REl - 0600067-76.2022.6.21.0057 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/09/2023 às 14:00

VOTO

O recurso atende aos pressupostos recursais, tais como a tempestividade, legitimidade, interesse de agir, adequação, não havendo a existência de fato extintivo ou impeditivo que impeça seu seguimento, razão pela qual dele conheço.

No mérito, trata-se de recurso em prestação de contas de campanha das Eleições Gerais de 2022 do PARTIDO DOS TRABALHADORES - PT DE URUGUAIANA/RS.

A sentença ID 45464437, em sua fundamentação, julgou desaprovadas as contas do recorrente, nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, tendo em vista terem sido identificadas notas fiscais emitidas contra o CNPJ do Partido, e não declaradas em sua prestação de contas, caracterizadas, portanto, como quitadas recursos de origem não identificada, no valor de R$ 1.800,00. Ainda, aplicou ao partido a sanção de suspensão de repasse de cotas do Fundo Partidário, pelo prazo de 04 (quatro) meses, fulcro nos §§ 5º e 7º do art. 74, da mesma Resolução.

Irresignado, após ter os embargos de declaração não conhecidos, com negativa de seguimento, o prestador interpôs o presente recurso.

Aduz o recorrente, em suas razões, que os valores identificados como de origem não identificada, pelo fato de não terem sido declarados na origem, referem-se a valores referentes a despesas ordinárias de manutenção do partido, cujos valores serão devidamente declarados e contabilizados na prestação de contas partidária anual da agremiação, no momento oportuno. Salienta também que tais valores referem-se a gastos, os quais contam nos extratos bancários da conta OUTROS RECURSOS, que nada tem a ver com os extratos ora declarados referentes à conta de arrecadação e despesas de recursos de campanha eleitoral, a qual demonstra a ausência de movimentação financeira.

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo provimento do recurso, com a reforma da sentença de primeiro grau, em acolhimento às razões recursais acima referidas.

Assiste razão ao recorrente, nos termos do parecer da Procuradoria.

A sentença recorrida apontou que "na data de emissão da nota fiscal mais antiga, já havia iniciado o período para a realização das convenções partidárias - o qual, nas eleições gerais de 2022 se deu em 20/07/2022 -, assim, o partido já estava legalmente obrigado a prestar contas das receitas e despesas realizadas, nos termos do § 2º do art. 46 da Res. TSE 23.607/19". Assim, reputou grave a irregularidade, pois, segundo seus termos, tal situação "impede o controle e a aferição da veracidade das informações prestadas".

Porém, como bem lembrado pelo Ministério Público em seu parecer, dispõe o art. 11 da Resolução TSE n. 23.607/19 que "Os partidos políticos devem manter, em sua prestação de contas anual, contas específicas para o registro da escrituração contábil das movimentações financeiras dos recursos destinados às campanhas eleitorais, a fim de permitir a segregação desses recursos em relação a quaisquer outros e a identificação de sua origem".

Depreende-se dessa redação que é responsabilidade do partido político manter contas bancárias distintas para o registro da escrituração contábil da movimentação financeira dos recursos destinados à campanha eleitoral, para que seja possível a separação desses recursos em relação a quaisquer outros de natureza ordinária voltados à manutenção da grei.

Assim, vemos que essa responsabilidade é ônus das agremiações, embora nada impeça que haja a fiscalização da Justiça Eleitoral para a identificação e correção de erros, e aplicação de penalidades.

Dessa forma, se o partido político estabeleceu que as despesas pelas notas fiscais, objeto da presente análise, tiveram sua origem na conta bancária "OUTROS RECURSOS", a qual se destina a suportar as despesas ordinárias anuais de manutenção do partido, e que não diz, portanto, respeito a despesas de campanha eleitoral, deverá a mesma ser objeto de análise dentro do processo de prestação de contas anual partidária.

Isso porque, em primeiro lugar, deve ser evitada a possibilidade de ocorrência de decisões contraditórias entre um processo e outro, o que poderia ocorrer em decorrência destes gastos. E, em segundo lugar, evita-se também a possibilidade de dupla penalização pelo mesmo fato, no caso de realmente haver alguma irregularidade.

Ademais, se levarmos em conta as circunstâncias norteadoras em relação às notas fiscais em comento, não podemos tomar tais despesas como sendo decorrentes de campanha eleitoral, uma vez que a sua contabilização foi efetuada na conta partidária anual; a conta de campanha está zerada; e as eleições de 2022 foram eleições gerais, na qual sequer o partido teve qualquer participação.

A agremiação, quando intimada na origem, manteve-se inerte e não prestou os esclarecimentos que lhe foram solicitados, tampouco apresentou todas as contas bancárias abertas em nome do partido, a fim de atender por completo ao princípio da transparência, e por óbvio, teve as suas contas julgadas desaprovadas. Ante essas circunstâncias, outro não poderia ter sido o resultado.

Porém, in casu, restou esclarecido pelo recorrente o que lhe havia sido solicitado e, assim, tenho que a irregularidade deve ser afastada, como bem pontuado pelo Ministério Público em seu parecer, in verbis:

Assim, a irregularidade merece ser afastada, pois as despesas constantes das notas fiscais questionadas devem ser objeto da análise quando da prestação de contas anual do partido, oportunidade em que a Justiça Eleitoral poderá exigir a demonstração de que o trânsito dos recursos usados para os pagamentos a que se referem ocorreu na conta bancária que suporta as movimentações financeiras anuais.

 

Ante o exposto, acolho o parecer do MP e VOTO pelo conhecimento e, no mérito, pelo provimento do recurso, para, reformando a sentença recorrida, afastar a irregularidade identificada na origem e aprovar as contas da agremiação recorrente.