REl - 0600003-78.2021.6.21.0032 - Voto Relator(a) - Sessão: 05/12/2023 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

Trata-se de recurso eleitoral interposto pelo Ministério Público Eleitoral contra sentença exarada pelo Juízo da 32ª Zona Eleitoral - Palmeira das Missões/RS (ID 45447992), que julgou improcedente a Representação por Captação e Gastos Ilícitos de Recursos cumulada com apuração de abuso de poder econômico, na campanha eleitoral de 2020, proposta em desfavor de ENIO GILMAR DE ABREU GIACOMELLI, sob o fundamento de que o conjunto probatório trazido pelo autor e aquele produzido durante a instrução processual não foram suficientes para comprovar os ilícitos eleitorais apontados na inicial (ID 45447576).

Anoto que o candidato demandado alcançou a condição de suplente no pleito e, conforme constatei no sítio da internet da Câmara de Vereadores de Palmeira das Missões, o recorrido estava no exercício do mandato na data da consulta (13.11.2023 – https://www.palmeiradasmissoes.rs.leg.br/institucional/contato-eletronico-dos-vereadores).

Passo à análise da peça recursal.

 

1. Admissibilidade

A sentença foi prolatada no dia 09.3.2023, sendo lançada no sistema PJE em 10.3.2023, com o registro na aba “Expedientes” do Sistema PJE de 1º grau de que o prazo final para ciência do recorrente encerraria em 20.3.2023.

O Ministério Público Eleitoral registrou ciência da sentença em 20.3.2023, mesmo dia que interpôs o recurso, dentro, portanto, do tríduo legal do § 3º do art. 30-A da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 258 do Código Eleitoral. Logo, foi atendido o requisito extrínseco de admissibilidade recursal.

Assim, tendo em vista ser o recurso tempestivo e presentes os demais requisitos de admissibilidade, deve ser conhecido.

Passo à análise das preliminares suscitadas.

 

2. Preliminares

2.1. Do julgamento conjunto do REl n. 0600003-78.2021.6.0032 e do REl n. 0600781-82.2020.6.21.0032

Postula o recorrente o apensamento dos recursos eleitorais relativos às Representações n. 0600003-78.2021.6.0032 e n. 0600781-82.2020.6.21.0032, alegando que os fatos de que tratam os processos constituem desdobramento um do outro e que não podem ser considerados em um contexto isolado, uma vez que tramitaram em conjunto, inclusive, no que concerne à fase instrutória. Ainda, explana que as representações teriam sido individualizadas, apenas, para fins de sentença.

De fato, no processo judicial eleitoral existe a previsão de serem reunidas para julgamento comum as ações eleitorais propostas por partes diversas sobre o mesmo fato e, no caso, será competente para apreciá-las o juiz ou relator que tiver recebido a primeira, nos termos do art. 96-B da Lei n. 9.504/97.

Nesse contexto, cediço que a regra estabelecida no art. 96–B da Lei das Eleições se aplica às ações eleitorais cíveis, mas, para sua incidência, faz-se necessário que haja conexão apta a ensejar o julgamento conjunto dos feitos, com similitude de pedido ou causa de pedir.

Definidas tais premissas, cabe dizer que o recurso que ora se examina envolve apuração de captação e gastos ilícitos de recursos, prevista no art. 30-A da Lei n. 9.504/97. Por seu turno, o REl n. 0600781-82.2020.6.21.0032 tem por objeto a captação ilícita de sufrágio, determinado no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, cumulada com AIJE, por abuso de poder econômico. Portanto, como bem apontou a douta Procuradoria Regional Eleitoral, os referidos processos possuem causas de pedir distintas.

Mas, para além disso, entendo que os processos envolvem questões dos fatos um tanto quanto diversas, de modo que a regra supracitada não se aplica à hipótese dos processos em tela. Portanto, não cabendo a imposição de reunião dos processos.

Com efeito, ambos os recursos foram distribuídos a esta Relatoria, como referido pela Procuradoria Regional Eleitoral, “ainda que não se imponha obrigatoriamente a reunião dos processos, por questão de economia processual”, cabível sejam pautados para julgamento na mesma data, para análise na mesma sessão de julgamento.

Logo, desacolho o pedido de apensamento do REl n. 0600003-78.2021.6.0032 e do REl n. 0600781-82.2020.6.21.0032. Mas, por haver possibilidade, cabe serem pautados para julgamento na mesma sessão, devendo assim se proceder.

 

2.2. Das preliminares suscitadas em contrarrazões

O recorrido ÊNIO GILMAR DE ABREU GIACOMELLI, em suas contrarrazões recursais, argui a nulidade da juntada de memoriais a destempo pelo Ministério Público Eleitoral. Também afirma a nulidade do compartilhamento de provas ocorrido no presente feito, sustentando que “a mesma não passou pelo crivo do contraditório, foi obtida em processo envolvendo terceiras pessoas, não foi juntada a cadeia de custódia da referida prova nestes autos para se verificar a sua integralidade e nem mesmo toda a sequência de decisões judiciais e requerimentos do Ministério Público ou da Autoridade Policial que ensejaram a obtenção, o uso e o compartilhamento”.

Na linha de precedente desta Corte, o “conhecimento das preliminares trazidas em contrarrazões deve ficar condicionado ao provimento do recurso principal, o que seria hábil a fazer surgir o interesse em recorrer, sob pena de admitir, mesmo em tese, a possibilidade de reforma da sentença em prejuízo da única parte que recorreu” (Recurso Eleitoral n. 060000135, Acórdão, Relatora Des. VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 2, Data: 10.01.2023).

Além da barreira constante no precedente, é de se considerar que o prazo para juntada de memoriais não é preclusivo e que a questão do compartilhamento de provas foi devidamente apreciada em primeira instância (decisão de ID 45447952 e reafirmação em sentença). Também o entendimento jurisprudencial do Tribunal Superior Eleitoral sobre o compartilhamento de provas nas ações eleitorais é de que “não há óbice à utilização de prova emprestada em feitos eleitorais, admitindo–se, em AIJE, o compartilhamento de provas produzidas inclusive em procedimento investigativo criminal, desde que resguardados os postulados do contraditório e da ampla defesa no processo em que tais provas serão aproveitadas” (TSE, AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 060039833, Acórdão, Relator Min. Raul Araújo Filho, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 152, Data: 08.8.2023).

Assim, as preliminares formuladas em contrarrazões não devem ser conhecidas.

 

3. Do mérito

Na petição inicial, o Ministério Público Eleitoral propõe Representação por Captação e Gastos Ilícitos cumulada com apuração de Abuso de Poder Econômico na campanha eleitoral de 2020.

A alegação da exordial é de que ENIO GILMAR DE ABREU GIACOMELLI, então candidato a vereador nas eleições 2020 no Município de Palmeira das Missões, teria praticado a conduta de captação ilícita de recursos, tendo por fundamento fático, conforme descrito na sentença, “a alegação de que o representado utilizou em sua campanha eleitoral valores não declarados à Justiça Eleitoral, notadamente recursos oriundos de um empréstimo de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais), obtido por Ênio junto à CRESOL (Ids. 80427151 e 80427155), em 26 de outubro de 2020, cujo valor – ou parcela dele – teria sido utilizado para o pagamento de despesas de campanha, sem que isso fosse informando na prestação de contas eleitoral (PCE n° 0600603-36.2020.6.21.0032)”, e, com isso, violado o disposto no previsto no art. 30-A da Lei n. 9.504/97.

O dispositivo em comento tem a seguinte redação:

Art. 30-A. Qualquer partido político ou coligação poderá representar à Justiça Eleitoral, no prazo de 15 (quinze) dias da diplomação, relatando fatos e indicando provas, e pedir a abertura de investigação judicial para apurar condutas em desacordo com as normas desta Lei, relativas à arrecadação e gastos de recursos.

§ 1o Na apuração de que trata este artigo, aplicar-se-á o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990, no que couber.

§ 2o Comprovados captação ou gastos ilícitos de recursos, para fins eleitorais, será negado diploma ao candidato, ou cassado, se já houver sido outorgado.

