PC-PP - 0600246-84.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 03/10/2023 às 16:00

VOTO

Cuida-se de prestação de contas apresentada pelo DIRETÓRIO ESTADUAL DO SOLIDARIEDADE e seus responsáveis, relativamente ao exercício financeiro de 2021.

A SAI deste Tribunal, analisando a contabilidade, elaborou parecer técnico conclusivo, em que informa não ter sido verificado aporte de valores de fonte vedada ou aplicação irregular de verbas do Fundo Partidário, mas aponta a seguinte irregularidade, consistente no recebimento de recursos de origem não identificada (ID 45476648):

3. DOS RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA

(Artigo 38, incisos IV e V, da Resolução TSE 23.604, de 2019)

No decorrer do exame das contas, analisados os extratos bancários eletrônicos disponibilizados pelo TSE e a documentação apresentada no processo, foram identificadas irregularidades no recebimento de recursos de origem não identificada, em desacordo com os artigos 13 e 36, inciso IV, ambos da Resolução TSE 23.604, de 2019.

3.1) Da análise dos extratos bancários eletrônicos, constatou-se, no item 3.2 do Relatório de Exame das Contas (ID 45414307), o ingresso de recursos de origem não identificada (sem a identificação do CPF do doador), uma vez que não atendem ao disposto no artigo 5º, inciso IV, da Resolução TSE de 23.604, de 2019, combinado com os artigos 7º e 8º, da citada Resolução, conforme tabela 1, abaixo:

Com relação a este ponto, a agremiação apresentou declarações, firmadas por pessoas físicas (IDs 45460360 e 45460363), de que as contribuições acima relacionadas foram feitas equivocadamente mediante utilização do CNPJ do partido.

Todavia, os documentos juntados pelo partido não têm o condão de reverter o posicionamento desta Secretaria de Auditoria Interna acerca da irregularidade identificada, uma vez que não foi apresentada documentação bancária demonstrando a origem dos recursos. Desta forma, os valores recebidos permanecem em desacordo com a norma.

Nos termos da legislação eleitoral, toda e qualquer doação ou contribuição feita a partido político deve possuir a identificação do CPF do doador ou contribuinte nos extratos bancários eletrônicos.

As doações oriundas de outras esferas do partido devem conter, além do CNPJ da agremiação doadora, também o CPF do doador originário. É de se destacar que a ausência dessa informação inviabiliza a identificação da real origem do recurso (doador originário).

Assim, não sendo possível atestar a real procedência do valor total de R$ 1.444,00, resta configurado o ingresso de recursos de origem não identificada, sujeitos a recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme disposto no já citado artigo 14 da Resolução TSE 23.604, de 2019.

(…).

DA CONCLUSÃO

(…).

3) Recursos de Origem não identificadas: A irregularidade identificada no item 3.1 deste Parecer corresponde ao valor de R$ 1.444,00, em desacordo com o disposto no inciso IV do artigo 5º e no artigo 7º da Resolução TSE 23.604, de 2019, sujeitando-se a recolhimento ao Tesouro Nacional, a teor do citado artigo. 14 da mesma resolução.

(…).

Sendo assim, a irregularidade identificada foi de R$ 1.444,00, representando 0,53% do montante de recursos recebidos (R$ 271.873,49), valor sujeito às sanções do artigo 4610, bem como à devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento), na forma do artigo 48 da Resolução TSE 23.604, de 2019. Malgrado o reduzido valor da falha, frisa-se que esta unidade técnica da Secretaria de Auditoria Interna não aplica juízo de valor ou princípios de proporcionalidade e razoabilidade.

Assim, como resultado deste Parecer Conclusivo e, em observação ao citado inciso VI do artigo 38 da Resolução TSE 23.604, de 2019, recomenda-se a desaprovação das contas.

