REl - 0601040-15.2020.6.21.0085 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/11/2023 às 14:00

VOTO

Na origem, as contas em exame foram desaprovadas com a determinação de devolução de R$ 1.312,04 ao erário, ante a presença de irregularidades consideradas graves e não sanadas, relativas à ausência de registro no sistema SPCE das doações de natureza pública repassadas pelo Diretório Estadual do Movimento Democrático Brasileiro do Rio Grande do Sul e da movimentação de recursos públicos provenientes do Fundo Especial de Financiamento (FEFC) e privados, na mesma conta bancária, sem prova da abertura de conta específica para a movimentação de recursos públicos.

Passo ao enfrentamento da preliminar de nulidade.

O recorrente suscita, inicialmente, a nulidade do parecer conclusivo elaborado pela unidade técnica, o qual conteria informações contraditórias, afirmando que: “Conforme item 7 está certificado que não houve recebimento do Fundo Partidário, no entanto, no item 1.2 pede a comprovação dos gastos e a destinação das sobras, sendo um apontamento totalmente contraditório. No mesmo apontamento certifica que não houve a juntada dos extratos, sendo que no próprio parecer aponta irregularidade dos extratos”.

Contudo, a alegação não merece prosperar, pois o parecer conclusivo do ID 45431629 não retrata o conteúdo referido no recurso e que seria objeto da insurgência, merecendo serem transcritos os itens mencionados:

1.2. Peças integrantes:

Foram apresentadas as peças obrigatórias que devem integrar a prestação de contas (art. 53 da Resolução TSE nº 23.607/2019).

6. OMISSÃO DE RECEITAS E GASTOS ELEITORAIS (ART. 53 DA RESOLUÇÃO TSE N° 23.607/2019)

6.3. Foram declaradas doações diretas realizadas por outros candidatos e partidos políticos, mas não registradas na prestação de contas em exame, revelando indícios de omissão de receitas:

(…)

7. EXAME DE REGULARIDADE DE DESPESAS REALIZADAS COM RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO (ART. 53, II, C, DA RESOLUÇÃO TSE N° 23.607/2019)

Não houve recebimento de recursos do Fundo Partidário.

(…)

8. EXAME DE REGULARIDADE DE DESPESAS REALIZADAS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (ART. 56, II, C, DA RESOLUÇÃO TSE N° 23.607/2019)

Houve recebimento de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, no valor de R$ 1.312,04 (um mil, trezentos e doze reais e quatro centavos).

Verificou-se que o valor não ingressou em conta bancária específica, conforme determina o artigo 9º da Resolução TSE n. 23.607/2019.

Ademais, verifica-se que houve movimentação de recursos oriundos de doação de pessoas físicas também na conta bancária n. 0611513104, da agência 0955, do Banrisul, e que foram juntados os comprovantes dos recebimentos.

Salienta-se que o extrato da prestação de contas (ID n. 106902215) não há registro do recebimento de recursos de origem pública.

(…)

10. ANÁLISE DA MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (ART. 53, DA RESOLUÇÃO TSE N° 23.607/2019)

10.3. Há contas bancárias na base de dados dos extratos eletrônicos não registradas na prestação de contas em exame, caracterizando omissão na prestação de informações à Justiça Eleitoral relativas ao registro integral da movimentação financeira de campanha, infringindo o art. 53, II, alínea "a", da Resolução TSE nº 23.607/2019:

10.5. As informações dos extratos/impressos divergem dos dados informados na qualificação do prestador de contas (art. 53, I, alínea "a", e II, alínea "a", da Resolução TSE nº 23.607/2019).

10.6. Os extratos impressos foram apresentados em sua forma definitiva, conforme o disposto no art. 53, II, alínea "a", da Resolução TSE nº 23.607/2019.

10.7. Os extratos bancários apresentam saldo inicial zerado e evidenciam que as contas foram abertas especificamente para a campanha, conforme o disposto no art. 53, II, alínea "a", da Resolução TSE nº 23.607/2019.

10.8. Os extratos bancários apresentados abrangem todo o período da campanha eleitoral, conforme o disposto no art. 53, II, alínea "a", da Resolução TSE nº 23.607/2019.

 

Como se vê, não se evidencia a contradição apontada porque o item 1.2 tão somente refere que “foram apresentadas as peças obrigatórias que devem integrar a prestação de contas (art. 53 da Resolução TSE nº 23.607/2019)”, o que em nada colide com a narrativa do item 7 no sentido de que “não houve recebimento de recursos do Fundo Partidário”.

Além disso, não se confirma a alegação de que o parecer teria referido que não houve a juntada dos extratos concomitante ao apontamento de irregularidade dos extratos, pois o item 10.5 é categórico ao ressaltar que “as informações dos extratos/impressos divergem dos dados informados na qualificação do prestador de contas (art. 53, I, alínea "a", e II, alínea "a", da Resolução TSE nº 23.607/2019)”.

