REl - 0600916-06.2020.6.21.0029 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/12/2023 às 17:00

VOTO

No mérito, observa-se, nas razões da sentença recorrida, que foi constatada uma irregularidade nas contas da recorrente, relativa à doação no valor de R$ 3.989,55, oriundo do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), destinado originariamente à candidatura feminina, a candidatos, sem prova de que o valor tenha sido empregado com benefício à recorrente (ID 44973092):

(…)

Observa-se que a unidade técnica promoveu a adequada fiscalização das contas, juntando relatório técnico, no qual observa que a irregularidade apontada no parecer preliminar, não foi sanada, restando, como irregularidade, a transferência de recursos do FEFC em desacordo com os §§ 6º e 7º do Art. 17 da Resolução TSE n. 23.607/19, conforme tabela abaixo:


Trata-se de transferência de recursos financeiros oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha no total de R$ 3.989,55 (três mil, novecentos e oitenta e nove reais e cinquenta e cinco centavos), para candidaturas do gênero masculino, repassadas à 8 candidatos a vereador do PODE.

Em sua manifestação (ID 101362831) a candidata informa que a origem do recurso foi doação do Partido aos candidatos, contudo, teve um equívoco onde o Partido realizou a doação a Candidata Daniela da Rosa Rodrigues, sendo que está repassou o valor aos demais. Não houve comprovação de que a transferência de recursos do FEFC, aos candidatos, resultou benefício para sua candidatura.

Conforme § 4º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.607/19, é de competência dos Partidos Políticos destinar no mínimo 30% (trinta por cento) do montante do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) para aplicação nas campanhas de suas candidatas. Conforme § 6º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.607/19 a verba destinada ao custeio das candidaturas femininas deve ser aplicada pela candidata no interesse de sua campanha ou de outras campanhas femininas, sendo ilícito o seu emprego, no todo ou em parte, exclusivamente para financiar candidaturas masculinas.

(...)

Desta forma a determinação é direcionada tanto aos partidos políticos quanto aos candidatos que participarão da disputa eleitoral. Ao partido cabe o recebimento e a distribuição das verbas públicas entre seus candidatos, observando a proporção mínima de 30%-70%. Ao candidato, por sua vez, compete administrar e aplicar corretamente a verba recebida.

Nesse pormenor, cumpre assentar que a divisão dos valores é da alçada dos partidos políticos e não dos candidatos.

Ao descumprir a legislação, transferindo recursos do FEFC a candidaturas masculinas, a candidata rompeu com o princípio norteador da norma, que é o de incentivar e impulsionar a atuação política feminina e fortalecer suas candidaturas, oportunizar às candidaturas femininas a assumirem um protagonismo até então ausente no cenário político brasileiro.

Os candidatos em questão, estão pleiteando ao mesmo cargo, ou seja, vereador. Em qualquer hipótese de transferência ou doação de valores destinados às campanhas femininas, deve haver benefício à candidata em questão. Garantir que seu adversário angarie mais votos não beneficia ninguém, a não ser o beneficiário da doação.

Desta forma verificado desvio de finalidade, concretizado na transferência de valor a fim de custear, sem qualquer vantagem ou contrapartida à doadora, campanha eleitoral dos candidatos elencados na tabela supra, quando, em verdade, tais valores deveriam ser geridos exclusivamente pela candidata doadora, buscando alavancar sua própria candidatura.

O descumprimento dos preceitos da aplicação dos recursos públicos em candidaturas femininas, no valor de R$ 3.989,55 (três mil, novecentos e oitenta e nove reais e cinquenta e cinco centavos) deverá ser recolhido ao Tesouro Nacional, sem prejuízo da aplicação à responsável e ao beneficiário das sanções do art. 30-A da Lei n. 9.504/75.
(…)

 

Nas razões recursais, a candidata alega, inicialmente,  que as quantias do FEFC foram transferidas para sua conta por equívoco e que foi orientada pelo vice-presidente da agremiação a repassar os valores a outros candidatos. Aduz, ainda, que foram empregados em benefício comum, da candidata recorrente e dos candidatos recebedores da doação, na forma autorizada pelo art. 17, § 7º, da Resolução TSE n. 23.607/19, pois a recorrente, com a doação, estava apoiando seus correligionários, visto que, por se tratar de eleição proporcional, ao aumentar o número de eleitores, ambos teriam condições de se eleger no pleito de 2020.

Todavia, não há, nos autos, prova alguma de que a candidata tenha obtido proveito pessoal para a campanha feminina com a doação, sendo a irregularidade bastante desabonatória, uma vez que houve malferimento à política de cotas destinada às candidaturas femininas.

O apoiamento de candidato, sem prova de benefício para a candidata, não autoriza a doação e o uso de recursos do FEFC, conforme o art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, na linha dos seguintes julgados:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. NÃO CONHECIDA DOCUMENTAÇÃO APRESENTADA DE FORMA EXTEMPORÂNEA. MÉRITO. IRREGULARIDADES NA UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DESTINADOS A CANDIDATURAS FEMININAS. FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). PERCENTUAL EXPRESSIVO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.


