PCE - 0602222-29.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 21/11/2023 às 14:00

VOTO

FLAVIO ALBERTO DE LARA, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, apresenta prestação de contas relativa às eleições de 2022.

Após a realização de exame inicial da contabilidade, o prestador foi intimado, prestou esclarecimentos e apresentou documentação.

Sobreveio, então, parecer conclusivo da Secretaria de Auditoria Interna – SAI. O órgão técnico apontou irregularidades, referentes à utilização de recurso de origem não identificada – RONI e à comprovação de gastos com verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

Por ocasião da análise do presente processo, para a apresentação de voto em sessão de julgamento, foi identificado o pedido de dilação de prazo para a realização de diligência perante o Diretório Nacional da agremiação (ID 45402909), e deferida reabertura de prazo para manifestação do prestador, sem aproveitamento.

Passo à análise.

1. Utilização de recurso de origem não identificada

O parecer conclusivo identificou, mediante o confronto das informações apresentadas pelo prestador e aquelas constantes da base de dados da Justiça Eleitoral, a emissão da nota fiscal n. 41805 pelo fornecedor GRAFICA AGETRA LTDA, no valor de R$ 11.412,50.

O dispêndio não integra os gastos declarados pelo candidato que, em manifestação ao exame das contas, assim se pronunciou:

Em relação a nota fiscal 00.041.805, datada em 19/09/2022 no valor de R$ 11.412,50 (onze mil quatrocentos e doze reais e cinquenta centavos) na qual está sendo anexada como despesa não paga, vem informar que não foi autorizado pelo candidato a contratação de 25.000 impressões flyers Busato e Lara, inclusive foi questionado ao Diretório Estadual, na qual este informou que seria depositado o presente valor na conta de campanha. Ocorre que dentro do prazo previsto na legislação eleitoral não foi efetuado o deposito, sendo que a forma para remediar o problema gerado pelo Diretório Estadual foi elaborado um “Termo de Assunção de Dívida, Cronograma de Quitação e Anuência do Credor”, na qual foi informado pela assessoria jurídica do Diretório Estadual que seria a única forma para efetuar o pagamento e documento hábil para apresentação de contas. O Candidato firmou o “Termo” mesmo não solicitado o serviço da gráfica, na qual até o momento os documentos não foram entregues, apenas foi enviado uma correspondência do Diretório em 25 de outubro de 2022 solicitando a autorização para o Diretório Estadual a assumir o débito, situação que foi realizada com o “Termo”. Desta forma, se torna claro que a presente dívida é de responsabilidade do Diretório e não do Candidato, reiteradas foram as vezes que informou o Diretório Estadual que não tinha autorizado nenhum trabalho, mesmo assim continuaram a efetuar serviços para o Diretório Estadual usando o CNPJ do Candidato sem o devido lastro. Por fim, colacionados, a prova que a dívida está sendo assumida pelo Diretório Estadual e que o Diretório Federal informa que está analisando.

 

Em suma, o prestador alega que o gasto foi realizado pelo Diretório Regional do União Brasil, o qual teria utilizado o CNPJ da campanha do candidato sem sua autorização. Aduz que firmou um termo de assunção de dívida ao partido e acosta cópias do termo, do pedido de autorização ao órgão partidário para reconhecimento do débito e da resposta do diretório – no sentido de futura análise da petição.

A assunção de dívidas pelo partido está regulamentada na Resolução TSE n. 23.607/19, art. 33, §§ 2º e 3º:

Art. 33. Partidos políticos e candidatas ou candidatos podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.

(...)

§ 2º Eventuais débitos de campanha não quitados até a data fixada para a apresentação da prestação de contas podem ser assumidos pelo partido político (Lei nº 9.504/1997, art. 29, § 3º ; e Código Civil, art. 299) .

§ 3º A assunção da dívida de campanha somente é possível por decisão do órgão nacional de direção partidária, com apresentação, no ato da prestação de contas final, de:

I - acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência da pessoa credora;

II - cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo;

III - indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

 

Conforme observou o órgão técnico contábil, não houve o cumprimento da integralidade dos requisitos exigidos pela legislação de regência, pois não foi apresentada a autorização do órgão nacional de direção partidária nem a anuência da dívida por parte do credor, que deixou de assinar o Termo de Assunção de Dívida constante dos IDs 45221313 e 45221364.

Ademais, o prestador deixou de retificar sua prestação de contas, e permanece a omissão da dívida de campanha no Sistema de Prestação de Contas SPCE.

Assim, sem comprovação da assunção de dívida pela agremiação, resta não esclarecida a fonte do recurso utilizado para pagamento da despesa de campanha. Em consequência, a quantia de R$ 11.412,50 configura recurso de origem não identificada e deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, conforme o art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

2. Ausência de comprovação de gastos com verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC

A análise das contas aponta que o prestador declarou despesa de impulsionamento de conteúdo no valor de R$ 1.000,00, pagos com verbas do FEFC (extrato de prestação de contas de ID 45221362).

Entretanto, a nota fiscal eletrônica n. 51687492, disponível no DivulgaCandContas, emitida por FACEBOOK SEVIÇOS ONLINE DO BRASIL (CNPJ 13.347.016/0001-17), no valor de R$ 673,91 (seiscentos e setenta e três reais e noventa e um centavos), consiste no único documento fiscal do referido fornecedor, a indicar um resíduo sem comprovação na importância de R$ 326,09.

Esta Corte, convém frisar, já se deparou com a matéria em outros feitos, e a disparidade entre os boletos efetivamente pagos e as notas fiscais emitidas pela empresa Facebook, via de regra, é resultante da compra de créditos de forma antecipada e sua parcial utilização.

