PCE - 0603044-18.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/01/2024 às 14:00

VOTO

Trata-se de prestação de contas apresentada por NESTOR PEDRO SCHWERTNER, candidato não eleito ao cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas Eleições Gerais de 2022.

A unidade técnica, inicialmente, apresentou exame de contas, apontando diversas falhas na contabilidade de campanha, tais como falta de documentos obrigatórios e divergências na movimentação bancária, no somatório de R$ 118.623,00 (ID 45490187).

Intimado a apresentar documentos e complementar dados, o candidato manteve-se silente durante todo o curso da instrução.

Somente após o parecer ministerial, e incluído o feito em pauta de julgamento, o prestador de contas apresentou memoriais e novos documentos comprobatórios (ID 45597890), asseverando que, às vésperas do prazo final de entrega das contas, o contador responsável foi vítima de furto "do equipamento em que arquivava todos os documentos e a pasta que carregava os documentos físicos das prestações de contas, que assessorava nas eleições de 2022", razão pela qual lhe foi impossível entregar os documentos de forma oportuna. Como comprovação do fato, acosta boletim de ocorrência policial emitido em 20.01.2023 (IDs 45597891 e 45597892)

Entretanto, a alegação de justo impedimento para a apresentação tempestiva dos documentos deveria ter sido feita e comprovada ainda durante a tramitação do processo, mormente quando intimado o prestador para responder ao relatório de análise preliminar, o que não ocorreu na hipótese, devendo ser reconhecida a preclusão relativamente ao exame pelo órgão técnico dos novos elementos.

Nada obstante, embora inviável o retorno à unidade técnica, este Tribunal tem mantido para o pleito de 2022 a jurisprudência quanto à possibilidade da apresentação intempestiva de documentos em processos de prestação de contas, após a emissão dos pareceres técnicos e ministerial, desde que não acarrete prejuízo à tramitação e que a simples leitura permita sanar a irregularidade, consoante ilustram as seguintes ementas:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA. SEGUNDA SUPLENTE. DEPUTADA FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS PÚBLICOS. FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. JUNTADOS DOCUMENTOS E ESCLARECIMENTOS. SUPERADOS OS APONTAMENTOS. REGULARIDADE DAS CONTAS DE CAMPANHA. APROVAÇÃO. 1. Prestação de contas apresentada por candidata eleita segunda suplente ao cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022. 2. Conhecidos os esclarecimentos e documentos juntados, aptos a sanar as irregularidades sem a necessidade de nova análise técnica ou de outras diligências. Superados os apontamentos referentes à comprovação de gastos efetuados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC. Declarada a regularidade das contas de campanha. 3. Aprovação.

(TRE-RS - PCE: 06030623920226210000 PORTO ALEGRE - RS, Relator: Des. VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK, Data de Julgamento: 05/12/2022, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 259, Data 07/12/2022) Grifei.

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO ELEITO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. IRREGULARIDADE NA COMPROVAÇÃO DE DESPESA. FALHA SANADA. APROVAÇÃO. 1. Prestação de contas apresentada por candidato ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022. 2. Após o parecer conclusivo, o prestador apresentou documentos e justificativas. A documentação, apesar de intempestiva, pode ser considerada no julgamento, pois a sua simples leitura tem o condão de sanar irregularidade apontada, sem nova análise técnica. Falha sanada. 3. Aprovação.

(TRE-RS - PCE: 06022786220226210000 PORTO ALEGRE - RS, Relator: Des. Luis Alberto Dazevedo Aurvalle, Data de Julgamento: 26/11/2022, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 28/11/2022 ) Grifei.

 

Assim, conheço dos documentos acostados após o parecer ministerial, cujo conhecimento dispensa análise técnica e novas diligência, consistentes em notas fiscais (ID 45597894) e instrumentos contratuais (ID 45597895).

Isso posto, passo à análise dos apontamentos.

 

1. Da ausência de extrato bancário da conta FEFC e da divergência entre a movimentação financeira declarada e a presente no extrato bancário.

Inicialmente, a unidade técnica apontou as seguintes impropriedades:

1.1 Não foram apresentadas as seguintes peças obrigatórias que devem integrar a prestação de contas (art. 53 da Resolução TSE nº 23.607/2019):

a) Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), se houver;

1.2 Há divergências entre a movimentação financeira registrada na prestação de contas e aquela registrada nos extratos eletrônicos (art. 53, I, alínea "g" e II, alínea "a", da Resolução TSE nº 23.607/2019, conforme abaixo:

A) Há divergência no fornecedor descrito na prestação de contas ("Espeto na Brasa" CNPJ 24.889.913/0001-79) e o constante no extrato impresso apresentado ("PSO Novo Hamburgo RS").

