RecCrimEleit - 0600046-47.2021.6.21.0086 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/11/2023 às 14:00

VOTO

Inexiste prescrição a ser reconhecida.

O interregno entre o recebimento da denúncia (22.8.2022 - ID 45447128), o aditamento da denúncia (27.10.2022 - ID 45457150), a sentença prolatada ( 09.02.2023 - ID 45457188) e a presente data é inferior a doze e dezesseis anos, prazo prescricional estabelecido, respectivamente, pelo art. 109, incs. II e III, do CP, quando o máximo da pena prevista para o delito tipificado no art. 350 do Código Eleitoral é de cinco anos e no art. 316 do Código Penal, doze anos.

Igualmente, não se evidencia a prescrição pela pena em concreto, pois não transcorrido o prazo de 4 e 8 anos do recebimento da denúncia e prolação da sentença em razão das penas aplicadas (1 ano para Adelar e 3 anos de reclusão para Moisés), respectivamente, diante do que dispõe o art. 109, incs. IV e V, e § 1º do art. 110, ambos do Código Penal.

Logo, inocorrente prescrição, passo ao exame de mérito dos recursos.

Cuida-se, primeiramente, de analisar recurso do Ministério Público Eleitoral contra a sentença absolutória, em relação aos réus Sildo Schuch e Cristiane Ieda Breunig, das sanções do art. 350 do Código Eleitoral proferida pelo Juízo da 86ª Zona Eleitoral de Esperança do Sul (ID 45457188).

A denúncia imputou aos denunciados fatos delituosos envolvendo o seguinte tipo penal eleitoral:

Art. 350. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais:

Pena - reclusão até cinco anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa, se o documento é público, e reclusão até três anos e pagamento de 3 a 10 dias-multa, se o documento é particular.

 

A denúncia oferecida pelo Ministério Público Eleitoral relatou os seguintes fatos delituosos (ID 45457107):

No dia 30 de junho de 2015, às 15h10min, por ocasião da entrega da prestação de contas referentes ao exercício financeiro de 2014 do Diretório Municipal do Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB, junto à Justiça Eleitoral, os denunciados Adelar Joaquim Chechi, na qualidade de presidente, Sildo Schuch, na qualidade de tesoureiro e Cristiane I. Breunig, na qualidade de contadora do PMDB, omitiram, em documento particular, declaração que dele devia constar, e inseriram declaração diversa da que deveria constar, para fins eleitorais.

Na oportunidade, os denunciados apresentaram à Justiça Eleitoral a prestação de contas relativas ao exercício financeiro do ano de 2014 do Diretório Municipal do Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB, declarando ter havido apenas a contribuição dos valores de R$ 350,00 e R$ 350,00 no exercício financeiro de 2013, recebidos de Rafael Ulrich Bihain e Cleberson Luis Severo (Evento 83914483) Ocorre que, na verdade, o partido havia recebido contribuições/doações em dinheiro de servidores detentores de cargo em comissão e função gratificada, no ano de 2014, porém, tais valores foram omitidos na prestação de contas, conforme se verifica nas contribuições partidárias constantes na planilha "Contribuições Partidárias 2014" e recibos inseridos no Evento 77568228, bem como parecer técnico do GAT - Unidade de Assessoramento Contábil do Ministério Público (Evento 83914463).

ASSIM AGINDO, os denunciados Adelar Joaquim Chechi e Sildo Schuch e Cristiane Ieda Breunig incidiram nas sanções do artigo 350 do Código Eleitoral, razão pela qual o Ministério Público Eleitoral oferece denúncia, na forma do artigo 357 do referido diploma legal, requerendo, após autuação, o processamento do feito criminal, na forma dos artigos 357 a 364, do Código Eleitoral, até final julgamento e condenação, com os consectários legais.

 

Em resumo, imputou-se a Adelar Joaquim Chechi, Sildo Schuch e Cristiane Ieda Breunig, presidente, tesoureiro e contadora do partido MDB, respectivamente, a omissão, na prestação de contas, de valores recebidos de contribuições/doações em dinheiro, no ano de 2014, de servidores detentores de cargo em comissão e função gratificada.

