ED no(a) REl - 0600790-22.2020.6.21.0007 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/12/2023 às 09:30

VOTO

Ambos os embargos de declaração são adequados, tempestivos e comportam conhecimento.

Passo à análise individualizada de cada um dos recursos.

 

1. Dos Embargos de Declaração Opostos por LUCIANO HANG

O embargante Luciano Hang, em síntese, volta-se contra “os entendimentos divergentes vencidos da E. DESEMBARGADORA PATRÍCIA DA SILVA OLIVEIRA, DESEMBARGADOR VOLTAIRE DE LIMA MORAES E DESEMBARGADORA PRESIDENTE VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK”, “eis que omissos e contraditórios, com o máximo respeito, às provas constantes nos autos”, uma vez que, segundo suas razões recursais, “inexistem provas robustas e concretas que justifiquem a conclusão de eventual ilícito eleitoral ou abuso de poder econômico por parte dos Votos divergentes, haja vista que o resultado do pleito nunca foi condicionante para a instalação das LOJAS HAVAN em BAGÉ” (ID 45586192).

Prontamente se observa que o conteúdo recursal visa à rediscussão ampla do contexto fático-probatório, a fim de propiciar uma ratificação das teses defensivas que não foram acolhidas pelos respeitáveis e fundamentados votos vencidos.

Em realidade, não se verificam omissões nos pronunciamentos que divergiram da posição majoritária, porquanto o conjunto probatório restou integralmente examinado em todas as manifestações dos julgadores, ainda que, por vezes, por remissão aos votos inaugurais de cada uma das posições.

Assim, os votos ora atacados tão somente alcançaram em uma convicção diversa daquela sufragada pela maioria do Pleno em relação ao exame da gravidade das circunstâncias, fazendo de forma adequada e suficientemente motivada, inexistindo qualquer vício.

Outrossim, o embargante não alega uma contradição interna, ou seja, uma incongruência entre passagens ou teses da própria decisão, mas indica tão somente a suposta contrariedade entre a prova produzida e a conclusão do voto, circunstância não remediável por meio dos aclaratórios.

Nessa linha, o seguinte precedente do TSE:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL. ART. 1022 DO CPC/2015. CONTRADIÇÃO. OFENSA NÃO CONFIGURADA. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO PROBATÓRIA. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM ANCORADO NO SUBSTRATO FÁTICO DOS AUTOS. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

1. No tocante ao tema da proporção dos honorários de sucumbência, não cabe falar em ofensa ao art. 1022 do CPC/2015. Isso porque, nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a contradição sanável por meio dos embargos de declaração é aquela interna ao julgado embargado - por exemplo, a incompatibilidade entre a fundamentação e o dispositivo da própria decisão. Em outras palavras, o parâmetro da contrariedade não pode ser externo, como outro acórdão, ato normativo ou prova.

2. No caso em exame, o dispositivo do acórdão embargado está em perfeita consonância com a fundamentação que lhe antecede. Portanto, não há contradição interna a ser sanada.

[...].

5. Agravo interno não provido.

(STJ - AgInt no AREsp 1224070/SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 01/10/2019, DJe 04/10/2019.) (Grifei.)

 

Na mesma linha, este Tribunal entende que a alegação de confronto entre as conclusões do voto e o arcabouço fático-probatório não configura vício autorizador do manejo de embargos de declaração, consoante o seguinte julgado:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. DUPLA OPOSIÇÃO. RECURSO CONTRA A EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA. PROCEDENTE. ALEGADA OCORRÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO E OBSCURIDADE NO ACÓRDÃO. INEXISTÊNCIA DOS VÍCIOS. DESPROVIMENTO. (...). 2.4. A embargante defende ser contraditória a análise da prova realizada pelo juízo. Esta Corte deliberou pela suficiência das informações coletadas nos autos e pela desnecessidade da reabertura de instrução para esse único fim. Manifesta a irresignação da parte com a análise da prova. Inexistência do vício. 2.5. Rejeitada a alegada contradição entre a prova produzida e o resultado do julgamento. O parâmetro invocado como justificativa é externo à decisão, tratando-se de inconformismo com a análise da prova realizada pelo julgador. Inviável o exame, uma vez que os vícios aptos ao manejo dos aclaratórios são aqueles internos à decisão, ou seja, entre os fundamentos e a conclusão. 2.6. Desprovidos. (...).

