REl - 0600030-26.2022.6.21.0097 - Voto Relator(a) - Sessão: 09/10/2023 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, está a merecer conhecimento.

Cuida-se de irresignação do Diretório Municipal de Esteio do PROGRESSISTAS contra a sentença do Juízo da 97ª Zona Eleitoral, que desaprovou as contas relativas ao exercício financeiro do ano de 2021, em razão do recebimento de recursos de origem não identificada – RONI. A sentença hostilizada determinou o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 750,00 (setecentos e cinquenta reais), acrescida de multa de 20%, e suspensão do repasse de verbas do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, pelo período de um ano.

O parecer técnico contábil apurou o recebimento de créditos, no valor total de R$ 750,00 (setecentos e cinquenta reais), referentes aos depósitos de R$ 150,00 realizado no dia 09.02.2023; R$ 240,00 realizado no dia 03.3.2023; R$ 150,00 realizado no dia 08.3.2023; R$ 120,00 realizado no dia 10.3.2023; e R$ 90,00 realizado no dia 13.4.2023, sem a regular identificação dos doadores originários, uma vez que nos extratos da conta bancária (documento de ID 45408813) consta o CNPJ do próprio partido político como responsável por tais créditos, a configurar recursos de origem não identificada – RONI, conforme o disposto no art. 13, § único, da Resolução TSE n. 23.604/19:
 

Art. 13. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, recursos de origem não identificada.

Parágrafo único. Constituem recursos de origem não identificada aqueles em que:

I – o nome ou a razão social, conforme o caso, ou a inscrição no CPF do doador ou contribuinte ou no CNPJ, em se tratando de partidos políticos ou candidatos:

a) não tenham sido informados; ou

b) se informados, sejam inválidos, inexistentes, nulos, cancelados ou, por qualquer outra razão, não sejam identificados;

II – não haja correspondência entre o nome ou a razão social e a inscrição no CPF ou CNPJ informado; e

III – o bem estimável em dinheiro que tenha sido doado ou cedido temporariamente não pertença ao patrimônio do doador ou, quando se tratar de serviços, não sejam produtos da sua atividade.
 

O partido político, em suas razões recursais, sustenta que os depósitos efetuados por equívoco com a utilização de seu CNPJ em lugar do CPF dos contribuintes seriam de Elisete Medeiros Bandeira (R$ 150,00), Emerson Eduardo D’Avila Machado (R$ 240,00) e Nilton Roberto Paes Levis (R$ 90,00), juntando aos autos as declarações de ID 45408881 (fls. 2 a 4), denominadas “atestado de contribuição partidária”, firmadas pelos supostos contribuintes. Registro, por oportuno, que não houve quaisquer menção ou indicação dos supostos responsáveis pelos depósitos de R$ 150,00 e R$ 120,00, realizados nos dias 08.3.2023 e 10.3.2023, respectivamente.

Embora tenha sido realizada a juntada das referidas declarações, a falta de confiabilidade e de transparência sobre a origem dos recursos não restou afastada, haja vista que os documentos unilaterais se mostram inúteis à sua comprovação, pois o art. 8º, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19 expressamente determinam que as doações somente poderão ser realizadas mediante transação bancária na qual o CPF do doador ou do contribuinte seja obrigatoriamente identificado.

Portanto, uma vez não logrado êxito em demonstrar a procedência dos valores, evidenciado que se está diante da utilização de recursos de origem não identificada – RONI, os quais devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, como bem estabelecido na sentença, nos termos do art. 14 da resolução em comento.

Em semelhante sentido:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019. RECEBIMENTO DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO EM PERÍODO VEDADO. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. ALTO PERCENTUAL. INVIABILIZADA A PLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. APLICADA MULTA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. […] 4. Recebimento de recursos de origem não identificada. Recebimento de depósito em espécie com a identificação do CNPJ pertencente ao diretório municipal, apesar de o órgão partidário não ter realizado movimentação financeira no exercício. Alegado equívoco por parte da doadora, pois foi registrado o CNPJ da legenda, em vez do CPF da doadora. Inviabilizada a verificação da procedência dos valores, devendo o montante ser considerado como recurso de origem não identificada e, via de consequência, transferido ao Tesouro Nacional. […] (Prestação de Contas nº 060022749, Acórdão, Relator(a) Des. KALIN COGO RODRIGUES, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data: 14/03/2022.)

 

Ademais, não prospera a alegação do recorrente de que “há extrato de movimentação de PIX que comprova que houve devolução dos valores quando identificados que haviam sido depositados de forma errônea”, uma vez que, da análise do extrato bancário de ID 45408813, não se logrou identificar as referidas operações financeiras de devolução dos valores apontados pela sentença de primeiro grau como recursos de origem não identificada.

