REl - 0600110-56.2022.6.21.0172 - Voto Relator(a) - Sessão: 28/09/2023 às 14:00

VOTO

Eminentes colegas,

Preliminarmente, consigno que nada obstante a eleitora tenha interposto recurso sem se fazer representar por advogado, o apelo deve ser conhecido por tratar-se de matéria eminentemente administrativa, caso em que este Tribunal tem atenuado o rigor da norma quanto à ausência de capacidade postulatória, tornando dispensável a juntada de procuração. Com esse entendimento, o seguinte precedente:

RECURSO ELEITORAL. NOMEAÇÃO DE MESA RECEPTORA. ELEIÇÕES 2018. PRELIMINAR. AUSÊNCIA DE ADVOGADO. PUNIÇÃO ADMINISTRATIVA. ADMISSIBILIDADE. MÉRITO. MESÁRIO FALTOSO. MULTA. JUNTADA DE DOCUMENTOS COM O RECURSO. AUSENTE JUSTO MOTIVO. DEMONSTRADA A HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA DA ELEITORA. DETERMINADA A REDUÇÃO DA MULTA. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Preliminar. Legitimidade para interpor o recurso sem procurador constituído nos autos. Conhecimento do apelo. Flexibilização do rigor da norma por se tratar de punição aplicada em matéria eminentemente administrativa. Superada a ausência de advogado constituído, a fim de facilitar o acesso ao Poder Judiciário. 2. Devidamente convocada para prestar serviço eleitoral como Presidente de seção, deixou de comparecer aos trabalhos eleitorais no dia em que ocorreu o primeiro turno do pleito, sem a apresentação de qualquer justificativa para a ausência no prazo de 30 dias. Diante da inércia da eleitora, o juízo a quo aplicou-lhe a multa. 3. Notificada, a recorrente manifestou-se, argumentando que deixou de atender à convocação eleitoral porque no dia do pleito trabalhara como freelancer, com o objetivo de pagar as despesas de aluguel, instruindo o recurso com cópias de sua CTPS, bem como a de seu marido, também desempregado. As justificativas prestadas não afastam a aplicação do art. 124 do Código Eleitoral, em face dos princípios que regem a Justiça Eleitoral, com a preponderância do interesse público sobre o particular. Entretanto, os documentos demonstram a atual hipossuficiência econômica da eleitora, circunstância que enseja a redução do valor da multa aplicada. 4. Parcial provimento.

(TRE-RS - RE: 533 NOVO HAMBURGO - RS, Relator: GUSTAVO ALBERTO GASTAL DIEFENTHÄLER, Data de Julgamento: 02.07.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 122, Data: 05.07.2019, Página 4.) (Grifei.)

 

Isso posto, conheço do recurso.

No mérito, após ser devidamente convocada para prestar serviço eleitoral como mesária, a recorrente deixou de comparecer aos trabalhos eleitorais nos dias em que ocorreram o primeiro e o segundo turnos do pleito de 2022, sem apresentar qualquer justificativa para a ausência no prazo de 30 dias previsto no art. 124 do Código Eleitoral.

Diante da inércia da eleitora, o juízo a quo aplicou-lhe multa no valor de R$ 351,40 por ausência aos trabalhos eleitorais.

A recorrente apresentou manifestação sustentando não ter condições de realizar o pagamento da multa, além de afirmar que o não comparecimento se deu em razão de problemas de saúde, em especial, crise de ansiedade e problemas gastrointestinais (ID 45526260).

Entretanto, como as razões apresentadas não foram demonstradas, não caracterizam justo motivo para o não comparecimento à seção para a qual a eleitora havia sido convocada, sendo certo que a recorrente estava ciente tanto da necessidade de comparecimento quanto de apresentação de justificativa prévia ao dia da eleição.

Acrescente-se que a composição completa da mesa receptora no dia da eleição restou prejudicada pela ausência da mesária, havendo necessidade de a recorrente ser substituída por outro eleitor no dia do pleito.

Assim, deve ser mantida a imposição da multa.

Entrementes, conforme concluiu a Procuradoria Regional Eleitoral, verifica-se desproporcional o quantum da condenação, no montante de R$ 351,40, pois a multa foi aumentada em 10 vezes a partir do patamar inicial mínimo de R$ 35,14, com fundamento nas seguintes razões (original sem grifos):

Vistos.

Trata-se de instauração de processo visando a apuração da ausência da mesária aos trabalhos eleitorais em ambos os turnos das Eleições Gerais de 2022.

A mesária não compareceu aos trabalhos eleitorais em ambos os turnos, não tendo apresentado justificativa no prazo legal de 30 dias, na forma do art. 124 do Código Eleitoral.

A carta foi recebida pelo marido da mesária, conforme comprovante nos autos.

Os autos foram com vista ao MPE, que se manifestou pelo arquivamento, por não ter havido intimação pessoal. ID 113559197

É o relatório.

Decido.