(TRE-RS - RCED: 215 TAQUARA - RS, Relator: ROBERTO CARVALHO FRAGA, Data de Julgamento: 31/03/2020, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 168, Data: 21/09/2020, Página 5-6.) (Grifei.)

 

Assim, os aclaratórios opostos por Luciano Hang devem ser rejeitados.

 

2. Dos Embargos de Declaração Opostos por DIVALDO VIEIRA LARA E OUTROS

Nos embargos de declaração opostos, Divaldo Vieira Lara e Outros sustentam a ocorrência de quatro omissões no julgado.

A primeira omissão sustentada envolve o enfrentamento do art. 97-A, caput e § 1º, da Lei n. 9.504/97, com a seguinte redação:

Art. 97-A. Nos termos do inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição Federal, considera-se duração razoável do processo que possa resultar em perda de mandato eletivo o período máximo de 1 (um) ano, contado da sua apresentação à Justiça Eleitoral. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 1º A duração do processo de que trata o caput abrange a tramitação em todas as instâncias da Justiça Eleitoral. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

Com base no preceito legal transcrito, os embargantes questionam que, dado o tempo de exercício do mandato já transcorrido, a demanda “só faria causar instabilidade social e política no Município”, considerando, ainda, a possibilidade de duas eleições municipais no ano de 2024.

Contudo, o dispositivo legal invocado não prevê qualquer consequência de ordem prescricional, decadencial ou de natureza processual que obste o prosseguimento do feito até a sua resolução final, ainda que ultrapassado o prazo nele indicado.

Ademais, tendo em vista que também é objeto autônomo da demanda a aplicação da sanção de inelegibilidade aos investigados Luciano Hang e Divaldo Vieira Lara, eventual inviabilidade de renovação das eleições não impede o prosseguimento do processo quanto a essa penalidade (TSE; AgR-AgR-RO 5376-10/MG; Relator: Min. EDSON FACHIN, DJe de 13.3.2020; e REspEl: 38519/MA, Relator: Min. LUÍS ROBERTO BARROSO, DJe de 31.03.2022).

De todo modo, o argumento e o dispositivo legal em questão não foram suscitados pela defesa no curso da instrução ou em contrarrazões recursais (ID 45131998), constituindo inovação argumentativa incabível em sede de embargos declaratórios (TSE - ED-RE n. 13210, Relator: Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJE de 05.04.2017, e ED-AgR-AI n. 96-25, Relator: Min. Og Fernandes, DJe de 5.11.2019).

Sobre a segunda omissão aventada, os embargantes requerem seja consignado no julgado dados relacionados ao “quadro eleitoral bajeense”, especialmente o desempenho do candidato Divaldo Lara e o número de visualizações da postagem investigada.

Em verdade, tais questões fáticas foram analisadas nas razões de decidir dos mMembros do Colegiado e expressamente expostas em diversos trechos dos votos escritos que compõem o acórdão, conforme ilustram as seguintes passagens:

Desa. Eleitoral Patrícia da Silveira Oliveira:

[...].

A primeira questão que entendo ser relevante para o exame do caso em tela é o fato de que a gravação foi realizada no ápice da campanha, 4 dias antes do pleito, teve duração de cerca de 20 minutos, e foi transmitida no perfil de Facebook do Prefeito e candidato à reeleição Divaldo Lara.

A live permanece divulgada na rede social, e o recurso da Coligação Unidos por Bagé afirma que a divulgação obteve 146.000 (cento e quarenta e seis mil) visualizações, mais de 2.400 (dois mil e quatrocentos) comentários e mais de 3.200 (três mil e duzentas) curtidas, ou seja, um engajamento altíssimo.

