ED no(a) REl - 0600721-63.2020.6.21.0015 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/10/2023 às 09:30

VOTO

Os embargos de declaração são adequados, tempestivos e comportam conhecimento.

No mérito, a COLIGAÇÃO CARAZINHO JÁ alega que o acórdão embargado incorreu em duas omissões:

a) a primeira, por não realizar a análise do pedido subsidiário de reabertura da instrução processual para oitiva de novas testemunhas, caso não anulada a sentença com fundamento no aventado cerceamento de defesa, ante o não conhecimento das declarações acostadas; e

b) a segunda, envolvendo a ausência de manifestação “quanto à alegação do Embargante de que as entregas foram feitas sem autorização legal, sem regulamentação e sem critérios objetivos e transparentes para acesso ao benefício e fiscalização dos órgãos de controle”.

No tocante à primeira omissão apontada, o acórdão embargado analisou de modo integral a preliminar de cerceamento de defesa, nos seguintes termos:

A recorrente suscita preliminar de cerceamento de defesa em face de não terem sido admitidas as declarações autorizativas das gravações ambientais.

Relata que o processo conta com diversas gravações ambientais que comprovariam a prática de ilícitos eleitorais, e que localizou os interlocutores das conversas e lhes deu ciência de que haviam sido gravados, colhendo a autorização para uso do material no processo em relação àqueles que não se sentiram violados na sua privacidade, intimidade ou honra.

Narra que as autorizações foram acostadas ao feito, porém o juízo a quo determinou que fossem desconsideradas, pois deveriam ter aportado juntamente com a exordial.

Alega que a fase de instrução ainda se encontrava aberta, quando coligidas ao processo as declarações, e que a jurisprudência assentou entendimento pela possibilidade de juntada de novos documentos até a fase recursal.

Com efeito, tenho, de maneira congruente ao parecer ministerial, que merece retoque a decisão monocrática que entendeu pela impossibilidade de juntada de documentos após o ajuizamento da representação.

A jurisprudência desta Corte aceita a juntada de documentos inclusive com a peça recursal, com fulcro no art. 266 do Código Eleitoral e no art. 435 do CPC.

Para ilustrar, trago à colação os seguintes precedentes:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. VEREADOR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL – AIJE. IMPROCEDENTE. PRELIMINAR. JUNTADA DE NOVOS DOCUMENTOS. POSSIBILIDADE. DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MÁSCARAS. RECURSOS PÚBLICOS. LIVE COM ADVOGADO. OFERTA DE ATENDIMENTO GRATUITO. ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. NÃO CONFIGURADO. CONDUTA VEDADA. CARACTERIZADA. PROMOÇÃO PESSOAL COM FINALIDADE ELEITORAL. MULTA. PATAMAR MÍNIMO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Recurso interposto contra sentença que julgou improcedente Ação de Investigação Judicial Eleitoral - AIJE proposta em desfavor de vereador, candidato à reeleição no pleito de 2020. Alegada ocorrência de abuso do poder político e econômico e de conduta vedada.

2. Preliminar. Possibilidade da juntada de documentos na fase recursal, nos termos do art. 266 do CE, quando estes não demandarem análise técnica.

[...]

(TRE-RS, REl n. 0601261-88.2020.6.21.0055, Relator Des. ARMINIO JOSE ABREU LIMA DA ROSA, Acórdão, julgado em 25.5.2021). (Grifei.)

RECURSOS. AÇÕES DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. JULGAMENTO CONJUNTO. PREFEITO E VICE ELEITOS. ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. ARTS. 19 E 22, INCS. XIV E XVI, DA LEI COMPLEMENTAR N. 64/90. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI N. 9.504/97. SÚMULA N. 62 DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. PRELIMINAR AFASTADA. PEÇA RECURSAL. DOCUMENTOS NOVOS. POSSIBILIDADE. MÉRITO. FRAUDE NOS AGENDAMENTOS DE PROCEDIMENTOS MÉDICOS. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. INSERÇÃO DE DADOS FALSOS NO ENDEREÇO DE PACIENTES. MORADORES DO INTERIOR. FACILITAÇÃO PARA ATENDIMENTO EM UNIDADES HOSPITALARES DA CAPITAL. FORNECIMENTO DE TRANSPORTE AOS PACIENTES FAVORECIDOS. BENEFÍCIO ELEITORAL. ASSISTENCIALISMO. CLIENTELISMO. PROVIMENTO. CASSAÇÃO DOS DIPLOMAS. INELEGIBILIDADE. MULTA. NOVAS ELEIÇÕES MUNICIPAIS. ELEIÇÕES 2016.

1. Questão preliminar rejeitada. É possível a juntada de novo documento com o recurso, nos termos do disposto nos arts. 266 do Código Eleitoral e 435 do Código de Processo Civil, mormente por tratar-se de documento referente a fato debatido nos autos e submetido ao contraditório.

[...]

(RE n. 56718, Acórdão, Relator Des. Eleitoral SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Publicação: DEJERS, Data: 12/09/2017, pp. 5-6.) (Grifei.)

Desse modo, não há de prevalecer o entendimento da magistrada a quo quanto ao ponto, uma vez que inexistia óbice a que a parte colacionasse as declarações complementares às provas carreadas na inicial durante a fase instrutória, tal como ocorrido.

Noutro vértice, o conhecimento desses documentos nesta fase não acarreta a nulidade da sentença, pois toda a matéria foi devolvida para reexame nesta instância, inexistindo prejuízo à parte.

Sendo assim, conheço das declarações autorizativas firmadas pelas pessoas que figuram nas gravações ambientais.

