PCE - 0603651-31.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 09/10/2023 às 14:00

VOTO

Trata-se da prestação de contas do candidato, não eleito, ao cargo de deputado estadual, ANDRÉ OLIVEIRA MACHADO, apresentada intempestivamente, relativa às Eleições Gerais de 2022. 

O prestador de contas não constituiu advogado. Foi citado e não regularizou a representação processual.

No mérito, a Secretaria de Auditoria Interna desta Corte concluiu haver uma série de irregularidades na comprovação dos gastos de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC e indícios de irregularidade referente à arrecadação de recursos financeiros provenientes de pessoa física inscrita em programa social do governo, no valor de R$ 50,00.

Passo à análise individualizada de cada um dos fornecedores e prestadores de serviço, conforme espécie das despesas descritas no parecer conclusivo.

1. Publicidade. Materiais

O fornecedor FRANCISCO ARNALDO MACHADO DE CASTILHOS emitiu a nota fiscal n. 202226, no total de R$ 1.600,00, e o fornecedor G E G IMPRESSOES GRAFICAS LTDA. emitiu a nota fiscal n. 2022150, no total de R$ 890,00, de acordo com o discriminado na demonstração contábil ID 45292051.

Com a finalidade de demonstrar a realização das despesas, o prestador de contas juntou aos autos apenas cópia dos cheques nominais, não cruzados, ID 45292048 e 45292047, respectivamente.

A parte foi devidamente intimada para complementar a documentação, mas não se manifestou.

Com efeito, não foram apresentados documentos fiscais comprovando a contratação e as despesas com publicidade por materiais impressos, com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, segundo determinação prevista nos arts. 35, 53, inc. II, al. "c", e 60, § 8º, todos da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, julgo irregulares os gastos realizados com publicidade por materiais impressos, no valor de R$ 2.490,00.

 

2. Despesas com pessoal

Os prestadores de serviço Angélica Machado da Silva e Dirceu Pires emitiram recibos referentes ao pagamento de serviços de militância (panfletagem e distribuição de material), no valor de R$ 675,00 e 500,00, respectivamente, conforme discriminado na demonstração contábil ID 45292051.

O candidato acostou aos autos apenas cópia dos cheques nominais, não cruzados, ID 45292046 e 45292045, respectivamente.

Novamente, a parte foi intimada a complementar a documentação e quedou silente.

Destaco, portanto, que não foram apresentados documentos fiscais comprovando a contratação e o pagamento das despesas com pessoal, consoante determinação prevista nos arts. 35, § 12, 53, inc. II, al. "c", e 60, todos da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, julgo irregulares os gastos realizados com pessoal, no valor de R$ 1.175,00.

3. Despesas com serviços contábeis

O prestador de serviço Eduardo Lima de Souza emitiu recibo no valor de R$ 110,00, referente à prestação de serviços contábeis, de acordo com o discriminado na demonstração contábil ID 45292051. Quanto à despesa, o candidato colacionou aos autos apenas comprovante de pagamento por meio de transação bancária, na modalidade Pix (ID 45292077).

Devidamente intimado para complementar a documentação, o prestador deixou de manifestar-se.

Também com relação às despesas com contabilidade, o prestador de contas não apresentou documentos fiscais comprovando o gasto, conforme determinação prevista nos arts. 35, 53, inc. II, al. "c", e 60, todos da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, julgo irregulares os gastos realizados com contabilidade, no valor de R$ 110,00.

4. Facebook

Verifico, entre os documentos juntados, dois comprovantes de pagamento de boletos bancários cujo beneficiário final é o Facebook (ID 45292041 e ID 45292042), ambos no valor de R$ 500,00, em contraposição à única nota fiscal emitida por Facebook Serviços Online do Brasil Ltda., no importe de R$ 906,80, extraída do DivulgaCandContas.

Esta Corte, convém frisar, já se deparou com a mesma circunstância em outros feitos, e a disparidade entre os boletos efetivamente pagos e as notas fiscais emitidas pela empresa Facebook, via de regra, é resultante da compra de créditos de forma antecipada e de sua utilização apenas parcial.

Em tais situações, compete ao prestador demandar à plataforma a compensação dos valores contratados e não utilizados e providenciar a transferência ao Tesouro Nacional a título de sobra de campanha, quando se tratar de recursos públicos, como no caso dos autos, conforme determinado na legislação de regência:

Resolução TSE n. 23.607/19

Art. 35.

