REl - 0000014-41.2018.6.21.0072 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/01/2024 às 09:30

VOTO

Trata-se de recurso interposto pelo Diretório Municipal de Viamão/RS do PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA – PSDB, em processo de contas anuais, exercício 2017, no qual busca a aplicação da anistia prevista no art. 55-D da Lei n. 9.096/95, no intuito de ver mitigada a necessidade de devolução dos valores percebidos de detentores de cargos/funções demissíveis ad nutum filiados à agremiação.

Manejados recurso especial contra acórdão desta Corte e embargos em face da decisão obtida no TSE, foi determinado o retorno do feito a este Regional para novo julgamento, porquanto reconhecida a constitucionalidade do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, de sorte que o novo aresto deve contemplar o entendimento alcançado pelo Ministro Mauro Campbell Marques na Instância Superior.

Na ocasião, ficou consignado o reconhecimento da presunção de constitucionalidade do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, até eventual decisão em sentido contrário na ADI n. 6.230, em trâmite no Supremo Tribunal Federal.

Todavia, a aludida ação direta de inconstitucionalidade já foi objeto de julgamento em 08 de agosto de 2022, com trânsito em 07.10.2022, tendo por relator o Ministro Ricardo Lewandowski, e que restou ementada nos seguintes termos:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 13.831/2019, QUE ALTERA A LEI 9.096/1995. OLIGARQUIZAÇÃO DOS PARTIDOS POLÍTICOS. IDEAL DEMOCRÁTICO. PRINCÍPIO REPUBLICANO. ART. 3º, § 2º. AUTONOMIA ASSEGURADA ÀS AGREMIAÇÕES PARTIDÁRIAS PARA DEFINIR O PRAZO DE DURAÇÃO DOS MANDATOS DOS MEMBROS DOS SEUS ÓRGÃOS PERMANENTES OU PROVISÓRIOS. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO. ALTERNÂNCIA DO PODER. REALIZAÇÃO DE ELEIÇÕES PERIÓDICAS EM PRAZO RAZOÁVEL. ART. 3º, § 3º. PRAZO DE VIGÊNCIA DOS ÓRGÃOS PROVISÓRIOS DOS PARTIDOS POLÍTICOS DE ATÉ 8 (OITO) ANOS. PROVISORIEDADE QUE NÃO SE CONFUNDE COM PERPETUIDADE. PROCEDÊNCIA QUANTO AO PONTO. ART. 55-D. ANISTIA. DEVOLUÇÕES, COBRANÇAS OU TRANSFERÊNCIAS AO TESOURO NACIONAL QUE TENHAM COMO CAUSA AS DOAÇÕES OU CONTRIBUIÇÕES FEITAS EM ANOS ANTERIORES POR SERVIDORES PÚBLICOS QUE EXERÇAM FUNÇÃO OU CARGO PÚBLICO DE LIVRE NOMEAÇÃO E EXONERAÇÃO, DESDE QUE FILIADOS A PARTIDO POLÍTICO. IMPROCEDÊNCIA QUANTO AO PONTO. MODULAÇÃO DA DECISÃO. PRODUÇÃO DE EFEITOS EXCLUSIVAMENTE A PARTIR DE JANEIRO DE 2023, PRAZO POSTERIOR AO ENCERRAMENTO DO PRESENTE CICLO ELEITORAL, APÓS O QUAL O TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL PODERÁ ANALISAR A COMPATIBILIDADE DOS ESTATUTOS COM O PRESENTE ACÓRDÃO. I - O § 2º do art. 3º da Lei dos Partidos Políticos garante às agremiações autonomia para definir o tempo de mandato dos membros dos órgãos partidários permanentes ou provisórios, estabelecendo norma de competência que pode ser lida, ao menos em tese, no sentido que estes mandatos tenham duração indefinida, sem restrições de nenhuma ordem. II - O § 3º dos art. 3º da Lei dos Partidos Políticos prevê que órgãos provisórios de partidos políticos possam perdurar por até 8 (oito) anos. III - Vocação dos partidos políticos para a autocracia que não é particularidade da política brasileira contemporânea. Estudos clássicos de Robert Michels e Maurice Duverger que explicam essa paradoxal propensão. IV - Da tensão entre interesses de eleitores, filiados e dirigentes partidários podem resultar abalos na representação política que afetam a qualidade da democracia e a própria sobrevivência do regime, que o Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, tem o dever de tutelar. V - Importância de reforçar as tendências democráticas dos partidos políticos, os quais são peças fundamentais para a construção de uma legítima e robusta democracia representativa, amplificando os movimentos políticos que engajam os cidadãos na política. VI - Ideal democrático que se firma na temporalidade dos mandatos, na renovação. O voto direto, secreto, universal e periódico constitui cláusula pétrea da nossa República (art. 60, § 4º, II, da Constituição). VII - A periodicidade dos mandatos reforça e garante o princípio republicano, o qual configura “o núcleo essencial da Constituição”, a lhe garantir certa identidade e estrutura, estando abrigado no art. 1º da Carta Magna. VIII - Concessão de interpretação conforme à Constituição ao § 2º do art. 3º da Lei 9.096/1995, na redação dada pela Lei 13.831/2019, para assentar que os partidos políticos podem, no exercício de sua autonomia constitucional, estabelecer a duração dos mandatos de seus dirigentes desde que compatível com o princípio republicano da alternância do poder concretizado por meio da realização de eleições periódicas em prazo razoável. IX - Inconstitucionalidade do art. 3º, § 3º, da Lei 9.096/1995, na redação dada pela Lei 13.831/2019, ao fixar o prazo de duração de até 8 (oito) anos das comissões provisórias. Período durante o qual podem ser realizadas distintas eleições (gerais e municipais), para todos os níveis federativos. O que é provisório não é eterno; o que é temporário, não pode ser permanente; o que é efêmero, não é duradouro. X - Improcedência do pedido quanto ao art. 55-D da Lei 9.096/1995, na redação dada pela Lei 13.831/2019. XI - Modulação para que a decisão, no trecho em que reconhece a inconstitucionalidade da norma, produza efeitos exclusivamente a partir de janeiro de 2023, prazo posterior ao encerramento do presente ciclo eleitoral, após o qual o Tribunal Superior Eleitoral poderá analisar a compatibilidade dos estatutos com o presente acórdão.

