REl - 0600841-86.2020.6.21.0054 - Divirjo em Parte com o(a) Relator(a) - Sessão: 08/11/2023 às 17:00

VOTO DIVERGENTE

des. eleitoral caetano cuervo lo pumo

Eminentes Colegas,

Acompanho o Excelentíssimo Senhor Desembargador Voltaire de Lima Moraes, no que diz respeito às preliminares.

Entretanto, rogando respeitosas vênias ao ínclito Relator, formei a convicção no sentido de que o conjunto probatório não possui aptidão para a aplicação da multa prevista no art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97.

Reproduzo, a seguir, o dispositivo em apreço:

Art. 33. As entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, junto à Justiça Eleitoral, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações:

I - quem contratou a pesquisa;

II - valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;

III - metodologia e período de realização da pesquisa;

IV - plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado, intervalo de confiança e margem de erro;

V - sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;

VI - questionário completo aplicado ou a ser aplicado;

VII - nome de quem pagou pela realização do trabalho e cópia da respectiva nota fiscal.

(…)

§ 3º A divulgação de pesquisa sem o prévio registro das informações de que trata este artigo sujeita os responsáveis a multa no valor de cinquenta mil a cem mil UFIR.

Primeiramente, destaco que estou de acordo com o entendimento do Relator, de que não tratam os autos de mera consulta sem rigor científico, mas de pesquisa eleitoral realizada com a metodologia que lhe é peculiar, inclusive tendo empresa de pesquisas PEJOR informado ao representante da Coligação representada quanto à impossibilidade de divulgação.

Contudo, consoante demonstrado no feito, não houve ampla divulgação da pesquisa em meios de comunicação convencionais e redes sociais, e inexiste prova de que tenha sido difundida em aplicativos de mensagem instantânea, como WhatsApp.

Consta na inicial que, em reuniões políticas realizadas nos dias 02.10.2020, 30.10.2020 e 11.11.2020, respectivamente no Restaurante do Carlão, Salão Santos e Salão do Fragata, no Município de Barros Cassal, os recorridos divulgaram pesquisas realizadas pela empresa PEJOR, que atribuíram vantagens técnicas ao então candidato ADÃO REGINEI DOS SANTOS CAMARGO.

Dessa maneira, exatamente por serem “reuniões políticas”, bem como pelos locais em que se realizaram – restaurante e salões de eventos – há que se concluir que se trataram de encontros restritos, destinados aos partidários da chapa encabeçada pelo representado ADÃO REGINEI DOS SANTOS CAMARGO.

E. sendo ato de campanha, é natural que os ouvintes expressem emoção, com aplausos e gritos, a fim de criar um ambiente contagiante de vitória, de sorte que nem as gravações anexadas sob IDs 44978989 e 44978994, ainda que tenham alaridos, não se mostram suficientes para comprovar que havia grande número de pessoas.

Veja-se que foi possibilitada ampla produção probatório, inclusive com a realização de audiência de instrução, não logrando os representantes demonstrar a divulgação pública das pesquisas eleitorais, havendo tão somente áudios que, a meu entender, não têm aptidão para tal.

Em realidade, tenho que a divulgação coibida pela norma não se satisfaz com a mera comunicação do resultado da pesquisa a um número de pessoas presentes a determinada reunião, como no caso vertente, mas imprescinde de publicização em meios de comunicação em massa, tais como jornais, revistas, ou, mais modernamente, em redes sociais e grupos de mensageria instantânea, com possibilidade de ampla difusão, com impacto na disputa eleitoral.

Assim, a fim de se enquadrar a conduta como violadora do art. 33 da Lei 9.504/97, deve-se examinar o público alvo atingido e a potencialidade de alastramento das informações, sendo pertinente transcrever a ementa de recente julgado do TSE:

AGRAVO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2020. VICE–PREFEITO. REPRESENTAÇÃO. PESQUISA ELEITORAL SEM REGISTRO. DIVULGAÇÃO. ART. 33, § 3º, DA LEI 9.504/97. GRUPOS DE WHATSAPP. CONHECIMENTO PÚBLICO. CONFIGURAÇÃO. NEGATIVA DE PROVIMENTO.

