REl - 0600099-27.2022.6.21.0172 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/09/2023 às 14:00

VOTO

Preliminarmente, anoto que, em que pese o recorrente não possua advogado constituído nos autos, não há obstáculo ao conhecimento do recurso, tendo em vista que o procedimento atinente à apuração de ausência de mesário aos trabalhos eleitorais e à aplicação de multa ostenta natureza administrativa, para o qual não há previsão legal de representação por advogado, na esteira da jurisprudência consolidada deste Regional:

RECURSO ELEITORAL. NOMEAÇÃO DE MESA RECEPTORA. ELEIÇÕES 2018. PRELIMINAR. AUSÊNCIA DE ADVOGADO. ADMISSIBILIDADE. MÉRITO. MESÁRIO FALTOSO. AUSENTE JUSTO MOTIVO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA. MULTA. DESPROVIMENTO.

1. Preliminar. Entendimento desta Corte no sentido de permitir o prosseguimento do feito, ainda que ausente procurador constituído nos autos, diante da natureza administrativa da atividade judicial sancionatória contra a qual se insurge a recorrente.

2. Devidamente convocada para prestar serviço eleitoral como 2º mesário, a recorrente deixou de comparecer na data em que ocorreu o segundo turno, sem a apresentação de justificativa. Atestado médico oferecido a destempo, informando impedimento por motivo de saúde em período diverso do abrangido pela realização do pleito eleitoral.

3. Aplicação de multa. Desprovimento.

(TRE-RS, RE 7238, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, Data de Julgamento: 27.01.2020, Publicação: DEJERS, Tomo 15, 04.02.2020, p. 4) Grifei.

 

No mérito, EZEQUIEL FERREIRA CANTINI, nomeado para a função de Segundo Mesário na Seção n. 91, pertencente à 172ª Zona Eleitoral, no Município de Novo Hamburgo, não compareceu aos trabalhos eleitorais em ambos os turnos das eleições gerais de 2022, tampouco apresentou justificativa no prazo de 30 (trinta) dias após a data do pleito.

Em face disso, foi promovida a autuação de processo próprio, o qual culminou com decisão do Juízo Eleitoral arbitrando multa ao mesário faltoso no valor de R$ 351,40 (ID 45498167).

Irresignado, recorreu o eleitor, aduzindo que não compareceu à mesa receptora de votos nas Eleições Gerais de 2022 porque seu pai se encontra doente, com câncer de próstata, sendo a única pessoa com condições de tomar conta dele, haja vista que sua esposa estava grávida à época. Defende que não tem condições de arcar com o pagamento da multa, em face de pagar aluguel, seu pai estar doente e seu filho ter apenas dois meses de idade.

Primeiramente, cumpre assinalar que a eventual impossibilidade do mesário em exercer as funções para a qual foi convocado deve ser previamente comunicada à Justiça Eleitoral, acompanhada da devida comprovação, de modo a possibilitar que, acaso a Autoridade Judiciária considere satisfatórios os motivos alegados, proceda à sua dispensa e promova a tempo sua substituição por outro eleitor.

No presente caso, depreende-se dos elementos colhidos dos autos que EZEQUIEL FERREIRA CANTINI não requereu previamente sua dispensa do serviço eleitoral.

Além disso, os fatos alegados em sua defesa não foram por qualquer meio demonstrados.

Em que pese isso, entendo que o recurso merece parcial provimento.

A matéria atinente às providências e penalidades decorrentes da não apresentação da pessoa convocada para os trabalhos eleitorais sem justificativa encontra-se inteiramente regulamentada pelo Tribunal Superior Eleitoral, por meio da Resolução TSE n. 23.659/21, cujos arts. 127 e 129 dispõem:

Art. 127. A fixação da multa observará a variação entre o mínimo de 3% e o máximo de 10% do valor utilizado como base de cálculo, podendo ser decuplicado em razão da situação econômica do eleitor ou da eleitora.

(…)

§ 3º A pessoa que declarar, sob as penas da lei, perante qualquer juízo eleitoral, seu estado de pobreza ficará isento do pagamento da multa por ausência às urnas.

(...)

Art. 129. A pessoa que deixar de se apresentar aos trabalhos eleitorais para os quais foi convocada e não se justificar perante o juízo eleitoral nos 30 dias seguintes ao pleito incorrerá em multa.

