REl - 0600091-66.2021.6.21.0081 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/10/2023 às 09:30

VOTO

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

 

Mérito

Eminentes Colegas.

O juízo de origem desaprovou as contas partidárias do Progressistas - PP de Toropi/RS, referentes ao exercício financeiro de 2020, e determinou o recolhimento de R$ 4.040,00 ao Tesouro Nacional, em virtude do recebimento de doações em valor superior a R$ 1.064,10 mediante depósitos bancários realizados de forma distinta da opção de transferência eletrônica ou cheque cruzado e nominal, em desacordo com o previsto no § 3º do art. 8º da Resolução TSE n. 23.604/19, configurando aporte de recursos de origem não identificada.

Pois bem, inicialmente pontuo que a prestação de contas sub judice está sujeita à disciplina prevista na Resolução TSE n. 23.604/19, que regulamenta o disposto no Título III - Das Finanças e Contabilidade dos Partidos - da Lei n. 9.096/95.

Essa premissa é necessária para refutar, de plano, a tese de que o presente feito está sujeito ao rito simplificado previsto na Resolução TSE n. 23.463/15, motivo pelo qual não haveria necessidade de oferecer outros documentos além daqueles exigidos para o tipo de contas apresentada.

Primeiro, a Resolução TSE n. 23.463/15 regulamentou a arrecadação e os gastos de recursos por partidos políticos e candidatos, bem como a prestação de contas das eleições de 2016, o que, evidentemente, não é o caso dos autos, visto que a presente demanda tem por objeto prestação de contas partidárias, referente ao exercício financeiro 2020, que em hipótese alguma pode ser confundida com prestação de contas eleitoral.

Segundo, não obstante os autos versarem sobre prestação de contas partidária e não de campanha, esclareço que a adoção do procedimento simplificado das prestações de contas eleitorais não dispensa o registro de todas as receitas e despesas eleitorais, de modo a permitir à Justiça Eleitoral a fiscalização integral da movimentação financeira de campanha, sendo que a tese levantada não encontra guarida em nenhuma legislação pátria.

Dito isso, passo à análise do mérito sob a luz da Resolução TSE n. 23.604/19, aplicável ao caso em exame.

Compulsando os autos, verifico que, de fato, nos dias 11.3.2020 e 19.5.2020, a agremiação partidária recebeu doações financeiras mediante depósitos em dinheiro, sem identificação da contraparte, nos valores, respectivamente, de R$ 1.740,00 e R$ 2.300,00, totalizando R$ 4.040,00, conforme extrato de n. 45494702 e parecer conclusivo de ID 45494711.

O fato foi confirmado pelos recorrentes, restando incontroverso (ID 45494707). Em suas razões recursais (ID 45494722), apenas sustentam que a impropriedade constatada não enseja, por si só, a reprovação das contas, dado que os recibos bancários identificam os doadores. Argumentam que, embora a análise da irregularidade seja sobre o percentual dos recursos, deve ser considerado que o valor total da falha é de pequeno vulto. Afirmam que as doações foram realizadas por filiados que não detêm o conhecimento contábil da forma disposta na legislação, inexistindo má-fé, reiterando que tais impropriedades não são suficientes para reprovação das contas, pugnando pela aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Ao final, postulam a reforma da sentença para o fim de aprovar as contas ou, alternativamente, reduzir o valor a ser recolhido ao erário.

Sem razão.

De fato, o conjunto de operações em tela está em desacordo com o disposto no § 3º do art. 8º da Resolução TSE n. 23.604/19, segundo o qual as doações financeiras acima de R$ 1.064,10 só podem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal:

Art. 8º As doações realizadas ao partido político podem ser feitas diretamente aos órgãos de direção nacional, estadual ou distrital, municipal e zonal, que devem remeter à Justiça Eleitoral e aos órgãos hierarquicamente superiores do partido o demonstrativo de seu recebimento e da respectiva destinação, acompanhado do balanço contábil (art. 39, § 1º, da Lei nº 9.096/95)

(...)

§ 3º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

(...)

