PCE - 0602262-11.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/12/2023 às 09:30

VOTO

Cuida-se de prestação de contas de TIAGO DELWING PEDROSO, candidato que concorreu ao cargo de deputado estadual pelo PSC, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022.

A Secretaria de Auditoria Interna (SAI) deste Tribunal emitiu parecer conclusivo pela desaprovação das contas, pois evidenciadas impropriedades quanto à assunção de dívidas de campanha pela agremiação e irregularidades relativas ao uso do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) envolvendo R$ 12.036,93, passíveis de devolução ao erário  (ID 45441414).

Impropriedade quanto à assunção de dívida pelo partido

No que toca à impropriedade relativa à assunção de dívida de campanha pela agremiação, conquanto a falha não tenha afetado a transparência da movimentação financeira, restaram contrariadas as determinações do § 3º do art. 33 da Resolução TSE n. 23.607/19, que impõe a apresentação de peças formalizando o acolhimento do débito pela grei:

Art. 33. Partidos políticos e candidatas ou candidatos podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.

(...)

§ 3º A assunção da dívida de campanha somente é possível por decisão do órgão nacional de direção partidária, com apresentação, no ato da prestação de contas final, de:

I - acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência da pessoa credora;

II - cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo;

III - indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

 

Nesse cenário, a dívida de campanha registrada no ID 45175631 não seguiu o trâmite previsto na regra eleitoral, resultando em vício contábil no montante de R$ 1.950,00.

Todavia, ainda que ressalvada a impropriedade, este Tribunal, no julgamento da PCE n. 0602652-78.2022.6.21.0000, por maioria, alinhou-se à jurisprudência do TSE, firmada no acórdão do RESPE n. 0601205-46.2018.6.12.000, da relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso, enquanto redator designado, no sentido de afastar o dever de recolhimento ao erário da importância equivalente à dívida, por falta de amparo normativo.

Transcrevo a ementa:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO ELEITO. SEGUNDO SUPLENTE. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. OMISSÃO DE DESPESA. EXISTÊNCIA DE NOTAS FISCAIS CONTRA O NÚMERO DE CNPJ DE CAMPANHA. PRESUNÇÃO DE DESPESA ELEITORAL. INFRAÇÃO AO ART. 53, INC. I, AL. “G”, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DÍVIDAS DE CAMPANHA NÃO ASSUMIDAS PELO PARTIDO. INCABÍVEL A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NORMATIVA. BAIXO PERCENTUAL. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas apresentada por candidato, eleito 2º suplente ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas Eleições Gerais de 2022.

2. Omissão de gastos. Divergência entre as informações relativas às despesas lançadas da prestação de contas e aquelas constantes da base de dados da Justiça Eleitoral, obtidas mediante confronto com notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais. Falha que não se confunde com simples dívidas de campanha. Operações não registradas na contabilidade, apartando-se de verificações técnicas sobre a regularidade de seus objetos, idoneidade dos fornecedores, limites de gastos, dentre outros aspectos necessários para que se apure a higidez das contas. A emissão de nota fiscal para o CNPJ de campanha gera a presunção de existência da despesa eleitoral, conforme preceitua o art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19. Infração ao disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19. Sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação dos gastos de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal do candidato, caracterizando os recursos como de origem não identificada. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.

3. Identificada dívida de campanha não assumida pelo partido político. Falha reconhecida. Informado que a agremiação partidária indeferiu o pedido de assunção de dívidas, consoante resposta juntada aos autos, razão pela qual o prestador pugna pela autorização para que proceda à quitação com recursos próprios. Todavia, o pedido deduzido não encontra amparo na legislação de regência. Caracterizada a irregularidade por descumprimento do art. 33, §§ 1º a 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19, uma vez que as despesas não foram integralmente quitadas até o prazo de entrega das contas e as dívidas remanescentes não foram assumidas pelo partido político. Incabível o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, pois as dívidas de campanha consistem em categoria com regulamentação específica, que não prevê a restituição de valores em caso de infringência.

4. O total das irregularidades representa 4,64% do montante de recursos recebidos, autorizando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

5. Aprovação com ressalvas, com esteio no art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS, PCE n. 0602652-78.2022.6.21.0000, Des. Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, publicado julgado em 9.12.2022).

 

Segundo a mais recente posição do Tribunal Superior Eleitoral, não há “respaldo normativo para determinar o recolhimento de dívida de campanha ao Tesouro Nacional como se de recursos de origem não identificada se tratasse” (REspEl n. 0601205–46/MS, rel. designado Min. Luís Roberto Barroso, julgado em 8.2.2022, DJe de 30.3.2022).