Esses dados podem ser verificados na consulta atual ao endereço do link de divulgação (https://www.facebook.com/divaldolaraoficial/videos/1067991400280219/), merecendo registro o fato de a inicial apontar que a transmissão ao vivo ocorreu para mil expectadores, circunstância também reconhecida pelos recorridos em sede de contrarrazões.

[...].

Nessa perspectiva, deve-se ter em mente que a campanha majoritária de Bagé, em 2020, contava com 7 candidatos, e que a conduta impugnada nos autos, materializada na transmissão de Facebook divulgada pelos recorridos, deve ser examinada sob a ótica do desequilíbrio do pleito em relação aos 6 demais candidatos que participavam da disputa.

[...].

 

Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira:

[...].

Esta é a distinção que se deve fazer em relação ao caso sub judice, pois aqui, ao contrário de Brusque, não houve reiteração de condutas, ao revés, como bem pontuado no voto do Relator, há um único encontro, sem aparente participação de eleitores, e ocorreu uma única postagem (live) na página do próprio candidato Divaldo Lara, tendo obtido, de acordo com a própria inicial (datada de 12-12-2020), apenas mil visualizações, num universo de quase cem mil eleitores no município (o que importa para o julgamento é a data da divulgação do vídeo e a data do pleito, razão pela qual não se pode tomar por base o número atual de visualizações no Facebook).

[...].

 

Des. Eleitoral Afif Jorge Simões Neto:

[...].

Não vislumbro como algo plausível e coerente a cassação de um prefeito, legitimamente eleito com exatos 50% (cinquenta por cento) dos votos válidos de uma cidade pujante e histórica como Bagé, apenas porque postou no seu Facebook a visita que um empresário fez à Rainha da Fronteira.

Ainda que o dito empresário (que professa o mesmo posicionamento ideológico do prefeito) seja nome de projeção nacional, parece evidente que a tal postagem jamais mudaria os rumos da eleição, cujo resultado merece ser observado e mantido. AQUI, ressalto que não me impressionam os números de “curtidas” ou “comentários”, ocorridos na medida de poucos milhares. Em relação às “curtidas", há a intransponível dificuldade de aferição do exato período em que ocorridas, (um internauta pode, mesmo após a eleição e até hoje, “curtir” a manifestação do prefeito), e, em relação aos comentários, nem todos são elogiosos, pois houve também numerosas críticas, a estampar o caráter sanguíneo do debate eleitoral instaurado, e não abuso de poder.

Ademais, mesmo que fosse possível exercer tais filtros – identificar a exata dimensão de “curtidas” e “comentários” de apoio ocorridos entre os quatro dias da postagem e a eleição –, não se pode olvidar que o Prefeito Divaldo Lara é, para o bem e para o mal, pessoa pública de destaque regional (atualmente, na rede social congênere Instagram, conta com mais de 21.600 seguidores), de modo que os números que envolvem a postagem sob exame se encontram dentro do contexto de destaque do perfil particular do representado, no qual ele poderia, obviamente, exercer seu direito de livre manifestação do pensamento.

[...].

 

Assim, não há de se cogitar em omissão no julgado quanto a tais pontos.

Por sua vez, a terceira e quarta omissões alegadas envolvem a análise de aspectos fáticos e teses enfatizadas pela defesa no curso do processo, inferidas assim nas razões dos aclaratórios:

II. III. Da omissão quanto às razões acerca da visita e da fala de Luciano Hang: mera resposta ao candidato da parte recorrente: ausência de preparo e premeditação: ausência de evento oficial: ausência de logística: ausência de organização: liberdade de expressão e direito de resposta:

[...].