(…)

§ 2º Os gastos de impulsionamento a que se refere o inciso XII deste artigo são aqueles efetivamente prestados, devendo eventuais créditos contratados e não utilizados até o final da campanha serem transferidos como sobras de campanha:

I - ao Tesouro Nacional, na hipótese de pagamento com recursos do FEFC; e (...)

 

Neste sentido, julgado desta Casa:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA ELEITA. DEPUTADA FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. PAGAMENTO DE DESPESAS OMITIDAS. INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE CANCELAMENTO DAS NOTAS FISCAIS. FALHA MANTIDA. IRREGULARIDADES COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA. DESPESAS COM IMPULSIONAMENTO. CRÉDITO NÃO UTILIZADO. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTO FISCAL. IRREGULARIDADES PARCIALMENTE SANADAS. CONTRATO OU DOCUMENTO FISCAL SEM ASSINATURA. INFRAÇÃO AO ART. 60 DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. CONTRATO FIRMADO POR PESSOA FÍSICA. IMPOSSIBILIDADE DE A DESPESA SER CUSTEADA COM RECURSOS. PÚBLICOS. NOTA FISCAL SEM A APRESENTAÇÃO DAS DIMENSÕES DO MATERIAL. IRREGULARIDADES EM CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE ATIVIDADE DE MILITÂNCIA. BAIXO PERCENTUAL DAS FALHAS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Prestação de contas apresentada por candidata eleita ao cargo de deputada federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022. 2. Recursos de origem não identificada. Pagamento de despesas omitidas na prestação de contas, verificadas a partir da localização de notas fiscais emitidas contra o CNPJ da candidatura (procedimento de circularização). Inexiste indícios de que houve o cancelamento das notas fiscais que teriam sido emitidas por equívoco, providência que incumbe aos candidatos e partidos e encontra previsão no art. 59 da Resolução TSE n. 23.607/19, segundo o qual "o cancelamento de documentos fiscais deve observar o disposto na legislação tributária, sob pena de ser considerado irregular". Caracterizado uso de recurso de origem desconhecida, na forma do art. 32, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19, impondo o recolhimento da quantia equivalente ao Tesouro Nacional. 3. Irregularidades na movimentação financeira realizada com verbas procedentes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. 3.1. Impulsionamento de internet junto ao Google. Existência de créditos não utilizados. Ausência de apresentação de documento fiscal ou comprovante de recolhimento ao erário da respectiva diferença, em contrariedade ao disposto no art. 35, § 2º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19. 3.2. Impulsionamento de internet junto ao Facebook. Ausência de apresentação de documento fiscal declarado como pago pela candidata. Apresentados dois recibos relacionados a impulsionamentos. Falha sanada parcialmente, pois consoante jurisprudência do TSE: "a Justiça Eleitoral pode admitir, para comprovação do gasto, além da nota fiscal, quaisquer meios idôneos de prova, tais como contratos, comprovantes de entrega de material ou serviço e comprovantes bancários de pagamento" (PC n. 0601826-13.2017.6.00.0000, rel. Min. Sérgio Banhos, DJE de 11.5.2022). Dever de recolhimento ao erário de créditos não utilizados. 3.3. Ausência de assinatura em documentos fiscal ou contrato comprovando a despesa. Infração ao art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19. 3.4. Contrato firmado pela pessoa física da candidata e não pela pessoa jurídica da candidatura. Impossibilidade de a despesa ser custeada com verbas provenientes dos fundos públicos, nos termos do art. 37 da Resolução TSE já mencionada. 3.5. Existência de uma nota fiscal de comprovação de despesas com publicidade de material impresso sem a apresentação das dimensões do material impresso e sem a emissão de carta de correção, em inobservância ao disposto no § 8º do art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19. 3.6. Irregularidades em contratos de prestação de serviços de atividade de militância e mobilização de rua. A falta de apresentação do respectivo acordo de trabalho, ou a sua apresentação incompleta, impede a fiscalização da correta utilização dos recursos públicos, prejudicando de forma insanável a transparência e a confiabilidade das contas. Dever de recolhimento ao erário. 4. As irregularidades representam 2,74% da receita total declarada pela candidata, sendo adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas com ressalvas. 5. Aprovação com ressalvas. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional. 

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS n. 060298967, Acórdão, Relatora Des. KALIN COGO RODRIGUES, Publicação: PSESS – Publicado em Sessão, Data: 12.12.2022.)

 

Desse modo, comprovado o gasto, por meio dos boletos pagos emitidos em favor do Facebook Serviços Online do Brasil Ltda., impõe-se o recolhimento do valor equivalente aos créditos contratados e não utilizados, no valor de R$ 93,20, consoante o art. 79, § 2º, do normativo citado.

