PCE - 0603607-12.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 08/11/2023 às 17:00

VOTO

Eminentes Colegas.

ROSELANE GARCIA LIMA DA SILVA, candidata não eleita ao cargo de deputada federal nas eleições 2022, apresentou sua prestação de contas referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha.

Processados os documentos nos termos da Resolução TSE n. 23.607/19, foi elaborado parecer conclusivo em que o órgão técnico apontou as seguintes falhas: a) utilização de recursos de origem não identificada – RONI, no montante de R$ 179,80 (cento e setenta e nove reais e oitenta centavos); b) irregularidades na comprovação de gastos com verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, no valor de R$ 185,48 (cento e oitenta e cinco reais e quarenta e oito centavos).

A Procuradoria Regional Eleitoral, além das falhas apontadas pela unidade técnica, identificou outra irregularidade, consubstanciada na extrapolação do limite de gastos de campanha com aluguel de veículos automotores em R$ 5.749,86 (cinco mil setecentos e quarenta e nove reais e oitenta e seis centavos).

Regularmente intimada a manifestar-se sobre os apontamentos, em duas oportunidades, a candidata permaneceu silente (ID 45509656 e ID 45522364).

Passo à análise das irregularidades apontadas.

 

Da utilização de recursos de origem não identificada – RONI

Foi detectada pelo órgão técnico, mediante circularização e/ou informações voluntárias de campanha e/ou confronto com notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais, a omissão de gastos de campanha no valor de R$ 179,80 (cento e setenta e nove reais e oitenta centavos), conforme tabela abaixo:


 

Intimada para se manifestar, a prestadora de contas quedou-se inerte (ID 45509656).

Em consulta aos sites das receitas estadual e municipal, verifiquei tratar-se da aquisição de “refeição” (R$ 79,80) e uma diária de hospedagem (R$ 100,00).

Com efeito, os gastos vinculados ao CNPJ da campanha, não declarados na prestação de contas, caracterizam omissão de registro de despesas, infringindo o disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual impõe que a prestação de contas deva ser composta das informações relativas a todos os gastos eleitorais, devidamente especificados.

Esse é o entendimento desta Corte sobre o tema. Confira-se:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA ELEITA. DEPUTADA ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. ATRASO NA ENTREGA DOS RELATÓRIOS FINANCEIROS. MERA IMPROPRIEDADE. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADAS ¿ RONI. NOTAS FISCAIS NÃO DECLARADAS. OMISSÃO DO REGISTRO DE DESPESA. INFRAÇÃO AO DISPOSTO NO ART. 53, INC. I, AL. "G", DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. MONTANTE INSIGNIFICANTE. REGULARIDADE DAS CONTAS NÃO COMPROMETIDA. BAIXA REPRESENTATIVIDADE DAS FALHAS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas apresentada por candidata eleita ao cargo de deputada estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

[...]

3. Recursos de origem não identificada. Notas fiscais não declaradas relacionadas ao abastecimento de combustíveis. O DANFE não é, não substitui, e não se confunde com uma nota fiscal eletrônica. A existência de outras despesas contratadas com o mesmo fornecedor impede que se realize o batimento dos gastos para verificação de perfeita coincidência entre o valor das despesas e os pagamentos efetuados. A emissão de nota fiscal para o CNPJ de campanha gera a presunção de existência da despesa, nos termos do art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19. Havendo o registro da transação comercial nos órgãos fazendários, o ônus de comprovar que o gasto eleitoral não ocorreu ou que ocorreu de forma irregular é do prestador de contas, que deve laborar para o cancelamento da nota fiscal, conforme previsto nos arts. 59 e 92, §§ 5º e 6º, da Resolução mencionada. Os elementos constantes nos autos não são aptos a sanar as irregularidades relativas à duplicidade de emissão de registros por fornecedor de combustíveis. Caracterizada a omissão de registro de despesas, infringindo o disposto no art. 53, inc. I, al. "g", da Resolução TSE n. 23.607/19, que impõe que a prestação de contas deva ser composta das informações relativas a todos os gastos eleitorais, devidamente especificados.

4. As despesas resultantes das notas fiscais omitidas e cujo cancelamento não foi devidamente comprovado implicam sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação do gasto de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal da candidata. Caracterizados os recursos como de origem não identificada, cujo montante deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

5. A soma das falhas corresponde a 0,93% da receita declarada e se mostra insignificante diante dos valores totais geridos pela candidata em sua campanha eleitoral. Assim, como as incorreções não têm aptidão para comprometer a regularidade das contas, em homenagem aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, é caso de aprovação com ressalvas da contabilidade.

6. Aprovação com ressalvas. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS n. 060311180, Acórdão, Relatora Des. DES. VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 12.12.2022.) (Grifei.)

