PCE - 0602304-60.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/11/2023 às 14:00

VOTO

Trata-se de prestação de contas apresentada por ADAO CLEITON LEAL DA SILVA, candidato ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

A Secretaria de Auditoria Interna (SAI), analisando a contabilidade, apontou irregularidades na comprovação dos gastos com o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, consoante o seguinte fragmento do laudo pericial (ID 45468708):

4. Do exame de regularidade de despesas realizadas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC e Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos – FP

4.1. Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC

Observados os procedimentos técnicos de exame e na análise dos extratos bancários eletrônicos, disponibilizados pelo TSE, assim como na documentação apresentada nesta prestação de contas, foram constatadas irregularidades6 na comprovação dos gastos com o Fundo Especial de Financiamento de Campanha.

Detalhamento da inconsistência observada na tabela

A - Débito bancário sem identificação do fornecedor beneficiário do pagamento, não consta CPF extrato bancário eletrônico disponibilizado pelo TSE, assim como não foi apresentada documentação bancária comprovando o destinatário dos recursos, conforme art. 38 da Resolução TSE 23.607/2019.

A1 – O Débito no extrato bancário eletrônico disponibilizado pelo TSE para o valor de R$ 250,00, corresponde ao CNPJ 03.124.886/0001-73 - “CAIXA PONTO DE OURO LOT LTDA”.

 

Intimado, o candidato não se manifestou.

Os débitos registrados no extrato bancário (ID 45325267) da conta n. 06.040295.0-9, agência n. 0136, do Banco Banrisul, pertinente à movimentação de verbas do FEFC, possuem a informação “CHEQUE TERCEIROS POR CAIXA”, “CHEQUE COMPENSADO” e “CHEQUE EMITENTE POR CAIXA”.

Reproduzo, abaixo, a imagem do documento bancário, extraído do sistema Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais (disponível em: <https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2022/2040602022/RS/210001649789/extratos>):

 

Com relação ao cheque n. 1, de R$ 4.000,00, o prestador de contas informa, no Relatório de Despesas Efetuadas (ID 45325244), que o pagamento foi feito a Jaqueline dos Santos Cardoso, por fornecimento de serviços digitais, em 15.09.2022, acostando aos autos o contrato de prestação de serviços para criação de conteúdos digitais (ID 45325256).

Já o cheque n. 2, de R$ 1.600,00, conforme Relatório de Despesas Efetuadas (ID 45325244), foi utilizado para pagamento de Deisi Costa Niemczeski, a título de prestação de serviços em campanha eleitoral, havendo contrato para fornecimento de merchandising, figurino e produtos de campanha eleitoral (ID 45325262).

Por sua vez, o cheque n. 7, como declarado pelo prestador de contas (ID 45325244), teria sido emitido em favor de Alexandre Barbosa Pereira, no valor de R$ 250,00, a título de prestação de serviços eleitorais para fornecimento de merchandising, figurino e produtos de campanha eleitoral (ID 45325259). Contudo, o fornecedor identificado no extrato bancário é a pessoa jurídica “Caixa de Ouro Lot Ltda.”.

Segundo declarado pelo prestador de contas, o cheque n. 11, de R$ 1.121,00, serviu ao pagamento de Everton Sidnei Leites (ID 45325244), materializado pelo contrato de ID 45325255, para fornecimento de material de merchandising, figurino e produtos de campanha.

A partir do que consta na declaração do candidato (ID 45325244), no que concerne aos cheques n. 5, 6, 8, 9, 10, todos no valor de R$ 400,00, tem-se que foram emitidos, respectivamente, em favor de Tamires da Silveira Silva, Lucimar da Silveira Silva, Joseane Saraiva da Silva, Katiely Soares da Rocha e Raquel Soares da Rocha, em contraprestação a serviços na campanha eleitoral, também amparados nos contratos que integram os autos (ID 45325258, 45325264, 45325260, 45325257 e 45325261). Especialmente em relação ao cheque n. 6, o fornecedor identificado no extrato bancário é a pessoa jurídica “Avicampo Ovos Ltda. Epp”, pessoa diversa do prestador de serviços declarado, Lucimar da Silveira Silva.

Em suma, não há identificação dos fornecedores dos cheques n. 1, 2, 5, 8, 9, 10, 11, sendo que nos cheques n. 7 e 6 os fornecedores indicados são Avicampo Ovos Ltda. Epp e Caixa Ponto de Ouro Lot Ltda., pessoas jurídicas que não correspondem às informações prestadas pelo candidato.

Em julgamentos envolvendo o presente tema, pontuei meu entendimento no sentido de que a ausência do cruzamento dos cheques não impediria, por si só, a comprovação dos gastos, quando apresentados documentos hábeis e fidedignos, aptos a comprovar os serviços e os pagamentos realizados, com a estrita vinculação dos cheques nominativos emitidos aos correspondentes contratos, também verificável a partir de eventual cadeia de endossos, sem trazer maiores prejuízos à análise das contas.

