PCE - 0602127-96.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 03/10/2023 às 16:00

VOTO

VIVIANE DOS SANTOS PEREIRA, candidata não eleita ao cargo de deputada federal, apresenta prestação de contas relativa às eleições gerais de 2022.

Após exame inicial da contabilidade e intimação da candidata, sem aproveitamento, a Secretaria de Auditoria Interna – SAI desta Corte concluiu remanescer irregularidade referente à comprovação de despesa junto ao prestador de serviço CLEBER DA SILVA MARQUES, no valor de R$ 3.590,00, pagos com verba do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

Especificamente, o órgão técnico apontou que a documentação relativa à despesa não apresenta a integralidade dos detalhes exigidos no § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…)

§ 12. As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.

 

Adianto que, quanto ao requisito “local de trabalho”, previsto pela legislação de regência, entendo ser possível estabelecer o Município de Porto Alegre (lugar da celebração do contrato e de residência do contratado), com fundamento no parágrafo terceiro da cláusula quarta da peça contratual, ID45235853, a qual reza que o contratado “poderá também se transferido, quantas vezes for necessário, de um para outro estabelecimento cidade (sic) situado em qualquer ponto da cidade sem que a ele assista a qualquer direito indenizatório”. Entendo razoável atribuir boa-fé ao instrumento da avença.

Nessa linha de raciocínio, este Tribunal já decidiu questão ligada à ausência de local de trabalho em contrato de prestação de serviço:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO. CARGO DE DEPUTADO FEDERAL. 2º SUPLENTE. GASTOS COM COMBUSTÍVEL OMITIDOS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. CARACTERIZADO RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. FORNECEDORES SEM CNPJ NA RECEITA FEDERAL. AFASTAMENTO DA FALHA. AUSÊNCIA DE EXTRATOS BANCÁRIOS COM A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDOS. OMISSÃO DE DOCUMENTOS FISCAIS. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DO FEFC PARA CUSTEIO DE ATIVIDADE DE MILITÂNCIA E MOBILIZAÇÃO DE RUA. FALHA FORMAL. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO AO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PARA APURAÇÃO DE POSSÍVEL FRAUDE NO RECEBIMENTO DE VERBA PÚBLICA. DETERMINADO O RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. IRRISÓRIA REPRESENTATIVIDADE DAS FALHAS. PRECEDENTE DO TSE. APROVAÇÃO DAS CONTAS.

(...)

4. Aplicação irregular de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

4.1. Ausência dos extratos bancários com a movimentação financeira do FEFC. Apresentados apenas os dados da conta “Outros Recursos”, e em duplicidade, não sendo possível averiguar a correta destinação de saldo existente na conta do recurso público. Determinado o recolhimento do montante respectivo ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1°, da Resolução TSE n. 23.607/19.

4.2. Inconsistências quanto à omissão de documentos fiscais comprobatórios de despesas com impulsionamento de conteúdos, relativos a pagamentos realizados com recursos privados e do FEFC. O art. 35, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõe que o contratante adquire créditos a serem utilizados durante a campanha, sendo considerados gastos de impulsionamento, apenas aqueles efetivamente utilizados, devendo ser devolvido os valores não utilizados até o final da campanha. Na hipótese, caracterizada falha parcial relativa à diferença de créditos não utilizados, a qual deve ser recolhida ao erário por se tratar de sobra (art. 35, § 2º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19).

4.3. Apontada falha na utilização de recursos do FEFC para o custeio de atividade de militância e mobilização de rua, em que os documentos de comprovação não especificariam o local de trabalho, contrariando o previsto no § 12 do art. 35 da Resolução TSE 23.607/19, além de não ter sido apresentada a justificativa do preço contratado e a descrição detalhada das atividades executadas. Entretanto, tal detalhamento é desnecessário uma vez que as tarefas designadas aos prestadores de serviço nos contratos é “atividades de DIVULGAÇÃO para a campanha Eleitoral 2022”, tendo a unidade técnica considerado que tal trabalho seria equivalente ao serviço de panfletagem. Quanto ao local da atividade, os contratos glosados referem–se aos residentes na cidade, para os quais é despicienda a especificação de onde os prestadores de serviço exerceriam suas atividades, pois o domicílio de todos os pactuantes é o mesmo, bem como o foro eleito para dirimir controvérsias, não havendo motivos para se entender que o trabalho seria realizado em outra cidade. Valor pago com recurso do FEFC, para divulgação da campanha eleitoral do candidato, de acordo com a especificidade do trabalho exercido por prestadores. No mesmo sentido, entendimento deste Tribunal. A irregularidade deve ser motivo de ressalva nas contas, uma vez que não foram trazidos aos autos os dados exigidos no § 12 do art. 35 da Resolução TSE 23.607/19. Falha meramente formal que não impõe o recolhimento do valor ao erário.

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº 060245356, Acórdão, Relator(a) Des. KALIN COGO RODRIGUES, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 271, Data: 15/12/2022.)

 

Do mesmo modo, tratando agora da especificação das atividades executadas, julgo o descritivo do acordo suficiente a cumprir a exigência: “o objeto do presente contrato é de coordenador de mobilização e divulgação da campanha eleitoral 2022 da Contratante", suficientemente claro.