§ 1º A fixação da multa a que se refere o caput observará a variação entre o mínimo de 10% e o máximo de 50% do valor utilizado como base de cálculo, podendo ser decuplicada em razão da situação econômica do eleitor ou eleitora, ficando o valor final sujeito a duplicação em caso de:

a) a mesa receptora deixar de funcionar por sua culpa; ou

b) a pessoa abandonar os trabalhos no decurso da votação sem justa causa, hipótese na qual o prazo aplicável para a apresentação de justificativa será de 3 dias após a ocorrência.

§ 2º A aplicação da multa de que trata este artigo observará, no que couber, o disposto nos §§ 1º a 3º do art. 127 desta Resolução.

§ 3º Recolhida a multa, será observado o previsto no art. 128 desta Resolução.

 

A Resolução em tela, ainda, em seu art. 133, fixou o valor da "base de cálculo" em R$ 35,13, litteris:

Art. 133. A base de cálculo para aplicação das multas previstas nesta Resolução, salvo se prevista de forma diversa, será R$ 35,13 (trinta e cinco reais e treze centavos).

 

Dessa feita, a multa há de ser fixada entre R$ 3,51 e R$ 17,57, podendo ser decuplicada em razão da situação econômica do eleitor ou eleitora, vale dizer, pode atingir R$ 175,70, ficando tal valor final sujeito a duplicação (R$ 351,40), em caso de a mesa receptora deixar de funcionar por sua culpa ou a pessoa abandonar os trabalhos no decurso da votação sem justa causa.

Nesse cenário, verifica-se que, ainda que fosse imposta a penalidade em seu máximo inicial, R$ 17,57, por cada turno, somente poderia ser majorada até R$ 175,70 se a situação econômica do eleitor exigisse o incremento, condição essa não demonstrada nos autos.

Cabe sublinhar que, por ocasião do primeiro turno de votação, a Mesa Receptora funcionou com três membros (ID 45498153), porém, no segundo ciclo, a composição esteve completa, com outra pessoa assumindo o posto de Segundo Mesário, embora não haja registro de nomeação ad hoc na respectiva ata (IDs 45498159, frente, e 45498160, verso), como permite o art. 123, § 3º, do Código Eleitoral, o que leva a crer que a Zona Eleitoral promoveu previamente a alteração dos integrantes da mesa. Desse modo, o comparecimento do mesário no segundo turno de votações já estava dispensado.

Ademais, mesmo que o mesário fosse economicamente abastado, não poderia a sanção aumentada até R$ 175,70 ser duplicada, porquanto a mesa receptora de votos não deixou de funcionar regularmente, tampouco trata a espécie de abandono dos trabalhos eleitorais no curso da votação.

Portanto, resta nítido que, no caso vertente, frente às circunstâncias declinadas, eventual multa aplicada a EZEQUIEL FERREIRA CANTINI não poderia exceder o limite de R$ 17,57 para o ciclo da eleição.

Ademais, tenho que ao eleitor não seria o caso de arbitramento de multa em seu patamar majorado, R$ 17,57, tendo em vista que já trabalhou como mesário nas eleições de 2020, no ápice da pandemia de COVID-19, fato que há de lhe render frutos frente a faltas incorridas perante a Justiça Eleitoral.

Por derradeiro, impende assinalar que o eleitor afirmou na peça recursal que "não tenho condições financeiras para efetuar estes pagamentos, tenho meu pai doente, meu filho tem apenas dois meses de vida e pago aluguel", não havendo outros elementos que possibilitem aferir sua capacidade econômica.

Nesse cenário, ante o histórico de comprometimento com os chamados da Justiça Eleitoral e ausentes indicativos de maior gravidade da conduta, julgo que a multa deve ser imposta em seu máximo inicial de R$ 17,57, exclusivamente em razão da defasagem monetária do quantum fixado pela norma e da ineficácia de sanção em menor valor.

Isso porque, inexistindo informações sobre alguma situação econômica mais abastada do eleitor e estando atestado nos autos que não houve embaraços ao funcionamento normal da mesa receptora de votos, entendo carente de fundamento a multiplicação da sanção para patamar mais elevado.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para reduzir a penalidade imposta a EZEQUIEL FERREIRA CANTINI para o valor de R$ 17,57.