A irregularidade decorre da inobservância objetiva do disposto no § 3º do art. 8 da Resolução TSE n. 23.604/19, sendo irrelevante o fato de as doações terem sido realizadas ou não por filiados que não detêm o conhecimento contábil da forma disposta na legislação, pois não se discute a boa-fé ou a má-fé de doadores e/ou do prestador de contas, e sim a observância objetiva das normas sobre finanças, transparência, confiabilidade e a lisura da prestação de contas partidária.

Ademais, cabia ao partido zelar pela observância da regularidade das doações recebidas para fins de não utilização e restituição tempestiva de valores, nos termos do § 10 do art. 8º da Resolução de regência.

Outrossim, não procede a tese de que os recibos bancários acostados aos autos (ID 45494708 e 45494709) são aptos a identificar os doadores, pois a inobservância da forma legal impossibilita o cruzamento de informações com o Sistema Financeiro Nacional, impedindo a confirmação exata da fonte declarada por meio dos mecanismos técnicos de controle da Justiça Eleitoral.

Sobre essa temática, a jurisprudência desta Corte pacificou o entendimento de que a carência de identificação da fonte originária do recurso na própria operação bancária é falha grave que impede o controle da Justiça Eleitoral sobre eventuais fontes vedadas e prejudica a transparência das declarações contábeis, ensejando a desaprovação do feito. Confira-se:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO 2020. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DESAPROVAÇÃO. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. ALTO PERCENTUAL. MANTIDA A DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS E O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. READEQUAÇÃO DA MULTA APLICADA. DESTINADA AO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas da agremiação referente ao exercício financeiro de 2020, em virtude do recebimento de recursos de origem não identificada. Determinado o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional, acrescida de multa de 20%.

2. Recebimento de recurso de origem não identificada por meio de depósito em dinheiro efetuado na conta bancária do partido. Incontroversa a operação fora dos parâmetros legais, na medida em que a regra é clara ao estabelecer que as doações financeiras acima de R$ 1.064,09 devem ocorrer por transferência eletrônica ou cheque cruzado e nominal, cabendo ao partido diligenciar para que o aporte de recursos financeiros seja sempre realizado na forma estabelecida na normatização legal, sob pena de devolução ao erário, nos termos do art. 14 da Resolução TSE n. 23.604/19. A norma caracteriza todo valor que ingressou de forma indevida na conta de campanha como irregular, e não apenas o montante que exorbitou o teto definido em resolução. Entendimento plasmado no art. 48 da Resolução TSE n. 23.604/19. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

3. A jurisprudência deste Tribunal pacificou o entendimento de que a carência de identificação da fonte originária do recurso na própria operação bancária é falha grave que impede o controle da Justiça Eleitoral sobre eventuais fontes vedadas e prejudica a transparência das declarações contábeis, ensejando a desaprovação do feito.

4. A irregularidade representa 72,20% da receita arrecadada e ultrapassa o parâmetro utilizado por esta Corte para considerar a quantia ínfima, seja em valores nominais ou percentuais. Inviável a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Readequação da multa para aplicação proporcional e razoável, reduzida para 14,44%, incidente sobre o valor total irregular, a ser recolhida ao Fundo Partidário, nos termos do art. 48 da Resolução TSE n. 23.604/19.

5. Parcial provimento. Mantida a desaprovação das contas e o recolhimento ao Tesouro Nacional. Reduzido o percentual da multa aplicada, destinada ao Fundo Partidário.

(RECURSO ELEITORAL (11548) - 0600095-27.2021.6.21.0074, Des. El. Amadeo Henrique Ramella Butteli, julgado em 15.07.2022, publicado no DJE em 25.07.2022.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. AFASTADA A PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DE DIRIGENTE PARTIDÁRIO. MÉRITO. LICITUDE DAS DOAÇÕES REALIZADAS POR DETENTORES DE MANDATO ELETIVO. VEREADOR. DEPUTADO ESTADUAL. FALTA DE IDENTIFICAÇÃO DO CPF DE CONTRIBUINTES NOS EXTRATOS BANCÁRIOS. REPASSE DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO A ÓRGÃO IMPEDIDO DE RECEBER VALORES DESSA RUBRICA. INOBSERVÂNCIA DA APLICAÇÃO DO PERCENTUAL DE PROMOÇÃO À PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DAS MULHERES. SUSPENSÃO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS.