Ocorre, no entanto, que o próprio candidato ao cargo de Prefeito pela Coligação autora, em tom de crítica áspera, afirmou, no período de campanha, dia antes de Luciano responde-lo, que seus estabelecimentos “vendiam quinquilharias da China”. Um velho vendedor de quinquilharias. Por quê Luciano Hang não poderia responde-lo? As pessoas podem falar. E têm direito de resposta. E Hang foi a Bagé, passou por lá pouco tempo, e assim o foi para responder ao candidato que o havia ofendido.

O mesmo candidato adversário promoveu, inclusive em sua propaganda eleitoral, críticas à conduta da administração de Divaldo Lara que, segundo ele, estaria privilegiando o empresariado de fora do Município em detrimento dos empreendedores locais, que, com isso, apoiariam a sua campanha e o seu projeto, caso eleito. [...].

Luciano Hang fez a fala em resposta ao candidato da oposição. E o direito de resposta, assim como a liberdade de expressão, é um direito fundamental, tal e qual consagrado no artigo 5º, inciso V, da Constituição Federal – “é assegurado o direito de resposta proporcional ao agravo...”.

Requerem, pois, vez mais, os embargantes, a manifestação expressa da Corte acerca desta facticidade, bem como à luz do dispositivo constitucional precitado.

 

II. IV. Do necessário esclarecimento acerca do teor da fala do empresário: de como ele jamais vinculou a instalação de loja à vitória de Divaldo:

Ademais, registre-se que Luciano Hang jamais vinculou a loja à vitória de Divaldo e, portanto, não chantageou o eleitorado bajeense. A sentença é esclarecedora:

[...].

Por fim, considerando que temos um contexto que envolve um estabelecimento comercial e a eleição, inexiste, na espécie, a facticidade reconhecida pelo TSE apta ao reconhecimento de eventual conduta abusiva, qual seja: utilização efetiva do aparato, dispêndio real de recursos financeiros ou patrimoniais, relação de subordinação e coação, além de desinformação.

[...].

Requerem, então, que seja consignado expressamente no bojo do acórdão o panorama trazido acima, especialmente quanto à sentença, quanto a inexistência de uso de aparato, dispêndio de recursos, relação de subordinação, coação e desinformação.

 

Ocorre que as omissões apontadas, envolvendo, resumidamente, a caracterização de um ato oficial da prefeitura, a liberdade de expressão do empresário no contexto eleitoral e o condicionamento da instalação da loja à reeleição do prefeito, foram claramente abordadas e explicitadas no voto condutor e constam, inclusive, na ementa do acórdão, conforme evidenciam os trechos em destaque:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL – AIJE. ABUSO DE PODER POLÍTICO OU ECONÔMICO. IMPROCEDENTE. MATÉRIA PRELIMINAR. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO ENVOLVENDO O PRESIDENTE DA REPÚBLICA À ÉPOCA DOS FATOS. QUESTÃO JÁ ENFRENTADA E AFASTADA POR ESTE TRIBUNAL. PRECLUSÃO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA SUSCITADA DE OFÍCIO. EXTINÇÃO DO FEITO EM RELAÇÃO À COLIGAÇÃO RECORRIDA. MÉRITO. PARTICIPAÇÃO DE EMPRESÁRIO EM CAMPANHA MAJORITÁRIA. EXIBIÇÃO DE VÍDEO EM REDES SOCIAIS. DISCURSO QUE TERIA VINCULADO A INSTALAÇÃO DE LOJA MEDIANTE VOTO NO CANDIDATO À REELEIÇÃO. INEXISTÊNCIA DE DESRESPEITO À LEGISLAÇÃO ELEITORAL OU EXISTÊNCIA DE ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO. INOCORRÊNCIA DE ATO OFICIAL. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS MÍNIMOS DE QUE O ENCONTRO ESTAVA INSERIDO EM AGENDA OFICIAL DA PREFEITURA OU QUE TENHA SIDO DIRETA OU INDIRETAMENTE CUSTEADO COM RECURSOS PÚBLICOS. NÃO DEMONSTRADA PARTICIPAÇÃO DE SERVIDORES PÚBLICOS DURANTE JORNADA DE TRABALHO. CIRCUNSTÂNCIAS QUE NÃO EVIDENCIAM DE MODO INDUVIDOSO A UTILIZAÇÃO DE EXPEDIENTE DE TEMOR, AMEAÇA OU COAÇÃO ELEITORAL CAPAZ DE AFETAR A LEGITIMIDADE DO PLEITO. DESPROVIMENTO.

