REl - 0600182-94.2021.6.21.0134 - Voto Relator(a) - Sessão: 12/12/2023 às 09:30

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, trata-se de recurso interposto pelo DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO (PTB) de Canoas contra a sentença que desaprovou suas contas referentes ao exercício de 2020, em face do recebimento de doações de pessoas físicas não filiadas ao partido e ocupantes de função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, no total de R$ 37.724,00, considerados recursos de fonte vedada, tendo sido determinado, ainda, o recolhimento da importância irregular, acrescida de multa de 10% (ID 45546852).

No apelo, o recorrente postula a aprovação das contas com ressalvas com base na boa-fé e nos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, bem como a redução da multa, imposta no patamar de 10%.

Adianto que, na linha do parecer ministerial, o recurso merece provimento.

O percentual da falha, consubstanciada em recebimento de recursos de fonte vedada, no somatório de R$ 37.724,00, equivale a tão somente 2,56% da receita auferida pelo partido no exercício em questão, que alcançou R$ 1.473.621,38.

Assim, inexistindo indícios de má-fé, consoante a jurisprudência pacífica deste Tribunal e do Tribunal Superior Eleitoral, resta viabilizada a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, para o fim de aprovar com ressalvas as contas.

Nesse sentido, colaciono, a seguir, a título de ilustração, arestos do TSE e desta Corte:

ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. CONTAS APROVADAS COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas do Diretório Nacional do REDE, relativa à arrecadação e à aplicação de recursos financeiros na campanha eleitoral de 2020, regida pela Res.–TSE nº 23.607/2019.

1.1. O órgão técnico do TSE e o MPE opinaram pela aprovação, com ressalvas, das contas.

Irregularidade

2. Omissão de gastos na prestação de contas parcial

2.1. No pleito de 2020, as contas parciais deveriam ser apresentadas pelos partidos políticos entre os dias 21 e 25 de outubro de 2020, conforme disposto no art. 7º, V, da Res.–TSE nº 23.624/2020, que promoveu ajustes normativos nas resoluções aplicáveis às eleições municipais de 2020.

2.2. Consoante dispõe o art. 71, § 1º, I e II, da Res.–TSE nº 23.607/2019, a retificação das contas obriga o prestador a enviar o arquivo da prestação de contas retificadora pela internet, mediante o uso do SPCE, e a apresentar extrato da prestação de contas, acompanhado de justificativas e, quando cabível, de documentos que comprovem a alteração realizada.

2.3. No caso, a mídia eletrônica com os dados e documentos relativos à prestação de contas parcial retificadora não foi apresentada pelo partido. Entretanto, a omissão das despesas nas contas parciais foi sanada com a apresentação das contas finais.

2.4. Esta Corte Superior firmou entendimento, aplicável às eleições de 2020 e subsequentes, no sentido de que a omissão de informações em prestações de contas parciais e relatórios financeiros configura irregularidade, haja vista comprometer a transparência, a lisura e a confiabilidade das contas.

2.5. Na espécie, a omissão do registro de gastos nas contas parciais é única irregularidade que persiste, no valor de R$ 52.200,00, corresponde ao percentual de 0,18% dos recursos aplicados na campanha.

2.6. A inexpressividade do percentual da irregularidade apurada e a ausência de indícios de má-fé possibilitam a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade no julgamento das contas.

3. Conclusão: contas aprovadas com ressalvas.

(TSE, PCE n. 0601635-60.2020.6.00.0000/DF, Acórdão, Relator Min. Raul Araujo Filho, Publicação: DJE, Tomo 168, Data: 29.8.2023.) (Grifei.)

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. DOAÇÃO DE FONTE VEDADA. PERMISSIONÁRIO DE SERVIÇO PÚBLICO. NÃO REALIZADA A DEVOLUÇÃO DA QUANTIA AO DOADOR. BAIXO PERCENTUAL. APLICADOS OS POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas de candidato, referentes às Eleições Municipais de 2020, em virtude do recebimento de doação proveniente de permissionário de serviço público. Determinado o recolhimento da respectiva quantia ao Tesouro Nacional.

2. O art. 31, inc. III e seus parágrafos, da Resolução TSE n. 23.607/19, elenca as fontes vedadas aos partidos e candidatos, dentre elas, pessoas físicas permissionárias de serviço público. Não observado o comando previsto no § 3º do art. 31 da Resolução TSE n. 23.607/19, que prevê a imediata devolução dos valores ao doador originário, deve o valor equivalente ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 31, § 4º, c/c o art. 79, da Resolução TSE n. 23.607/19.

3. A falha corresponde a 5,2 % dos recursos arrecadados. Conforme jurisprudência consolidada nesta Casa, as contas devem ser julgadas aprovadas com ressalvas, por força da aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, quando inexistente má-fé do prestador e as irregularidades apuradas perfizerem montante absoluto inferior a R$ 1.064,10 ou representarem percentual menor que 10 % das receitas arrecadadas.

4. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS, REl n. 060092786, Acórdão, Relatora: Desa. Eleitoral Kalin Cogo Rodrigues, julgado em 28.4.2022, Publicação: DJE, Data: 03.5.2022.) (Grifei.)

 

Por consequência, sendo as contas aprovadas com ressalvas, impõe-se o afastamento da multa, a qual somente tem espaço em caso de desaprovação das contas, conforme dispõe expressamente o art. 48, caput, da Resolução TSE n. 23.604/19, verbis:

Art. 48. A desaprovação das contas do partido implicará a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento) (art. 37 da Lei nº 9.096/95).