§ 3o O prazo de recurso contra decisões proferidas em representações propostas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial.

 

O art. 30-A da Lei das Eleições trata da captação e dos gastos ilícitos de recursos, ambos com finalidade eleitoral.

Portanto, para a incidência da norma, o ingresso e o dispêndio do valor financeiro na campanha eleitoral há de ser realizado em desacordo com o disposto na Lei n. 9.504/97, especificamente no que concerne às regras reguladoras da arrecadação e dos gastos de recursos durante a campanha.

Nestes termos, a ilicitude poderá estar na forma de recebimento de recursos que seriam, em princípio, lícitos – por exemplo, valores que não tenham transitado pela conta obrigatória do candidato, consoante o art. 22, caput, da Lei n. 9.504/97, ou, ainda, no recebimento de recursos ilícitos em si mesmos, v.g., doação efetuada por concessionário ou permissionário de serviço público - fonte vedada, conforme o art. 24 do mesmo diploma, desde que comprovada a gravidade e o impacto na disputa eleitoral.

O bem jurídico protegido é a lisura da campanha eleitoral, mas a representação fundada no art. 30-A da Lei n. 9.504/97 visa assegurar não só a moralidade e a lisura do pleito eleitoral, como também a igualdade entre os candidatos.

Logo, o comando legal busca evitar o desequilíbrio da disputa entre os candidatos. De modo reflexo, há o prestígio da transparência na arrecadação e nos gastos dos concorrentes que participam do processo eleitoral com obediência às normas da Lei Eleitoral.

Para a configuração do ilícito previsto art. 30-A da Lei n. 9.504/97, é necessária a avaliação da relevância jurídica do evento, uma vez que a cassação do mandato ou do diploma deve ser proporcional à gravidade da conduta e à lesão ao bem jurídico protegido pela norma. Dessa forma, não se trata de examinar apenas se houve irregularidades censuráveis na prestação de contas do candidato. Importa verificar se tal irregularidade foi relevante a ponto de impor ao candidato a cassação devida.

Segundo a firme jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, para a procedência do pedido formulado na representação pelo art. 30–A da Lei n. 9.504/97 é necessário aferir a gravidade da conduta reputada ilegal, que pode ser demonstrada tanto pela relevância jurídica da irregularidade quanto pela ilegalidade qualificada, marcada pela má–fé do candidato (Recurso Especial Eleitoral n. 060006324, Acórdão, Relator Min. Mauro Campbell Marques, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 175, Data: 09.9.2022).

Com essa contextualização normativa e jurisprudencial, passo ao exame da moldura fático-probatória.

Inicio por referir que a exordial expressamente afirma que o demandado utilizaria recursos provenientes de atividades ilícitas na sua campanha eleitoral, porquanto essa seria custeada por integrantes de organização criminosa.

Em outra oportunidade, quando esta Corte julgou fatos em que candidato supostamente ligado à organização criminosa “Os manos”, atuante no Rio Grande do Sul, teria utilizado valores provenientes da aludida facção para custeio de sua campanha eleitoral, tive oportunidade de manifestar minha preocupação com a utilização de recursos oriundos dessas fontes ilícitas, bem como a necessidade da severa aplicação e execução das regras legais por parte da Justiça Eleitoral nessas situações (Recurso Eleitoral 060015594/RS, Relatora Desa. Eleitoral ELAINE MARIA CANTO DA FONSECA, Acórdão de 03.8.2023, Publicado no Diário de Justiça Eletrônico-147, data: 14.8.2023).

Diversamente da posição que adotei no exame do caso mencionado, tenho que aqui o acervo probatório não demonstrou que eventuais atividades ilícitas desenvolvidas pelo candidato ou seus familiares estivessem relacionadas com a campanha eleitoral.

Sobre o tema, José Jairo Gomes ensina que:

“Os candidatos e partidos políticos necessitam de recursos para se divulgarem e se aproximarem do eleitorado, exporem suas ideias e projetos, de maneira a captarem os votos necessários para vencerem o pleito, ascenderem aos postos estatais e, pois, se investirem ou se manterem no poder político. Para tanto, é essencial que tenham acesso a dinheiro e canais de financiamento. É impensável a realização de campanha eleitoral sem dispêndio de recursos, ainda que pouco vultosos.

Normalmente, são arrecadadas e gastas – de forma legal e ilegal – elevadíssimas somas pecuniárias, o que é particularmente notório em eleições majoritárias para o Poder Executivo.

E o que é mais grave e preocupante: boa parte do dinheiro efetivamente gasto em campanhas eleitorais tem origem ilícita, emanando da corrupção envolvendo agentes estatais e pessoas privadas, do desvio de recursos do Estado, de caixa 2, de organizações criminosas etc. Em geral, os valores oficialmente declarados como gastos de campanha correspondem a apenas uma parte do montante realmente despendido. Note-se que uma doação oficial de campanha pode ser lícita ou não; será ilegal ou ilícita quando for vedada ou sua origem for criminosa. Como a origem do recurso doado em regra não é objeto de investigação, as contas do candidato podem ser regularmente prestadas e aprovadas pela Justiça Eleitoral – sem que isso afaste a origem criminosa dos recursos.

É certo que se dinheiro é necessário para o financiamento da democracia, também pode ser usado como instrumento para indevida influência no processo eleitoral e nas decisões políticas. Por isso, como afirma Speck (2007, p. 154), a diminuição de sua importância na disputa político-eleitoral “coincide com o ideal de uma relação mais orgânica e consciente entre os partidos políticos e o seu eleitorado”.

Afinal, o uso de recursos ilícitos torna ilegítima qualquer eleição, além de oportunizar que espúrios financiadores privados cooptem agentes públicos e exerçam indevida influência na esfera estatal.

Por isso, é de fundamental importância haver abertura e transparência quanto à veraz origem e destino de todos os recursos efetivamente empregados no financiamento de campanhas políticas.

Daí a necessidade de haver estrita regulamentação, bem como severa aplicação e execução das regras legais por parte da Justiça Eleitoral.

(Direito eleitoral – 16. ed. – São Paulo: Atlas, 2020) (Grifos meus)

Quando do comento do art. 30-A da Lei das Eleições, o doutrinador reconhece as dificuldades impostas à Justiça Eleitoral para conhecer a extensão de irregularidades relacionadas, por exemplo, à utilização de recursos de fontes não declaradas e de caixa dois, tecendo o seguinte apontamento:

“É grave a conduta de quem se afasta da regulamentação estabelecida para o financiamento de campanha, seja percebendo contribuição de fonte vedada, seja lançando mão de recursos oriundos de fontes não declaradas, de caixa dois, seja, enfim, extrapolando os limites de gastos adrede fixados. A ocorrência de tais fatos revela que a campanha se desenvolveu por caminhos tortuosos, obscuros, sendo, muitas vezes, impossível à Justiça Eleitoral conhecer toda a extensão da irregularidade. Despiciendo dizer que o mandato assim conquistado é ilegítimo. “

 

Pois bem, o exame do conjunto probatório bem demonstra os desafios enfrentados na produção da prova no caso em análise.

E é justamente na análise dos elementos de prova, tendo em mente a referida impossibilidade de a “Justiça Eleitoral conhecer toda a extensão da irregularidade”, que se dá a inviabilidade de alterar o resultado da decisão a quo.

Nesse panorama, a tese recursal está amparada precipuamente no Procedimento Preparatório Eleitoral acerca de apoio de organização criminosa ao candidato ÊNIO GIACOMELLI, bem como decorrendo a instauração de PIC para apuração do crime de tráfico de drogas e obtenção de medida judicial. Ocorre que tais provas não foram confirmadas em juízo, não tendo o condão de modificar a solução sentencial ante a ausência de provas hábeis a demonstrar o liame subjetivo entre ÊNIO e a captação e utilização de recursos oriundos de fontes ilícitas, como os de organizações criminosas, comprovações essas que seriam indispensáveis para a incidência das sanções previstas no art. 30-A da Lei n. 9.504/97.