Assim, constata-se uma diferença (“crédito”) entre o valor pago pelo candidato com recursos oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (R$ 1.000,00) e o valor cobrado por serviços efetivamente prestados pela empresa contratada (R$ 673,91), no valor de R$ 326,09, que deve ser considerado “sobras de campanha” e devolvido ao Tesouro Nacional.

Em sua manifestação (ID 45402909), o prestador de contas reconheceu o valor acima descrito. Informa ter sido feita tentativa de devolução – "ocorre que não foi possível desta forma, o candidato não se opõe a ser efetuado o pagamento dos valores apontados”.

Na hipótese dos autos, a legislação de regência impõe ao prestador a transferência ao Tesouro Nacional, a teor do art. 35, § 2º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35.

(…)

§ 2º Os gastos de impulsionamento a que se refere o inciso XII deste artigo são aqueles efetivamente prestados, devendo eventuais créditos contratados e não utilizados até o final da campanha serem transferidos como sobras de campanha:

I - ao Tesouro Nacional, na hipótese de pagamento com recursos do FEFC; e

(...)

 

Neste sentido, julgado desta Casa:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA ELEITA. DEPUTADA FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. PAGAMENTO DE DESPESAS OMITIDAS. INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE CANCELAMENTO DAS NOTAS FISCAIS. FALHA MANTIDA. IRREGULARIDADES COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA. DESPESAS COM IMPULSIONAMENTO. CRÉDITO NÃO UTILIZADO. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTO FISCAL. IRREGULARIDADES PARCIALMENTE SANADAS. CONTRATO OU DOCUMENTO FISCAL SEM ASSINATURA. INFRAÇÃO AO ART. 60 DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. CONTRATO FIRMADO POR PESSOA FÍSICA. IMPOSSIBILIDADE DE A DESPESA SER CUSTEADA COM RECURSOS. PÚBLICOS. NOTA FISCAL SEM A APRESENTAÇÃO DAS DIMENSÕES DO MATERIAL. IRREGULARIDADES EM CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE ATIVIDADE DE MILITÂNCIA. BAIXO PERCENTUAL DAS FALHAS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

[...]

3. Irregularidades na movimentação financeira realizada com verbas procedentes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. 3.1. Impulsionamento de internet junto ao Google. Existência de créditos não utilizados. Ausência de apresentação de documento fiscal ou comprovante de recolhimento ao erário da respectiva diferença, em contrariedade ao disposto no art. 35, § 2º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19. 3.2. Impulsionamento de internet junto ao Facebook. Ausência de apresentação de documento fiscal declarado como pago pela candidata. Apresentados dois recibos relacionados a impulsionamentos. Falha sanada parcialmente, pois consoante jurisprudência do TSE: "a Justiça Eleitoral pode admitir, para comprovação do gasto, além da nota fiscal, quaisquer meios idôneos de prova, tais como contratos, comprovantes de entrega de material ou serviço e comprovantes bancários de pagamento" (PC n. 0601826-13.2017.6.00.0000, rel. Min. Sérgio Banhos, DJE de 11.5.2022). Dever de recolhimento ao erário de créditos não utilizados. 3.3. Ausência de assinatura em documentos fiscal ou contrato comprovando a despesa. Infração ao art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19. 3.4. Contrato firmado pela pessoa física da candidata e não pela pessoa jurídica da candidatura. Impossibilidade de a despesa ser custeada com verbas provenientes dos fundos públicos, nos termos do art. 37 da Resolução TSE já mencionada. 3.5. Existência de uma nota fiscal de comprovação de despesas com publicidade de material impresso sem a apresentação das dimensões do material impresso e sem a emissão de carta de correção, em inobservância ao disposto no § 8º do art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19. 3.6. Irregularidades em contratos de prestação de serviços de atividade de militância e mobilização de rua. A falta de apresentação do respectivo acordo de trabalho, ou a sua apresentação incompleta, impede a fiscalização da correta utilização dos recursos públicos, prejudicando de forma insanável a transparência e a confiabilidade das contas. Dever de recolhimento ao erário. 4. As irregularidades representam 2,74% da receita total declarada pela candidata, sendo adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas com ressalvas. 5. Aprovação com ressalvas. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS n. 060298967, Acórdão, Relatora Desa. Eleitoral KALIN COGO RODRIGUES, Publicação: PSESS – Publicado em Sessão, Data 12.12.2022). Grifei.

 

Desse modo, o valor equivalente aos créditos contratados junto à empresa Facebook Serviços Online do Brasil LTDA. (CNPJ 13.347.016/0001-17), e não utilizados, devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

Em linha de conclusão, no concernente às penalidades, destaco que a utilização de recurso de origem não identificada – RONI (R$ 11.412,50) e a realização de gasto não comprovado com verbas do FEFC (R$ 326,09) impõem igualmente o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional, nos termos dos arts. 14, 32 e 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

A soma das irregularidades alcança R$ 11.738,59 (R$ 11.412,50 + R$ 326,09), quantia que representa 20,59% das receitas declaradas na prestação, R$ 57.000,00, situação que impede, na linha de entendimento pacificado deste Tribunal, o juízo de aprovação com ressalvas mediante a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Diante do exposto, VOTO pela desaprovação das contas de FLAVIO ALBERTO DE LARA, candidato ao cargo de deputado federal, e determino o recolhimento do valor de R$ 11.738,59 (onze mil setecentos e trinta e oito reais e cinquenta e nove centavos) ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.