 

Não obstante o art. 53, inc. II, al. "a", da Resolução TSE n. 23.607/19 prescreva a obrigatoriedade de apresentação pelo candidato dos extratos bancários contendo a movimentação financeira de todo o período eleitoral, a omissão do prestador, no caso concreto, foi suprida pela disponibilização dos extratos eletrônicos no sistema de Divulgação de Contas Eleitorais, possibilitando a análise da movimentação financeira por esta Justiça Especializada.

Da mesma forma, uma vez possibilitado o acesso aos extratos eletrônicos, em relação ao gasto com alimentação no valor de R$ 2.310,00, a divergência entre o que constou anotado no sistema SPCE e o constante nos registros bancários pode ser considerada falha meramente formal, pois consubstanciada em mera troca de nomes do fornecedor do bem/serviço contido na nota fiscal com aquele declarado, mantendo-se o mesmo objeto, valor pago e demais dados.

A corroborar a conclusão supra, consoante apontado pelo examinador técnico, "as impropriedades descritas não afetaram a identificação da origem das receitas e destinação das despesas comprovadas pela movimentação bancária".

 

2. Da irregularidade na comprovação dos gastos realizados com o Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC.

Também foi apontada pela unidade técnica a não comprovação dos gastos realizados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, no total de R$ 118.623,00, em desconformidade com o preceituado nos arts. 35 e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, nos seguintes termos:

4.1.1 Foram identificadas as seguintes inconsistências nas despesas pagas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), contrariando o que dispõem os arts. 35, 53, II, c, e 60 da Resolução TSE nº 23.607/2019:

 

Detalhamento da inconsistência observada na tabela:

C) Não foi apresentado documento fiscal comprovando a despesa, em conformidade ao art.53, II e de forma a comprovar os art. 35 e 60 da Resolução TSE 23.607/2019.

 

No ponto, o prestador de contas não acostou aos autos as notas fiscais e os contratos de cessão/prestação de serviços que teriam sido pagos com a verba pública.

A Procuradoria Regional Eleitoral, por sua vez, opinou pela regularidade do montante de R$ 72.503,00, uma vez que, no sítio eletrônico do DivulgaCandContas, constam as respectivas notas fiscais eletrônicas emitidas pelas pessoas jurídicas prestadoras dos serviços.

De fato, o entendimento do órgão ministerial merece acolhida.

O objetivo de fiscalizar o ingresso, dispêndio e regularidade dos gastos efetuados em campanha foi devidamente atingido por meio da documentação comprobatória dos gastos disponíveis no sistema de Divulgação de Contas (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2022/2040602022/RS/210001604661/nfes), motivo pelo qual vejo como superadas em parte as irregularidades consideradas pelo órgão técnico.

Assim, em linha com a Procuradoria Regional Eleitoral, entendo devidamente comprovado o total de R$ 72.503,00.

Ocorre que, em memoriais (ID 45597894), o prestador efetivamente apresentou as notas fiscais emitidas por ORUS UNIFORMES IND. E COM. LTDA. (R$ 8.780,00), LETIANE DE OLIVEIRA BUENO ME (R$ 6.700,00), CLAIRTON RODRIGUES ME (R$ 6.000,00) e MRS SOLUÇÕES CORPORATIVAS LTDA. ME (R$ 500,00).

As três primeiras notas fiscais eletrônicas já se encontravam disponíveis no sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, de modo que estão englobadas nas despesas anteriormente consideradas regularizadas.

Por outro lado, a última nota fiscal, referente a gasto de natureza publicitária em jornais e revistas com pessoa jurídica (MRS Soluções Corporativas Ltda ME), diferente das demais, não se encontra disponível no DivulgaCandContas, de modo que a apresentação do documento pelo candidato é apta para sanear a falha, no valor de R$ 500,00.

As demais despesas apontadas no parecer técnico envolvem pessoas físicas e são relacionadas: a) à contratação de serviços advocatícios; b) à cessão ou locação de veículos e c) a serviços de militância durante a campanha.