Embora a convocação não tenha sido pessoal, foi entregue no endereço da mesária constante do Cadastro Nacional de Eleitores e, ademais, não seria crível que o próprio marido da mesária lhe ocultaria obrigação tão importante lhe causando prejuízos. Considera-se a mesária, portanto, plenamente ciente da obrigação.

A mesária não apresentou justificativas nos prazos legais nos termo do art. 124, do Código Eleitoral segundo o qual o mesário faltoso que não apresentar justificativa no prazo de 30 (trinta dias) incorrerá em multa no valor de meio a um salário mínimo.

Entretanto, o dispositivo infraconstitucional não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, que, em seu artigo 7º, inc. IV, veda a vinculação do salário mínimo para qualquer fim.

Assim, esclarecendo o tema, a Resolução TSE 23.659/2021 determinou, no  1º do art. 129, que a fixação da multa observará a variação entre o mínimo de 10% e o máximo de 50% do valor utilizado como base de cálculo, podendo ser decuplicada em razão da situação econômica do eleitor ou eleitora.

No seguimento, o art. 759 da CNJE dispõe que a multa poderá ser arbitrada entre R$ 17,57 e R$ 35,14, havendo a possibilidade de ser dispensada, aplicada em dobro ou multiplicada até o décuplo, observado o disposto nos §§ 2º e 3º deste artigo.

Seu § 3ºdispõe que:

§ 3º Avaliada a situação econômica da eleitora ou do eleitor, o juízo eleitoral poderá:
I – dispensar o pagamento da multa; ou
II – multiplicar o valor da multa por até 10 (dez) vezes.

O Código Eleitoral, por seu turno, autoriza a elevação do valor da multa em até dez vezes (§ 2º do art. 367):

§ 2º A multa pode ser aumentada até dez vezes, se o juiz, ou Tribunal considerar que, em virtude da situação econômica do infrator, é ineficaz, embora aplicada no máximo.

Por essas razões, atento ao princípio da proporcionalidade e ao caráter pedagógico da sanção, suficiente e necessário à garantia da lisura e bom andamento dos trabalhos eleitorais, fundamentais à preservação e manutenção do princípio democrático, forte no art. 124, caput, c/c art. 367, § 2º do Código Eleitoral, § 1º do art. 129 da Resolução TSE 23.659/2021 e art. 759 da CNJE, CONDENO a mesária faltosa SILMARA VARGAS ao pagamento de multa no valor de R$ 175,70 (cento e setenta e cindo reais e setenta centavos) por turno de votação em que se ausentou, totalizando R$ 351,40 (trezentos e cinquenta e um reais e quarenta centavos), valor a ser recolhido no prazo de 30 dias, mediante GRU, por infração ao art. 124, caput, do Código Eleitoral.

Intime-se a mesária para, querendo, recorrer no prazo de 3 dias e, no mesmo documento, notifique-a para que, em não recorrendo, recolha o valor no prazo de 30 dias.

Intime-se o MPE.

Quitada a multa, proceda-se na forma do art. 760 da CNJE, arquivando-se os autos.

Não havendo o pagamento no prazo legal, proceda-se na forma do art. 762 da CNJE.

Diligências Legais.

 

Assim, como manifestado pelo Parquet eleitoral, entendo que os argumentos expostos não justificam o estabelecimento da sanção pecuniária no grau máximo, devendo ser levado em consideração que os dispositivos citados - art. 129 da Resolução TSE n. 23.659/21; art. 367, § 2º, do Código Eleitoral; e art. 759, § 3º, da Consolidação Normativa Judicial Eleitoral - reportam-se ao fator econômico, mas que, na espécie, não houve juntada de documentos que atestem a capacidade financeira da eleitora.

De outra parte, entendo razoáveis e proporcionais os apontamentos contidos no parecer ministerial, no sentido de que as peculiaridades do caso concreto recomendam o estabelecimento da penalidade no dobro do mínimo legal de R$ 35,13, totalizando R$ 70,26.

Com efeito, a ausência no dia do pleito resultou em dificuldades para a formação da mesa receptora da respectiva seção eleitoral, uma vez que precisou haver substituição da mesária, e deve ser resguardado o caráter pedagógico e a efetividade da norma sancionadora ante a ausência de atualização das multas eleitorais, a fim de gerar um efeito mínimo pelo descumprimento.

Adotando a mesma linha, menciono decisão recente deste Tribunal Regional Eleitoral: RECURSO ELEITORAL n. 060015869, Acórdão, Relatora Des. Patricia da Silveira Oliveira, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 92, Data: 25.5.2023.

Destarte, acolho o parecer ministerial e concluo pela adequação da multa para que esta seja fixada no montante de R$ 70,26.

 

Ante o exposto, voto pelo provimento parcial do recurso de SILMARA VARGAS para reduzir a multa aplicada para R$ 70,26 (setenta reais e vinte e seis centavos), a ser recolhida mediante Guia de Recolhimento da União (GRU), nos termos do art. 4º da Resolução TSE n. 23.659/21.

É o voto.