Da mesma forma, entendo, desde logo, que as provas efetivamente produzidas nos autos relativas à obtenção de empréstimo que teria sido utilizado em campanha eleitoral, cujos valores não teriam sido declarados à Justiça Eleitoral, a violar o disposto no art. 30-A da Lei n. 9.504/97, não foram suficientes em demonstrar a ocorrência de fatos que pudessem conduzir ao reconhecimento da ilegitimidade do diploma obtido pelo recorrido ENIO GILMAR DE ABREU GIACOMELLI.

Passo então a tratar da questão do exame da prova dos autos sobre as supostas condutas descritas como configuradoras dos ilícitos eleitorais, ou seja, a alegação de que o recorrido teria realizado atos de arrecadação e gastos ilícitos durante sua campanha eleitoral, sintetizados na sentença como utilização “em sua campanha eleitoral valores não declarados à Justiça Eleitoral, notadamente recursos oriundos de um empréstimo de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais), obtido por Ênio junto à CRESOL (Ids. 80427151 e 80427155), em 26 de outubro de 2020, cujo valor – ou parcela dele – teria sido utilizado para o pagamento de despesas de campanha, sem que isso fosse informando na prestação de contas eleitoral (PCE n° 0600603-36.2020.6.21.0032)”.

Especificadamente, o recorrente alega que

[…] o representado, com auxílio de familiares e amigos (cita o empresário Luís Carlos Pietrobelli) teria recebido dinheiro para formação de “caixa 2”, ou seja, recursos não declarados em sua prestação de contas apresentada à Justiça Eleitoral. Sustenta que, em 26/10/2020, Ênio obteve um empréstimo de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais) junto à CRESOL, para gastar em sua campanha eleitoral. Deste valor, R$ 1.000,00 (um mil reais) foram utilizados para conserto do motor do veículo de seu filho (FIAT/Uno), Rafael Eduardo Moreira Giacomelli, o qual foi utilizado para fornecer caronas e viagens em benefício de eleitores do município, a exemplo de Neiva Suzana Cruz dos Santos, cadeirante, que foi transportada, em troca de seu voto, até a agência da Caixa Econômica Federal de Palmeira das Missões/RS; R$ 862,00 (oitocentos e sessenta e dois reais) foram transferidos para Diego Reus Cristóvão, para fins de pagamento de “marmitas e bebidas” em seu estabelecimento comercial, indicando que o representado teria feito a distribuição de tais gêneros a eleitores, em troca do voto, ou a cabos eleitorais engajados em sua campanha; R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) foram depositados na conta da esposa de Luís Carlos Pietrobelli, seu apoiador e fornecedor durante a campanha eleitoral. Sustentou a existência de alguns saques em dinheiro (R$ 2.000,00, R$ 1.000,00 e R$ 900,00), cuja destinação não foi esclarecida pelo representado, havendo indícios que tais valores foram utilizados para o pagamento de despesas eleitorais não declaradas. Alega que, em que pese a citado movimentação financeira, o representado declarou à Justiça Eleitoral receitas totais de R$ 5.831,50 (cinco mil, oitocentos e trinta e um reais e cinquenta centavos), dos quais R$ 2.000,00 (dois mil reais) são de recursos próprios, R$ 2.000,00 (dois mil reais) são oriundos de FEFC e R$ 1.831,50 (um mil, oitocentos e trinta e um reais e cinquenta centavos) são oriundos de doações de pessoas físicas. Sustentou que, através de interceptações telefônicas, obteve-se a informação sobre a confecção de 3 mil ou 30 mil adesivos em prol de sua candidatura, sem que a despesa tenha sido declarada em sua prestação de contas, tampouco comprovada através da juntada da respectiva nota fiscal, bem como realizada a compra de bandeiras e adesivos (“dezoito adesivos” “dos grandes”) do município de Passo Fundo-RS, cuja despesa também não foi declarada.

ENIO GILMAR DE ABREU GIACOMELLI, em apertada síntese, sustenta que as informações do Relatório Técnico n 003/20 datado de 14.9.2020 apontadas pelo Ministério Público de 1º grau, relativas a tráfico de drogas, ameaças, constrangimento ilegal e outros crimes durante a campanha eleitoral, não foram comprovadas, conforme o relatório policial e, em decorrência, nenhuma ilicitude teria sido perpetrada. Afirma que foi apenas constatado que o recorrido possui armas, porém todas devidamente registradas em seu nome e acompanhadas da competente documentação necessária. Aduz que sua rede social é aberta e que qualquer um pode seguir e comentar, bem como que não há ligação com seus simpatizantes e pessoas que estariam cometendo crimes de ameaça. Afirma ser caso de lawfare, onde o Ministério Público escolheu “seu adversário/bode expiatório”.

Na mesma peça de contrarrazões, o recorrido traz razões de defesa, afirma ter contraído um empréstimo de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais) no Banco Cresol para dar prosseguimento em suas atividades comerciais e arcar com gastos pessoais e de sua família. Reitera que todas as receitas e despesas com a campanha eleitoral foram regularmente prestadas à Justiça Eleitoral, que aprovou as suas contas. Quanto às despesas com material de campanha, adesivos e bandeiras reprisa que a Justiça Eleitoral corretamente aprovou as contas do candidato.

Apenas a título de esclarecimento, anoto que o candidato apresentou, na mesma peça, contrarrazões no tocante à imputação de captação ilícita de sufrágio, infração prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, a qual é objeto do processo n. 0600781-82.2020.6.21.0032, que igualmente recebeu juízo de improcedência na origem, tendo havido interposição de recurso pelo Ministério Público Eleitoral, processo a ser julgado conjuntamente a este.

No caso destes autos digitais, entretanto, consoante o judicioso parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, é de ser mantida a sentença de improcedência, pois não comprovada utilização de recursos não declarados na campanha, fundamentos os quais, a fim de evitar tautologia, adoto como razões de decidir:

[…]

No caso, a conduta apontada como captação ilícita de recursos encontraria lastro fático na obtenção de empréstimo junto ao banco CRESOL, durante o período eleitoral, contudo nada indica irregularidade na contratação realizada pelo candidato junto à instituição financeira cooperativa. Quanto à informação de que PIETROBELLI, que se declarou amigo de ÊNIO, teria lhe emprestado, em data anterior, o valor de R$ 8.000,00, nada foi apurado nos autos, sendo que tal conduta não é irregular e, tampouco, há qualquer indício de uso na campanha eleitoral.

No tocante às condutas que configurariam gastos ilícitos de recursos na campanha eleitoral, intenta buscar lastro fático na destinação dos recursos oriundos do empréstimo junto à instituição financeira CRESOL, no valor de R$ 35.000,00, durante o período eleitoral, ao que se resume a controvérsia.

No ponto, a prova carreada ao feito após dois anos de investigação não teve o condão de demonstrar a prática de nenhuma das condutas imputadas ao representado ÊNIO, o que se depreende dos frágeis diálogos obtidos nas interceptações telefônicas, pela ausência de prova de uso do empréstimo com finalidade eleitoral e das oitivas das testemunhas e informantes ouvidos em sede judicial.

Salienta-se que ÊNIO obteve o empréstimo, como o próprio representado informa, contudo não há comprovação de que tenha utilizado o dinheiro para constituição de “Caixa 2” para custear gastos eleitorais não declarados na prestação de contas.

A propósito, as contas eleitorais do candidato, ora representado, foram aprovadas, conforme se constata nos autos do processo nº 0600603-36.2020.6.21.0032 (ID 76776805), cumprindo ressaltar que não houve impugnação no prazo legal.

[...]

Com efeito, verifica-se ausência de provas de gastos não declarados na contabilidade de campanha que, somados aos depoimentos juntados ao feito, resultam na não comprovação de aporte financeiro a desbordar na ocorrência de captação ilícita de recursos ou de valores proveniente de facção criminosa.