Da mesma forma, o alegado agir de boa-fé e o desconhecimento da legislação eleitoral pelos contribuintes do partido político não eximem a agremiação de sua responsabilidade sobre o controle e a fiscalização de suas receitas financeiras, cabendo a ela, em tais casos, nos termos do art. 14, caput, da Resolução TSE n. 23.604/19, providenciar o recolhimento dos valores de origem não identificada ao Tesouro Nacional, até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito, providência que não foi observada.

Diante disso, correta a sentença de primeira instância ao enquadrar como recurso de origem não identificada as contribuições recebidas pelo partido político, que totalizam R$ 750,00 (setecentos e cinquenta reais), bem como determinar sua devolução ao Tesouro Nacional.

Contudo, o montante considerado irregular é inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (um mil e sessenta e quatro reais e dez centavos), e representa apenas 1,61% das receitas totais recebidas pelo partido durante o exercício financeiro (R$ 46.470,50), ficando, portanto, abaixo do percentual de 10% utilizado como limite para permitir a aprovação das contas com ressalvas, por incidência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, na esteira da jurisprudência desta Corte e do TSE, razão pela qual a sentença a quo merece ser reformada neste ponto, para fins de aprovar com ressalvas as contas do partido político.

Como consequência da aprovação com ressalvas das contas, imperioso o afastamento da multa imposta na sentença recorrida, a qual é cabível somente em casos de desaprovação das contas, nos termos do art. 48, caput, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Pelos mesmos motivos, a suspensão do repasse dos recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, pelo período de um ano, deve ser afastada, igualmente na linha da jurisprudência desta Corte.

Com efeito, este Tribunal, ao interpretar os arts. 36 e 37, § 3º, da Lei dos Partidos Políticos, posicionou-se no sentido de que não se aplica suspensão do repasse do Fundo Partidário quando houver aprovação com ressalvas de contas, por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, uma vez que o apontamento de ressalvas não descaracteriza o fato de que a contabilidade foi aprovada, ainda que não integralmente, não se mostrando adequado equiparar à desaprovação a aprovação com ressalvas, para efeitos de sancionamento:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTAÇÃO INCOMPLETA. UTILIZAÇÃO INCORRETA DO SISTEMA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. RECEBIMENTO DE RECURSOS ADVINDOS DE FONTES VEDADAS. PERCEPÇÃO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. FALHA EQUIVALENTE A 9,08% DO TOTAL DE RECURSOS AUFERIDOS NO PERÍODO EM EXAME. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. INVIABILIDADE DA APLICAÇÃO DE MULTA E DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. (...). 6. Falhas que representam 9,08% dos recursos auferidos no exercício financeiro. Hipótese que, na esteira da jurisprudência firmada no Tribunal Superior Eleitoral, viabiliza a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para afastar a severa penalidade de desaprovação das contas, admitindo o juízo de aprovação com ressalvas quando a baixa representação percentual das irregularidades não comprometa o balanço contábil como um todo, circunstância que afasta a sanção de multa de até 20% e a suspensão do Fundo Partidário. 7. O art. 36 da Lei n. 9.096/95 trata das sanções aplicadas aos partidos quando constatada a violação de normas legais ou estatutárias, enquanto o art. 37 da mesma lei estabelece o regramento para o caso de desaprovação das contas. Trata-se de normas distintas, independentes entre si e que não se confundem. O primeiro artigo vige até os dias atuais com a mesma redação da data da promulgação e nunca sofreu alterações, ao contrário do segundo, que foi sucessivamente modificado pelo Congresso Nacional por meio das Leis n. 9.693/98 e n. 13.165/15. A nova redação do art. 37 da Lei n. 9.096/95 dispõe que a desaprovação das contas enseja, como única penalidade, a devolução da quantia apontada como irregular acrescida de multa, circunstância que prejudica eventual interpretação de que, no caso de aprovação das contas, mesmo com ressalvas, poder-se-ia aplicar pena mais severa. Desde a edição da Lei dos Partidos Políticos, ao interpretar o art. 36, o TRE-RS assentou que, em se tratando de aprovação com ressalvas, não há fixação da pena de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário aos partidos políticos, nada obstante a previsão legal disponha a cominação dessa sanção. Diretriz alinhada ao entendimento do TSE no mesmo sentido. A sanção é desconsiderada por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, uma vez que o apontamento de ressalva não descaracteriza o fato de que a contabilidade foi aprovada, ainda que não integralmente, situação incompatível com a fixação de penalidade. 8. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS, PC 0600288-75, Relator: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 15.6.2020, DJE de 23.6.2020) (Grifei).

 

Portanto, ao julgar aprovadas com ressalvas as contas, afasto a sanção de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário prevista no art. 36 da Lei n. 9.096/95, bem como do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

 

Diante do exposto, VOTO para dar provimento parcial ao recurso e aprovar com ressalvas as contas, manter a determinação de recolhimento de R$ 750,00 (setecentos e cinquenta reais) ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 14 da Resolução TSE n. 23.604/19, e afastar a multa e a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC impostos na sentença.