 

Nesse particular, calha reproduzir julgados do TSE e do TRE-RS amparando a mesma compreensão:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. DIRETÓRIO NACIONAL. PODEMOS (PODE). EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

SÍNTESE DO CASO

1. Trata–se de prestação de contas do Diretório Nacional do Podemos (PODE) referente ao exercício financeiro de 2017, apresentada em 29.4.2018, com sugestões da Assessoria de Contas Eleitorais e Partidárias no sentido da desaprovação das contas.

[...]

16. O total de irregularidades com recursos do Fundo Partidário (R$ 597.303,29 – itens i, ii, iii e iv), especificamente em face da integralidade dos recursos do Fundo Partidário (R$ 6.293.980,04), corresponde a 9,49% dessas receitas, o que justifica, reputada a ausência de gravidade qualificada das falhas, sem comprometimento do ajuste contábil e em observância aos princípios da proporcionalidasde e da razoabilidade, a aprovação das contas, com ressalvas, com fundamento no art. 37 da Lei 9.096/95, c.c. o art. 46, II, da Res.–TSE 23.464.

17. A desaprovação das contas partidárias acarretava a sanção de suspensão de cotas futuras do Fundo Partidário e, com o advento da Lei 13.165/2015, a rejeição das contas passou a implicar "exclusivamente a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento)" (art. 37 da Lei 9.096/95, alterado pela Lei 13.165/2015).

18. No julgamento das PCs 0601752–56 e 0601858–18, DJE de 3.8.2020, prevaleceu a compreensão externada no voto do Ministro Luís Roberto Barroso, no sentido de que a interpretação lógica e sistemática do atual teor do art. 37 da Lei dos Partidos Políticos impõe que seja diferenciada a medida de recomposição do Erário, que não apresenta caráter sancionador; e da multa, essa sim, reprimenda aplicável em decorrência da rejeição das contas e apenas essa passível de desconto dos futuros repasses do fundo partidário. Precedentes: PC 0601849–56, rel. Min. Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, j. em 6.5.2021; PC 0600237–15, rel. Min. Sérgio Banhos, j. em 18.3.2021.

19. Na linha do voto condutor no indigitado leading case acerca dessa questão em específico, extrai–se que – sob nenhuma hipótese e com base em uma interpretação constitucional – poderia se admitir que o partido, ao não aplicar devidamente recursos públicos, pudesse recompor os valores irregulares ao erário mediante um simples decote nas futuras receitas oriundas do fundo partidário, independentemente do cumprimento da reprimenda pecuniária.

20. A devolução de valores tidos por irregulares diz respeito à recomposição dos cofres, não se tratando de sanção, mas de obrigação resultante das glosas apuradas na prestação de contas e resultantes da não aplicação do dinheiro público nas finalidades previstas no art. 44 da Lei 9.096/95, o que deve ser providenciado pelo próprio partido, com recursos próprios, conforme sempre se norteou a jurisprudência desta Corte Superior, orientação que deve ser mantida mesmo com o advento da Lei 13.165/2015.

CONCLUSÃO

Prestação de contas aprovadas, com ressalvas, com determinações.

(TSE, PC n. 0600410-73.2018.6.00.0000/DF, Acórdão, Relator Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE, Tomo 14, Data: 03.02.2022.) (Grifei.)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO 2019. DESAPROVAÇÃO. AFASTADA A PRELIMINAR. ALEGADA INAPTIDÃO DO RELATÓRIO CONCLUSIVO ELABORADO POR SERVIDOR PÚBLICO. ART. 34 DA LEI N. 9.096/95.

DOAÇÃO IDENTIFICADA COM O CNPJ DO PARTIDO. MANTIDA A FALHA. DOAÇÕES DE FONTE VEDADA. CONTRIBUINTES EXERCENTES DE CARGOS PÚBLICOS DE LIVRE NOMEAÇÃO E EXONERAÇÃO. NÃO FILIADOS AO PARTIDO BENEFICIÁRIO DAS DOAÇÕES. AFRONTA AO ART. 31, INC. V, DA LEI N. 9.096/95. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. BAIXO PERCENTUAL DAS FALHAS. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. MANTIDO O DEVER DE DEVOLUÇÃO AO ERÁRIO. AFASTADA A PENA DE MULTA. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Recurso contra sentença que desaprovou as contas de diretório municipal de partido político, referentes ao exercício financeiro de 2019, regidas pela Lei n. 9.096/95 e Resolução TSE n. 23.546/17 e, no âmbito processual, pela Resolução TSE n. 23.604/19.

[...]

6. Irregularidades que representam 6,99% da receita arrecadada no exercício financeiro, possibilitando o juízo de aprovação com ressalvas. Circunstância que não afasta o dever de devolução ao Tesouro Nacional do valor indevidamente recebido, afastando-se apenas a aplicação da multa, cabível somente nos casos de desaprovação.

7. Provimento parcial.

(TRE-RS, REl n. 060002194, Acórdão, Relator Des. Federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle, Publicação: DJE, Data: 18.10.2022.) (Grifei.)

 

Assim, em linha com o parecer ministerial, deve ser dado provimento ao recurso, para, reformando-se a sentença, aprovar com ressalvas as contas partidárias e afastar a imposição de multa.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento do recurso, para que as contas do DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO (PTB) de Canoas sejam aprovadas com ressalvas, com o afastamento da multa imposta, mantendo-se a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 37.724,00.