Assim, os fatos não se encontram demonstrados de forma cabal, e as graves alegações do recorrente não podem ser presumidas, não havendo como acolher o recurso para aplicar a gravíssima sanção de cassação do diploma do candidato, destacando-se que tal medida requer conjunto probatório consistente e induvidoso, uma vez que implica o afastamento do resultado das urnas, expressão máxima da soberania popular.

Nesse sentido posiciona-se a jurisprudência do egrégio Tribunal Superior Eleitoral, segundo a qual, para caracterizar-se o ilícito, exige-se prova robusta e contundente da utilização de recursos ilícitos na campanha eleitoral:

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. ART. 30-A DA LEI N° 9.504/97.CAPTAÇÃO ILÍCITA DE RECURSOS. DOAÇÃO POR PESSOA FÍSICA SEM CAPACIDADE ECONÔMICA. ARRECADAÇÃO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. AUSÊNCIA DE GRAVIDADE SUFICIENTE PARA MACULAR A LISURA DO PLEITO ELEITORAL. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO PARA JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO FORMULADO NA REPRESENTAÇÃO, AFASTANDO-SE A CASSAÇÃO DO MANDATO DO RECORRENTE.

1. O art. 30-A da Lei das Eleições visa coibir práticas ilícitas relativas ao uso de recursos financeiros em campanhas eleitorais que possam acarretar o comprometimento da lisura do pleito e o desequilíbrio entre os candidatos na disputa.

2. A relevância jurídica dos fatos impugnados, ou a gravidade deles, é balizadora da incidência da severa penalidade de cassação do diploma de candidato eleito, razão pela qual o ilícito descrito no indigitado art. 30-A não se confunde com irregularidades contábeis apuradas em processo próprio de prestação de contas, as quais, se detectadas, ensejam, naquela seara, as consequências apropriadas.

3. É assente neste Tribunal Superior que a doação eleitoral, realizada por pessoa física sem capacidade econômica, configura captação de recursos de origem não identificada, apta a caracterizar o ilícito inscrito no art. 30-A da Lei n° 9.504/97, desde que o fato consubstancie ilegalidade qualificada ou possua relevância jurídica suficientemente densa para macular a lisura do pleito. Precedentes. Na hipótese dos autos, a arrecadação de recursos de origem não identificados.

4. Na hipótese dos autos, a arrecadação de recursos de origem não identificada no valor de R$6.000,00 (seis mil reais), afigura-se inapta para atrair a reprimenda contida no art. 30-A da Lei n. 9.504/97, visto que não se verifica a gravidade da doação ilegal no contexto da campanha eleitoral. Com efeito, embora reprovável, a irregularidade não repercute substancialmente no contexto da campanha para vereador na cidade de São Paulo, a ponto de violar o bem jurídico tutelado pela norma proscrita no art. 30-A e, via de consequência, acarretar a cassação do diploma/mandato do candidato.

5. Recurso especial provido, para julgar improcedente o pedido formulado na representação e afastar a sanção de cassação do diploma, imposta a Camilo Cristófaro Martins Júnior.

(Recurso Especial Eleitoral nº 179550, Acórdão, Relator(a) Min. Edson Fachin, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 25/08/2020, Página 180) (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. DEPUTADO ESTADUAL. REPRESENTAÇÃO. ART. 30-A DA LEI 9.504/97. ARRECADAÇÃO E GASTOS ILÍCITOS DE CAMPANHA. OMISSÕES DE DESPESAS E DE RECEBIMENTO DE RECEITAS ESTIMÁVEIS EM DINHEIRO. AUSÊNCIA DOS ELEMENTOS CARACTERIZADORES DA CONDUTA ILÍCITA. SÍNTESE DO CASO

1. O Tribunal a quo, por unanimidade, julgou improcedente a representação eleitoral com base no art. 30-A da Lei 9.504/97, em razão da ausência de prova robusta e contundente de utilização em campanha de recursos oriundos de fonte vedada ou de prática de "caixa dois".

2. Por meio da decisão agravada, negou-se provimento ao recurso ordinário, mantendo-se o acórdão regional e, consequentemente, a improcedência da representação.

ANÁLISE DO AGRAVO REGIMENTAL

3. A Corte de origem examinou, uma a uma, as falhas arguidas na ação proposta e afirmou que não se vislumbra, por si só, gravidade suficiente para ensejar a cassação do mandato do representado, ainda mais que nem sequer restou demonstrada, mediante a apresentação de prova robusta e contundente, a utilização em campanha de recursos de fonte vedada ou a prática de 'caixa dois', tendo sido apenas reconhecidos os seguintes fatos: a) a omissão na prestação de contas das receitas/despesas relativas à cessão de uso do local utilizado pelo comitê de campanha; b) de palco, sonorização, iluminação, banheiros químicos e fechamento no evento denominado "Grande Caminhada";c) de palco no evento denominado caminhada "homens X Mulheres";d) de impulsionamento com a página oficial do candidato no Facebook e Instagram;e) prestação de serviço de locutor realizada pelo radialista Sidney Sérvulo.

4. O acórdão regional teve por fundamento a orientação consolidada por este Tribunal Superior, no sentido de que a procedência da representação com fundamento no art. 30-A da Lei 9.504/97 depende da efetiva comprovação de ilícitos que ultrapassem o âmbito contábil e comprometam, de forma contundente, a moralidade da eleição.

5. Embora tenha ficado demonstrada a existência de irregularidades insanáveis, em razão de omissões de despesas e de recebimento de recursos estimáveis em dinheiro, não há elementos probatórios robustos que evidenciem, de forma segura e inequívoca, a ilicitude da captação de recursos ou dos gastos de campanha, apta a macular a lisura do pleito.

6. Conforme consignado na decisão agravada, não é possível extrair de nenhuma das irregularidades detectadas, com a certeza necessária, de que as irregularidades foram decorrentes de má-fé do candidato, ou, ainda, que elas tenham gravidade suficiente para interferir na higidez do processo eleitoral.

7. "O art. 30-A da Lei nº 9.504/1997 incide sobre a captação ou o gasto de recursos, para fins eleitorais, que se dê em desacordo com as normas legais aplicáveis" e, para a procedência do pedido, "é preciso, ainda, aferir a gravidade da conduta reputada ilegal, que pode ser demonstrada tanto pela relevância jurídica da irregularidade quanto pela ilegalidade qualificada, marcada pela má-fé do candidato" (AgR-REspe 310-48, rel. Min. Jorge Mussi, redator designado para o acordão, Ministro Luís Roberto Barroso, DJE de 25.8.2020).

8. As irregularidades constatadas em determinados gastos de campanha não têm gravidade suficiente para ensejar a cassação do diploma do deputado recorrido, na medida em que não ficou comprovada a utilização de recursos de fontes vedadas ou a prática de "caixa dois".

CONCLUSÃO

A gravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Ordinário nº 060000507, Acórdão, Relator(a) Min. Sérgio Banhos, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 194, Data: 28/09/2020) (Grifei.)

Em sequência, na mesma linha, irretocável a sentença prolatada pelo douto magistrado a quo, Dr. Davi de Souza Lopes, que, em percuciente e bem fundamentada análise, entendeu pela ausência de elementos comprobatórios mínimos para caracterização da alegada captação ilícita de recursos, por parte do recorrido, a qual, igualmente, agrego às minhas razões de decidir:

Para o Ministério Público Eleitoral, além dos valores declarados à Justiça Eleitoral, o representando utilizou-se de recursos de suas contas pessoais para a realização de arrecadação e gastos em benefício de sua campanha, violando as diretrizes da Lei 9.504/97 e da Resolução TSE 23.607/2019.

Em relação à movimentação financeira ocorrida na conta bancária número 016.480-1, da agência 5605-7, da CRESOL, na qual foi creditado o valor do empréstimo obtido pelo representado, além do montante transferido para a conta de Ênio na Caixa Econômica Federal, o Ministério Público Eleitoral destaca, em especial, a existência de dois gastos que, embora não tenham sido declarados na prestação de contas de campanha, configurariam despesas eleitorais: i) cheque de R$ 1.000,00 (um mil reais) creditado em favor de Plínio Alberti do Nascimento Vargas (Id. 80427160); ii) cheque de R$ 862,00 (oitocentos e sessenta e dois reais) creditado em benefício de Diego Reus (Ids. 80427161 e 80427162.

