ED no(a) PCE - 0602280-32.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/01/2024 às 14:00

VOTO

Quanto ao primeiro ponto considerado contraditório, o embargante alega que ao manter o apontamento técnico de falha quanto à utilização do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), no total de R$ 12.000,00, para pagamento do serviço de militância política - considerado devido à apresentação de quatro contratos nos quais não consta a identificação dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, a especificação das atividades executadas e a justificativa do preço contratado -, o acórdão divergiu de julgados do TRE em que tais dados foram informados em mera petição e as contas foram aprovadas, citando precedentes.

Ocorre que a hipótese que autoriza o manejo dos embargos declaratórios é a contradição interna do julgado, “não a contradição entre este e o entendimento da parte, nem menos entre este e o que ficara decidido na instância a quo, ou entre ele e outras decisões do STJ” (STJ, EDcl no AgRg nos EAREsp 252.613/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, CORTE ESPECIAL, julgado em 05/08/2015, DJe 14/08/2015).

No caso em apreço, a fundamentação do acórdão é clara no sentido de que os contratos glosados foram firmados sem especificar os dados legalmente exigidos, previstos no art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, e que em petição apartada, juntada após os pareceres conclusivo e da Procuradoria Regional Eleitoral, quando o feito já se encontrava concluso para julgamento, o ora embargante descreveu os dados faltantes, contudo é inviável o recebimento dessa justificativa, “que faz as vezes de um aditamento unilateral”, porque “a narrativa do candidato informando os dados faltantes no contrato firmado sequer pode ser conhecida como um aditamento, pois está sem assinatura de um dos contratantes, no caso, o prestador de serviços”.

O voto condutor prossegue fundamentando sua conclusão no sentido de que a falha não foi sanada: “Ainda que fosse possível o aditamento de contrato de trabalho com vigência expirada, o documento sem assinatura de uma das partes representa ausência de exteriorização da manifestação de vontade do contratado, requisito de validade para que o negócio jurídico produza seus efeitos, sendo o contrato aditado, portanto, inexistente”.

Além disso, o acórdão embargado assevera que, por se tratar de irregularidade afeta à utilização de recursos públicos, a falha apresenta maior gravidade:

Anoto que, em razão na natureza pública da verba do FEFC, a fiscalização contábil, nesse ponto, exige redobrada atenção a fim de permitir o controle da contratação e dos dispêndios com mão de obra.

 

A adoção injustificável de procedimento contábil consistente em cláusulas contratuais preenchidas sem a aquiescência prévia do fornecedor do serviço, sem especificação sobre a divisão das atividades realizadas pelos prestadores de serviço e sem a formalização contratual adequada, com pactuação mediante cláusulas em branco ou com rasuras, compromete a fiscalização desta Justiça Especializada sobre a correta utilização de recursos públicos e viola o art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Como se vê, a conclusão do aresto está em pleno acordo com a sua fundamentação, não cabendo a oposição de embargos de declaração para forçar a comparação do caso concreto a outros julgados do Tribunal, ou o reexame de fatos e provas.

Ora, a existência de dissídio jurisprudencial não dá azo à oposição de embargos de declaração, e o presente recurso integrativo não tem o condão de compelir o Tribunal a realizar o cotejo analítico entre o caso concreto submetido a julgamento e outros julgados.

Portanto, não se verifica contradição passível de integração pela via dos aclaratórios nesse ponto.

No segundo ponto indicado como caracterizador de contradição no julgado, o embargante alega que a ementa de precedente jurisprudencial colacionada ao seguinte trecho do voto condutor em nada se relaciona ao caso concreto:

A adoção injustificável de procedimento contábil consistente em cláusulas contratuais preenchidas sem a aquiescência prévia do fornecedor do serviço, sem especificação sobre a divisão das atividades realizadas pelos prestadores de serviço e sem a formalização contratual adequada, com pactuação mediante cláusulas em branco ou com rasuras, compromete a fiscalização desta Justiça Especializada sobre a correta utilização de recursos públicos e viola o art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Nesse sentido, na contratação de prestadores, a orientação da jurisprudência desta Casa reafirma a aplicação dos requisitos do art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, conforme ementa abaixo transcrita:

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CARGO DE DEPUTADA FEDERAL. 3ª SUPLENTE. IMPROPRIEDADES. ABERTURA EXTEMPORÂNEA DE CONTA BANCÁRIA. NÃO APRESENTADOS OS EXTRATOS DAS CONTAS BANCÁRIAS. OMISSÃO DE GASTOS. NOTA FISCAL NÃO CANCELADA. ATUALIZAÇÃO JURISPRUDENCIAL DO TSE NÃO APLICÁVEL À HIPÓTESE. NÃO COMPROVADOS GASTOS REALIZADOS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). COMBUSTÍVEIS. IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO. FACEBOOK. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTO FISCAL IDÔNEO. DESPESAS COM PESSOAL. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

 

(...)