Trata-se de posicionamento acolhido, por maioria, neste Tribunal para as eleições de 2022, consoante julgamentos da PCE n. 0602777-46.2022.6.21.0000, Relatora Desembargadora Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, DJe de 14/12/2022; PCE n. 0603265-98.2022.6.21.0000, Relator Desembargador Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, DJe de 16/12/2022; PCE n. 0602861-47.2022.6.21.0000, Relatora Desembargadora Eleitoral Elaine Maria Canto da Fonseca, DJe de 13/12/2022; PCE n. 0602936-86.2022.6.21.0000, Relatora Desembargadora Eleitoral Kalin Cogo Rodrigues, DJe de 15/12/2022; PCE n. 0603217-42.2022.6.21.0000, Relator Desembargador Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, DJe de 11/12/2022.

Com essas considerações, reconheço a irregularidade em questão, a qual deve ser levada em consideração para o julgamento de aprovação ou rejeição das contas, entretanto deixo de determinar o recolhimento da importância de R$ 1.950,00 ao Tesouro Nacional.

Da malversação de verbas do FEFC

Em parecer conclusivo, a SAI apontou a utilização indevida de recursos públicos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), no valor total de R$ 12.036,93, devido à falta de apresentação de documentos fiscais comprovando as despesas, conforme estabelecido nos arts. 35 e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Colaciono a tabela constante do item 4.1 do exame técnico:

Entretanto, como bem assinalado pela douta Procuradoria Regional Eleitoral (ID 45486900), "os apontamentos indicados pela analista técnica merecem, contudo, ser parcialmente afastados, eis que parcela dos documentos fiscais comprobatórios de despesas realizadas com a fornecedora Janaina Saldanha Sehn, nos valores de R$ 3.900,00 e R$ 2.600,00, estão disponíveis na página do DivulgaCandContas do prestador, bem como a nota fiscal referente ao fornecedor Abastecedora de Combustíveis AR Ltda, no montante de R$ 1.870,27".

Ou seja, o montante de R$ 8.370,27 deve ser abatido do somatório de valores irregulares, porquanto comprovadas as despesas por meio do sistema da Justiça Eleitoral de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais.

Por outro lado, devem ser mantidas as glosas quanto aos dispêndios junto aos fornecedores Margo Grasiane de Oliveira (R$ 2.100,00) e Locadora de Veículos Lajeado Ltda. (R$ 1.566,66), totalizando R$ 3.666,66, na medida em que desacompanhados de documentos fiscais ou esclarecimentos a justificá-los, devendo o montante ser recolhido ao Tesouro Nacional, de acordo com o art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

É o entendimento sufragado por esta Corte:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO. DEPUTADO FEDERAL. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS ORIUNDOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. VERBA DE NATUREZA PÚBLICA. ALTO PERCENTUAL DAS FALHAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. 1. Prestação de contas apresentada por candidato não eleito ao cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas Eleições Gerais de 2022. 2. Aplicação irregular de recursos oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. 2.1. Contratos de prestação de serviços de militância em desacordo com a legislação de regência. Ausência das informações previstas no art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, quanto à identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas, da justificativa do preço contratado e da assinatura do candidato. Ausente justificativa específica sobre os contratos inquinados, remanescem as falhas apontadas no parecer conclusivo. Inviabilizada a fiscalização do conteúdo e dos requisitos legais dos contratos de prestação de serviço de militância, considera–se irregular a utilização de recursos originados do FEFC, impondo a devolução do valor ao Tesouro Nacional, consoante dispõe o § 1º do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19. 2.2. Ausência de comprovantes fiscais e identificação do candidato, em conflito com a norma. Tratando–se de serviços prestados por pessoas jurídicas, a falta de comprovante fiscal viola o art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual estabelece que a comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo, emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ, e endereço. Ausentes os comprovantes fiscais ou insuficientes as informações de que trata o art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/2019, impõe–se o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional. 3. As falhas representam 32,56% dos recursos recebidos pelo candidato em sua campanha, impondo o juízo de reprovação das contas, na forma do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19. 4. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS - PCE: 06031776020226210000 PORTO ALEGRE - RS, Relator: Des. Patricia Da Silveira Oliveira, Data de Julgamento: 28/09/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 180, Data: 02/10/2023.)

 

Por conseguinte, o total das irregularidades (FEFC e dívida de campanha) representa R$ 5.616,66, equivalente a 16,55% dos recursos recebidos pelo candidato em sua campanha (R$ 33.932,69), montante que extrapola os parâmetros fixados na jurisprudência desta Justiça Especializada, quando da aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, para formar juízo de aprovação com ressalvas da contabilidade (abaixo de R$ 1.064,10 e inferior a 10% da arrecadação financeira).

Logo, impõe-se a desaprovação das contas, devendo o valor de R$ 3.666,66 ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79 da citada Resolução TSE n. 23.607/19.

Em face do exposto, VOTO pela desaprovação das contas apresentadas por TIAGO DELWING PEDROSO, na forma do inc. III do art. 74 da Resolução TSE n. 23.607/19, e determino o recolhimento do valor de R$ 3.666,66 ao Tesouro Nacional, referente à aplicação irregular do FEFC.