUERQUE DE SOUZA, CPF n. 015.891.670-07, R$ 100,00 - atividades de militância e mobilização de rua.

 

Não carreadas ao feito provas quanto às contratações, a quantia vertida indevidamente deve ser recolhida ao Tesouro Nacional.

Por derradeiro, a prestadora de contas recebeu um total de R$ 15.000,00 de doação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha. O depósito do valor foi efetuado pelo Diretório Nacional do PSC na conta bancária da candidata na data de 30.8.2022.

A análise técnica do TRE apontou que a prestadora realizou despesas com verbas do FEFC no montante de R$ 10.000,00, havendo uma diferença de R$ 5.000,00 entre o valor total recebido do Diretório Nacional (R$ 15.000,00) e o valor gasto (R$ 10.000,00), cuja utilização não foi comprovada com documentos fiscais.

Entretanto, de forma injustificada, a candidata transferiu o valor de R$ 5.000,00 da conta de campanha para a sua conta bancária de pessoa física, conforme bem apontado pelo Parquet em seu parecer, o qual transcrevo (ID 45557180):

Observa-se no extrato bancário da conta FEFC o desconto de um cheque, na boca do caixa, no valor de R$ 5.000,00, em operação realizada na data de 01.09.2022, tendo como contraparte a própria canditada. Essa quantia equivale exatamente à diferença entre o valor das despesas registradas e o montante de recursos FEFC recebidos.

Verifica-se, assim, além da falta de comprovação do destino dado ao numerário em questão, a existência de indícios de apropriação de recursos públicos pela candidata, de que trata o art. 82 da Resolução TSE nº 23.607/2019, passível de configurar o crime do art. 354-A do Código Eleitoral.

 

Entendo aqui ter havido irregularidade na comprovação da utilização de verba FEFC, sendo impositiva a devolução do valor de R$ 5.000,00 ao Tesouro Nacional. Ademais, tenho por configurada a hipótese do art. 82 da Resolução TSE n. 23.607/19, devendo cópia dos autos ser enviada ao MPE para apuração dos fatos.

Dessa maneira, o montante apurado como irregular na presente contabilidade totaliza R$ 13.426,00 (R$ 100,00 + R$ 8.326,00 + R$ 5.000,00), quantia equivalente a 61,21% dos recursos percebidos em campanha (R$ 21.932,69), o que enseja, conforme entendimento desta Corte, um juízo reprobatório em controle judicial de contas.

Diante do exposto, acolho o parecer ministerial e VOTO pela desaprovação das contas de FABIANA DOS REIS DEUS, nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e determino:

a) o recolhimento do valor de R$ 13.426,00 ao Tesouro Nacional, desses correspondendo R$ 100,00 ao uso de RONI e R$ 13.326,00 à malversação de verbas do FEFC;  e

b) o envio de cópia dos autos ao Ministério Público Eleitoral de primeira instância para apuração de eventual prática de infração penal do art. 354-A do Código Eleitoral.