Ou seja, a unidade técnica verificou divergências e inconsistências na documentação apresentada nos autos, não havendo contradição alguma a ser declarada quanto ao exame.

Nesse cenário, afasto a arguição de nulidade do parecer conclusivo.

No mérito, quanto à falta de declaração dos recursos procedentes do Fundo Especial de Financiamento (FEFC) repassados à grei pelo Diretório Estadual do MDB, acompanho o entendimento da Procuradoria Regional Eleitoral no sentido de que o partido conseguiu apresentar nos autos o recibo eleitoral e o comprovante de transferência do valor doado, devendo ser afastada a falha.

Foram juntados aos autos, no momento da apresentação de contas, quatro repasses desses recursos para candidaturas femininas, cada qual no valor de R$ 328,01, totalizando a quantia de R$ 1.312,04, o que possibilitou a fiscalização da Justiça Eleitoral, não havendo prejuízos para a análise da contabilidade (ID 45431622 e ID 45431625).

Tais documentos demonstram o atendimento ao disposto no art. 64 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 64. A prestação de contas simplificada será composta exclusivamente pelas informações prestadas diretamente no SPCE e pelos documentos descritos nas alíneas a, b, d e f do inciso II do art. 53.[...]

(...)

§ 5º Na hipótese de utilização de recursos provenientes do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), além das informações transmitidas pelo SPCE, na forma do caput, a prestadora ou o prestador de contas deverá apresentar os respectivos comprovantes dos recursos utilizados, na forma do disposto no § 1º do art. 53 desta Resolução.

[...]

 

Entendo que o partido logrou comprovar a real destinação do recurso público, ainda que não tenha declarado o recebimento do valor, o que constitui uma falha formal que não prejudicou o exame contábil.

Portanto, merece ser afastada a determinação de recolhimento da quantia de R$ 1.312,04 ao Tesouro Nacional.

Em prosseguimento, o recorrente, ainda que donatário de contribuição proveniente do FEFC, no valor de R$ 1.312,04, deixou de abrir conta bancária específica para a movimentação financeira do recurso público, violando o que determina o disposto no art. 9º da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 9º Na hipótese de repasse de recursos oriundos do Fundo de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário) e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), os partidos políticos e as candidatas ou os candidatos devem abrir contas bancárias distintas e específicas para o registro da movimentação financeira desses recursos.

§ 1º O partido político que aplicar recursos do Fundo Partidário na campanha eleitoral deve fazer a movimentação financeira diretamente na conta bancária estabelecida no art. 43 da Lei nº 9.096/1995.

 

O descumprimento da norma traz prejuízo ao controle da arrecadação pela sociedade e pela Justiça Eleitoral. A obrigatoriedade de abertura de conta específica de campanha não se dirige apenas ao recebimento de "outros recursos", mas também às verbas de natureza pública, ainda que não se tenha movimentação financeira.

No caso dos autos, o recorrente efetuou uma confusão patrimonial entre verbas públicas e privadas, mas a falha teve a consequência de uma impropriedade formal porque os valores puderam ser rastreados.

Assim, também como concluiu o órgão ministerial, tem-se que a irregularidade não teve o condão de macular as contas do partido, uma vez que os recursos efetivamente transitaram em conta bancária e foi possível aferir que a verba omissa na prestação de contas restou, de fato, distribuída às candidatas mulheres mediante recebido de doação juntado nos autos, tendo sido cumprida a devida destinação da doação.

O equívoco não comprometeu a apreciação e a regularidade dos registros contábeis e, como bem assinalou o Parquet Eleitoral, “a irregularidade identificada no parecer conclusivo consiste, diante das particularidades do caso em exame, em mera impropriedade, falha formal, que não afeta a regularidade das contas do partido”.

Em conclusão, entendo que as falhas verificadas nas contas são formais, relativas à falta de escrituração do recebimento de recursos públicos e à ausência de abertura de conta bancária específica para a movimentação de valores procedentes do Fundo Especial de Financiamento (FEFC), razão pela qual se afigura demasiado severo o julgamento de desaprovação.

As contas merecem ser aprovadas com ressalvas, em atenção aos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, com o afastamento da determinação de recolhimento ao erário da quantia de R$ 1.312,04, nos termos do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Diante do exposto, afasto a matéria preliminar e VOTO, com base nos fundamentos ora expendidos e em harmonia com o parecer ministerial, pelo provimento parcial do recurso para aprovar com ressalvas as contas do PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (MDB) DE MAMPITUBA/RS, referentes às eleições municipais de 2020, e afasto a determinação de recolhimento da importância de R$ 1.312,04 ao Tesouro Nacional.