No que diz respeito à autoria e à materialidade do crime, registro que a condenação em razão da prática do delito previsto no art. 350 do CE não dispensa a demonstração de que houve gastos de campanha ou ingresso de recursos não declarados na contabilidade na qual deveriam constar, bem como que a omissão foi dolosa e teve a finalidade específica de alterar a verdade sobre fato relevante para fins eleitorais (TSE - Agravo de Instrumento n. 65548, Acórdão, Relator: Min. Edson Fachin, DJE: 07.02.2020).

E, como bem examinado na sentença (ID 45457188), não houve demonstração de dolo na conduta de Sildo Schuch e Cristiane Ieda Breunig, ao contrário, o que se percebe é o desconhecimento acerca dos fatos:

Sildo Schuch, réu, tesoureiro do MDB à época, afirmou que nunca ficou sabendo desse dinheiro oriundo das contribuições, que tinha conhecimento apenas sobre os dois valores de R$ 350,00 que constaram na prestação de contas.

Sildo não efetuou o pagamento de qualquer contribuição, pois, exercia a profissão de agricultor à época. Não há provas nos autos de que o mesmo tinha conhecimento do recolhimento das contribuições e de que tenha omitido estes valores na prestação de contas.

Cristiane Ieda Breunig, ré, e, à época contadora do MDB relatou (id 111971889) que fez a prestação de contas do Partido Movimento Democrático Brasleiro -MDB de Esperança do Sul/RS, com base nos documentos que lhe foram apresentados, que foram apenas os dois depósitos de R$ 350,00 contribuições de Rafael Ulrich Bihain e Cleberson Luis Severo ao Partido. Relatou que não tomou conhecimento de outros valores.

Considerando-se o domicílio da contadora em Três Passos, coerente a alegação de não conhecimento das contribuições que eram recolhidas na Prefeitura Municipal de Esperança do Sul/RS.

Há de se considerar, ainda, que o MDB não era o único cliente da contabilista à época e, em especial, que os lançamentos contábeis são realizados, em regra, a partir dos extratos e demais documentos bancários e fiscais apresentados. Deste modo, os registros contábeis foram realizados abrangendo apenas os dois depósitos que chegaram ao conhecimento da contadora.

 

Assentado pelo Supremo Tribunal Federal que o desconhecimento do denunciado sobre a falsificação de documento utilizado na prestação de contas eleitoral não autoriza a sua responsabilização criminal:

EMENTA AÇÃO PENAL. DEPUTADO FEDERAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA ELEITORAL. ART. 350 DO CÓDIGO ELEITORAL. TERMO DE DOAÇÃO ELEITORAL FALSIFICADO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DOLO DO AGENTE. PEDIDO DE IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO PENAL PELA PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA. ATIPICIDADE DA CONDUTA IMPUTADA AO ACUSADO. ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE.

1. Para caracterização do crime de falsidade eleitoral ideológica, tipificado no art. 350 do Código Eleitoral, além da materialidade delitiva, imprescindível a demonstração do dolo do agente em praticar as condutas descritas no tipo penal incriminador. 2. Comprovado, pela prova dos autos, o desconhecimento do denunciado sobre a falsificação de documento utilizado em sua prestação de contas eleitoral inexiste possibilidade de responsabilização criminal. 3. Manifestação da Procuradoria-Geral da República pela improcedência da ação penal. 4. A ausência de comprovação de elemento subjetivo a tornar atípica a conduta imputada ao acusado. 5. Absolvição decretada com fundamento no art. 386, III, do CPP.

(AP 896, Relator (a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 09/10/2018, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-050 DIVULG 13-03-2019 PUBLIC 14-03-2019)

(STF - AP: 896 DF - DISTRITO FEDERAL 9990443-70.2013.1.00.0000, Relator: Min. ROSA WEBER, Data de Julgamento: 09/10/2018, Primeira Turma)

 

De igual modo o decidido pelo TSE e pelo TRE-RS:

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2008. AÇÃO PENAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA ELEITORAL. OMISSÃO DE DESPESAS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. REJEIÇÃO PREMATURA DA DENÚNCIA. ACOLHIMENTO INDEVIDO TESE DE ATIPICIDADE. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO. PRECEDENTES. ANULAÇÃO DO ACÓRDÃO A QUO. REMESSA AO JUIZ ELEITORAL DE PRIMEIRO GRAU. PERDA SUPERVENIENTE FORO PRERROGATIVA DE FUNÇÃO (PREFEITO).