Segundo o representante, o cheque de R$ 1.000,00 (mil reais) foi emitido pelo representado em favor de Plínio Alberti do Nascimento Vargas, para fins de pagamento do conserto do motor do veículo de seu filho (FIAT/Uno), Rafael Eduardo Moreira Giacomelli, utilizado para fornecer caronas e viagens em benefício de eleitores do município, em troca de votos para Ênio Giacomelli. Por sua vez, o cheque de R$ 862,00 (oitocentos e sessenta e dois reais) foi entregue a Diego Reus Cristóvão em contrapartida ao pagamento de “marmitas e bebidas” em seu estabelecimento comercial, distribuídas a eleitores, em troca do voto, ou a cabos eleitorais engajados em sua campanha.

Além de tais pagamentos, efetuados através de cheques, o representante destaca, ainda, os saques, em dinheiro, de R$ 900,00 (novecentos reais), realizado em 30/10/2020, e de R$ 3.000,00 (três mil reais), realizado no dia 11/11/2020, ou seja, a quatro dias do pleito eleitoral, alegando terem sido utilizado para o custeio de despesas de campanha, não declaradas à Justiça Eleitoral.

As alegações do Ministério Público Eleitoral, de que tais valores – cheques bancários emitidos e valores em espécies sacados – foram utilizados para o pagamento de despesas eleitorais não declaradas pelo candidato Ênio em sua prestação de contas, não restaram devidamente comprovadas nos autos.

Da mesma forma, as alegadas irregularidades de arrecadação e gastos eleitorais, referentes a valores contidos na conta bancária nº 00025391-4, da agência 492, da Caixa Econômica Federal, de titularidade do representado, também não foram comprovadas.

Visando esclarecer a movimentação financeira ocorrida na conta da Caixa Econômica Federal, para a qual o representado transferiu o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) do valor obtido por empréstimo da CRESOL, a instituição financeira enviou o ofício de Id. 104607728 e o extrato eletrônico de Id. 104607727, que retrata a movimentação financeira realizada por Ênio no período de 01/10/2020 a 30/12/2020. Além disso, enviou o documento de Id. 104607726, que contém a relação dos dados de bancos, agências e contas bancárias beneficiadas por cheques bancários emitidos pelo representado e que foram compensados na conta bancária.

Diante de tais documentos, o Ministério Público Eleitoral requereu a identificação nominal, pelas instituições financeiras, das pessoas beneficiadas com os cheques emitidos pelo representado, referentes à conta bancária da Caixa Econômica Federal (Id. 100376713), o que restou deferido por este juízo eleitoral (Id. 100378125). Em resposta, foram apresentadas as seguintes informações:

i) Id. 106415133 – enviada pelo Banco do Brasil S.A. – informando que não foram localizadas as contas bancárias nº 14488-7 e 2048-5, da agência 0321;

ii) Id. 106528471 – enviada pelo Banco Bradesco S.A. – informando que a conta bancária nº 615-7, da agência 0584, pertence a Alberti Comércio de Alimentos Ltda (CNPJ: 072316342/0001-26), de sócios: Valdomiro Alberti e Amarildo Alberti;

iii) Id. 106529419 – enviada pelo Sicredi – informando que as contas bancárias elencadas no ofício pertencem, respectivamente, a: 1) conta nº 0011259-3, da agência 1061 – Alcides Mallmann (CPF: 460.935.080-72); 2) conta nº 0024021-8, agência 5578 – Apolus Marques Ribeiro EPP (CNPJ: 94.218.781/0005-62); 3) conta nº 0062227-3, agência 1268 – Irmãos Merten Ltda. ME (CNPJ: 01.049.975/0001-77); 4) conta nº 0028968-8, agência 5578 – Aline Barc LTDA (CNPJ: 35.686.595/0001-65); 5) conta nº 0091099-6, agência 1089 – Distribuidora de Alimentos Riograndense EIRELI (CNPJ: 09.428.216/0001-27); 6) conta nº 0032891-0, agência 1057 – Comércio de Combustíveis Seberi LTDA (CNPJ: 10.571.788/0001-40); 7) conta nº 1322322-2, agência 0100 – Não localizada; 8) conta nº 0018235-3, agência 5615 – Sérgio Locatelli Brizolla (CPF: 891.988.670-91); e 9) conta nº 0028726-0, agência 1185 – Ubiratan Camargo (CPF: 021.443.420-67);

iv) Id. 106808922 – enviada pelo Banco Santander S.A. – informando que a conta bancária 033-1238-10117312 pertence a Fábio Luis Fracasso (CPF:034.301.159-06);

Embora identificadas as pessoas que receberam os valores oriundos das contas bancárias de Ênio, não ficou suficientemente esclarecido nos autos quais pagamentos referem-se aos alegados gastos de campanha, que não foram declarados na prestação de contas eleitoral, e quais referem-se ao pagamento de despesas ordinárias do representando, sem qualquer vinculação à sua campanha eleitoral de 2020, ônus que cabia ao representante.

Também não ficou suficientemente demonstrado que o valor de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais), obtido pelo representado em empréstimo junto à CRESOL, foi utilizado, ainda que parcialmente, em sua campanha eleitoral.

Ouvido pelo Ministério Público Eleitoral, em depoimento prestado no dia 15 de dezembro de 2020, referente a tais fatos, o representado Ênio sustentou que fez um empréstimo de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais), junto à cooperativa CRESOL, tendo transferido R$ 15.000,00 (quinze mil reais) para sua conta na Caixa Econômica Federal, onde tinha pendências; que pegou o valor emprestado para forma “capital de giro” para sua empresa (“tele-ceva”); que, deste valor, pagou R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) para Pietrobelli, referente a um empréstimo anterior; que o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) sacado no dia 11/11/2020 foram utilizados para o pagamento da prestação de um caminhão; que sacou mais R$ 2.000,00 (dois mil reais), no mesmo dia, para o pagamento da mesma prestação; que Pietrobelli intermediou o empréstimo, por ser conhecido do gerente do banco; que a urgência para a obtenção do crédito decorre da necessidade de pagar suas contas pessoais e as da empresa (Id. 80427200 – fls. 11-16).

No dia 25 de fevereiro de 2021, o representado Ênio prestou novo depoimento ao Ministério Público Eleitoral, oportunidade em que sustentou que, em relação ao cheque nº 000006, no valor de R$ 1.000,00 (um mil reais), depositado para Plínio Alberti do Nascimento Vargas, informa que refere-se ao pagamento da reforma do motor de um automóvel FIAT/Uno, pertencente a seu filho Rafael, não recordando se houve a emissão de nota fiscal pelo serviço; que em relação ao cheque nº 000007, no valor de R$ 862,20 (oitocentos e sessenta e dois reais e vinte centavos), depositado para Diego Reus Cristóvão, informa que refere-se ao pagamento de “marmitas”, “chopp e caipiras”, sendo que o declarante tem uma ficha no comércio de Diego e faz o pagamento depois de determinado período de tempo; que em relação ao cheque nº 000008, no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), depositado para José Ênio Machado Fortes, refere-se ao pagamento de prestações de uma GM/Blazer, comprada de José, sendo devido, ainda, entre R$ 3.500,00 e R$ 4.000,00 a ele; que o declarante possui uma “garagem de veículos” e já revendeu o citado carro para terceiros; que a negociação foi feita verbalmente, não havendo um contrato formalizado; que não recorda do que se trata o cheque nº 000009, no valor de R$ 200,00 (duzentos reais), recordando que Rogério, nome que consta no verso da cártula, refere-se ao pagamento da reforma de uma cocheira de cavalo; que em relação ao cheque nº 000005, no valor de R$ 50,00 (cinquenta reais), refere-se ao pagamento de gás comprado pelo declarante; que em relação ao boleto para OMNI S A CREDITO FINANCIAMENTO E INVEST, no valor de R$1.174,31 (um mil, cento e setenta e quatro reais e trinta e um centavos), refere-se ao pagamento de parcela de sua caminhonete GM/S1O; que, em relação ao boleto do BANCO AJRENNER S A, no qual figura como pagador JOSÉ VITAL DAL BIANCO, no valor de R$1.653,27 (um mil, seiscentos e cinquenta e três reais e vinte e sete centavos), refere-se à parte do pagamento de um jogo de cozinha no valor total de R$ 12.600,00 (doze mil e seiscentos reais) e um veículo GM/Monza, no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), devidos para Michele, proprietária de uma fábrica de móveis; que realiza o pagamento mensal de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a Michele, a qual é esposa de Sérgio Locatelli; que Michele não lhe forneceu nota fiscal pela compra dos móveis; que, em relação aos boletos pagos à SPAL INDUSTRIA BRASILEIRA BEBIDAS S.A. e à UNIÃO DISTRIBUIDORA DE BEBIDAS LTDA., referem-se ao pagamento de fornecedoras de seu empreendimento, um tele-entrega de bebidas (Id. 80428804 – fls. 50-52).