1. Recurso especial interposto contra aresto unânime em que o TRE/MT manteve a condenação dos três recorrentes (candidato ao cargo de vice–prefeito de Chapada dos Guimarães/MT em 2020 e, ainda, duas pessoas físicas) ao pagamento de multa de R$ 53.205,00 por divulgarem pesquisa em grupos de WhatsApp sem prévio registro na Justiça Eleitoral.

2. Preliminar de ofensa ao art. 275, § 6º, do Código Eleitoral rejeitada. Os segundos embargos interpostos na origem revestiram–se de caráter protelatório, uma vez que, além de conter tese inédita de defesa, a matéria tida por omissa envolvendo o número de participantes dos grupos já havia sido exaustivamente enfrentada pelo TRE/MT por duas vezes.

3. A controvérsia cinge–se à incidência da multa prevista no art. 33, § 3º, da Lei 9.504/97 na hipótese de divulgação de pesquisa eleitoral, sem prévio registro, por meio do aplicativo WhatsApp.

4. No leading case sobre a matéria – REspEl 0000414–92/SE, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 2/10/2018 –, esta Corte Superior, atenta à realidade imposta pelas novas mídias digitais e de sua possível influência na legitimidade das eleições, registrou que se deve perquirir, caso a caso, o público alvo atingido pela mensagem e a potencialidade de alastramento das informações veiculadas por meio da ferramenta a fim de se enquadrar a conduta como violadora do art. 33 da Lei 9.504/97.

5. Nesse sentido, fixaram-se alguns parâmetros que, em cada hipótese concreta, podem nortear o julgador na qualificação da pesquisa divulgada em rede social como de conhecimento público ou não, a saber: (a) uso institucional ou comercial da ferramenta; (b) capacidade de alcance das informações; (c) número de participantes; (d) nível de organização do aplicativo; (e) características dos participantes.

6. No caso dos autos, os elementos contidos na moldura fática do aresto a quo permitem concluir que a conduta dos recorrentes é ilícita, porquanto teve aptidão para levar a pesquisa irregular ao "conhecimento público".

7. Conforme assentou o TRE/MT, a pesquisa se propagou em grupos que "se destinavam à circulação de material político", denotando a finalidade de difundir conteúdo voltado ao convencimento de eleitores, não se tratando, portanto, de ambiente restrito a relações privadas. Ademais, um deles contava com "mais de 150 participantes", a revelar o caráter coletivo da ferramenta e, por conseguinte, a propensão ao alastramento das informações.

8. Ainda de acordo com a moldura do acórdão a quo, "houve circulação de pesquisa em formato gráfico que mimetiza as divulgações tradicionais". No ponto, entendimento diverso esbarra no óbice da Súmula 24/TSE, que veda o reexame de fatos e provas em sede extraordinária.

9. Recurso especial a que se nega provimento.

(AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL n. 060056849, Acórdão, Relator(a) Min. Benedito Gonçalves, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 49, Data 24/03/2023)

 

No caso sub examine, o público alvo atingido parece ser, como alegado pelos recorridos, limitado, não havendo potencialidade de alastramento das informações, veiculadas oralmente.

No leading case citado na decisão acima – REspEl 0000414-92/SE, de relatoria do Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto – foi assentado que a dimensão atribuída ao termo "conhecimento público", inscrito no art. 33 da Lei n° 9.504/97, o qual se traduz, em outras palavras, na capacidade de alcance do conteúdo da mensagem,
deve ser analisada com base na situação concreta, havendo de se perquirir se a informação divulgada extrapolou os limites de um grupo fechado de interlocutores:

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. PESQUISA ELEITORAL SEM PRÉVIO REGISTRO. GRUPO DE WHATSAPP. NÃO CARACTERIZAÇÃO. COMUNICAÇÃO RESTRITA AOS VÍNCULOS DE AMIZADE. DESPROVIMENTO. INTELIGÊNCIA DO DISPOSTO NO ART. 33 DA LEI Nº 9.504/97.