1. O fato capitulado no artigo 350 do Código Eleitoral, e imputado ao então prefeito de São Luiz Gonzaga/RS, é de omissão, na prestação de contas, de informação que dela deveria constar: despesas de campanha.

2. O tipo de falsidade ideológica eleitoral requer dolo específico. A conduta - de omitir em documento, público ou particular, informação juridicamente relevante, que dele deveria constar (modalidade omissiva) ou de nele inserir ou fazer inserir informação inverídica (modalidade comissiva) - deve ser animada não só de forma livre e com a potencial consciência da ilicitude, como também com um "especial fim de agir". E essa especial finalidade, que qualifica o dolo como específico, é a eleitoral.

3. Denúncia rejeitada liminarmente pelo fundamento teórico, pois não analisado no caso concreto, de ausência da "finalidade eleitoral" na conduta em tese praticada.

4. Contrariamente ao assentado no acórdão recorrido, é equivocada a afirmação de que nenhuma omissão de informações ou inserção de informações inverídicas em prestação de contas tem aptidão para configurar o delito em análise, por ser cronologicamente posterior às eleições.

5. O argumento de que esta Corte Superior assentou, em dois precedentes, essa impossibilidade, não encontra esteio na atual jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral nem do Superior Tribunal de Justiça. Não autoriza, portanto, o juízo de atipicidade prematuro (pela ausência de dolo específico).

6. Se é certo, de um lado, que a inserção inverídica de informações na prestação de contas ou a omissão de informações (que nela deveriam constar) não configura necessariamente o crime do art 350 do Código Eleitoral; também é certo, de outro, que não se pode, antes do recebimento da denúncia e da consequente instrução, afirmar ser atípica a conduta, pela falta do elemento subjetivo do tipo - dolo específico - unicamente sob o argumento da ausência de finalidade eleitoral na conduta, porque realizada em procedimento posterior às eleições (na prestação de contas).

7. Presentes na narrativa inicial todas as elementares do tipo, descabe a rejeição da denúncia pela falta de dolo específico. Precedentes.

8. Recurso especial eleitoral provido para anular o acórdão recorrido e determinar a remessa ao juízo eleitoral de primeiro grau (arts. 35 c/c 356 do Código Eleitoral), constatada a perda superveniente do foro por prerrogativa de função (prefeito).

(Recurso Especial Eleitoral nº 41861, Acórdão, Relator(a) Min. João Otávio De Noronha, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 211, Data: 09/11/2015, Página 72)

 

RECURSO. CRIME ELEITORAL. ART. 350 DO CÓDIGO ELEITORAL. FALSIDADE ELEITORAL. IMPROCEDÊNCIA. ABSOLVIÇÃO. ACERVO PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA FORMAÇÃO DE JUÍZO CONDENATÓRIO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

O delito tipificado no art. 350 do Código Eleitoral trata da prática de conduta consistente em omitir, em documento público ou particular, declaração que dele deveria constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa, para fins eleitorais. Alegada inserção de documento falso em processo de prestação de contas eleitorais, mediante recibo simulando a prática de doação estimável em dinheiro, a qual jamais existiu. Acervo probatório escasso e insuficiente para comprovar a ocorrência do fato narrado nos autos. Manutenção da sentença absolutória. Provimento negado.

(TRE-RS - RC: 9296 BARRA DO RIBEIRO - RS, Relator: JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Data de Julgamento: 07/05/2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 83, Data: 10/05/2019, Página 5)

 

Assim, deve ser mantida a sentença no ponto que absolveu os recorridos Sildo Schuch e Cristiane Ieda Breunig.

 

No que diz respeito ao réu ADELAR JOAQUIM CHECHI, restou demonstrada a subsunção da conduta ao tipo previsto no art. 350 do CE, a justificar a condenação, como muito bem observado na sentença (ID 45457188):

Imputação da prática do crime de omissão de declaração em documento particular, em razão de que, na prestação de contas à Justiça Eleitoral, relativa ao exercício 2014 do Partido do Movimento Democrático Brasileiro - MDB de Esperança do Sul/RS foram omitidas as informações referentes à contribuições recebidas.