(STF - ADI: 6230 DF 7000613-45.2019.1.00.0000, Relator: RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 08/08/2022, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 16/08/2022.) (Grifei.)

 

Do julgado, restou cristalina a exegese alcançada pela Corte Superior, a qual sinalizou pela constitucionalidade do art. 55-D da Lei dos Partidos Políticos.

Ou seja, as doações oriundas de servidores públicos que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados à sigla política, não são consideradas como oriundas de fontes vedadas.

Prossigo.

A tese vertida na irresignação, em síntese, aponta que as contribuições atribuídas a fontes vedadas foram realizadas de maneira transparente, sem dolo, e que existe previsão legal para que os filiados, ainda que investidos em cargos/funções ad nutum, possam realizar doações ao partido, razão pela qual o recorrente requer o afastamento da ordem de devolução do valor total disposto no comando sentencial e, alternativamente, o abatimento de R$ 1.873,05, montante o qual entende regular (ID 44997976 – p. 5-9).

Ciente do entendimento sufragado pela Instância Superior, adianto que o recurso merece parcial provimento.

Explico.

A decisão prolatada na origem determinou o recolhimento de R$ 4.620,05. Deste total, R$ 1.873,05 seriam decorrentes de fontes vedadas, conforme exame de contas de ID 44997973, p. 3-8.

Do montante advindo de servidores públicos de livre nomeação/exoneração, a unidade técnica, após consulta ao sistema de filiações eleitorais (FILIAWEB), constatou que R$ 794,00 foram transferidos por filiados à agremiação (ID 44997974, p. 3-6).

Neste compasso, deve ser abatido da cifra alcançada na sentença o valor obtido das contribuições dos servidores associados à grei, de sorte que a monta a ser recolhida deve ser de R$ 1.079,05, porquanto decorrente de doações de não filiados (R$ R$ 1.873,05-R$ 794,00).

O novo cálculo perfaz R$ 3.826,05, na medida em que mantidas as demais glosas quanto aos recursos de origem não identificada (fontes vedadas R$ 1.079,05+2.747,00 RONI), totalizando 28,03% das receitas auferidas.

Destarte, adequado o valor a ser recolhido ao entendimento do egrégio TSE, as demais sanções devem ser mantidas, visto que não foram objeto de irresignação, na linha do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral:

No que diz respeito à multa, fixada pela sentença em 5%, e ao prazo de suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário, estabelecido em 4 (quatro) meses, tem-se que igualmente merecem ser mantidas, uma vez que não foram objeto de irresignação do prestador, conforme ressaltado no acórdão de ID 44997979, p. 22 e segs).

 

Ante o exposto, VOTO pelo conhecimento e parcial provimento do recurso, apenas para adequar o valor a ser recolhido, mantida a desaprovação das contas, bem como a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário por 4 meses e multa de 5% a ser aplicada sob o total irregular, nos seguintes termos:

a) Fontes Vedadas - R$ 1.079,05; e

b) Recursos de Origem não Identificada – R$ 2.747,00.