1. A busca do equilíbrio entre as garantias constitucionais da liberdade de informação e a proteção da veracidade dos dados divulgados ao longo do pleito eleitoral demanda o constante redimensionamento do rigor dispensado pela Justiça Eleitoral em relação ao tema das pesquisas de opinião, com vistas a resguardar a manutenção das boas práticas democráticas.

2. Ferramentas como o WhatsApp e assemelhadas (Telegram, Viber, Hangouts, Skype, Chaton, Line, Wechat, Groupme) podem apresentar feições diversas, a saber, de cunho privado ou público, ao viabilizarem a interação individual ou por meio de conversas em grupos e até por videoconferências.

3. Diante dos desafios impostos por essa nova sociedade informacional, o julgador deverá aferir se houve, em cada caso, um legítimo direito de expressão e comunicação ou se, por outro lado, a informação foi veiculada com intuito de interferir no comportamento do eleitorado, se teve a aptidão para levar ao "conhecimento público" o resultado da pesquisa eleitoral e, dessa forma, interferir ou desvirtuar a legitimidade e o equilíbrio do processo eleitoral. Para tanto, poderá basear-se em alguns elementos ou sintomas denunciadores de que a divulgação dos dados extrapolou a esfera particular, tais quais: i) uso institucional ou comercial da ferramenta digital; ii) propensão ao alastramento de informações; iii) interesses e número de participantes do grupo; iv) finalidade e nível de organização e/ou institucionalização da ferramenta; v) características dos participantes e, principalmente, do criador ou responsável pelo grupo, pela mídia ou rede social, uma vez que, a depender do seu grau de liderança ou da atuação como formador de opinião, aumenta a potencialidade da informação para atingir um público diversificado, em ambiente propício à manipulação dos interlocutores.

4. In casu, a dimensão atribuída ao termo "conhecimento público" não restou assentada nas premissas apresentadas pela Corte Regional, instância exauriente na análise dos fatos e provas. Contudo, não há olvidar-se a facilidade do acesso contemporâneo à tecnologia e, por consequência, à informação, nos diversos canais existentes na atualidade.

5. Recurso especial desprovido.

(REspEl 0000414-92/SE, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Publicação: DJE, Tomo 197, Data 02/10/2018, p. 9-10).

 

No caso em apreciação, não há prova de que a informação divulgada tenha extrapolado os limites de um grupo fechado de interlocutores, porquanto as gravações não fazem prova do extravasamento.

Quanto à participação de Edson Moraes Zinn, representante da COLIGAÇÃO CONTINUAR GOVERNANDO PARA TODOS, foi destacado no voto do Relator que os áudios juntados ao feito, em que se verifica uma voz masculina, são atribuídos a ele.

Entretanto, as declarações de Edson, em audiência, não amparam essa versão, uma vez que ele “confirmou que fez a avaliação e análise de pesquisa, mas negou ter feito a divulgação”, de modo que nem isso restou cabalmente evidenciado.

Noutro giro, ainda que se pudesse entender essa comunicação do resultado de pesquisa como divulgação de pesquisa não registrada perante a Justiça Eleitoral, tal condenação não poderia atingir o candidato recorrido, ADÃO REGINEI DOS SANTOS CAMARGO, pois a regra sanciona tão somente a conduta comissiva, o fato de “divulgar”, e não a omissiva de eventual beneficiário, e, inexistindo prova de sua participação, não poderia sofrer a penalização.

Com essas breves considerações, respeitosamente, divirjo em parte do eminente Relator, para VOTAR pelo desprovimento do recurso, mantendo a sentença que julgou improcedente a representação.