Constata-se que as contribuições efetivamente eram recolhidas pela Sra. Nair Cristina Vivian, a qual, inclusive fazia os registros dos valores arrecadados no caderno de anotações (id 77568221 a partir da fl. 65), em seguida, Nair entregava os valores a Moisés que lhe passava recibo constando ora "Recebi de Nair Cristina Vivian" e, ora "Recebi de Coligação Esperança para Todos".

Toda a prova testemunhal está neste sentido, inclusive, os réus confirmaram que o recolhimento das contribuições era realizado por Nair e entregue mediante recibo a Moisés, Vice-prefeito e filiado ao MDB . Vejamos:

Adelar Joaquim Chechi, réu, afirmou (id 111971891) que realizou contribuições entregues à Nair, por alguns meses, quatro ou cinco vezes, em torno de R$ 80,00 cada. Embora, no relatório (id 83914463) apresentado pelo Ministério Público evidenciou-se que as contribuições de Adelar totalizaram R$ 1360,00.

Deste modo, não há que se falar em desconhecimento, por parte de Adelar, acerca da existência destas contribuições mensais oriundas dos ocupantes de cargos em comissão e detentores de funções gratificadas na prefeitura de Esperança do Sul, que não foram declaradas na prestação de contas do Partido do Movimento Democrático Brasileiro - MDB, do qual o Sr. Adelar era o presidente e contribuições estas que realizou pessoalmente.

Conforme fls. 04 e 05 do Documento GAT CO 1022 2020 (id 83914463) existem contribuições realizadas por detentores de FC ou FGs ao Partido MDB e não declaradas na prestação de contas do referido exercício.

 

Ainda, de modo a evitar desnecessária tautologia, colho no parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral (ID 45541753):

[…]

Em seu interrogatório (ID 45457178), Adelar relatou que contribuiu por alguns meses, a pedido da senhora Nair Cristina Vivian, no valor aproximado de R$ 80,00 (oitenta reais), para ajudar o prefeito Roberto.

Entretanto, consoante parecer técnico da Unidade de Assessoramento Contábil do Ministério Público (ID - 83914463), após análise das planilhas de contribuições partidárias do ano de 2013 e 2014, referente aos valores pagos pelos servidores recebedores de CCs e FGs do município, denota-se que ADELAR consta na planilha do ano de 2013, como contribuinte no valor de R$ 1.600,00 (um mil e seiscentos reais). Com relação ao ano de 2014, foi apurado que as contribuições de Adelar somam R$ 1.021,00 (um mil e vinte e um reais). Assim, os valores pagos por ADELAR nos anos de 2013 e 2014 perfazem o valor de R$ 2.621,00 (dois mil, seiscentos e vinte e um reais). Por oportuno, cabe frisar que estes valores não constam na prestação de contas apresentadas pelo partido, na qual Adelar era o presidente. Ademais, existem diversos registros de outros doadores detentores de cargos em comissão que não constam na prestação de contas do Partido.

Aliás, ao cotejar o demonstrativo de contribuições recebidas do Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB, no ano de 2014, do Município de Esperança do Sul (ID 83914483), verifica-se somente duas contribuições, datadas de 10 de abril de 2014, no valor de R$ 350,00 (trezentos e cinquenta reais) tendo como contribuintes Rafael Ulrich Bihain e Cleberson Luís Severo, as quais totalizam o montante de R$ 700,00 (setecentos reais).

Em suas razões (ID 45457202), ADELAR relata que "chegou a contribuir, referindo que o destino do dinheiro era para pagamento de dívidas contraídas pelo então candidato e posteriormente prefeito eleito".

Não assiste razão a defesa.

Da simples análise dos autos, denota-se que ADELAR, como presidente do partido PMDB no ano de 2014 assinou a prestação de contas com somente duas contribuições que perfazem o valor de R$ 700,00. Não mencionou as demais contribuições recebidas pelo partido e, tampouco, as suas doações, que, somente no ano de 2014, totalizaram R$ 1.021,00 (mil e vinte e um reais).

Assim, tem-se que há elementos suficientes para a configuração do delito, demonstrada, por parte de Adelar, na intenção deliberada de encobrir valores na prestação de contas. Ademais, a autoria restou sobejamente demonstrada, uma vez que Adelar era o presidente do partido PMDB e firmou o demonstrativo de contribuições do partido referente ao ano de 2014.

