REl - 0000006-28.2014.6.21.0097 - Voto Relator(a) - Sessão: 05/09/2023 às 14:00

VOTO

I – DA ADMISSIBILIDADE RECURSAL

A preliminar de não conhecimento do recurso arguida pela Procuradoria Regional Eleitoral merece ser acolhida.

De fato, constata-se equívoco na interposição do recurso inominado, previsto no art. 265 do Código Eleitoral, para atacar a decisão recorrida, uma vez que foi prolatada em processo em fase de cumprimento de sentença condenatória por desaprovação de prestação de contas. Transcrevo a decisão (ID 45139597):

Vistos.

Trata-se de requerimento da Executada, de reconhecimento da anistia para a dívida em execução nos autos, argumentando que recente decisão do TSE reconhece a aplicação do disposto no art. 55-D, da Lei n. 9096/1997, introduzido pela Lei n. 13.831/2019, que assim dispõe:

"Art. 55-D. Ficam anistiadas as devoluções, as cobranças ou as transferências ao Tesouro Nacional que tenham como causa as doações ou contribuições feitas em anos anteriores por servidores públicos que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados a partido político".

Intimada, manifestou-se a União, requerendo, em suma, o indeferimento da solicitação da executada.

Com razão a União.

A matéria já foi analisada e decidida no presente processo, operando-se o instituto da preclusão.

Ademais, em análise sobre o mesmo tema, este Juízo já decidiu da inaplicabilidade do disposto no artigo 55-D, acima referido, no caso em tela, posto que a decisão já havia transitado em julgado no momento da promulgação da Lei n. 13831/2019, que introduziu o art. 55-D, na Lei n. 9096/97.

Assim, deve-se analisar a Lei que criou o referido dispositivo, em sua totalidade e, desta forma, verificamos que o art. 3º daquele dispositivo legal, excepciona, quanto a aplicação da anistia, as decisões que já tenham trânsito em julgado. Verbis:

"Art. 3º.: As disposições desta lei terão eficácia imediata nos processos de prestação de contas e de criação dos órgãos partidários em andamento , a partir de sua publicação, ainda que julgados, mas não transitados em julgado". (grifei)

A sentença que condenou a executada teve seu trânsito em julgado em 12/11/2015, data anterior à publicação da Lei n. 13831/2019, portanto, não está incluída nos casos previstos de anistia.

No caso dos presentes autos, além de precluso o pedido, posto que já requerido e indeferido, conforme decisão de 05/08/2019 (ID 100797226 - fls. 302/302-verso), operou-se a coisa julgada, previsão constitucional, extremamente importante para a segurança jurídica das relações processuais.

Ressalto, por fim, não tratar-se aqui de discussão quanto a inconstitucionalidade da Lei n. 13831/2019, mas sim de aplicação de disposição do que a própria norma, em seu art. 3º prevê, de não aplicabilidade da anistia para os casos em que as decisões já haviam, na época de sua publicação, transitado em julgado.

Assim, tanto por estar precluso o assunto, quanto pela existência de coisa julgada e, finalmente por estar enquadrado pela exceção prevista no art. 3ª da Lei n. 13831/2019, que acrescentou o art. 55-D, à lei n. 9096/1997, não pode prosperar a tese e requerimento da Executada.

Diante do exposto, indefiro o pedido da Executada, determinando o regular prosseguimento do feito, até final pagamento.

 

A decisão em tela tem natureza interlocutória, e o art. 1.015, parágrafo único, do CPC de 2015 é expresso ao estabelecer que cabe agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença no processo de execução e no processo de inventário.

De se destacar que a sentença julgou as contas com base no rito estabelecido na Resolução TSE n. 23.432/14 (ID 45139362 - p. 14-17), a qual dispõe, em seu art. 63, que a execução das decisões se dá “mediante a apresentação de petição de cumprimento de sentença nos próprios autos, nos termos dos arts. 475-I e seguintes do Código de Processo Civil”.