Quanto à justificativa do preço, mostra-se razoável a cifra de R$ 3.590,00 por todo período eleitoral (30.8.2022 a 01.10.2022), em um município das dimensões da capital gaúcha e em uma campanha que não contratou militância, apenas um coordenador de campanha, mesmo que moderadamente acima da média verificada, por máxima de experiência adquirida nos julgamentos desta Corte.

Resta, então, o quesito das “horas trabalhadas”.

No ponto, há imprecisão quanto à jornada de trabalho estabelecida, como se depreende dos registros nos parágrafos 1º e 2º da “Cláusula Quarta”:

CLÁUSULA QUARTA: O CONTRATADO se compromete nesse ato a prestar os serviços acima citados na carga horária da campanha eleitoral em local a ser designado pelo contratante, observadas as formalidades legais.

Parágrafo primeiro: O horário de trabalho poderá ser alterado tantas vezes quanto necessários, para qualquer outro, inclusive de noite para o dia e vice-versa desde que respeitados os limites legais, sem que assista ao(a) CONTRATADO qualquer direito de indenização.

Parágrafo segundo: O CONTRATANTE poderá alterar a jornada sem qualquer acréscimo de valor compensado o excesso de horas de um dia para o correspondente e diminuição dentro da mesma semana.

 

Ainda que não expressamente estipulada a carga diária do trabalho, infere-se, dos termos do contrato, que houve a estipulação de jornada entre os contratantes, pois prevê “a diminuição dentro da mesma semana”, em caso de excesso de horas trabalhadas.

Destaco ser esta a única falha de toda a contabilidade apresentada, e enfatizo o zelo por parte da candidata, evidenciado em todo o conjunto probatório, especialmente na plena demonstração do destino do recurso – transferido por meio de PIX ao beneficiário CLEBER DA SILVA MARQUES.

Ainda, a campanha ao cargo de deputada federal contou com a transferência de apenas R$ 8.000,00 em recursos financeiros do FEFC, os quais foram gastos com publicidade por materiais impressos (R$ 4.406,00) e o coordenador de campanha. No mais, houve o ingresso de R$ 550,00 em recursos próprios, dos quais R$ 500,00 foram utilizados para pagamento da administradora financeira e o restante foi devolvido à agremiação, a título de sobra de campanha (ID 45235869).

Por todo o exposto, entendo inexistentes elementos ou indícios de falhas graves, de modo que a desaprovação da contabilidade se mostraria excessivamente gravosa no caso concreto. A apontada irregularidade consubstancia falha formal, indicativa apenas de anotação de ressalvas no julgamento das contas. Nessa linha, indico o julgamento do processo n. 0603030-34.2022.6.21.0000, de relatoria do Des. Voltaire de Lima Moraes, publicado no DJE em 10.7.2023:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO NÃO ELEITO. DEPUTADO ESTADUAL. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL. PANFLETAGEM. EQUIPE DE MOBILIZAÇÃO DE RUA. RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC) E DO FUNDO PARTIDÁRIO (FP). FALTA DE DETALHAMENTO. INOBSERVÂNCIA DO ART. 35, § 12, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. FALHA FORMAL. NÃO PREJUDICADA A FISCALIZAÇÃO DA JUSTIÇA ELEITORAL. PAGAMENTO DE GASTOS COM COMBUSTÍVEIS COM VERBA DO FUNDO PARTIDÁRIO. AUSENTE INSTRUMENTO DE CESSÃO DE VEÍCULO. IRREGULARIDADE CARACTERIZADA. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

(...)

2. Inconsistências na contratação de pessoal (panfletagem e coordenação de equipe de mobilização de rua) custeada com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC e do Fundo Partidário, em razão do oferecimento de documentação que não indica a integralidade dos elementos mencionados no § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19. Ausência de referência ao local de trabalho e juntada de contratos sem assinatura ou ilegíveis. Entretanto, é possível presumir que cada contratado exerceu as atividades no município de residência, o que, somado à diversidade de funções indicada nas pactuações, justifica as diferenças entre preços contratados, todos dentro da normalidade para a remuneração das atividades de militância e mobilização de rua. As diferentes atividades executadas também justificam remuneração em valores diversos repassados aos prestadores de serviço. Supridas as falhas relativas aos contratos sem assinatura ou ilegíveis com a apresentação das avenças de prestação de serviços, admitidas como provas no processo em prestígio da boa–fé, por não haver elemento que indique que sua confecção ocorreu em momento posterior à indicação das irregularidades no exame das contas. A ausência de indicação de todos os elementos necessários nos contratos configura impropriedade, mas não obstou a fiscalização da Justiça Eleitoral. Falha meramente formal. Afastada a necessidade de recolhimento de valores ao erário. Nesse sentido, precedente deste Tribunal.

(...)

(PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº 060303034, Acórdão, Relator(a) Des. Voltaire De Lima Moraes, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 123, Data 10/07/2023)

 

Diante do exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas de VIVIANE DOS SANTOS PEREIRA.