ED no(a) PCE - 0603194-96.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 14/12/2023 às 09:30

VOTO

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos, está a merecer conhecimento.

No mérito, o embargante alega o cometimento de erro material no bojo do acórdão embargado, e requer a aceitação de documentos que acompanham os embargos de declaração.

1. Erro material.

Adianto que julgo inocorrente erro material, como bem salientado pela d. Procuradoria Regional Eleitoral. O argumento do recorrente não espelha a hipótese. Transcrevo trecho dos embargos:

Não se nega a falha da defesa inicial do candidato que por não ter familiaridade com as questões eleitorais deixou de efetuar a juntada do documento, mas o fato incontroverso conforme se comprova com a referida nota, é que o gasto foi lícito e o serviço foi efetivamente entregue, ou seja a devolução de valores a união seria uma medida equivocada e contrária a legislação de regência ou seja verdadeiro erro material eis que não trata de critério de julgamento, mas sim de mero documento que deixou de ser apresentado, mas que por outros meios a equipe de análise técnica poderia ter tido acesso por meio de cruzamento. (Grifei.)

 

Ora, se o documento deixou de ser apresentado, como admitido pelo próprio embargante, obviamente não se está a tratar de erro material.

Convém, no ponto, deixar claro que os processos de prestação de contas possuem caráter eminentemente declaratório. Cabe ao candidato apresentar, declarar e demonstrar a regularidade de receitas e gastos. Dessa maneira, é defeso aos prestadores eximir-se da apresentação de documentos esclarecedores dos contratos que realizam (no mais das vezes com a utilização de verbas públicas) sob o argumento de que “a análise técnica poderia ter tido acesso por meio de cruzamento”.

Equivocado.

Ora, a responsabilidade de transparência e elucidação do manejo de valores envolvidos em campanha eleitoral é do prestador de contas. Aliás, o argumento do embargante, levado a extremo efeito objetivo, teria o condão de eliminar, de extinguir os processos judiciais de prestação de contas – pois todas as operações poderiam ser objeto de cruzamento de dados de parte da Justiça Eleitoral e, portanto, o candidato nada precisaria diligenciar.

Situação obviamente sem qualquer respaldo legal. O dever de prestar contas possui inclusive matiz constitucional, preceito que é, art. 17, inc. III, de funcionamento dos partidos políticos.

Nessa ordem de ideias, o que o cruzamento de dados permite é a percepção de situações de omissão de gastos ou de receitas, transações. Naquelas situações declaradas pelo candidato, o dever, o ônus de esclarecer e demonstrar o bom uso dos valores é do candidato, conforme a legislação de regência.

Afasto, portanto, a alegação de ocorrência de erro material. O embargante pretende, aqui, apenas transferir à Justiça Eleitoral um dever que é seu, não apenas perante a Justiça Eleitoral, mas sim à sociedade como um todo.

2. Da apresentação de documentos juntamente aos embargos de declaração.

O ponto é, antecipo, tormentoso. A Procuradoria Regional Eleitoral, em alentado parecer, defende o respeitável posicionamento de que a nota fiscal apresentada deve ser considerada, e abatido o valor de R$ 3.540,30 da ordem de recolhimento ao Tesouro Nacional, que o acórdão embargado fixou em R$ 4.236,18. Traz, inclusive, jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, relativa às eleições do ano de 2018, em que o TSE admite o conhecimento de documentos com o exclusivo efeito de ajustar o montante do recolhimento devido (AI n. 060801632, Ac. Relator Min. Edson Fachin, DJE de 29.04.2020).

Ocorre, todavia, que para as eleições de 2022, em processo cujo julgamento foi objeto de intensos debates, o Plenário deste Tribunal decidiu recentemente (30.10.2023) e por maioria (vencido, apenas nesse ponto, o Rel. Des. Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo), não ser possível a admissão de documentos em sede de embargos de declaração, em decorrência da preclusão e em prestígio ao verbete número 30 da Súmula do TSE. O caso tratava da apresentação de duas notas fiscais juntamente aos aclaratórios, situação bastante semelhante ao caso posto.

Trago a ementa do julgado, e sublinho os itens 2 e 3 da ementa, que também abordaram a questão dos valores a serem recolhidos ao Tesouro Nacional:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÃO 2022. DESAPROVAÇÃO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. PEDIDO DE EFEITOS INFRINGENTES. NOVOS DOCUMENTOS ACOSTADAS COM OS EMBARGOS. NÃO CONHECIDOS. PRECLUSÃO. AUSENTE OMISSÃO OU CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO. REJEIÇÃO.

1. Oposição em face do acórdão que, por unanimidade, desaprovou prestação de contas referente à campanha para o cargo de deputado federal nas eleições gerais de 2022 e determinou o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional. Pedido de atribuição de efeitos infringentes.

2. Novos documentos acostados com o recurso. Os embargos de declaração são cabíveis para sanar vício de obscuridade, omissão, contradição ou existência de erro material na decisão embargada, não devendo ser manejados como um recurso de reexame da matéria, bem como para suscitar fatos e documentos novos. Intransponível o óbice de utilização dos aclaratórios como recurso para rejulgamento da matéria, máxime para conhecimento de documentos que deveriam ter sido, no tempo e modo oportunos apresentados.

3. Além de as hipóteses de cabimento dos embargos de declaração não se prestarem ao propósito pretendido pelo embargante, operada a preclusão, não há como conhecer dos documentos. Eventual consequência do dever de recolhimento de valor ao Tesouro Nacional é corolário do exame de mérito das contas, procedido conforme os documentos que se encontravam nos autos.

4. Não conhecidos os documentos apresentados. Rejeição aos embargos de declaração.

(ED na PCE 0602920-35.2022.6.21.0000, julgado em 30/10/2023. Relator Des. El. Caetano Cuervo Lo Pumo).

 

Ou seja, esse é o posicionamento desta Corte Regional para as eleições de 2022, em alinhamento, aliás, a uma série de outros regionais – Amapá, Distrito Federal, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Pará, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe -, como bem pontuado pelo voto do Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira no citado precedente deste TRE-RS, de modo que, em respeito ao art. 926 do Código de Processo Civil, e sobretudo por respeito ao princípio de tratamento paritário (igualdade de chances) aos competidores de uma mesma eleição, julgo por não conhecer dos documentos que acompanham as razões de embargos de declaração. Em momento oportuno, certamente, o e. Tribunal Superior Eleitoral debruçar-se-á sobre o tema no relativo às eleições de 2022.

 

Diante do exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.