PCE - 0603148-10.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/02/2024 às 14:00

VOTO

Eminentes colegas.

Trata-se da prestação de contas de JOÃO EDEGAR PRETTO e de PEDRO LUIZ FAGUNDES RUAS, candidatos não eleitos aos cargos de governador e vice-governador nas Eleições Gerais de 2022, referentes à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha.

Processados os documentos nos termos da Resolução TSE n. 23.607/19, foi elaborado parecer conclusivo (ID 45514392) em que o órgão técnico apontou a existência de irregularidades não sanadas pelos candidatos. Mediante realização de procedimento de circularização e/ou informações voluntárias de campanha e/ou confronto com notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais, foi indicada despesa, que deixou de ser arrolada na prestação de contas, e divergência entre informações sobre valor de contratação, o que caracterizaria o recebimento e a utilização de recursos de origem não identificada para custeio dos gastos, no valor total de R$ 7.487,50. Também foram arrolados indícios de irregularidades, com registro de que estes “não afetaram na aplicação dos procedimentos técnicos de exame”.

Na hipótese, as irregularidades referem-se ao registro da despesa realizada com Nova Geração Ltda., declarada no valor de R$ 5.712,50, e cuja nota fiscal localizada atinge o valor de R$ 11.900,00 (diferença de R$ 6.187,50), e à omissão da nota fiscal no valor de R$ 1.300,00, relativa à contratação da fornecedora Sharon Monique Cordova Barros.

Em relação ao gasto com a empresa Nova Geração Ltda., os prestadores de contas juntaram Termo de Acordo Extrajudicial, firmado em 11.10.2022, em que compõem o débito, com a anuência manifesta da empresa em receber R$ 100.000,00 e dar quitação do débito de R$ 106.187,50 (ID 45399720). Foram colacionados também os comprovantes de pagamento do valor acordado.

O mencionado acordo justifica a diferença de R$ 6.187,50 apontada no parecer técnico e tem aptidão para sanar o apontamento.

Nessa mesma linha é o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, que entendeu que a comprovação da renegociação do débito afastou a irregularidade. Confira-se:

O parecer técnico aponta a permanência da falha, "uma vez que não foi apresentado cancelamento de nota fiscal no valor de R$ 6.187,50, ou a prova material de um fornecimento a menor de serviços por parte do fornecedor que justificasse a diferença no pagamento." Todavia, não se verifica a ocorrência de erro na emissão da nota fiscal, mas de uma negociação entre as partes, posterior ao fornecimento dos produtos e à emissão do documento fiscal, cujo teor pode não ser aceito pelo Fisco como motivo para a modificação do seu valor, tendo em vista as repercussões tributárias subjacentes.

Diante da plausibilidade da alegação de que houve renegociação para pronto pagamento de substancial valor devido ao fornecedor dos serviços, esta Procuradoria Regional Eleitoral entende que a juntada do termo de acordo revela-se suficiente para sanar a irregularidade, nos termos do art. 60, §1º, I, da Resolução TSE nº 23.607/2019. (Grifo no original)

 

Assim, afasto a glosa relativa à diferença entre os valores constantes na nota fiscal e aqueles registrados na prestação de contas, considerado sanado o apontamento no valor de R$ 6.187,50.

A irregularidade subsequente é relativa à omissão de despesa no valor de R$ 1.300,00, em relação à qual os prestadores de contas apresentaram a seguinte manifestação (ID 45399718):

Em relação ao fornecedor “Sharon Monique Cordova Barros”, por descuido o prestador não enviou a nota fiscal ao financeiro da campanha em tempo hábil de reconhecer na prestação de contas, mas foi identificado que de fato o serviço foi prestado e trata-se de impressão e instalação de um painel, o registro da nota fiscal nº 35, no valor de 1.300,00, foi reconhecido e incluso na prestação de contas com as devidas comprovações de gastos.

O candidato, a fim de manter a máxima lisura e transparência de suas contas e quitar o compromisso com o prestador, entrou em contato com a empresa e realizou o no dia 25/01/2023 conforme comprovante [...]

 

Na hipótese, o pagamento foi realizado pelo próprio prestador de contas, com valores oriundos de conta bancária titularizada por sua pessoa física. Quando apresentada a declaração retificadora, o valor também foi registrado como dívida de campanha.

Ainda que se reconheça que os candidatos diligenciaram no sentido de corrigir a falha e regularizar o apontamento, não há como considerar que o procedimento adotado tenha sanado a irregularidade, já que o pagamento da despesa ocorreu com recursos que não passaram pelo controle e pela fiscalização da Justiça Eleitoral.

No entanto, diversamente do proposto no parecer ministerial, não é cabível o recolhimento do valor correspondente à irregularidade.

A Procuradoria Regional Eleitoral aponta que “o candidato registrou que se trata de dívida de campanha, mas não promoveu a juntada do correspondente termo de assunção de dívida por parte do partido político, conforme exige o art. 33, §3º, da Resolução TSE nº 23.607/2019; e realizou o pagamento a partir de sua conta pessoal, consoante documentos apresentados (IDs 45515930 e 45515933)”.

