PCE - 0603057-17.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 09/10/2023 às 14:00

VOTO

Trata-se de prestação de contas apresentada por BENHUR TIECHER, candidato ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

A Secretaria de Auditoria Interna (SAI), analisando a contabilidade, apontou o recebimento de recursos de origem não identificada, consoante o seguinte fragmento do exame técnico (ID 45440185):

3.1 Foram identificadas as seguintes omissões relativas às despesas constantes da prestação de contas em exame e aquelas constantes da base de dados da Justiça Eleitoral, obtidas mediante confronto com notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais, revelando indícios de omissão de gastos eleitorais, infringindo o que dispõe o art. 53, I, g, da Resolução TSE n. 23.607/2019:

 

Assim, por não comprovação da origem dos recursos utilizados na campanha, considera-se irregular o montante de R$ 3.300,00, passível de recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme o art. 14 e o art. 32 da Resolução TSE 23.607/2019.

Intimado para esclarecer o ponto, o candidato manteve-se inerte.

Examinando a nota fiscal em questão, pela página da receita estadual na internet, https://www.sefaz.rs.gov.br/dfe/Consultas/ConsultaPublicaDfe?, tendo em vista que o documento acostado ao feito pela área técnica não contém a descrição da mercadoria (ID 45459602, fl. 5), observo que diz respeito à produção de 100.000 colinhas, tamanho 9,5 X 5,5, ao custo de R$ 3.300,00, ou seja, trata-se indiscutivelmente de material de campanha, tornando inafastável a necessidade de contabilização em campanha.

Consoante entendimento desta Corte, a emissão de nota fiscal contra o CNPJ de campanha gera a presunção de existência da despesa eleitoral, de sorte que, ausentes provas de seu cancelamento, retificação ou estorno, resta caracterizada a omissão de registro de despesa, em violação ao disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Nessa linha, o TSE entende que “gastos não declarados que tenham sido informados por fornecedores por meio do Sistema de Registro de Informações Voluntárias, e/ou constem de notas fiscais oriundas das Secretarias das Fazendas Estaduais e Municipais, (...) constituem omissão de despesas” (TSE; Prestação de Contas n. 97795, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, DJE, Tomo 241, Data 16.12.2019, p. 73).

Além disso, as despesas não declaradas implicam, igualmente, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação dos gastos de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal do candidato, caracterizando o recurso como de origem não identificada.

Nesse sentido, cito o seguinte precedente desta Corte:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA. VEREADORA. OMISSÃO DE GASTOS ELEITORAIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA - RONI. SAQUE ELETRÔNICO DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. CONFIABILIDADE CONTÁBIL. MACULADA. RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. RECOLHIMENTO DOS VALORES AO TESOURO NACIONAL. VALOR NOMINAL DAS IRREGULARIDADES. DIMINUTO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. REDUÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO. PROVIMENTO PARCIAL. (...). 2. Detectadas 07 (sete) notas fiscais emitidas contra o CNPJ de campanha, sem que os recursos para quitação da despesa tenham transitado pelas contas bancárias da candidata, indicando omissão de gasto eleitoral. Os gastos não contabilizados afrontam o art. 53, inc. I, als. “g” e “i”, da Resolução TSE n. 23.607/19. Nesse trilhar, a Corte Superior entende que a omissão em tela viola as regras de regência e macula a confiabilidade do ajuste contábil. 3. As despesas não declaradas implicam, igualmente, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação da dívida de campanha, cujo trânsito ocorreu de modo paralelo à contabilidade formal da candidata, caracterizando o recurso como de origem não identificada, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19. (...).

(TRE-RS, REl 06006545520206210094, Relator: Des. Francisco José Moesch, Data de Julgamento: 03.2.2022.) (Grifei.)

 

Não fosse isso, verificada a emissão por pessoa jurídica de nota fiscal contra postulante a cargo eletivo sem demonstração do correspondente pagamento, há de ser reconhecido o fato como doação proveniente de fonte vedada, o que, assim como os recursos de origem não identificada, enseja o recolhimento da importância ao erário.

Nesse trilhar, colaciono recente precedente da Corte Superior:

ELEIÇÕES 2018. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO POLÍTICO. PTC (ATUAL AGIR). INTEMPESTIVIDADE NA ENTREGA DA PRESTAÇÃO DE CONTAS FINAL DE SEGUNDO TURNO. DESCUMPRIMENTO DO PRAZO PARA ENTREGA DO RELATÓRIO FINANCEIRO. OMISSÃO DE RECEITAS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS PARCIAL. IMPROPRIEDADES. DESCUMPRIMENTO DA NORMA REFERENTE AO FINANCIAMENTO DAS CANDIDATURAS DE GÊNERO. EC Nº 117/2022. OMISSÃO DE GASTOS ELEITORAIS (NOTAS FISCAIS ELETRÔNICAS DESCOBERTAS POR MEIO DE CONVÊNIO COM AS SECRETARIAS DE FAZENDA). INEXISTÊNCIA DE REGISTRO DE DOAÇÃO PARA CANDIDATURA FEMININA. IRREGULARIDADES QUE ALCANÇARAM O VALOR DE R$ 87.000,00, EQUIVALENTE A 1,24% DO MONTANTE ARRECADADO NA CAMPANHA ELEITORAL. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO À FISCALIZAÇÃO. NÃO COMPROMETIMENTO DA CONFIABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

[...]