A Procuradoria Regional Eleitoral, na mesma toada, entendeu caracterizado o recebimento de recursos de origem não identificada, manifestando-se pela aprovação com ressalvas e pela determinação de recolhimento da quantia ao erário (ID 45483867).

Compulsando os autos, verifico que, no extrato bancário da conta n. 06.158202.0-6, agência n. 62, do Banrisul, consoante informado pela unidade técnica, constam aportes em dinheiro, no dia 02.3.2021, no valor de R$ 444,00; no dia 28.5.2021, de R$ 500,00; e em 28.6.2021, de R$ 500,00 (ID 45006582, fls. 3, 5 e 6), no somatório de R$ 1.444,00, tendo sido os depósitos identificados pelo CNPJ da agremiação (20.066.348/0001-99).

A grei política acostou declarações subscritas por Shauan Pereira de Oliveira Júnior, CPF n. 004.839.890-02 (ID 45460360), e Yasmin Gabriele Souza de Lima, CPF n. 864.628.900-10 (ID 45460363), afirmando que realizaram, respectivamente, os depósitos de R$ 1.000,00 (R$ 500,00 + R$ 500,00) e R$ 444,00 na conta bancária do órgão partidário, e que, por equívoco, suas contribuições de filiados foram lançadas com o CNPJ do partido.

Nos termos do art. 7º, caput, da Resolução TSE n. 23.604/19, as contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador, quando pessoa física, ou do CNPJ, no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos:

Art. 7º As contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou do contribuinte ou no CNPJ, no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

 

A infringência à norma impede o conhecimento da real origem dos valores recebidos, implicando a sua caracterização como de origem não identificada, na forma do art. 13, parágrafo único, inc. I, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 13. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, recursos de origem não identificada.

Parágrafo único. Constituem recursos de origem não identificada aqueles em que:

I - o nome ou a razão social, conforme o caso, ou a inscrição no CPF do doador ou do contribuinte ou no CNPJ, em se tratando de partidos políticos ou candidatos:

a) não tenham sido informados; ou

b) se informados, sejam inválidos, inexistentes, nulos, cancelados ou, por qualquer outra razão, não sejam identificados;

II - não haja correspondência entre o nome ou a razão social e a inscrição no CPF ou no CNPJ informado; e

 

No caso, a forma pela qual foi efetivada a injeção de recursos financeiros na agremiação gerou embaraço à aferição por esta Justiça Eleitoral dos verdadeiros doadores, impondo-se a glosa, na esteira da jurisprudência desta Corte:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS PARTIDÁRIA. EXERCÍCIO 2019. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RONI. DEPÓSITO BANCÁRIO. CNPJ DO PRÓPRIO PARTIDO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RESOLUÇÃO TSE N. 23.546/17. PERCENTUAL ELEVADO. VALOR ABSOLUTO IRRISÓRIO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. DESCABIMENTO DA MULTA. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Irresignação contra sentença que desaprovou a prestação de contas partidária em virtude do recebimento de recursos de origem não identificada. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional, acrescido de multa no percentual de 1%.

2. Aporte de recursos por meio de depósito detectado, no extrato bancário, com o CNPJ do próprio partido como depositante. Nos termos do art. 7º da Resolução TSE n. 23.546/17, as contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador, quando pessoa física, ou do CNPJ, no caso de valores provenientes de outro partido político ou de candidatos.

3. A infringência à norma impede o conhecimento da real origem das receitas, implicando a sua caracterização como de fonte não identificada, na forma do art. 13, parágrafo único, inc. I, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.546/17. Os valores recebidos sem a correta identificação dos doadores originários devem ser transferidos ao Tesouro Nacional, como definido no art. 14, caput, da citada resolução.