Destaco, na mesma linha, recente julgado de 09.03.2023, nos autos do AREspEl n. 0600203-46.2020.6.10.0026, no qual o TSE ratificou, para o pleito de 2020, o posicionamento já assentado para as eleições de 2018 (REspE n. 0602985-69, rel. Min. Og Fernandes, rel. designado Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 16.8.2021, e REspE n. 0602104-92, rel. Min. Carlos Horbach, DJE de 20.10.2021), no sentido de que, apesar da não observância do cruzamento dos cheques, dando ensejo ao saque por caixa, “não é o caso de determinar o recolhimento ao Tesouro Nacional se há comprovação da própria regularidade dos gastos” por meio da juntada de “notas fiscais, contratos de prestação de serviços, declarações e cópias de cheques”, conforme a seguinte ementa:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CAMPANHA. PREFEITO E VICE–PREFEITO. DESAPROVAÇÃO. PROVIMENTO PARCIAL. REDUÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO AO ERÁRIO. SÍNTESE DO CASO 1. O Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão manteve, à unanimidade, a sentença que desaprovou as contas de campanha do agravante, referentes às Eleições de 2020, quando concorreu ao cargo de prefeito do Município de Carolina/MA, com a determinação de recolhimento, ao Tesouro Nacional, dos recursos de origem não identificada, no valor de R$ 8.216,99, bem como dos recursos recebidos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), no montante de R$ 77.280,65. 2. Na decisão agravada, o agravo em recurso especial teve seguimento negado por não ter sido reconhecida a alegada violação aos dispositivos legais invocados, bem como pela incidência do óbice do verbete sumular 24 do Tribunal Superior Eleitoral, tendo sido interposto agravo regimental. ANÁLISE DO AGRAVO REGIMENTAL 3. (...). 4. No que respeita ao pagamento a fornecedores de bens e serviços e de atividades de militância por meio de cheque nominal não cruzado, é certo que a Corte de origem assinala que foram anexados “notas fiscais, contratos de prestação de serviços, declarações e cópias de cheques”, embora tenha entendido que o pagamento desses gastos por meio de cheque nominal não cruzado (ao invés de cruzado) seria suficiente para manutenção da falha. 5. A jurisprudência admite que – mantida a glosa em face da não observância da formalidade preconizada quanto à necessidade de emissão de cheque nominal cruzado para quitação de despesas – não é caso de determinar o recolhimento ao Tesouro Nacional se há a comprovação da própria regularidade do gasto. Nesse sentido: Recurso Especial 0602985–69, rel. Min. Og Fernandes, rel. designado Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 16.8.2021; Recurso Especial 0602104–92, rel. Min. Carlos Horbach, DJE de 20.10.2021. CONCLUSÃO Agravo regimental provido em parte, a fim de prover o agravo em recurso especial eleitoral e, desde logo, prover em parte o recurso especial eleitoral, para, subsistente a desaprovação das contas do candidato a prefeito Erivelton Teixeira Neves, manter a determinação de recolhimento, ao Tesouro Nacional, somente dos recursos de origem não identificada, no valor de R$ 8.216,99 (oito mil, duzentos e dezesseis reais e noventa e nove centavos) e, ainda, de R$ 6.001,00 (seis mil e um reais), decotado, portanto, o valor de R$ 71.279,65.

(TSE - AREspEl: 06002034620206100026 CAROLINA - MA 060020346, Relator: Min. Sergio Silveira Banhos, Data de Julgamento: 09/03/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 47.) Grifei.

 

No caso concreto, muito embora o candidato tenha encartado nos autos os instrumentos de contrato firmados com os prestadores de serviço e o relatório de despesas emitido pelo SPCE, tais documentos mostram-se insuficientes para demonstrar o destino dos recursos públicos.

Não foram juntadas aos autos as cópias dos referidos cheques, de modo que não é possível aferir se foram efetivamente emitidos nominais e/ou cruzados aos respectivos contratados, ou se ocorreu o endosso pelo fornecedor beneficiado.

Assim, a circunstância de inexistirem esclarecimentos pertinentes, aliada à flagrante dissonância quanto a alguns beneficiários dos pagamentos, impede que seja afastada a irregularidade, sobretudo por ter sido o dispêndio suportado por verbas públicas, o que atrai a necessidade de recomposição ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Desse modo, restou caracterizada a irregularidade, devendo o montante de R$ 8.971,00 ser recolhido ao Tesouro Nacional, na forma prescrita pelo art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, em razão da inobservância da regra contida no art. 38, inc. I, do referido normativo.

Por fim, registro que o conjunto de falhas alcança R$ 8.971,00, correspondentes a 93,73% do total de recursos recebidos (R$ 9.571,00), inviabilizando a aprovação das contas com ressalvas com base nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela desaprovação das contas de ADAO CLEITON LEAL DA SILVA, relativas ao pleito de 2022, com esteio no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e pela determinação do recolhimento de R$ 8.971,00 ao Tesouro Nacional, na forma do art. 79, § 1º, da mesma Resolução.