Com os memoriais, o candidato juntou diversos instrumentos contratuais (ID 45597895), incluindo alguns que não estão assinados pela parte contratada, carecendo, assim, de integridade e idoneidade para a comprovação dos gastos de campanha. Estão nessa situação os contratos com Luis Roberto da Silva, Karla Fabiane Santos da Silva, Alecsandro da Silva Meirelles, Tais Virissimo, José Antônio Vale dos Reis, Ana Paula Vieira, Arivelton Ramos, Mário Dagoberto Abreu de Quadros e Cátia Rodrigues Meireles.

Por outro lado, os contratos firmados com Fernando Cordeiro da Silva (R$ 7.000,00; por serviços advocatícios), Jair Silva dos Santos (R$ 4.500,00; por coordenação e atividades de mobilização de rua); Ubirajara Pertile Garcia (R$ 3.760,00; por locação de veículo, e R$ 600,00, por panfletagem e mobilização de rua); José Pedro França (R$ 2.840,00; por panfletagem e mobilização de rua) e Antônio Marcos Ventura da Silva (R$ 800,00; por panfletagem e mobilização de rua) estão completos e preenchem os requisitos exigidos pelos arts. 35, § 12, e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, razão pela qual julgo saneadas as falhas em relação a tais despesas, no total de R$ 19.500,00 (R$ 7.000,00 + R$ 4.500,00 + 3.760,00 + R$ 600 + R$ 2.840,00 + R$ 800,00).

Anoto que valor maior pago para José Pedro França se deve ao período mais longo de contratação (de 19.08.2022 a 01.10.2022), enquanto os demais contratados para idêntica tarefa atuaram por intervalos inferiores a vinte dias antecedentes ao pleito.

Os gastos eleitorais saneados com os novos documentos acostados somam o valor de R$ 20.000,00 (R$ 500,00, referente à nova nota fiscal + R$ 19.500,00, envolvendo os contratos).

Sobre os demais gastos com pessoas físicas, a ausência de documento idôneo, seja comprovante, contrato, recibo ou qualquer outro equivalente, inviabiliza a aferição da regularidade nas contratações e dos pagamentos com os recursos públicos.

Logo, devem ser mantidas as irregularidades sobre os gastos não comprovados envolvendo a contratação de pessoas físicas, no total de R$ 26.120,00, quantia que deve ser restituída ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

3. Do indício de irregularidade.

Finalmente, o órgão técnico registrou o seguinte indício de irregularidade:

5.1 Mediante a integração do módulo de análise do SPCE e da base de dados MACIÇA/CNIS/RAIS, realizado em 07/11/2022, foi identificado o recebimento de doação realizada por pessoa física, cuja renda formal conhecida é incompatível com a doação realizada, o que pode indicar ausência de capacidade econômica para realizar a doação:

A despeito disso, não constam quaisquer outros elementos informativos sobre a condição econômica da doadora, ou sobre a sua relação com o beneficiário, que possibilitem concluir, de modo cabal, acerca de eventual irregularidade na doação.

Nessa linha, acolho o parecer ministerial no sentindo de afastar o apontamento, mormente ao se considerar o valor diminuto ao qual se vincula e a inexistência de outros indícios quanto a possível ilicitude:

(...) tocante ao valor da doação feita por Ana Paula Macedo, objeto de apontamento no item 5.1, tendo em vista que se trata de montante pouco expressivo (R$ 1.000,00) e na ausência de outros elementos, não entende caracterizada a utilização de recurso de origem não identificada.

 

Do Julgamento das Contas

Nos termos da jurisprudência do TSE, "é possível a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aquilatar se o valor total das irregularidades não supera 10% do total da arrecadação ou da despesa, permitindo-se, então, a aprovação das contas com ressalvas" (TSE - RESPE 060355917/MG, Relator: Min. Edson Fachin, Data de Julgamento: 26.05.2020, DJE de 04.06.2020).

Na hipótese, a irregularidade envolvendo a ausência de comprovação dos gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha alcança R$ 26.120,00, equivalentes a 10,4% do total auferido pelo candidato (R$ 249.042,00), superando o parâmetro estabelecido pela jurisprudência e impondo a desaprovação das contas.

Ademais, deve o montante de R$ 26.120,00 ser recolhido ao Tesouro Nacional, na forma prescrita pelo art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, em razão da inobservância da regra contida no art. 53, inc. II, "c", c/c o art. 60 da mesma Resolução.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela desaprovação das contas de NESTOR PEDRO SCHWERTNER, relativas ao pleito de 2022, com esteio no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e pela determinação do recolhimento de R$ 26.120,00 ao Tesouro Nacional, na forma do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.