REl - 0600790-22.2020.6.21.0007 - Acompanho o(a) relator(a) - Sessão: 09/11/2023 às 14:00

De início, acompanho em parte a divergência inaugurada pela Desª Patrícia da Silveira Oliveira, apenas quanto à preliminar de ilegitimidade passiva da Coligação Bagé, Orgulho do Brasil, uma vez que, de acordo com a jurisprudência do TSE, pessoas jurídicas não podem integrar o polo passivo em ação de investigação judicial eleitoral pela razão de não estarem sujeitas às penas previstas na Lei Complementar nº 64/90. 

No mais, com a vênia da Desª Patrícia da Silveira Oliveira, acompanho o em. Relator.

Cabe salientar que, no caso de investigação judicial eleitoral com fundamento em abuso do poder econômico, extrai-se da jurisprudência do TSE que é “imprescindível a demonstração: (i) da gravidade das condutas reputadas como ilegais, de modo a abalar a normalidade e a legitimidade das eleições; e (ii) do efetivo benefício ao candidato (embora não se exija a comprovação da participação direta ou indireta do candidato ou seu conhecimento” (Recurso Ordinário Eleitoral nº 352379 – CURITIBA/PR, Acórdão de 08/10/2020, Relator Min. Herman Benjamin, Relator designado Min. Luís Roberto Barroso, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 27, Data 18/02/2021).

Ainda segundo a jurisprudência do TSE, em compilação que consta no site da Corte Superior, em comentários à Lei de Inelegibilidade (LC nº 64/90), “O abuso de poder político se caracteriza como o ato de agente público (vinculado à Administração ou detentor de mandato eletivo) praticado com desvio de finalidade eleitoreira, que atinge bens e serviços públicos ou prerrogativas do cargo ocupado, em prejuízo à isonomia entre candidaturas” (TSE, 30.6.2023, AIJE nº 060081485) e ocorre quando agentes públicos se valem da condição funcional para beneficiar candidaturas (Ac.-TSE, de 20.4.2023, no AgR-REspEl nº 060089607; de 15.3.2022, no RO-El nº 060160890; de 9.11.2021, no RO-El nº 060086542; de 8.10.2020, no RO-El nº 352379 e, de 28.11.2016, no AgR-RO nº 288787).

Já o abuso do poder econômico se configura com a utilização de recursos patrimoniais em excesso, públicos ou privados, sob poder ou gestão do candidato, em seu benefício eleitoral (Ac.-TSE, de 15.6.2023, no REspEl nº 060024298; de 20.10.2022, no AgR-REspEl nº 060034373; de 9.9.2021, no AgR-AI nº 21082 e, de 1º.8.2017, no AgR-RO nº 98090).

No caso de Brusque (Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial Eleitoral 0600427-08.2020.6.24.0086, no qual, por 5 votos a 2, o Plenário do TSE cassou os mandatos do prefeito e vice-prefeito de Brusque/SC, impondo a eles e ao empresário Luciano Hang a inelegibilidade por 8 anos subsequentes ao pleito de 2020, por abuso do poder econômico), como se denota do voto do Min. Alexandre de Moraes, condutor da maioria, houve prática reiterada de comportamentos considerados abusivos, tais como: i) utilização do interior e adjacências de Lojas Havan; ii) ostensiva exibição, nas camisetas utilizadas pelo Investigado Luciano Hang, em avião e em caminhão da logomarca da mencionada pessoa jurídica; iii) sucessivas manifestações contrárias aos partidos tidos como de “esquerda”, acompanhadas de diversos pedidos de “não voto” em tais candidatos; iv) nítido apoio aos candidatos Investigados; v) participação dos candidatos em vídeos, havendo, inclusive, live de apoio – em que o empresário, no interior das Lojas Havan, repete o padrão alusivo à camiseta com a respectiva logomarca – e ato realizado dentro de uma loja da mencionada pessoa jurídica; vi) sucessivas marcações, em postagens de conteúdo negativo, do perfil do candidato do partido Recorrente (@pauloecceloficial); vii) exibição de entrevistas com funcionários das Lojas Havan nos mencionados vídeos, inseridos em nítido contexto eleitoral.

Esta é a distinção que se deve fazer em relação ao caso sub judice, pois aqui, ao contrário de Brusque, não houve reiteração de condutas, ao revés, como bem pontuado no voto do relator, há um único encontro sem aparente participação de eleitores e ocorreu uma única postagem (live) na página do próprio candidato Divaldo Lara, tendo obtido, de acordo com a própria inicial (datada de 12-12-2020), apenas mil visualizações, num universo de quase cem mil eleitores no município (o que importa para o julgamento é a data da divulgação do vídeo e a data do pleito, razão pela qual não se pode tomar por base o número atual de visualizações no Facebook).

Assim, embora tenha havido, por parte do empresário Luciano Hang, manifestação contrária a candidatos e partidos considerados “de esquerda”, e apoio explícito ao então prefeito, candidato à reeleição, o fato narrado na inicial não se reveste de especial gravidade, a ponto de abalar a normalidade e a legitimidade das eleições.

Tampouco se pode afirmar, com base nesse único encontro e nessa única postagem, que tenha havido a utilização de recursos patrimoniais em excesso, públicos ou privados, em benefício eleitoral do candidato Divaldo Lara.

A meu ver, o presente caso é, inclusive, de menor gravidade se compararmos com o fato ocorrido em Santa Rosa. Como destacou o em. Relator, naquela ocasião houve a transmissão do evento, ao vivo, nas redes sociais do candidato ao pleito majoritário e em portal de notícias local (chamado Portal Plural), com a presença do então Prefeito Alcides Vicini, do Deputado Federal Osmar Terra, dos candidatos a prefeito e vice, Anderson Mantei e Aldemir Ulrich, e do empresário Luciano Hang. Na hipótese ocorrida em Santa Rosa, destacam-se a divulgação, ao vivo, do encontro, não apenas na página de campanha do candidato, mas também em importante portal de notícias da região, a ostentação de avião da empresa como fundo dos acontecimentos e a participação de parlamentar federal no encontro, circunstâncias não evidenciadas no fato ocorrido em Uruguaiana.

Não obstante, o Pleno do TRE, à unanimidade, manteve a sentença de improcedência da AIJE, considerando que não havia conduta eleitoralmente abusiva e com gravidade suficiente a justificar a desconstituição do mandato eletivo (TRE-RS, REl 0600658-54.2020.6.21.0042, Relator: DES. ELEITORAL AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI, julgamento: 16.05.2022, DJE/TRE-RS, edição n. 93/2022, de 27.05.2022).

Portanto, na esteira do precedente supramencionado deste Pleno, a solução que se impõe, reconhecida a ilegitimidade passiva da Coligação Bagé, Orgulho do Brasil, é o desprovimento do Recurso e a manutenção da sentença de improcedência.