Quanto à possibilidade de aplicação do princípio da fungibilidade recursal, atualmente, a doutrina e a jurisprudência, em especial do TSE e do STJ, têm exigido para aplicação do princípio da fungibilidade a presença concomitante dos requisitos afetos à (a) dúvida fundada e objetiva sobre o recurso a ser interposto; (b) inexistência de erro grosseiro; (c) interposição no prazo estabelecido para o recurso adequado:

ELEIÇÕES 2018. AÇÃO DE DECRETAÇÃO DE PERDA DE CARGO ELETIVO POR INFIDELIDADE PARTIDÁRIA. AGRAVO INTERNO. INTERPOSIÇÃO DE RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. DECISÃO REGIONAL QUE, À LUZ DA LEITURA CONJUNTA DO ART. 121, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, DO ART. 276, INCISOS I E II, DO CÓDIGO ELEITORAL E DA SÚMULA 36 DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL DEVE SER DESAFIADA POR RECURSO ORDINÁRIO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. IMPOSSIBILIDADE. A INTERPRETAÇÃO DO TEXTO CONSTITUCIONAL, DO CÓDIGO ELEITORAL E DO ENTENDIMENTO SUMULADO DO TSE AFASTAM A EXISTÊNCIA DE DÚVIDA OBJETIVA E, QUANDO DESCUMPRIDOS PELA PARTE, IMPORTAM EM ERRO GROSSEIRO. FIXAÇÃO DA COMPREENSÃO DESTA CORTE SUPERIOR. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL NÃO CONHECIDO. 1. O acesso, pela via recursal, ao Tribunal Superior Eleitoral pode se dar por via do recurso especial eleitoral ou por via do recurso ordinário. 2. A aferição do recurso apropriado a ser manejado deve ser feita à luz da leitura conjunta do art. 121, § 4º, incisos I a V, da Constituição Federal, do art. 276, inciso I e II, do Código Eleitoral e da Súmula 36 deste Tribunal Superior Eleitoral. 3. A existência de um sistema normativo específico, complementado por verbete de entendimento sumulado do Tribunal Superior Eleitoral, confere, aquele conjunto de hipóteses, certeza, previsibilidade e segurança jurídica quanto à distinção entre recurso especial eleitoral e recurso ordinário. 4. As decisões judiciais que abarquem as hipóteses previstas no art. 121, § 4º, incisos I e II, da Constituição Federal desafiam a interposição de recurso especial eleitoral, na forma do art. 276, inciso I, alínea 'a' e 'b' do Código Eleitoral. 5. Quando proferidas decisões judiciais que acarretem os efeitos previstos no art. 121, § 4º, incisos III, IV e V, da Constituição Federal, o recurso correto a ser manejado é o ordinário, conforme disposição do art. 276, inciso II, alínea 'b', do Código Eleitoral e da Súmula 36 do Tribunal Superior Eleitoral. 6. O princípio da fungibilidade recursal, previsto no art. 810, do Código de Processo Civil de 1939, não foi repetido nos diplomas processuais civis de 1973 e 2015. Contudo, continua a ser aplicado pelas Cortes Nacionais, desde que observada a existência de dúvida objetiva e a inocorrência de erro grosseiro. 7. O sistema normativo específico que disciplina e distingue as hipóteses de recurso especial eleitoral e de recurso ordinário, na Justiça Eleitoral, extraído da leitura conjunta do art. 121, § 4º, incisos I a V, da Constituição Federal, do art. 276, incisos I e II, do Código Eleitoral e da Súmula 36 do TSE, impõe o degredo da dúvida objetiva para as hipóteses nele contidas e obsta a utilização do princípio da fungibilidade recursal. 8. A inobservância do mencionado sistema normativo específico que disciplina o acesso, pela via recursal, ao Tribunal Superior Eleitoral descortina inescusável erro grosseiro que também obsta a aplicação do princípio da fungibilidade recursal. 9. É inadmissível a interposição de recurso especial eleitoral contra decisão que produz os efeitos previstos no art. 121, § 4º, inciso IV, da Constituição Federal. 10. Agravo interno conhecido e provido para a finalidade de julgar não conhecido o recurso especial eleitoral.

(TSE - RO-El: 06000868020196240000 FLORIANÓPOLIS - SC, Relator: Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Data de Julgamento: 01.9.2020, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 211, Data: 20.10.2020, Página 0.)

 

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART. 535 DO CPC. ACOLHIMENTO PARA FINS DE EXPLICITAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL OPOSTO CONTRA DECISÃO COLEGIADA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE, NO CASO. 1. Os requisitos para a aplicação do princípio da fungibilidade recursal estão pacificados no STJ: "a) dúvida objetiva sobre qual o recurso cabível; b) inexistência de erro grosseiro; c) que o recurso inadequado tenha sido interposto no prazo do que deveria ter sido apresentado." (AgRg no AgRg nos EDcl nos EDv no AgRg no CC 134.824/GO, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 31.3.2015). 2. Além do não preenchimento de todos os requisitos acima, o conteúdo do Agravo Regimental denota tão somente objetivo infringente, nada podendo se abstrair relativamente à ocorrência de omissão ou de contradição no acórdão recorrido para acionar a aplicação do princípio da fungibilidade recursal. 3. Embargos de Declaração acolhidos, sem efeito infringente.