Alexandre Sonda, funcionário da CRESOL e responsável pela negociação do empréstimo realizado pelo representado, sustentou que:

[…] que é funcionário da CRESOL, exercendo a função de coordenador no município de Palmeira das Missões; que em relação aos diálogos com Plínio, interceptados pela polícia, pelo que lembra, quem entrou em contato inicialmente foi o Sr. Luiz Carlos Pietrobelli, solicitando um “capital de giro” para o Sr. Ênio Gilmar; que informou que era necessário um avalista, tendo eles indicado o nome de Plínio; como houve demora para a resposta dos interessados, o declarante, que tinha o telefone de Plínio, entrou em contato diretamente com ele, oportunidade em que explicou o valor do contrato e a motivação; que sempre quando estavam na CRESOL, Ênio e Luiz estavam juntos, tendo aquele autorizado ao declarante a fazer o que precisasse, a pedido de Luiz; que Luiz agia como um “preposto” ou “representante” do Ênio junto à CRESOL, mas não tinha nada formalizado neste sentido; que a negociação foi via telefone e não presencialmente; que Luiz Carlos e Ênio estavam juntos durante a ligação, tendo aquele questionando este sobre algumas coisas; que conheceu eles através de crédito liberado à esposa de Luiz Carlos, de nome de Patrícia, no qual Ênio assinou de avalista; que o crédito liberado para Patrícia foi para a reforma de sua casa; que conheceu Ênio por causa deste empréstimo para Patrícia; que, segundo foi dito, o empréstimo obtido por Ênio serviu para a formação de “capital de giro”, sendo justificado no parecer interno para o fornecimento do crédito a utilização para a reforma e ampliação de uma casa; que tal justificativa foi dada por Luiz e Ênio, durante a ligação; que ao solicitar um avalista para a operação de crédito, Luiz e Ênio indicaram o nome de Plínio; como demorou para este vir até o banco fazer o cadastro, o declarante entrou em contato com ele, pedindo se ele seria o avalista; que não lhe explicaram o porquê Plínio seria o avalista; que ficou sabendo posteriormente que Plínio exercia a função de coordenador do Partido dos Trabalhadores, mas na época da contratação não sabia; que Plínio e sua esposa (Jurema da Graça de Lima Santos) foram, posteriormente, até a agência assinar os documentos, pois eram casados; que não sabia que Jurema tinha sido vereadora pelo PT, no município de Palmeira das Missões; que assim que aprovado e assinado, o valor foi liberado, sendo transferido para a conta de Ênio; que os pagamentos das parcelas foram normalmente realizados, os quais são feitos pelo próprio Ênio, tendo visto ele na agência bancária por várias vezes; que não foi o declarante quem coletou as assinaturas dos avalistas; que, pelo que lembra, fez apenas esta ligação para Plínio; que, ao fazer as negociações, eles pediram em quantos dias os recursos estariam disponíveis, tendo solicitado que “fosse liberado o quanto antes”; que a CRESOL não pede a comprovação da efetiva destinação dos recursos para a linha de crédito fornecida. Questionado pela defesa, sustentou que o fornecimento de crédito tinha o prazo médio de dois dias, não lembrando de quanto tempo demorou a transação envolvendo Luiz e Ênio, mas demorou mais do que o normal, em razão da demora da assinatura por Plínio; que não sabia que Plínio e Jurema são compadres de Giba; que não houve apontamento de irregularidade pelo Banco Central, em relação à operação de crédito; que Ênio apresentou um comprovante de “pró-labore”, referente a um comércio de bebidas, o qual foi utilizado para efetivar o financiamento.

Ouvidos sobre o empréstimo obtido pelo representado, Luiz Carlos Pietrobelli sustentou que:

[…] uma das primeiras pessoas que criou conta bancária junto à CRESOL de Palmeira das Missões foi uma namorada do declarante e, em razão disso, criou-se um vínculo, uma relação com o Alexandre; que Giba tem um depósito de bebidas e estava construindo “uma peça ao lado do depósito” e precisava de “dinheiro para o giro”, razão pela qual o declarante ligou para Alexandre intermediando o fornecimento de um empréstimo; que não pôde ser avalista do empréstimo porque “seu nome tem problemas”, se não “eu me oferecia de aval pro Giba”; que o declarante “forçou que Giba fosse candidato, porque ele é um cara que ajuda o povo da vila”; que nem lembra o valor do empréstimo; que fez a intermediação do empréstimo porque o Giba é um cara muito humilde e, como o declarante tinha cesso ao cara do banco, ficaria mais fácil; que Giba é avalista de um empréstimo de sua namorada; que a folha de pró-labore, em nome do Giba, apreendida na empresa do declarante “era para levar pro banco”, pois “como eu acionei o branco, eu fiquei de levar e depois o Ênio ia no banco acertar direto com o cara”; que acredita que o dinheiro foi utilizado para o giro do depósito de bebida dele, pois “na segunda tu recebe bebida e na quarta tem que pagar o boleto”, e porque ele estava construindo peça do lado do depósito de bebida; que não sabe dizer qual foi a destinação dada aos recursos, mas sabe da dificuldade dos negócios dele; que do valor recebido no empréstimo junto à CRESOL, Ênio lhe deu R$ 2.500,00, referente ao pagamento de um empréstimo feito a ele uns oito ou dez dias antes; que não sabe qual a destinação dada por Giba para o valor emprestado pelo declarante; que, em relação ao empréstimo concedido para o Ênio, o declarante deu um cheque em nome de Patrícia para ele, sendo o valor restituído na conta dela, quando saiu o financiamento no banco; que acredita que o empréstimo tenha sido utilizado pois “um cara que é candidato a vereador, deixar o nome sujar por não pagar um título, não tem futuro nenhum um cara ser candidato, daí”; que acredita que a urgência na obtenção do empréstimo, conforme demonstrado nas conversas interceptadas, se deve “pelo lado financeiro dele”; que acha que Ênio não tinha títulos protestados e nem deveria deixar a “chegar nesse ponto”; que o declarante tem acesso a Plínio pois ele é tio de sua ex-esposa e sempre foram amigos; que não sabe se Plínio era coordenador de campanha do PT na época, pois o declarante não participou muito da campanha do PT, uma vez que tinha bastante serviço para fazer; que a esposa de Plínio foi vereadora há 6 anos, mas na última gestão não foi vereadora e nem candidata; [...] que acha que a negociação do empréstimo junto à CRESOL demorou, “não foi de um dia pro outro”; que Giba se machucou no início da campanha.

Conforme se percebe, ao serem ouvidos em juízo, Luiz Carlos e Alexandre alegam que o empréstimo obtido por Ênio junto à CRESOL destinava-se ao pagamento de despesas de natureza pessoal (incluindo a constituição de “capital de giro” para sua empresa e pagamento de despesas com ampliação do estabelecimento), corroborando a versão trazida pelo representado em seus depoimentos prestados na fase administrativa, perante o Ministério Público Eleitoral.