5. Indício de Irregularidade

A unidade técnica identificou, mediante a integração do módulo de análise do SPCE e da base de dados CADÚNICO, o recebimento de doação financeira realizada por pessoa física inscrita em programa social do governo, a evidenciar a ausência de capacidade financeira do doador. Assim, Veridiana da Silva Ribeiro, inscrita em programas sociais do Governo Federal, beneficiária do Auxílio Brasil, realizou a doação de R$ 50,00 ao candidato.

Intimado para manifestar-se sobre o indício de irregularidade, o prestador de contas permaneceu silente.

Inicialmente, indico não desconhecer que, no julgamento do Recurso Eleitoral n. 060011540, em 20.04.2021, de relatoria do Desembargador Eleitoral Sílvio Ronaldo Santos de Moraes, este Tribunal decidiu que receita proveniente de beneficiário de programa social do governo, após ponderada análise das circunstâncias específicas do caso concreto, poderá ser considerada recurso de origem não identificada (RONI) e, por tal motivo, sujeita ao recolhimento ao Tesouro Nacional.

Todavia, sublinho que a hipótese destes autos não se assemelha ao referido paradigma, merecendo distinção. Aqui, a doação obedeceu às prescrições normativas, está devidamente declarada na contabilidade e registrada nos extratos bancários do candidato, de modo que, ao presente caso, se aplica a jurisprudência deste Tribunal, no sentido de que eventual ausência de capacidade do doador deve ser apurada em autos próprios:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PREFEITO E VICE. DESAPROVAÇÃO. ELEIÇÕES 2016. REJEITADA A PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. MÉRITO. AUSÊNCIA DE EXTRATOS BANCÁRIOS. INCONSISTÊNCIA NA RECEITA DE RECURSOS ESTIMÁVEIS EM DINHEIRO. FALHA SANADA. AUSÊNCIA DE PAGAMENTO DE DESPESAS. INDÍCIOS DE FALTA DE CAPACIDADE ECONÔMICA DE DOADOR. MATÉRIA QUE DEVE SER APURADA EM AUTOS PRÓPRIOS. DOAÇÃO ADVINDA DE INTEGRANTE DO QUADRO DE EMPRESA RECEBEDORA DE RECURSOS PÚBLICOS. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Preliminar rejeitada. Suscitada preliminar de nulidade da sentença, diante de omissão quanto à análise de petição e de documentos juntados. Matéria que confunde-se com o mérito da irregularidade. 2. O art. 48, inc. II, al. "a", da Resolução TSE n. 23.463/15, exige a apresentação de extratos da conta bancária, contemplando todo o período de campanha. No caso dos autos, o prestador apresentou extratos bancários parciais. 3. Constatada irregularidade na receita de recursos estimáveis em dinheiro, oriundos de doador que não detém a propriedade do bem doado. Falha corrigida com a juntada de procuração outorgando poderes ao doador para alienar o bem. Documento hábil a demonstrar que a cessão do veículo foi feita em nome do seu proprietário. 4. Dívida de campanha. O art. 27 da Resolução TSE n. 23.463/15 prevê os requisitos para assunção de dívidas após a data da eleição. Persistência do apontamento, diante da falta dos esclarecimentos necessários. 5. Consoante jurisprudência deste Tribunal, eventual ausência de capacidade do doador deve ser apurada em autos próprios, não sendo a prestação de contas a esfera competente. 6. Doador que integra quadro societário de empresa recebedora de recursos públicos. Inexistente comprovação de que as quantias doadas pela pessoa física sejam oriundas de dinheiro público recebido pelas empresas das quais é sócio. Reformada sentença. 7. Falhas que representam 5% do montante global, circunstância que autoriza a aplicação dos postulados da proporcionalidade e razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas. 8. Provimento parcial. 

(Recurso Eleitoral n. 53939, ACÓRDÃO de 09.04.2019, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data: 12.04.2019, Página 7.)

 

Nesse sentido, afasto o indício de irregularidade, consistente no recebimento de doação financeira realizada por pessoa física inscrita em programa social do governo, no valor de R$ 50,00.

Por fim, destaco que o somatório das irregularidades, no valor de R$ 4.673,20 (R$ 2.490,00 + R$ 1.175,00 § R$ 110,00 + R$ 93,20), representa 43,22% dos recursos declarados pelo prestador, impedindo o juízo de aprovação com ressalvas mediante a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Diante do exposto, VOTO pela desaprovação das contas de ANDRÉ OLIVEIRA MACHADO, candidato ao cargo de deputado estadual, e determino o recolhimento do valor de R$ 4.673,20 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.