 

Na mesma linha do precedente, as despesas resultantes dos documentos fiscais indicados, no valor total de R$ 179,80 (cento e setenta e nove reais e oitenta centavos), implicam, por consequência, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação dos gastos de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal da candidata, caracterizando o recurso como de origem não identificada, cujo montante deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC

O examinador de contas identificou irregularidades na comprovação dos gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, no montante de R$ 185,48 (cento e oitenta e cinco reais e quarenta e oito centavos), em razão de o documento fiscal apresentado, emitido por Auto Posto da Mata Ltda. EPP, não conter a integralidade das informações previstas no art. 35, § 11, da Resolução TSE 23.607/19.

De fato, na nota fiscal de ID 45177017 não consta o CPF e/ou CNPJ do destinatário da despesa. Inclusive, no campo de identificação da contraparte, consta a expressão “consumidor não identificado”, o que contraria o disposto nos arts. 35, § 11, e 60, ambos da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35 (…)

§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:

I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;

II - veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que:

a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e

b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim; e

(…)


Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das(os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

 

Devidamente intimada para se manifestar sobre os apontamentos e comprovar os gastos, a prestadora de contas silenciou (ID 45509656).

Destarte, em consonância com o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, tenho que deve ser recolhida ao Tesouro Nacional a quantia de R$ 185,48 (cento e oitenta e cinco reais e quarenta e oito centavos), na forma do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, por entender que o gasto pago com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC não foi regularmente comprovado nos autos, nos termos da fundamentação supra.

 

Extrapolação do limite de gastos com locação de veículos

A Procuradoria Regional Eleitoral identificou irregularidade, consubstanciada na extrapolação do teto de gastos de campanha com aluguel de veículos automotores.

A disciplina normativa do limite de gastos da espécie encontra-se no art. 26, § 1º, inc. II, da Lei n. 9.504/97 e no art. 42, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Lei n. 9.504/97

Art. 26. São considerados gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites fixados nesta Lei:

§ 1º São estabelecidos os seguintes limites com relação ao total do gasto da campanha:

(...)

II - aluguel de veículos automotores: 20% (vinte por cento).

…………………………………...

Resolução TSE n. 23.607/19

Art. 42. São estabelecidos os seguintes limites em relação ao total dos gastos de campanha contratados (Lei nº 9.504/1997, art. 26, § 1º):

(...)

II - aluguel de veículos automotores: 20% (vinte por cento).

 

Está expresso que as despesas com locação de veículos ficam limitadas a 20% do total dos gastos eleitorais, sob pena de ser caracterizada irregularidade atinente à aplicação dos recursos de campanha.

No caso, os gastos contratados pela candidata, conforme indicado no extrato da prestação de contas final (ID 45177021), totalizaram R$ 21.247,87, de sorte que poderia ter sido despendido com aluguel de automóveis o valor máximo de R$ 4.249,57.

Contudo, a despesa com o arrendamento de bens alcançou o patamar de R$ 10.000,00, sendo R$ 5.500,00 com o fornecedor Marcos Aurélio Alves da Silva (ID 45177015) e R$ 4.500,00 com o fornecedor Luís Carlos Lima da Silva (ID 45177013), extrapolando em R$ 5.750,42 o teto legal, em violação às normas de regência.

Ainda que a jurisprudência entenda não aplicável a multa pelo excesso, considerando que foram empregados recursos do FEFC para pagamento do aluguel de automóvel, e tendo havido extrapolação do correspondente limite, resta configurada aplicação irregular de verba pública, ensejando o recolhimento da quantia excedida ao Tesouro Nacional, na forma estipulada no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, consoante entendimento sufragado por esta Corte:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CARGO. VEREADOR. OMISSÃO DE DESPESAS. NOTA FISCAL NÃO REGISTRADA NA CONTABILIDADE. GASTO COM COMBUSTÍVEIS. CONTRATAÇÃO DE CÔNJUGE/COMPANHEIRO COMO FORNECEDOR DE CAMPANHA. AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS. DESPESA COM ALUGUEL DE VEÍCULO. LIMITE EXCEDIDO. AFASTADO O APONTAMENTO DE ATRASO NA ABERTURA DA CONTA BANCÁRIA. IRREGULARIDADES PERCENTUALMENTE REPRESENTATIVAS DIANTE DO TOTAL MOVIMENTADO. INVIÁVEL A APLICAÇÃO DA PROPORCIONALIDADE. MANTIDA A DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. READEQUAÇÃO, DE OFÍCIO, DA FUNDAMENTAÇÃO PARA O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. PROVIMENTO PARCIAL.

(...)