1. Não conhecidos os documentos apresentados intempestivamente. O candidato já teve conhecimento e oportunidade para sanar ou esclarecer a irregularidade apontada, e não o fez de forma tempestiva, restando precluso o prazo para o cumprimento das diligências tendentes à complementação dos dados ou para saneamento das falhas, na forma determinada pelo § 1º do art. 72 da Resolução TSE n. 23.553/17.


2. Irregularidade atinente à utilização de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) destinados às campanhas femininas, repassados por candidata ao cargo de senadora. A ausência de documentos comprobatórios da aplicação de valores do FEFC recebidos para o incentivo das campanhas femininas, implica em ofensa ao art. 19, §§ 5º e 7º, da Resolução TSE n. 23.553/17.


3. Não há ilicitude na transferência dos valores entre os candidatos, vez que a candidata está autorizada a realizar doações dos recursos recebidos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) para candidatos do gênero masculino, desde que sejam utilizados para as despesas comuns e seja resguardado o objetivo da norma de incentivo à campanha feminina. Circunstância não comprovada na hipótese, uma vez que o candidato deixou de apresentar cópias de notas fiscais e impressos publicitários capazes de atestar que os valores foram empregados para aquisição de material comum de campanha e assim afastar a irregularidade. Falha que enseja o dever de recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional, conforme dispõe o art. 82, § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17.


4. Desaprovação.


(TRE-RS, PC n. 0602683-40.2018.6.21.0000, Relator Des. Eleitoral André Luiz Planella Villarinho, julgado em 18.12.2020.) (Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. OMISSÃO DE DESPESAS ELEITORAIS. UTILIZAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC) DESTINADOS ÀS CAMPANHAS FEMININAS. DÍVIDAS DE CAMPANHA NÃO ASSUMIDAS PELA AGREMIAÇÃO. IRREGULARIDADES GRAVES. VALOR SIGNIFICATIVO. AFASTADA APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DESAPROVAÇÃO.


1. Apurada falta de correspondência entre os registros contábeis declarados pelo prestador de contas e os resultados encontrados nos procedimentos técnicos de exame, representando falha grave que malfere a transparência que deve revestir o balanço contábil. No caso, o valor da receita correspondente ao gasto omitido é considerado como recurso de origem não identificada, ensejando o dever de recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 34, da Resolução TSE n. 23.553/17.


2. Constatado que o prestador recebeu recursos do FEFC, provenientes do repasse da conta bancária de candidata ao Senado, no mesmo pleito. A candidata pode realizar doações dos recursos recebidos do FEFC para candidatos homens, desde que sejam utilizados para despesas comuns e seja assegurada a aplicação no interesse da campanha feminina, conforme previsto no art. 19, §§ 5º e 6º, da Resolução TSE n. 23.553/17. Não comprovado o cumprimento da forma exigida pela legislação. Determinada a devolução dos valores ao Tesouro Nacional.


3. As despesas de campanha dos candidatos, não adimplidas até o prazo de apresentação das contas, exigem a assunção da dívida pelo partido, nos termos do art. 35 da Resolução TSE n. 23.553/17. No ponto, a norma regente prevê tão somente a rejeição das contas como consequência jurídica da presente falha, sem referência a outras espécies de cominações. Inviável aplicação extensiva da legislação aplicável à espécie.


4. As irregularidades são graves e envolvem aproximadamente 69% do total de receitas captadas na campanha, sendo inviável a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.


5. Desaprovação.


(TRE-RS, PRESTAÇÃO DE CONTAS n. 0602376-86.2018.6.21.0000, Relator Des. Eleitoral JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, julgado em 24.6.2019.) (Grifei.)

 

Para afastar a irregularidade, cumpriria à doadora apresentar documentos que justificassem o repasse nos termos legais, como notas fiscais e exemplares de material de propaganda eleitoral capazes de demonstrar que os valores foram empregados em proveito comum de ambas as campanhas, especialmente da candidatura feminina, ônus do qual não se desincumbiu.

Convém enfatizar que não se discute a boa-fé ou a má-fé da recorrente, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha, assim como a transparência e a lisura da prestação de contas. Na hipótese, houve descumprimento das regras contábeis aplicáveis a todos os candidatos.

Desse modo, as razões recursais são insuficientes para o afastamento da falha verificada nas contas.

Nesses termos, o recurso não comporta provimento, em virtude de a irregularidade perfazer o total de R$ 3.989,55, referente à doação de recursos do FEFC para a campanha feminina, quantia que representa 57,32% das receitas financeiras, no montante de R$ 6.960,00, e ultrapassa o valor de parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a Resolução TSE n. 23.607/19 considera módico.

Com essas considerações, não é adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas, mesmo com ressalvas, pois a falha é grave e compromete de forma insanável a confiabilidade da movimentação financeira.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, para manter a desaprovação das contas e a determinação de recolhimento de R$ 3.989,55 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.