 

Portanto, em realidade, a decisão expressamente apontou inexistir nulidade na sentença, pois a prova pretendida foi inequivocamente produzida a destempo, sem justa causa para tanto, estando a oportunidade fulminada pela preclusão.

Assim, não havendo vício na instrução ou na decisão recorrida, está logicamente afastado o pedido subsidiário que pretendia, exatamente, a reabertura da instrução, com novas provas testemunhais.

Nada obstante, o acórdão, com fundamento no art. 266 do Código Eleitoral, admitiu as declarações acostadas, tornando despicienda, novamente, a anulação da sentença ou a reabertura da instrução processual, tendo em conta a possibilidade de imediata apreciação do ponto pela Corte, porquanto, consoante constou na fundamentação, “o conhecimento desses documentos nesta fase não acarreta a nulidade da sentença, pois toda a matéria foi devolvida para reexame nesta instância, inexistindo prejuízo à parte”.

Logo, inexistente a lacuna alegada.

Em relação à segunda omissão, a embargante defende que o acórdão, reconhecendo o estado de calamidade para a distribuição de alimentos e cartões de vale-compras, deixou de enfrentar as alegações de ausência de fundamentação legal, de regulamentação e de critérios objetivos e transparentes para a concessão dos benefícios à população necessitada.

Ocorre que a decisão embargada expressamente pontuou a ausência de provas suficientes de eventuais condutas vedadas ou abusivas, pois os documentos acostados aos autos indicam que o Poder Público se limitou a fornecer o cadastro de catadores de baixa renda e que os cartões de vale-compras foram custeados com recursos de entes assistenciais privados.

Transcrevo o trecho pertinente ao aspecto:

No pertinente à conduta vedada prevista no inc. II do art. 73 acima mencionado, há que se assinalar que, na espécie, os cartões com vale-alimentação não foram custeados pela administração pública municipal.

Inexiste nos autos demonstração cabal de que tenha havido excesso do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) no ato de entrega dos 25 cartões, extrapolando suas atribuições.

Para a configuração do ilícito, devem ser usados materiais ou serviços que ultrapassem as prerrogativas consignadas nas normas que regulam a atuação do órgão, devendo a afronta ao dispositivo ser direta, na própria origem do ato.

[...].

Ainda que se entendesse que a atividade não poderia ser efetivada pela área de assistência social do município, não existe comprovação de que eventuais servidores envolvidos a realizaram durante o horário de expediente e com a utilização da estrutura pública.

Noutro vértice, quanto à conduta vedada prevista no art. 73, inc. IV, da Lei Eleitoral, como acima referido, os bens de caráter social não foram custeados ou subvencionados pelo poder público.

Como ficou demonstrado, os vales-alimentação foram custeados pela ONG Pimp My Carroça, Cataki e Novartis e entregues a catadores de materiais recicláveis (ID 44958739).

Quanto à alegada violação ao art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97, não procede, tendo em vista que, além de o benefício distribuído gratuitamente não ter sido financiado pelo poder público, nem ter sido informado aos beneficiários que assim o fosse, havia decreto declarando estado de calamidade pública em Carazinho, em razão do surto de COVID-19 (ID 44958549), que constitui exceção à regra plasmada no dispositivo.

[...].

No caso concreto, não restou evidenciado favorecimento à campanha dos recorridos pela entrega de 25 cartões de vale-alimentação a recicladores cadastrados como tal no CadÚnico (IDs 44958741 a 44958764), adquiridos com fundos da entidade de apoio a esses trabalhadores e distribuídos com o fim de mitigar os efeitos adversos das medidas de contenção da pandemia.

Inexistem provas de que as candidaturas dos demandados tenham sido beneficiadas por emprego excessivo de recursos ou por desvio de finalidade por parte de agentes públicos, de modo a comprometer a legitimidade do pleito.

 

Da mesma forma, no pertinente à suposta entrega irregular de marmitas, a conclusão vertida da decisão embargada advém da debilidade da prova em relação às alegadas irregularidades e abusos, consignando que “o arcabouço probatório é assaz frágil no sentido de indicar ilicitude no campo eleitoral”.

Em apoio, constou no voto expressa adoção da análise probatória exposta na sentença, então reproduzida no voto em relação ao ponto, por meio da técnica da fundamentação per relationem, que, nos termos da jurisprudência do TSE, é “compatível com o disposto no art. 93, IX, da Constituição Federal, não podendo ser confundida com ausência ou eficiência de fundamentação” (TSE - RMS: 060017543/DF, Relator: Min. Ricardo Lewandowski, Data de Julgamento: 10.04.2023, Data de Publicação: 25.04.2023).

Conforme se observa, não estão configurados os supostos vícios de fundamentação, pois as razões do apelo estão suficientemente enfrentadas no acórdão.

Nas circunstâncias, a pretensão recursal possui nítido intento de rediscutir a matéria decidida pelo Tribunal, o que é incabível em âmbito de embargos declaratórios, vez que "a omissão apta a ser suprida pelos declaratórios é aquela advinda do próprio julgamento e prejudicial à compreensão da causa, não aquela deduzida com o fito de provocar o rejulgamento da demanda ou modificar o entendimento manifestado pelo julgador" (TSE, ED-AgR-AI 10.804, Rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJE de 1º.2.2011).

De todo modo, considerando a disciplina do art. 1.025 do CPC, os elementos que a parte suscitou nos embargos de declaração serão considerados como prequestionados mesmo com sua rejeição, desde que tribunal superior considere que houve erro, omissão, contradição ou obscuridade.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.