6. Omissão de gastos eleitorais. Cruzamento de informações com outras fontes. Fonte vedada.

6.1. O órgão técnico identificou que não foram registradas notas fiscais eletrônicas no SPCE, oriundas de convênio entre as secretarias de fazenda estaduais e municipais e a Justiça Eleitoral, relativas a bens e serviços prestados ao partido, no valor de R$ 75.000,00, e que "a despesa no valor de R$60 mil foi identificada nos extratos da conta–corrente nº 403507–0, de Fundo Partidário, enquanto a despesa de R$15 mil não restou identificada nos extratos bancários do Partido" (ID 157834905, fl. 17).

6.2. A mera circunstância de o candidato ter sido omisso quanto à juntada de notas fiscais de serviços de campanha não implica concluir, por si só, que houve doações por fonte vedada de pessoas jurídicas, sendo certo que "[...] a restituição somente está autorizada pela legislação quando efetivamente são identificados recursos de origem não identificada ou de fonte vedada, não quando a circularização indica despesas supostamente não declaradas [...]" (PC nº 0601227–40/DF, rel. designado Min. Alexandre de Moraes, julgada em 9.8.2022, DJe de 11.10.2022.

6.3. Quanto à despesa de R$ 60.000,00, o partido não nega a prestação do serviço pela empresa que emitiu a nota fiscal, tendo a glosa realizada pelo órgão técnico sido fundamentada na omissão no registro das despesas nas presentes contas, cuja identificação decorreu de circularização realizada por meio de convênios com as secretarias de fazenda estaduais e municipais. Da análise da nota fiscal, verifica–se que, além de obedecer ao disposto no art. 63, caput, da Res.–TSE nº 23.553/2017, contém elementos hábeis a demonstrar o vínculo eleitoral do gasto custeado com recursos públicos. Nesse contexto, é de rigor manter–se a irregularidade, ante a violação ao art. 56, I, g, da Res.–TSE nº 23.553/2017, sem, contudo, determinar o recolhimento do valor ao erário, haja vista a impossibilidade de se presumir, de modo automático, que a omissão do registro da despesa ocorreu por se tratar de doação de pessoa jurídica, circunstância não demonstrada nos autos.

6.4. Em relação à nota fiscal nº 2, no valor de R$ 15.000,00, o partido se limitou a dizer que "o pagamento não foi feito porque os serviços não foram realizados, cabendo ao prestador de serviço o cancelamento da NF–e" (ID 157572004, fl. 4). Conforme verificou a Asepa, "[...] a nota permanece ativa segundo consulta ao sistema de verificação de autenticidade de notas fiscais do Município de Salvador e não foi identificado seu cancelamento" (ID 157834905, fl. 21).

6.4.1. O mero pedido de cancelamento de nota fiscal, por si só, não demonstra que o documento foi efetivamente cancelado, competindo tal providência unicamente ao prestador de contas. Ademais, a legislação tributária impõe o prazo de 24 horas para o pedido de cancelamento de nota fiscal. Precedentes.

6.4.2. As circunstâncias constantes dos autos revelam a omissão de gastos, em violação ao art. 56, I, g, da Res.–TSE nº 23.553/2017, bem como atraem o entendimento desta Corte Superior no sentido de que, "[...] configurada a emissão de nota fiscal referente a serviços prestados ao candidato sem o correspondente pagamento, deve ser reconhecida a existência de doação de fonte vedada, nos termos do art. 33, I, da Res.–TSE 23.553" (PC nº 0601188–43/DF, rel. Min. Sérgio Banhos, julgada em 9.12.2021, DJe de 3.2.2022).

[...]

8.4. Determinações: (a) restituição ao Tesouro Nacional do valor de R$ 15.000,00, atualizado e com recursos próprios; e (b) aplicação do valor de R$ 15.824,63, atualizado, nas eleições subsequentes ao trânsito em julgado desta decisão, nos termos da EC nº 117/2022.

(Prestação de Contas n. 060118588, Acórdão, Relator Min. Raul Araújo Filho, Publicação: DJE, Tomo 38, Data: 13.3.2023.) (Grifei.)

 

Desse modo, restou caracterizada a irregularidade, devendo o montante de R$ 3.300,00 ser recolhido ao Tesouro Nacional, na forma prescrita pelo art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, o importe da falha representa 45,83% do total arrecadado pelo candidato (R$ 7.200,00), de modo a inviabilizar a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade como meio de atenuar a gravidade da mácula sobre o conjunto das contas, sendo, portanto, mandatória a desaprovação, em linha com o parecer ministerial.

 

Ante o exposto, VOTO pela desaprovação das contas de BENHUR TIECHER, relativas ao pleito de 2022, com esteio no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e pela determinação do recolhimento de R$ 3.300,00 ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.