Nesse sentido, posiciona-se a jurisprudência:

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016. CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA ELEITORAL. ART. 350 DO CÓDIGO ELEITORAL. CONTAS DE CAMPANHA. PARTIDO POLÍTICO. OMISSÃO DE DESPESAS PAGAS PELO PRESIDENTE DA GREI. DOLO ESPECÍFICO. POTENCIALIDADE LESIVA. COMPROVAÇÃO. SÚMULA 24/TSE. NEGATIVA DE PROVIMENTO.1. No decisum agravado, manteve-se aresto unânime do TRE/SC em que se verificou a prática do crime de falsidade ideológica para fins eleitorais (art. 350 do Código Eleitoral), condenando-se o agravante a um ano de reclusão em regime aberto e cinco dias-multa, substituída a pena física por serviços comunitários. Afirmou-se que o réu, no exercício da presidência de partido político, omitiu despesas de campanha que ele mesmo havia contratado e pago em benefício de dois candidatos no pleito proporcional de 2016, apresentando ajuste de contas da grei sem nenhuma movimentação financeira.2. No crime de falsidade ideológica (art. 350 do Código Eleitoral), o elemento subjetivo que descreve o fim eleitoral como dolo específico realiza-se pelo mero agir de forma livre e consciente capaz de ferir o bem jurídico tutelado. Tratando-se de crime formal, ou seja, que não exige resultado naturalístico, a potencialidade lesiva caracteriza-se pelo risco ou ameaça à fé pública, a qual se traduz na confiança, lisura e veracidade das informações prestadas no âmbito das eleições. De outra parte, não se identifica nenhum elemento cronológico no tipo, de modo que a entrega do ajuste de contas após o pleito afigura-se irrelevante na tipificação do ilícito. Precedentes.3. De acordo com o TRE/SC, o agravante encomendou e pagou pelos serviços gráficos de um dos candidatos de seu partido, no valor de R$ 2.500,00, mas instruiu a empresa prestadora a não emitir nota fiscal até que se decidisse o CNPJ responsável. Ele também ressarciu as despesas com combustíveis de outra candidata após apresentação de dez notas fiscais que somaram R$ 850,00, todavia não declarou nenhum dos gastos.4. Diante desse contexto, concluiu-se ser "insubsistente a alegação de mero equívoco na contabilização da despesa, estando, sim, plenamente demonstrado o dolo específico, ou seja, a intenção deliberada de ocultar conteúdo relevante na prestação de contas, a fim de prejudicar a transparência do processo eleitoral".5. A reforma do aresto a quo - ao argumento de que não houve dolo específico ou potencialidade lesiva contra a fé pública eleitoral - demandaria o reexame de fatos e provas, vedado no apelo nobre, nos termos da Súmula 24/TSE.6. Agravo interno a que se nega provimento.

(RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 060216566, Acórdão, Relator(a) Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 224, Data 04/11/2020, Página 0) Original sem grifos.

 

Destarte, deve ser mantida a sentença condenatória em relação ao réu ADELAR JOAQUIM CHECHI no que diz respeito ao tipo previsto no art. 350 do CE.

 

Por outro lado, a denúncia foi aditada (ID 45457147) para incluir MOISÉS ALFREDO LEDUR, então vice-prefeito, pela incidência nas sanções do art. 316 do Código Penal (Fato 2):

Em diversas datas e horários, durante os anos de 2013 e 2014, na Avenida rio Branco, 1626, no Município de Esperança do Sul, nas dependências da Prefeitura Municipal, o denunciado Moises Alfredo Ledur, então Vice-Prefeito, em comunhão de esforços e conjugação de vontades com a então Secretária de Administração, Nair Cristina Vivian (falecida), exigiram para outrem, diretamente, em razão de suas funções, vantagem indevida, qual seja, 5% do salário mensal de servidores ocupantes de cargo em comissão e função gratificada (constantes nas planilhas "Contribuições Partidárias 2013" e "Contribuições Partidárias 2014")

Nas diversas oportunidades, os denunciados exigiram dos servidores ocupantes de cargo em comissão e função gratificada que efetuassem o pagamento do "dízimo", ou seja, 5% do salário mensal, ou da função gratificada, a fim de gerar um fundo eleitoral para as eleições municipais de 2016, em que Moises seria candidato a Prefeito do Município. Os valores eram pagos diretamente a Nair, que, por sua vez, repassava-os a Moises (planilhas e recibos inseridos no Evento 77568228). Quem não contribuísse, era exonerado do cargo em comissão ou perdia a função gratificada.