Na linha da jurisprudência desta Corte, adotada para as Eleições de 2022, consoante decidido nos julgamentos da PCE n. 0603217-42.2022.6.21.0000; Relator: Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, em 09.12.2022 e PCE n. 0602320-14.2022.6.21.0000; Relator: Des. Eleitoral Afif Jorge Simões Neto, de 17.10.2023, não há de ser comandado o recolhimento dos respectivos valores ao erário, pois as dívidas de campanha não quitadas e não assumidas pela agremiação consistem em categoria com regulamentação específica, em que é estabelecida tão somente a possibilidade de rejeição das contas, por ocasião do julgamento da contabilidade, sem imposição de outras sanções, não havendo espaço para, interpretando-se extensivamente o art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19, determinar-se o ressarcimento da quantia ao Tesouro Nacional a título de recurso de origem não identificada.

Tal posição foi adotada em consonância com julgados do Tribunal Superior Eleitoral (AREspE n. 0608511-76.2018.6.26.0000/SP, Acórdão, Relator: Min. Mauro Campbell Marques, Publicação: DJE, Tomo 175, Data: 09.9.2022; AgR-REspEl n. 0605340-14.2018.6.26.0000/SP, Relator: Min. Benedito Gonçalves, Data de Julgamento: 10.3.2022, Data de Publicação: DJE, Tomo 55, Data: 29.3.2022).

Assim, a irregularidade relativa à dívida de campanha não assumida pelo partido político, no valor de R$ 1.300,00, é mácula que não foi superada nos autos.

Por fim, o parecer indica a existência de indícios de irregularidades consistentes no recebimento de recursos doados por pessoas que se encontrariam em situação de desemprego em bases de dados de órgãos públicos ou com renda incompatível. Também refere a realização de despesas com sócios filiados ao partido político do prestador de contas.

Sobre o ponto, os prestadores sustentam que não compete ao candidato verificar a capacidade financeira dos doadores e que os serviços contratados foram efetivamente prestados (ID 45399900).

Assiste razão aos prestadores de contas.

Para além dos indícios mencionados, não aportou nos autos qualquer elemento que indicasse a irregularidade das doações e da contratação. Anoto também que uma rápida busca, na internet, pelo nome da doadora aportou os valores mais significativos - "Amanda Angelica Cardoso" -demonstra ter sido esta eleitora advogada da Caixa Econômica Federal (https://www.advocef.org.br/wp-content/uploads/2017/03/1998-07JUL.pdf), estando atualmente aposentada (https://maissuas.files.wordpress.com/2016/05/cartaaberta_v3.pdf), o que contraria a presunção de incapacidade financeira. Da mesma forma, a contratação da gráfica cujos sócios são filiados ao partido já foi afastada em outras prestações de contas julgadas por este Tribunal Regional Eleitoral, cabendo aplicar a mesma solução ao caso dos autos. Ilustrativamente, menciono um desses casos, de minha relatoria: Prestação de Contas Eleitorais n. 0603625-33.2022.6.21.0000, julgado em 25.07.2023.

Em conclusão, a irregularidade não superada nestes autos, no valor de R$ 1.300,00, representa 0,024% da receita declarada pelos candidatos (R$ 5.306.091,44).

Em relação às consequências do reconhecimento de irregularidades em percentuais insignificantes e nas hipóteses em que o prestador de contas tenha buscado regularizar a situação, como é o caso dos autos, verifiquei que esta Corte não tem posição firme.

A solução de aprovação com ressalvas das contas foi adotada por esta Corte quando do julgamento da PCE n. 0602640-64.2022.6.21.0000, realizado em 24.11.2022, da Relatoria do Des. Eleitoral Gerson Fischmann, da PCE n. 0602511-59.2022.6.21.0000, da Relatoria do Des. Eleitoral Amadeo Buttelli, julgado na sessão de 25.11.2022, e da PCE n. 0603234-78.2022.6.21.0000, da Relatoria do Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado na sessão de 26.11.2022, ocasião em que se entendeu que, por critério de isonomia e coerência, deve ser considerado que o recolhimento da quantia irregularmente recebida não tem o condão de sanar a falha, pois o procedimento é mero atendimento do comando normativo e reflexo do recebimento de recurso de fonte vedada, sendo todos casos de percentuais ínfimos de irregularidades.

Também nos autos do processo n. 0602588-68.2022.6.21.0000, aprovei com ressalvas prestação de contas de candidato ao cargo de deputado federal que recolheu antecipadamente valores, cuja irregularidade atingia 0,23% do montante movimentado na campanha.

Já nos autos do processo n. 0603328-26.2022.6.21.0000, de relatoria da Desembargadora Eleitoral Patrícia da Silveira Oliveira, que dizia respeito a outro candidato ao cargo de governador, também nas Eleições 2022, o Tribunal Regional Eleitoral, em julgamento realizado em 2.9.2023, aprovou as contas de campanha, sem ressalvas, ainda que reconhecida irregularidade que representava 0,03% do total dos recursos arrecadados.

Penso que merece ser observada a decisão proferida nesse último processo, tendo em vista a similaridade entre os casos e o fato de tratar-se de candidaturas para o mesmo cargo, na mesma eleição, no Rio Grande do Sul. Parece impositivo que os candidatos sejam tratados de forma equânime.

Assim, divergindo do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, por entender que pode ser dispensado o recolhimento de valores registrados como dívida de campanha não assumida pelo partido político e em relação às consequências da irregularidade, tendo em vista os precedentes invocados na fundamentação, as contas devem ser aprovadas sem ressalvas.

 

ANTE O EXPOSTO, voto por aprovar as contas de campanha de JOÃO EDEGAR PRETTO e PEDRO LUIZ FAGUNDES RUAS, candidatos não eleitos aos cargos de governador e vice-governador no Rio Grande do Sul nas Eleições 2022, nos termos do art. 74, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

É o voto.