4. A disciplina normativa do limite de gastos com locação de veículos encontra-se no art. 26, § 1º, inc. II, da Lei n. 9.504/97, e no art. 42, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19. Expresso que as despesas com locação de veículos ficam limitadas a 20% do total dos gastos eleitorais, sob pena de caracterizar irregularidade atinente à aplicação dos recursos de campanha. Entretanto, a penalidade prevista no art. 18-B da Lei das Eleições, que foi imposta à recorrente, somente há de ser aplicada em caso de extrapolação dos limites de gastos globais de campanha, não se relacionando com o limite de gastos parciais previstos no art. 26, § 1º, da Lei n. 9.504/97. Esta Corte, em julgamento ocorrido na data de 13.10.2021, reviu seu posicionamento para fixar que a aplicabilidade da previsão contida no art. 18-B da Lei n. 9.504/97, combinado com o art. 6º da Resolução TSE n. 23.607/19, é restrita à extrapolação do limite global de gastos. Assim, deve ser afastada a sanção de multa por excesso do limite de gastos específico com locação de veículo.

5. Considerando que foram empregados recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC para pagamento do aluguel de automóvel e que houve extrapolação do correspondente limite, resta configurada aplicação irregular de verba pública, ensejando o recolhimento da quantia excedida ao Tesouro Nacional, na forma estipulada no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Consolidada a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que é imperativo o ressarcimento ao erário quando houver uso indevido de verbas públicas.

(...)

9. Parcial provimento, apenas para afastar a irregularidade relativa ao atraso na abertura das contas bancárias de campanha, mantendo o juízo de desaprovação das contas e readequando, de ofício, o fundamento legal para imposição do recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

(TRE/RS - Recurso Eleitoral n. 0600678- 77.2020.6.21.0096 - Relator Des. FRANCISCO JOSÉ MOESCH – Data: 24.01.2022.)

 

Outrossim, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral encontra-se consolidada no sentido de que é imperativo o ressarcimento ao erário quando houver uso indevido de verbas públicas:

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO ESTADUAL. CONTAS DE CAMPANHA. VALOR PERCENTUAL PEQUENO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. DEVOLUÇÃO AO ERÁRIO. ART. 82, § 1º, DA RES.–TSE 23.553/2017. NEGATIVA DE PROVIMENTO.

1. No decisum agravado, proveu–se em parte o recurso especial interposto por candidata não eleita ao cargo de deputado estadual em 2018 para aprovar com ressalvas suas contas de campanha, porém mantendo–se a determinação do retorno de R$ 1.500,00 ao Tesouro Nacional, o que ensejou agravo pelo Parquet.

2. A aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade em processo de contas condiciona–se a três requisitos cumulativos: a) falhas que não comprometam a higidez do balanço; b) percentual ou valor não expressivo do total irregular; c) ausência de má–fé. Precedentes.

3. Na espécie, segundo o TRE/SE, embora inexista comprovação da titularidade de veículo alugado com recursos públicos, a falha incide sobre apenas 0,5% dos recursos arrecadados, sem indício de má–fé por parte da candidata.

4. Nesse contexto, impõe–se aprovar o ajuste contábil, na linha da jurisprudência desta Corte Superior, mantendo–se a devolução ao erário, pois não se demonstrou o correto uso de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), nos termos do art. 82, § 1º, da Res.–TSE 23.553/2017.

5. Agravo interno a que se nega provimento.

(RECURSO ESPECIAL ELEITORAL n. 060126119, Acórdão, Relator: MIN. LUIS FELIPE SALOMÃO, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 62, Data 08.4.2021.) (Grifei.)

 

Dessa forma, em consonância com o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, deve ser recolhida ao Tesouro Nacional a quantia de R$ 6.115,70 (seis mil cento e quinze reais e setenta centavos), sendo R$ 179,80 (cento e setenta e nove reais e oitenta centavos) referentes aos recursos de origem não identificada; R$ 185,48 (cento e oitenta e cinco reais e quarenta e oito centavos) relacionados à irregularidade na comprovação dos gastos com verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC; e R$ 5.750,42 (cinco mil setecentos e cinquenta reais e quarenta e dois centavos) decorrentes da extrapolação do limite de gastos com locação de veículos, nos termos da fundamentação supra.

Considerando que as falhas, no valor R$ 6.115,70 (seis mil, cento e quinze reais e setenta centavos), representam 28,77% do total de receitas arrecadadas (R$ 21.250,69), inaplicáveis os princípios da proporcionalidade ou da razoabilidade, ou valor módico (até R$ 1.064,10), motivos pelos quais as contas devem ser desaprovadas.

 

Ante o exposto, acolho o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral e voto por desaprovar as contas de campanha de ROSELANE GARCIA LIMA DA SILVA, candidata não eleita ao cargo de deputada federal nas eleições gerais de 2022, nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e por determinar a devolução de R$ 6.115,70 (seis mil cento e quinze reais e setenta centavos) ao Tesouro Nacional.

É o voto.