PCE - 0603131-71.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/01/2024 às 14:00

VOTO

Trata-se de prestação de contas apresentada por FERNANDA SERPA MOREIRA, candidata ao cargo de deputada federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas Eleições Gerais de 2022.

A Secretaria de Auditoria Interna (SAI), em seu parecer conclusivo, apontou a seguinte falha nas contas de campanha, consistente em excesso de gasto com locação de veículos, verbis (ID 45525098):

As despesas com aluguel de veículos automotores, num total de R$ 20.000,00, extrapolaram o limite de 20% do total dos gastos de campanha contratados, num total de R$ 20.000,00, em R$ 16.000,00, infringindo o que dispõe o art. 42, II, da Resolução TSE nº 23.607/2019.

A candidata não exerceu seu direito de manifestação como previsto no §1º, do art. 69 da Resolução TSE 23.607/2019, não apresentou esclarecimentos ou documentos no Processo Judicial Eletrônico - PJe a fim de sanar tal irregularidade.

Assim, por falha na aplicação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC, considera-se irregular o montante de R$ 16.000,00, passível de devolução ao Tesouro Nacional, conforme o art. 79, §1º da Resolução TSE 23.607/2019.

[…]

CONCLUSÃO

4. Aplicação irregular dos recursos públicos - A irregularidade na aplicação dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, apontada no subitem 4.1, monta R$ 16.000,00. O valor está sujeito à devolução ao Erário na forma do art. 79, §1º da Resolução TSE 23.607/2019.

Finalizada a análise técnica das contas, o valor total das irregularidades foi de R$ 16.000 e representa 66,16% dos recursos recebidos, R$ 24.182,69. Assim, como resultado deste Parecer Conclusivo, recomenda-se a desaprovação das contas, em observância ao art. 72 da Resolução TSE 23.607/2019.

 

Assim, de acordo com a unidade técnica, os gastos contratados pela candidata totalizaram R$ 20.000,00, de sorte que poderia ter sido despendido com aluguel de automóveis o valor máximo de R$ 4.000,00.

A disciplina normativa afeta ao caso sub examine encontra-se plasmada na Lei n. 9.504/97, art. 26, § 1º, inc. II, e na Resolução TSE n. 23.607/19, art. 42, inc. II, verbis:

Lei n. 9.504/97

Art. 26. São considerados gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites fixados nesta Lei:

§ 1º São estabelecidos os seguintes limites com relação ao total do gasto da campanha:

(...)

II - aluguel de veículos automotores: 20% (vinte por cento).

…………………………………...

Resolução TSE n. 23.607/19

Art. 42. São estabelecidos os seguintes limites em relação ao total dos gastos de campanha contratados (Lei nº 9.504/1997, art. 26, § 1º):

(...)

II - aluguel de veículos automotores: 20% (vinte por cento).

 

Desse modo, resta nítido que os dispêndios com locação de veículos ficam limitados a 20% do total dos gastos eleitorais, havendo, no caso concreto, o excesso de gastos em R$ 16.000,00, caracterizando a aplicação irregular de recursos públicos.

De seu turno, o órgão ministerial sustentou que a irregularidade alcança a totalidade da despesa realizada com a locação de veículo automotor, no montante de R$ 20.000,00, porquanto não comprovada a propriedade do veículo automotor através de documento regularmente expedido pelo poder público, no caso o Certificado de Registro do Veículo ou o Certificado de Registro e Licenciamento do Veículo (CRLV), bem como não demonstrado que o contratado possui CNH compatível para condução do aludido veículo. Argumentou, ainda, que, "tendo-se como parâmetro outras candidaturas das eleições 2022, não parece razoável o desenvolvimento de uma campanha eleitoral para o cargo de deputado federal alicerçada em uma única despesa, qual seja, a locação de um veículo automotor" (ID 45539696).

Merece acolhida o entendimento da Procuradoria Regional Eleitoral.