 

4. Ausência de documentação apta a comprovar gastos realizados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

 

4.4. Inobservância do § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, referente às despesas com pessoal. Apresentados contratos firmados com os prestadores de serviço que revelam inconsistências que não podem ser superadas. Determinada a devolução do somatório irregular ao Tesouro Nacional (art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

 

(...)

 

6. Desaprovação. Determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

 

(TRE/RS – PCE nº 060237477, Relatora Desembargadora Eleitoral Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, Publicação: DJE, Tomo 273, 16/12/2022.)

 

Desta forma, à vista da ausência das informações de que trata o art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, fator que culmina na impossibilidade de fiscalização sobre o conteúdo e os requisitos legais desses contratos de prestação de serviço de militância, considera-se irregular a utilização de recursos originados do FEFC na quantia de R$ 12.000,00, a qual deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, consoante dispõe o § 1° do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Segundo o embargante, “a análise da jurisprudência utilizada para fundamentar a reprovação das contas de Jovani dos Santos da Silva revela inconsistências que não se alinham adequadamente ao caso em questão. O acórdão referenciado aborda irregularidades relacionadas a diferenças nos valores contratados e recebidos, bem como a falta de justificativa para a disparidade de preços para funções semelhantes. Entretanto, as questões centrais nas contas de Jovani concentram-se na especificação dos locais de trabalho, horas trabalhadas, atividades executadas e justificativa do preço contratado. A ausência de congruência entre as circunstâncias abordadas na jurisprudência e os fundamentos da reprovação destaca a inadequação do precedente para sustentar a decisão desfavorável às contas de Jovani dos Santos da Silva”.

Todavia, da simples leitura do acórdão embargado percebe-se que a conclusão pela existência da irregularidade nos contratos apresentados pelo candidato não está fundamentada na citação de ementa contida na decisão, a qual foi colacionada a título obiter dictum, por trazer à tona entendimento que igualmente assentou pela necessidade de observância do § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19 referente às despesas com pessoal.

Nesse sentido, assento que, segundo jurisprudência consolidada do STJ, “a contradição que justifica a oposição de embargos de declaração é a interna, decorrente de proposições inconciliáveis entre si, mas não a suposta contradição entre as razões de decidir e a lei, doutrina, jurisprudência, fatos ou provas” (STJ - EDcl no REsp: 1745371 SP 2018/0069218-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 14/12/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/12/2021).

Ademais, como se verifica da precisa fundamentação do acórdão, tem-se que a ementa citada no voto condutor é de todo dispensável para a conclusão do julgamento, conforme explica a doutrina:

“Existem várias proposições que não são necessárias para solução de qualquer questão do caso. Nessa hipótese, todo esse material judicial deve ser qualificado como obiter dictum – literalmente, dito de passagem, pelo caminho (saying by the way). Obiter dictum é aquilo que é dito durante um julgamento ou consta em uma decisão sem referência ao caso ou que concerne ao caso, mas não constitui proposição necessária para sua solução” (MARINONI, Luiz; ARENHART, Sergio; MITIDIERO, Daniel. 13.4 Ratio decidendi e obiter dictum In: MARINONI, Luiz; ARENHART, Sergio; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de processo civil: tutela dos direitos mediante procedimento comum. São Paulo (SP):Editora Revista dos Tribunais. 2017).

 

Entendo que cumpre ser aqui reproduzido o entendimento do STJ no sentido de que “inexiste afronta aos arts. 489 e 1.022 do CPC/2015 quando a decisão recorrida pronuncia-se, de forma clara e suficiente, acerca das questões suscitadas nos autos, manifestando-se sobre todos os argumentos que, em tese, poderiam infirmar a conclusão adotada pelo Juízo” (STJ - EDcl no AgInt no REsp: 1941932 SP 2021/0142753-4, Relator: Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Data de Julgamento: 14/03/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/03/2022).

Na hipótese em tela, o acórdão apreciou as teses do prestador com base nos fundamentos de fato e de direito que entendeu relevantes e suficientes à compreensão e ao julgamento do feito, não havendo contradição passível de integração pela via dos aclaratórios.

Assim, tem-se que não há na decisão qualquer contradição, sendo descabida a oposição de declaratórios com o escopo de forçar o Tribunal a julgar novamente o caso concreto.

Por fim, anoto que o prequestionamento se dá pelos elementos que o embargante suscitou, na forma do art. 1.025 do CPC.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.