1. Recurso eleitoral interposto por coligação contra sentença que julgou improcedente ação de investigação judicial eleitoral (AIJE) diante da inexistência de provas do alegado abuso de poder político.

2. Matéria preliminar. 2.1. A alegação de litisconsórcio passivo necessário envolvendo o Presidente da República à época dos fatos já foi enfrentada e afastada por este tribunal nestes mesmos autos, que extinguiu a ação diante do reconhecimento da decadência e da ausência de formação de litisconsórcio passivo necessário entre os candidatos beneficiários e o autor do fato tido como ilícito. 2.2. Preclusão. Ocorrência. O art. 1.013 do CPC, ao consagrar o princípio tantum devolutum quantum appellatum, é expresso ao prever que a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada, podendo ser objeto de apreciação e julgamento todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas por inteiro em primeira instância, mas desde que relativas ao capítulo impugnado Na hipótese, o recurso não impugnou especificamente o mérito decisório da questão envolvendo as manifestações do ex-presidente, encontrando-se o tema precluso. 2.3. Ilegitimidade passiva suscitada de ofício, uma vez que os partidos e as coligações não podem sofrer as sanções previstas em caso de procedência da ação de investigação judicial eleitoral. Jurisprudência sedimentada de que não são legitimados para figurar no polo passivo por não restarem alcançados pelas penalidades de cassação de registro ou diploma e declaração de inelegibilidade. Extinção do feito, sem resolução de mérito, em relação à coligação recorrida, com fundamento no art. 485, inc. VI, do CPC.

3. Mérito. Controvérsia recursal em relação ao fato de o candidato recorrido, então no efetivo exercício do cargo de prefeito do município, ter iniciado uma transmissão ao vivo em sua página pessoal no Facebook, na qual, com outros empresários, secretários municipais e políticos locais, recebeu empresário em visita ao terreno onde seria instalada uma nova unidade de sua rede de lojas. No contexto apresentado, a participação do empresário em vídeo de campanha eleitoral, ainda que pedindo votos ao candidato de sua preferência e desqualificando o concorrente e seu partido, não implica desrespeito à legislação eleitoral ou abuso de poder político e econômico, uma vez que a pessoa física do empresário detém direito à participação política e à livre manifestação de seu pensamento. Jurisprudência consolidada pela possibilidade de manifestação política de empresários e figuras públicas na propaganda eleitoral, a qual se insere na livre manifestação do pensamento constitucionalmente protegida (art. 5º, inc. IV, da CF/88).

4. Inocorrência de abuso a partir da alegação de que o encontro iniciou em um ato oficial transmudado em evento de campanha e realizado em horário de expediente da Prefeitura e aproveitando-se do aparato público. Apesar do esforço argumentativo da recorrente, não há nos autos indícios mínimos de que o encontro estava inserido na agenda oficial da Prefeitura, que tenha sido direta ou indiretamente custeado com recursos públicos ou efetuado por meio do uso de servidores públicos em jornada de trabalho. Do vídeo acostado, extrai-se que o encontro ocorreu na rua, em frente ao terreno em que seria instalado o novo empreendimento, sem a presença massiva de público e sem a realização de formalidades ou protocolos oficiais. Nítida a diferença entre o caso em tela e a decisão liminar referendada pelo Plenário do TSE nos autos da AIJE n. 0601002-78.2022.6.00.0000, invocada como possível paradigma pela coligação recorrente.