O gasto realizou-se por meio de contrato particular celebrado com a pessoa física THARICK NUNES MICHELOTTI, cujo objeto é a locação de uma van, placas LZZ6I39, com serviço de motorista e combustível incluídos, sendo a função de motorista exercida pelo próprio CONTRATADO, o qual declara "ser o único dono do veículo". (ID 45230116).

Sendo assim, de forma bastante apropriada, requereu a Procuradoria Regional Eleitoral a intimação da candidata para "prestar esclarecimentos, apresentar documentos, comprovar a propriedade do bem e demonstrar a efetiva prestação dos serviços, na forma do art. 60, § 3º, da Resolução TSE nº 23.607/2019".

Entretanto, apesar de regularmente intimada para manifestar-se acerca da promoção ministerial de ID 45527246, a candidata quedou-se inerte. Ou seja, não houve manifestação da intimação de ID 45495997, referente ao laudo inicial, e tampouco quanto ao ID 45531439, referente ao parecer ministerial.

Desse modo, não tendo sido acostados aos autos o Certificado de Registro e Licenciamento do Veículo (CRLV) e a cópia da CNH do contratado, impossível aferir a propriedade do veículo automotor, assim como a existência de habilitação do contratado para a atividade de motorista do veículo em questão e, de modo consequente, validar o contrato de locação apresentado pela candidata.

Assim, conquanto tenha a candidata sido instada a apresentar documentos essenciais ao perfeito exame do gasto suportado por verbas públicas, manteve-se silente, de sorte que se revela impositiva a glosa das despesas, por aplicação irregular de recursos do FEFC, com a determinação de recolhimento da quantia malversada ao Tesouro Nacional, consoante o disposto no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, litteris:

Art. 79.(...)

§ 1º Verificada a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou a sua utilização indevida, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional no prazo de 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado, sob pena de remessa dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União, para fins de cobrança.

 

A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral encontra-se consolidada no sentido de que é imperativo o ressarcimento ao erário quando houver uso indevido de verbas públicas:

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO ESTADUAL. CONTAS DE CAMPANHA. VALOR PERCENTUAL PEQUENO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

DEVOLUÇÃO AO ERÁRIO. ART. 82, § 1º, DA RES.-TSE 23.553/2017. NEGATIVA DE PROVIMENTO.

1. No decisum agravado, proveu-se em parte o recurso especial interposto por candidata não eleita ao cargo de deputado estadual em 2018 para aprovar com ressalvas suas contas de campanha, porém mantendo-se a determinação do retorno de R$ 1.500,00 ao Tesouro Nacional, o que ensejou agravo pelo Parquet.

2. A aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade em processo de contas condiciona-se a três requisitos cumulativos: a) falhas que não comprometam a higidez do balanço; b) percentual ou valor não expressivo do total irregular; c) ausência de má-fé. Precedentes.

3. Na espécie, segundo o TRE/SE, embora inexista comprovação da titularidade de veículo alugado com recursos públicos, a falha incide sobre apenas 0,5% dos recursos arrecadados, sem indício de má-fé por parte da candidata.

4. Nesse contexto, impõe-se aprovar o ajuste contábil, na linha da jurisprudência desta Corte Superior, mantendo-se a devolução ao erário, pois não se demonstrou o correto uso de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), nos termos do art. 82, § 1º, da Res.-TSE 23.553/2017.

5. Agravo interno a que se nega provimento.

(RECURSO ESPECIAL ELEITORAL n. 060126119, Acórdão, Relator Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 62, Data: 08.4.2021.) (Grifei.)

 

Dessa maneira, impõe-se a restituição ao erário do montante de R$ 20.000,00.

Em conclusão, a irregularidade representa 82,70% do montante arrecadado pela candidata (R$ 24.182,69), de maneira a inviabilizar a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade como meio de atenuar a gravidade das máculas sobre o conjunto das contas, sendo, portanto, mandatória a reprovação contábil, em linha com o parecer ministerial.

Ante o exposto, VOTO pela desaprovação das contas de FERNANDA SERPA MOREIRA, relativas ao pleito de 2022, com esteio no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e pela determinação do recolhimento de R$ 20.000,00 ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, do mesmo diploma normativo.