PCE - 0602743-71.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/12/2023 às 17:00

VOTO

Cuida-se de prestação de contas apresentada por IVAR PAVAN, candidato que alcançou a suplência para o cargo de deputado estadual pela FEDERAÇÃO BRASIL DA ESPERANÇA - FE BRASIL(PT/PC DO B/PV), referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022.

Após exame inicial da contabilidade e intimação do prestador, a Secretaria de Auditoria Interna (SAI) emitiu parecer conclusivo no qual apontou persistir irregularidade quanto ao uso de recursos de origem não identificada (RONI) e assinalou a existência de indícios de irregularidade referente à contratação de serviços de filiados à mesma agremiação que o prestador, o que pode caracterizar desvio de finalidade do gasto eleitoral.

Do uso de recurso de origem não identificada

No caso, foram identificadas duas notas fiscais omissas na prestação de contas em exame, nos valores de R$ 30,00, lançada pela CHURRASCARIA CAMPINENSE LTDA., e R$ 570,00, emitida por DANIEL PRIMO PICCINI, totalizando R$ 600,00, as quais foram consideradas quitadas com valores sem prévio trânsito pelo sistema bancário nacional, a indicar o uso de recursos sem demonstração de origem.

A vedação ao uso de RONI vem estampada no art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

Intimada, a parte manifestou-se quanto aos apontamentos (ID 45502099 e 45502100).

Em relação à despesa contraída junto à CHURRASCARIA CAMPINENSE LTDA., o candidato alega que, apesar de a despesa ter ocorrido durante um almoço da comissão de campanha, tratou-se de um equívoco. Aponta que um dos almoços, no valor de R$ 30,00, foi pago separadamente (com recursos do próprio militante) e a nota fiscal foi emitida por engano contra o CNPJ de campanha. Juntou declaração do fornecedor, onde consta que teria ficado acertado que a NF 2234 seria cancelada, o que, por um lapso, não ocorreu.

Quanto à despesa de R$ 570,00 junto à empresa Daniel Primo Picini, o prestador declara que “não solicitou a produção de qualquer o material; Não autorizou esta despesa; Não recebeu o suposto material correspondente aquela NF; Não sabe quem fez”.

Entretanto, apesar das informações trazidas pelo candidato, não há nos autos elementos que permitam atestar conformidade da movimentação financeira com os termos da Resolução TSE n. 23.607/19, dado ser inquestionável que as notas fiscais foram emitidas contra o CNPJ de campanha, sendo que deveriam ter sido canceladas, o que não ocorreu.

A conjectura, neste caso, aponta para o uso de recursos sem demonstração de origem, ao arrepio da norma eleitoral, os quais devem ser recolhidos ao erário.

Dos indícios de irregularidade pela contratação de filiados ao partido

Quanto aos indícios de irregularidade, entendo sanada a demanda, porquanto colacionadas ao feito as respectivas notas fiscais, a indicar a escorreita prestação dos serviços contratados, bem como a situação da empresa, no momento, constar como "ativa" junto à Receita Federal do Brasil (ID 45502100).

Esta Corte, em situação análoga, já se debruçou sobre a matéria e alcançou o mesmo entendimento:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO NÃO ELEITO. CARGO DE DEPUTADO FEDERAL. ELEIÇÕES 2022. NÃO COMPROVADOS GASTOS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO. FACEBOOK. CRÉDITO CONTRATADO E NÃO UTILIZADO. DEVER DE REGISTRO COMO SOBRA DE CAMPANHA. EMISSÃO DE CHEQUE SEM IDENTIFICAÇÃO DO DESTINATÁRIO. INFRAÇÃO AO ART. 38 DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. DESPESAS JUNTO A FORNECEDORES CONSTITUÍDOS NO ANO DAS ELEIÇÕES. NÃO CARACTERIZADO DESVIO DE FINALIDADE DE GASTO ELEITORAL. VALOR MÓDICO DAS IRREGULARIDADES. INCIDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Prestação de contas apresentada por candidato não eleito ao cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022. 2. Irregularidades no uso de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC referente à não identificação da devolução da diferença de sobra financeira e à utilização de cheque sem determinação do destinatário do valor. 2.1. Em se tratando de despesa paga com verbas do FEFC para serviço de impulsionamento de conteúdos, eventual crédito contratado e não utilizado até o final da campanha deve ser registrado como sobra de campanha e recolhido à conta do Tesouro Nacional, providência não tomada pelo prestador. Inobservância do § 2º do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19. Falha reconhecida. 2.2. Pagamento de despesa relativa a contrato de cessão/locação de veículo. Emissão de cheque sem identificação do destinatário. Os pagamentos por meio de recursos públicos devem ser demonstrados por documentos que permitam a rastreabilidade dos valores e a vinculação do crédito com o fornecedor declarado. Não observados os requisitos do art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19. Gasto não comprovado. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional. 3. Doação financeira realizada por pessoa física inscrita no programa social do governo federal. Conforme entendimento deste Tribunal, a simples inscrição de doador de campanha em programas sociais não indica, necessariamente, a ausência de capacidade financeira para efetuar a doação, exigindo que o conjunto probatório ofereça elementos a confirmar tal conclusão e, ainda, que haja prova do conhecimento dos candidatos a respeito da falta de condição do doador. Na hipótese, inexistem elementos nos autos que demonstrem que o candidato tinha ciência de que o doador era beneficiário do referido programa. Ademais, a doação se deu em valor módico. Desconsiderado indicativo de irregularidade. 4. Superado indício de realização de despesas junto a fornecedores constituídos no ano da eleição com sócio de empresa de filiado ao partido do prestador de contas, uma vez que a contratação se reveste de aparente regularidade. Não caracterizado desvio de finalidade de gasto eleitoral. 5. As falhas relativas à comprovação de gastos realizados com recursos do FEFC representam 5,16% do total das receitas declaradas na campanha, sendo adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas com ressalvas, na linha do que vem decidindo este Tribunal Regional e o Tribunal Superior Eleitoral. 6. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS - PCE: 06036253320226210000 PORTO ALEGRE - RS, Relator: Des. Voltaire De Lima Moraes, Data de Julgamento: 25.07.2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 138, Data 31.07.2023.) (Grifei.)

 

Nessa toada, o vício remanescente totaliza R$ 600,00 e representa 0,44% do total auferido em campanha (R$ 137.320,17), devendo a contabilidade ser aprovada com ressalvas, na esteira do entendimento desta Corte, mediante aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
 

Em face do exposto, acolho o parecer do Ministério Público e VOTO pela aprovação das contas com ressalvas de IVAR PAVAN, com base no art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, e determino o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 600,00, referente ao uso recursos de origem não identificada, nos termos da fundamentação.