Em relação ao pagamento do conserto do motor de um veículo pertencente ao filho do representado, Plínio Alberti do Nascimento Vargas alegou que:

[…] presta serviços de mecânica de automóveis, há muitos anos; que Giba é seu cliente há anos; que em relação ao cheque de R$ 1.000,00 recebido de Giba, refere-se ao pagamento de um “meia-sola no motor” feita em um Uno pertencente ao representado; que foi cobrado R$ 1.200,00, tendo recebido um cheque de R$ 1.000,00 e R$ 200,00 em dinheiro; que o carro era de Giba, um Uno branco, ano 1996, que era utilizado por um filho do Giba, “um magrinho, branquinho”, não sabendo o nome; que o serviço, a “meia-sola do motor”, retífica, o declarante demora uns três dias para fazer; que não foi o motor inteiro; que o serviço foi prestado “na época da política”, que no veículo tinha propaganda eleitoral; que no período da política Ênio não fez outros serviços com o declarante, nem efetuou outros pagamentos.

Ora, o conserto de veículo avariado, de propriedade do filho e/ou do representado, ainda que seja eventualmente utilizado durante a campanha, não pode ser considerado despesa eleitoral, uma vez que se trata de bem permanente, de utilização contínua pelos agentes.

Neste contexto, conclui-se que as provas produzidas nos autos, mesmo após a individualização de todas as pessoas beneficiadas pelos pagamentos realizados pelo candidato com recursos mantidos na conta bancária da Caixa Econômica Federal, foram insuficientes para demonstrar o dolo específico do representado em utilizar os valores obtidos através de empréstimo bancário para a constituição de “caixa 2”, bem como a realização de arrecadação e gastos irregulares, ônus do qual não se desincumbiu o representante.

O próprio Ministério Público Eleitoral, ao propor a ação, sustentou que:

“A toda evidência, o representado ÊNIO omitiu intencionalmente à Justiça Eleitoral o fato de ter contraído empréstimo perante a CRESOL para obter recursos destinados – ao menos em parte – a financiar clandestinamente sua campanha, nada mencionando a respeito em sua prestação de contas, como expressamente exigido pela legislação. Mesmo porque parcela substancial desses recursos financeiros foi consumida com gastos ilícitos, vedados pela Lei Eleitoral.

De ver que o valor de R$35.000,00 (trinta e cinco mil reais) arrecadado pelo representado através do referido empréstimo corresponde a mais de 600% do total de receitas financeiras por ele declaradas a Justiça Eleitoral, bem como extrapola seu limite de gastos de campanha.

E ainda que tão somente 20% desse valor (o equivalente a R$7.000,00) tivesse sido revertido para realização de gastos de campanha à margem da contabilização da Justiça Eleitoral (do que se cogita exclusivamente a título argumentativo), tal representaria 120% do valor de receitas financeiras declaradas pelo candidato, evidenciando-se o impacto negativo real dessa omissão sobre a credibilidade das contas prestadas, bem como efetivo prejuízo à normalidade e à igualdade de condições no processo eleitoral, em proveito do candidato” (grifei)

Ou seja, desde a propositura da representação não estava claro se o valor obtido pelo representado – ou qual parcela deste – foi utilizado para a constituição de “caixa 2” e, em consequência, para o pagamento de despesas eleitorais não declaradas na prestação de contas de campanha. As provas produzidas durante a instrução processual, em que pese as diversas diligências autorizada por este juízo, não permitiram sanar tal dúvida.

Por outro lado, o próprio representante reconhece que parcela do valor obtido por empréstimo foi utilizado para o pagamento de despesas pessoais pelo representado, ao admitir que uma parte do dinheiro foi utilizada para o pagamento de “boletos em favor de empresas fornecedoras de bebidas e/ou cheques a terceiros que com ele teriam mantido negociações aparentemente desvinculadas do contexto político-eleitoral”.

A título de exemplo: o representado, visando comprovar a relação jurídica com Sérgio Locatelli, que ocasionou a emissão de cheque no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) – depoimento de Id. 110961132 – juntou a manifestação de Id. 110276908, na qual anexa fotos de mesa e cadeiras adquiridas na empresa Planejar, de propriedade daquele.

O pagamento de despesas de natureza pessoal e a ausência de provas da utilização do valor para pagamento de despesas de campanha afastam o dolo específico do agente em relação a alegada conduta, não sendo possível sustentar que o agente, ao realizar o empréstimo junto à instituição financeira visava a realização de despesas de campanha não declaradas à Justiça Eleitoral.

Da mesma forma, o representante não conseguiu demonstrar, através de provas robustas, a alegada realização de gastos extras – e não declarados – de campanha para a confecção de adesivos e/ou bandeiras pelo representado, não havendo elementos que permitam concluir que foram confeccionadas mais materiais de campanha do que aqueles efetivamente declarados em sua prestação de contas, tampouco que o alegado excesso tenha sido capaz de influenciar no resultado do pleito.

Ouvido sobre tais fatos, Marcelo de Souza Brum sustentou que:

[…] a empresa do declarante, além de fazer a impressão direta para o cliente final, também faz terceirizações; que durante a campanha eleitoral foram terceirizados serviços para outras empresas da cidade e de fora, citando a empresa de Pietrobelli; que a empresa do declarante tem uma máquina grande de impressão digital, uma das poucas da cidade que tem, razão pela qual algumas empresas que não têm essa máquina compram do declarante e repassam para o cliente final; que para Pietrobelli foi fornecido, principalmente, adesivos microperfurados, banners de lona e adesivos para veículos, que eram os mais utilizados na campanha; que não lembra as dimensões dos adesivos, mas é uma média de 60x40 cm, dentro dos padrões liberados para a campanha política; que os adesivos eram fabricados na sua empresa; que em Passo Fundo, quando o declarante não tem o material ou quando excede o tamanho da minha, eu mando para a JS de Passo Fundo, mas não lembra de ter feito isso na campanha; questionado sobre uma conversa mantida por Ênio e Pietrobelli sobre adesivos “dos grandes” de Passo Fundo, o declarante informa que teve uma falta de adesivos perfurados, que foi uma falta geral pelas empresas da região, razão pela qual comprou alguns adesivos de Passo Fundo e até do Paraná; que o que conseguiu imprimiu na sua empresa, outros imprimiu fora e outros comprou só material de fora, mas toda a impressão feita para o Pietrobelli saiu no CNPJ dele; que em relação aos dezoito adesivos dos grandes, trazidos de Passo Fundo, devem se referir a adesivos perfurados, devendo ser os de 75x45 cm; que tudo o que foi encomendado por Pietrobelli para o declarante, era ele quem emitia a nota fiscal, pois era o CNPJ dele que constava no material; que a empresa não fabricava bandeiras, as quais eram terceirizadas com Pietrobelli e com o Lamar, que são as empresas de Palmeira que tem as máquinas, havendo uma parceira entre as empresas; que quando precisava das bandeiras comprava deles e repassava para os clientes com seu CNPJ, mas não fez muitas bandeiras; que o declarante fez alguns adesivos pra Ênio, por intermédio do partido, mas pouca coisa, sendo emitida as respectivas notas fiscais; que o PT organizava, mas era para cada vereador, sendo feito um “pacote para cada vereador do partido”; questionado sobre o preço dos adesivos grandes, disse que só sabe o valor cobrado para o repasse a Pietrobelli, sendo de R$ 48,00 a R$ 58,00 o metro quadrado, não sabendo qual foi o preço final; que os adesivos repassados a Pietrobelli devem ter custado em torno de R$ 22,00.