4. Ainda que equivalente a 23,08% dos recursos arrecadados pelo partido no exercício em exame, a importância glosada como de origem não identificada representa quantia irrisória, assim como o valor absoluto das contas despendido pela agremiação no curso do exercício, circunstância que autoriza a aprovação das contas com ressalvas, com fundamento nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

5. A aprovação com ressalvas das contas mostra-se incompatível com a incidência de multa, uma vez que, conforme esta Corte vem reiteradamente decidindo, o texto do art. 49 da Resolução TSE n. 23.546/17 prevê, de forma expressa, a desaprovação das contas como fato gerador da referida sanção.

6. Parcial provimento.

(REl n. 0600010-10.2020.6.21.0031, Relator: Desembargador Francisco José Moesch, sessão de 01.07.2021.) (Grifei.)

 

Importante referir, ainda, que, consoante a jurisprudência deste Tribunal, as declarações dos alegados doadores, por si sós, não têm o condão de comprovar a origem do recurso, posto que produzidas unilateralmente pelo partido, tanto que a legislação exige que as doações de recursos financeiros sejam efetuadas mediante cheque cruzado ou transação bancária que identifiquem, obrigatoriamente, o CPF do doador ou contribuinte, nos termos do art. 8º, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Nesse exato sentido, trago à colação precedente deste Tribunal:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DOAÇÃO DO DIRETÓRIO NACIONAL. DOADORES ORIGINÁRIOS NÃO IDENTIFICADOS. APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS UNILATERAIS. RECIBOS DE DOAÇÃO. LISTAGENS INTERNAS. CARACTERIZADA A IRREGULARIDADE. SUSPENSÃO DO REPASSE DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO PELO PRAZO DE QUATRO MESES. RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. PROVIMENTO NEGADO. 1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas de diretório municipal de partido político, referentes à movimentação financeira do exercício de 2019, determinando a suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo prazo de 4 (quatro) meses e o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, acrescidos de multa de 10%, corrigidos monetariamente, em virtude do recebimento de recursos de doações provenientes do diretório nacional, sem a identificação do doador originário. 2. Incontroverso o ingresso de receitas sem identificação dos doadores originários nos extratos bancários. Apresentação de documentos unilaterais relativos a recibos de doação emitidos pelo próprio partido, não gerados no momento do recebimento dos recursos e sim pouco antes da apresentação das contas, demonstrando que não são seguros e confiáveis para atestar a origem dos valores depositados na conta bancária da legenda. A juntada, ao recurso, de listagens internas da agremiação trazendo os nomes dos supostos doadores não sana a irregularidade, pois produzidas unilateralmente e fora do sistema bancário. 3. A falha apurada representa 100% dos recursos financeiros arrecadados no exercício 2019, sendo razoáveis, adequadas e proporcionais as sanções fixadas na sentença. Determinados a suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo prazo de 4 (quatro) meses e o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor da irregularidade, acrescido de multa de 10%, com atualização monetária e incidência de juros moratórios, conforme disposto no art. 18, inc. III, da Resolução TRE-RS n. 371/21. 4. Provimento negado.

(TRE/RS – REl n. 0600014-76 – Relator Des. Eleitoral Gerson Fischmann – Julgado sessão de 03.11.2021.) (Grifei.)

 

Desse modo, restou caracterizada a irregularidade, devendo o montante de R$ 1.444,00 ser recolhido ao erário, consoante prescrito no art. 14, caput, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Por derradeiro, tem-se que a irregularidade, que representa apenas 0,53% do montante arrecadado pelo órgão partidário (R$ 271.873,49), não compromete a confiabilidade do ajuste contábil, de sorte que, em conformidade com a jurisprudência pacífica desta Corte, e na linha do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, mostra-se cabível a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, para que as contas sejam aprovadas com ressalvas.

 

Ante o exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas do DIRETÓRIO ESTADUAL DO SOLIDARIEDADE, relativamente ao exercício financeiro de 2021, com fulcro no art. 45, inc. II, da Resolução TSE n. 23.604/19, e pela determinação do recolhimento de R$ 1.444,00 ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 14, caput do mesmo diploma normativo.