 

Em relação ao conjunto probatório que ampara a condenação de MOISÉS ALFREDO LEDUR quanto ao delito do art. 316 do Código Penal, colho na respeitável sentença, a qual, antecipo, deve também ser mantida:

No mérito, o réu está sendo acusado de praticar atos caracterizados como delitos de concussão, previsto no art. 316 do Código Penal, que segue.

Art. 316 - Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida:

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.

Tenho que o delito em questão é formal, consumando-se com a exigência da vantagem indevida, tendo o pagamento como exaurimento.

Seguem julgados do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul sobre o ponto.

Ementa: HABEAS CORPUS. FLAGRANTE. CONCUSSÃO. Embora a consumação ocorra quando da exigência da vantagem indevida, o recebimento do dinheiro ainda é um exaurimento do crime de concussão, emprestando legalidade à prisão em flagrante efetuada nesse momento. Ausência de constrangimento ilegal. Ordem denegada. (Habeas Corpus Nº 70015378466, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Constantino Lisbôa de Azevedo, Julgado em 08/06/2006)

Ementa: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. DELITO DE CONCUSSÃO. CONSUMAÇÃO. O delito de concussão é formal, consuma-se no momento em que o agente exige a vantagem indevida. Conflito procedente. Unânime. (Conflito de Competência Nº 70015008071, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, Julgado em 25/05/2006)

Tanto a existência dos fatos quanto a autoria são verificadas basicamente pelas mesmas provas, as quais passo a examinar abaixo. Ressalto que o tipo de delito tratado, como consta no julgado abaixo, ocorre geralmente "na clandestinidade", tornando o campo probatório reduzido, já que dificilmente se conseguiria documentar à exaustão sua ocorrência. Com isso, a palavra das vítimas adquire maior relevância probatória.

No entanto, no caso em tela, temos proba robusta, qual seja o caderno com anotações das cobranças realizadas.

Ementa: APELAÇÃO-CRIME. CONCUSSÃO. Exigência de vantagem indevida, direta ou indiretamente, no exercício da função pública e em razão dela. Delito que costuma ocorrer na clandestinidade, sem a presença de testemunhas. Relevo probatório da palavra da vítima. Sentença condenatória mantida. Pena alterada. Apelo parcialmente provido. Unânime. (Apelação Crime Nº 70078306305, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, Julgado em 08/11/2018)

Vejamos, a prova testemunhal (id 111426144 - 111440350), o caderno de anotações e o parecer técnico do GAT - Unidade de Assessoramento Contábil do Ministério Público (id 83914463) demonstram a efetiva cobrança irregular, mediante desconto de porcentagem (5%) da remuneração dos servidores à época ocupantes de cargos em comissão ou detentores de função gratificada na Prefeitura Municipal de Esperança do Sul/RS.

Carlos Rogério Hunning, testemunha, relatou, em juízo, (111382010) referente ao caderno constante dos autos: "Era um controle de caixa de valores pagos por detentores de CC ou FG da Prefeitura, relativos a exigência que lhes era feita de pagamento de um percentual em favor dos beneficiados para que pudessem continuar em seus cargos ou funções".

 

Vitor Strohhaecker (id 111440343) " no caderno havia anotações sobre a cobrança que era feita dos funcionários comissionados, de uma porcentagem que era recolhida". Disse que tal porcentagem lhe era cobrada também. E que Nair fazia o recolhimento dos valores e repassava para o vice-prefeito Moises, que emitia e assinava os recibos.

Valdecir Luís Holschu (id 111428710) relatou que exercia a função de chefe de equipe e, posteriormente, de Secretário de obras e viação e afirmou que pagava mensalmente, para Nair, o valor de 5% do salário a título de dízimo.