1. Afastada a preliminar de ilegitimidade passiva. Incontroverso que o dirigente foi um dos responsáveis pelo controle e pela movimentação financeira da agremiação durante parcela do exercício financeiro em análise, sendo assim legitimado para integrar o presente processo. Aplicação das disposições processuais previstas na Resolução TSE n. 23.464/15.

2. Recebimento de valores advindos de deputado estadual e de vereadores. Licitude das doações. Cargos não enquadrados no conceito de autoridade pública a que se refere o art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, na redação vigente ao tempo dos atos em análise. O fundamento para vedar a doação de ocupantes de cargos de direção e chefia é evitar a distribuição de funções públicas com o intento de alimentar os cofres partidários. O detentor de mandato eletivo não é titular de cargo nomeado em razão de vinculações partidárias, ao contrário, são alçados ao cargo pela vontade popular. Considerar tais doadores como autoridade pública significaria atribuir interpretação ampliativa de uma norma restritiva de direitos, o que não se coaduna com a ordem constitucional.

3. Emprego de verbas de origem não identificada. Valores depositados em espécie e na conta da agremiação, sem a identificação do CPF do contribuinte. Irregularidade que enseja o recolhimento do montante indevidamente utilizado ao Tesouro Nacional.

4. Configura irregularidade o repasse de recursos do Fundo Partidário ao Diretório Municipal durante o período em que cumpre suspensão de recebimento das quotas.

5. Inobservância da regra de destinação do percentual mínimo de 5% dos recursos oriundos do Fundo Partidário na criação e manutenção de programas para promover e difundir a participação política das mulheres. Imposição do acréscimo de 2,5% no ano seguinte ao trânsito em julgado, bem como o recolhimento do valor correspondente ao Erário, ante a proibição legal de utilização da quantia para outra finalidade, nos termos do art. 22 da Resolução TSE n. 23.432/14.

6. Sancionamento. Suspensão de recebimento de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de um mês. Recolhimento ao Tesouro Nacional do valor da quantia irregularmente empregada.

7. Desaprovação.

(PC N. 54-16, Des. El. Gerson Fischmann, julgado em 10.10.2018, publicado no DEJERS n. 187, de 15.10.2018, pp. 4-5.) (Grifei.)

Portanto, prestigiando o entendimento sufragado por este Tribunal, tem-se que a ausência de comprovação segura dos doadores compromete a regularidade das contas, restando tais recursos qualificados como de origem não identificada, devendo o valor correspondente ser integralmente recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos dos arts. 8, §§ 3º e 10, e 48, caput, da Resolução TSE n. 23.604/19, não havendo espaço para se falar em redução do montante a ser recolhido.

De outra banda, considerando que as falhas, no valor R$ 4.040,00 (quatro mil e quarenta reais), representam 17,65% do total de receitas arrecadadas (R$ 22.877,03), inaplicáveis os princípios da proporcionalidade ou da razoabilidade, ou valor módico (até R$ 1.064,10), motivos pelos quais deve ser mantida a desaprovação de contas.

Por fim, inviável a determinação de suspensão de distribuição ou repasse de recursos oriundos do Fundo Partidário, prevista no art. 46, inc. II, da Resolução TSE 23.604/19, em atenção ao princípio da non reformatio em pejus, visto que inexiste insurgência recursal sobre esse capítulo da sentença.

 

Ante o exposto, voto pelo desprovimento do recurso, mantendo integralmente a sentença que desaprovou as contas do Progressistas - PP de Toropi/RS, relativas ao exercício financeiro de 2020, e determinou o recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 4.040,00 (quatro mil e quarenta reais), nos termos da fundamentação.

É o voto.