Questionado sobre o material fornecido para a campanha do representado, Luiz Carlos Pietrobelli sustentou que:

[…] que é empresário do ramo de confecção esportiva e, em relação a “impressos”, faz terceirização, estando a empresa em nome de seu filho, João Vítor, mas quem “toca” a empresa é o declarante; que atuou apoiando a candidatura de Ênio, com quem possui amizade de mais de seis anos; que a terceirização de impressos é feita junto ao Marcelo de Souza Brum, da empresa Singular; que Marcelo fez para vários candidatos, a pedido do declarante; que, em relação à campanha de Ênio, foram feitos adesivos pequenos e maiores, não lembrando exatamente tudo o que foi feito, mas foi tirado nota de tudo; que as bandeiras eram feitas pelo declarante e os adesivos e perfurites fazia pouco; que Marcelo fazia bandeiras com o declarante e este fazia os adesivos com aquele, havia uma “troca de serviços”; que como em Palmeira havia falta de matéria-prima, Marcelo mandava vir material de Passo Fundo, não sabendo especificar quem era seu fornecedor; [...] que o declarante tem acesso a Plínio pois ele é tio de sua ex-esposa e sempre foram amigos; que não sabe se Plínio era coordenador de campanha do PT na época, pois o declarante não participou muito da campanha do PT, uma vez que tinha bastante serviço para fazer; que a esposa de Plínio foi vereadora há 6 anos, mas na última gestão não foi vereadora e nem candidata; que o que fabricou para o Giba está na nota, não lembrando sobre orçamentos; que há várias anotações sobre orçamentos, inclusive para outros candidatos; questionado sobre a anotação de 500 adesivos para Giba, que foi rasurada, disse que não pode informar nada, pois “o que foi feito está na nota”; questionado sobre uma conversa interceptada em que conversa com um interlocutor sobre a fabricação de adesivos, sustenta que o “piá da gráfica” é Marcelo Brum, com quem negociava adesivos; que quando citou “o outro lá faz” estava se referindo a Fábio da A3, com quem pegava orçamentos, mas alega não ter feito nada com ele; que quando Giba falou em “fazer 3 mil ou 30 mil” estava se referindo aos santinhos de campanha, não sabendo dizer quantos ele fez; que isso era feito na gráfica e não pelo declarante; que o fornecedor de Passo Fundo tinha vínculos com Marcelo, pois havia falta de material em Palmeira; que o declarante tem nota de Marcelo e não do cara de Passo Fundo, pois encomendava daquele; que não sabe o nome do cara de Passo Fundo. Questionado pela defesa, alegou que tudo o que foi feito e pago por Ênio foi emitida nota fiscal; que os adesivos foram terceirizados, mas que tem conhecimento que neles devem constar o CNPJ e a tiragem, sendo que o material produzido pelo declarante continha tais informações [...].

Conforme se depreende, Marcelo e Luiz Carlos, responsáveis pela confecção das bandeiras, adesivos e materiais de campanha do representado, ao serem ouvidos em juízo, sustentaram que o material fornecido para a campanha de Ênio foi integralmente incluído nas notas fiscais emitidas por suas empresas, não havendo nos autos elementos de provas que evidenciem a realização de outros gastos, não declarados.

Assim, conclui-se que o Ministério Público Eleitoral não logrou especificar quanto do valor total obtido por empréstimo junto à CRESOL (R$ 35.000,00) foi destinado pelo representado para constituir o alegado “caixa 2” e, portanto, utilizado em sua campanha eleitoral, sem que fosse declarado em sua prestação de contas, nem tampouco comprovou quais foram as despesas eleitorais efetivamente pagas com tais recursos ou o real impacto que estas tenham ocasionados à lisura do pleito, razão pela qual a presente representação merece ser julgada improcedente.

Registre-se que, nos termos da jurisprudência consolidada dos Tribunais eleitorais, a cassação de diploma em razão da captação e gastos ilícitos de recursos (artigo 30-A da Lei 9.504/95) exige prova robusta da irregularidade e da gravidade da conduta, que precisa ser apta a macular a normalidade do pleito eleitoral.

Neste sentido:

RECURSO. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO CUMULADA COM REPRESENTAÇÃO POR INFRAÇÃO AO ART. 30-A DA LEI N. 9.504/97. CAPTAÇÃO E GASTO ILÍCITO DE RECURSO. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. ART. 22, INC. XIV, DA LEI COMPLEMENTAR N. 64/90. VEREADOR. SENTENÇA PROCEDENTE. ELEIÇÕES 2016. DISTRIBUIÇÃO DE VALES-COMBUSTÍVEL. OMISSÃO DE DESPESA NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA COMPROVAR OS FATOS ALEGADOS. REFORMA DA SENTENÇA. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. PROVIMENTO. 1. Aquisição e distribuição de vales-combustível e utilização ilícita de recursos na campanha eleitoral. A Ação de Impugnação de Mandato Eletivo está prevista no art. 14, § 10, da Constituição Federal e comporta cabimento nas hipóteses de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude. A representação por infração ao art. 30-A da Lei n. 9.504/97, por sua vez, busca coibir e sancionar a arrecadação e a utilização de recursos em contrariedade às normas que regulamentam o processo de prestação de contas eleitoral. 2. A jurisprudência do TSE exige, na representação por captação e gastos ilícitos de recursos, a prova robusta do descumprimento qualificado das normas que regem a arrecadação de receitas e a realização de gastos na campanha, mediante a utilização dolosa de fontes vedadas de financiamento ou pela omissão grave e intencional de informações contábeis. 3. O abuso do poder econômico requer, para sua caracterização, a violação ao bem jurídico protegido, ou seja, está vinculado à gravidade da conduta, capaz de alterar a normalidade do pleito. 4. As exaustivas diligências realizadas não resultaram em provas inequívocas da aplicação irregular de recursos, tampouco da existência de abuso do poder econômico. O alegado envolvimento do candidato no fornecimento de vales-combustível não deve ser presumido. A participação deve estar seguramente demonstrada em sólidas evidências, o que não se verificou no caso concreto. Reformada a sentença e afastadas as condenações impostas. 5. Provimento. Improcedência da ação. (Recurso Eleitoral nº 102, Acórdão, Relator(a) Des. JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 57, Data: 29/03/2019, Página 7)

 

AGRAVO INTERNO. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO ESTADUAL. REPRESENTAÇÃO. ARRECADAÇÃO E GASTOS ILÍCITOS DE RECURSOS. ART. 30–A DA LEI 9.504/97. REALIZAÇÃO DE JANTARES PARA REUNIR LIDERANÇAS POLÍTICAS E PROMOVER ATOS DE CAMPANHA. IMPROCEDÊNCIA. NEGATIVA DE PROVIMENTO. […] Ainda que a conduta se revestisse de ilicitude, não haveria espaço para a cassação do diploma. Na linha do entendimento desta Corte, a procedência da representação fundada no art. 30–A da Lei 9.504/97 exige, além da arrecadação e/ou dos gastos irregulares de campanha, a ilegalidade qualificada, pela manifesta má–fé do candidato, suficiente para macular a lisura do pleito. [...] (RECURSO ORDINáRIO ELEITORAL nº 060000204, Acórdão, Relator(a) Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 217, Data: 28/10/2020, Página 0)

Não estando suficientemente comprovada a utilização dos alegados recursos financeiros pelo candidato em sua campanha eleitoral e a configuração dos supostos gastos como despesas eleitorais, inviável também o reconhecimento de abuso de poder econômico na conduta do agente.

Assim, a improcedência dos pedidos contidos na representação (configuração de arrecadação e gastos ilícitos de campanha e/ou, subsidiariamente, a configuração de abuso de poder econômico) é medida que se impõem.

 

Como se depreende da criteriosa análise transcrita, não há nos autos provas que revelem a utilização de valores ilícitos na campanha ou de abuso de poder econômico.

Portanto, não restou demonstrada a captação ou a ocorrência de gastos ilícitos na campanha e nem abuso de poder econômico aptos a ferir a normalidade e a legitimidade do pleito e contaminar de modo irreversível a regularidade do processo eleitoral, consoante resta previsto do art. 30-A da Lei das Eleições.

Por conseguinte, na esteira da manifestação ministerial, impõe-se a manutenção da sentença que julgou improcedente a representação diante da debilidade probatória quanto aos requisitos exigidos para a caracterização dos ilícitos descritos na petição inicial.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO por não conhecer das preliminares arguidas em contrarrazões e, no mérito, pelo desprovimento do recurso, mantendo a sentença a quo na sua íntegra, nos termos da fundamentação.

É o voto.