Fernando Rodrigo Muller exercia a função de Chefe da Divisão de Agricultura e relatou (id 111428714) que fazia contribuição em dinheiro, "dízimo", para tanto, Nair, telefonava chamando-o ao seu gabinete. Deixou de fazer os pagamentos quando ingressou em cargo público por concurso.

Jonas Armando Schmeier relatou (id 111428705) ter exercido cargo de função gratificada e realizado as contribuições que chamavam de dízimo.

Ademar Francke referiu (id 111426144) que emprestou dinheiro para Roberto Prediger investir na campanha eleitoral de 2012, cujo pagamento ficou acertado para após o pleito. Afirmou que tinha conhecimento da cobrança do percentual de 5% dos CCs e detentores de FGs e que acreditava que os valores destinavam-se a quitar o empréstimo que Roberto tinha com ele.

Rudimar Roque Vivian, esposo da falecida Nair Cristina Vivian relatou (id 111426146) que Nair comentava com ele sobre a cobrança dos valores "dizimo", cujo depositário era Moisés, mediante recibo e o destinatário seria Roberto Prediger, que utilizava o dinheiro para pagar despesas particulares.

As testemunhas Ademar e Rudimar ainda referiram a excelente situação financeira de Moisés Ledur e de toda sua família no município de Esperança do Sul. Contudo, este argumento não impediu a consumação do delito.

Deste modo, ante o exposto, certo é que houve a cobrança indevida do percentual de 5% da remuneração dos ocupantes de cargos em comissão e detentores de função gratificada do Município de Esperança do Sul/RS, nos anos de 2013 e 2014, realizada pela Sra. Nair Cristina Vivian e entregue ao Sr. Moisés Alfredo Ledur, mediante recibos. O denunciado Moises Alfredo Ledur, então Vice-Prefeito, em comunhão de esforços e conjugação de vontades com a então Secretária de Administração, Nair Cristina Vivian (falecida), exigiram para outrem, diretamente, em razão de suas funções, vantagem indevida.

Não há nos autos, em especial no caderno, anotações quanto ao recebimento de valores por parte de Roberto Prediger.

Os próprios réus corroboraram estes fatos.

Adelar Joaquim Chechi confirmou ter contribuído por alguns meses e realizado o pagamento à Nair.

Moisés Alfredo Ledur (id 111974112), negou as acusações que lhe foram imputadas. Que como Vice-prefeito não teria responsabilidade pois se tratava de questão administrativa do Prefeito, exonerações, nomeações. Afirmou que se tornou apenas fiel depositário das contribuições, e que guardou esses valores em seu estabelecimento comercial e passou recibo para agir de modo transparente. Referiu que não sabia que não poderia ser cobrado esses valores, que acreditava que as contribuições foram de livre e espontânea vontade e que a finalidade seria para pagamento de despesas do candidato Roberto.

Por fim, não vislumbro a hipótese de doações espontâneas, ao contrário, estou convencida de que os pagamentos foram realizados, de modo obrigatório, mensalmente, como condição de assunção e manutenção nos cargos.

 

Outrossim, cabe destacar, em relação, especificamente, ao recurso de Moisés Alfredo Ledur, que não há excesso no apenamento. A pena-base afastou-se do mínimo porque houve uma circunstância judicial considerada desfavorável (culpabilidade). Já o aumento de 1/3 (um pouco acima do mínimo - 1/6) decorrente da continuidade delitiva é justificado na medida em que os crimes foram praticados em diversas datas ao longo de dois anos (2013 e 2014), e a prova documental e testemunhal demonstra que a cobrança feita dos funcionários comissionados era de forma mensal (Valdecir Luís Holschu relatou que pagava mensalmente, para Nair, o valor de 5% do salário a título de dízimo).

 

Dessa forma, restou demonstrado, por meio da prova testemunhal (ID 111426144 - 111440350), caderno de anotações e parecer técnico do GAT - Unidade de Assessoramento Contábil do Ministério Público (id 83914463), que houve a cobrança indevida mediante desconto de porcentagem (5%) da remuneração dos servidores ocupantes, à época, de cargos em comissão ou detentores de função gratificada na Prefeitura de Esperança do Sul/RS.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento dos recursos do MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL e de MOISÉS ALFREDO LEDUR e ADELAR JOAQUIM CHECHI, mantendo integralmente a sentença proferida (ID 45457188).