5. Alegação de que a fala do empresário teria excedido os limites da sua liberdade de expressão e do mero proselitismo político para emitir um “discurso ameaçador”, condicionando o investimento na nova loja a um resultado das urnas favorável ao então prefeito. Fato bastante semelhante foi analisado por esta Corte que entendeu pela inexistência de conduta eleitoralmente abusiva e com gravidade suficiente a justificar a desconstituição do mandato eletivo (REl n. 0600658-54.2020.6.21.0042, de Relatoria do Des. Amadeo Henrique Ramella Buttelli, procedente de Santa Rosa). Assim, nada de concreto e sério é dito a ponto de fazer crer que um resultado diferente na eleição poderia retirar, por vontade de uma única pessoa, seja do candidato concorrente ou do empresário, o investimento já iniciado no município. Portanto, no caso, as circunstâncias não revelam o uso indevido ou exorbitante de recursos público ou privados para alavancar ou prejudicar determinado candidato na realização do vídeo, tampouco evidenciam, de modo cabal e induvidoso, a utilização de expediente de temor, ameaça ou coação eleitoral capaz de afetar a legitimidade do pleito.

6. Desprovimento.

 

A pretensão dos embargantes, portanto, cinge-se ao dissenso com a posição vencida e ao pedido de reafirmação ou aprofundamento de questões já decididas, o que não é cabível em embargos de declaração, uma vez que "a omissão apta a ser suprida pelos declaratórios é aquela advinda do próprio julgamento e prejudicial à compreensão da causa, não aquela deduzida com o fito de provocar o rejulgamento da demanda ou modificar o entendimento manifestado pelo julgador" (TSE - REspEl: 060060024/SE, Relator: Min. Sergio Silveira Banhos, Data de Julgamento: 05.05.2023, Data de Publicação: 18.05.2023).

De todo modo, considerando a disciplina do art. 1.025 do CPC, os elementos que a parte suscitou nos embargos de declaração serão considerados como prequestionados, mesmo com sua rejeição, desde que tribunal superior considere que houve erro, omissão, contradição ou obscuridade.

 

3. Da Aplicação de Multa por Litigância de Má-Fé

De seu turno, a Coligação Unidos por Bagé manifestou-se em relação a ambos os embargos declaratórios opostos (ID 45586754 e 45586782), requerendo a aplicação de multa por litigância de má-fé, defendendo que “a oposição de embargos de declaração por parte que não restou sucumbente no julgamento não se justifica, no presente caso, ainda mais pelas razões expostas”, e que “trata-se de expediente meramente protelatório, buscando postergar a subida de Recurso Especial da parte vencida”.

Porém, a lei processual permite às partes a oposição a embargos de declaração para o aperfeiçoamento da prestação jurisdicional, saneando vícios ou esclarecendo pontos reputados indispensáveis à solução da causa ou, simplesmente, de modo a viabilizar o debate na instância superior.

Justamente por ser voltado à integração e à correção da decisão judicial, e não à sua reforma, essa espécie recursal não está condicionada à sucumbência do embargante, como explica a doutrina de Teresa Arruda Alvim:

(...) os embargos de declaração são um recurso sui generis. Aliás, é conhecida a discussão, já mencionada, sobre sua natureza não recursal. Sabe-se que quando a decisão é embargável de declaração não há propriamente um “vencido”. Ambos têm interesse em ver a decisão esclarecida, integrada, complementada, tanto o que foi por esta beneficiado, quanto o que deve cumpri-la. Por isso, o art. 996 não diz respeito aos embargos de declaração.

(ALVIM, Teresa Arruda. Embargos de Declaração: Como se Motiva Uma Decisão Judicial?. 5º ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2021. E-book.)

 

Por isso, não podem ser tidos como protelatórios os embargos de declaração opostos pela parte vencedora com a finalidade de provocar a manifestação do julgador acerca de matérias que, ao menos do ponto de vista do embargante, sejam relevantes para a completude e clareza da decisão judicial.

Dessa maneira, na hipótese, descabe a aplicação de multa aos embargantes.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração opostos por LUCIANO HANG e por DIVALDO VIEIRA LARA E OUTROS.