(STJ - EDcl no AgRg no REsp: 1509293 MG 2015/0002730-8, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 15.3.2016, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 23.5.2016.)

 

Segundo Fredie Didier Jr. e Leonardo José Carneiro da Cunha: “Na verdade, inexistência de erro grosseiro e a existência de ‘dúvida objetiva’ são as duas faces de uma mesma moeda. Poder-se-ia dizer, em resumo, que o requisito para aplicação da fungibilidade seria um só: a inexistência de ‘dúvida objetiva’, pois havendo tal dúvida não há erro grosseiro; não havendo a dúvida, haverá erro grosseiro” (Curso de direito processual civil. 7. ed. Salvador: JusPodivm, 2009. vol. 3, p. 46).

Alexandre Freitas Câmara, por sua vez, aponta que, “sempre que um recurso inadequado for interposto no lugar do recurso adequado será possível admitir o ‘recurso errado’ no lugar do ‘recurso certo’ (sem que haja necessidade de conversão) se não houver erro grosseiro na sua interposição nem má-fé do recorrente. Em primeiro lugar, é preciso recordar a possibilidade de haver dúvida quanto ao recurso adequado. A dúvida de que aqui se trata, porém – e é preciso ter isto bem claro –, é a que resulta de divergência doutrinária ou jurisprudencial acerca do ponto” (O novo Processo Civil Brasileiro. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2018, p. 504).

Desse modo, para a aplicação do princípio, tem-se que a verificação da ausência de erro grosseiro se perfectibiliza com a caracterização de uma dúvida extrínseca, e não apenas subjetiva, ínsita ao próprio recorrente, sobre o recurso próprio a ser interposto.

Além disso, de acordo com o entendimento do STJ, “(...) essa dúvida deverá ser atual, ou seja, se a divergência existia, mas foi superada porque houve alteração do diploma legal ou porque a doutrina e a jurisprudência acabaram se firmando num ou noutro sentido, não há mais que se falar em dúvida objetiva e, portanto, em admissão de um recurso por outro erroneamente interposto” (STJ - REsp: 1133447 SP 2009/0065314-2, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 11.12.2012, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 19.12.2012).

Entretanto, no caso dos autos, não se verifica a presença de dúvida de qualquer natureza sobre o recurso a ser interposto, pois é firme o entendimento jurisprudencial de que a decisão judicial que resolve a impugnação ao cumprimento de sentença, sem extinguir a execução, tem natureza de decisão interlocutória, conforme o art. 203, § 2º, CPC/15, e deve ser atacada por agravo de instrumento, uma vez que não acarreta a extinção da fase executiva em andamento.

Para ilustrar, trago à colação entendimento jurisprudencial, como segue:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSOS. CPC/2015. DECISÃO QUE ENCERRA FASE PROCESSUAL. SENTENÇA, CONTESTADA POR APELAÇÃO. DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS PROFERIDAS NA FASE EXECUTIVA, SEM EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. 1. Dispõe o parágrafo único do art. 1015 do CPC/2015 que caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário. Por sua vez, o art. 1.009, do mesmo diploma, informa que caberá apelação em caso de "sentença". 2. Na sistemática processual atual, dois são os critérios para a definição de "sentença": (I) conteúdo equivalente a uma das situações previstas nos arts. 485 ou 489 do CPC/2015; e (II) determinação do encerramento de uma das fases do processo, conhecimento ou execução. 3. Acerca dos meios de satisfação do direito, sabe-se que o processo de execução será o adequado para as situações em que houver título extrajudicial (art. 771, CPC/2015) e, nos demais casos, ocorrerá numa fase posterior à sentença, denominada cumprimento de sentença (art. 513, CPC/2015), no bojo do qual será processada a impugnação oferecida pelo executado. 4. A impugnação ao cumprimento de sentença se resolverá a partir de pronunciamento judicial, que pode ser sentença ou decisão interlocutória, a depender de seu conteúdo e efeito: se extinguir a execução, será sentença, conforme o citado artigo 203, § 1º, parte final; caso contrário, será decisão interlocutória, conforme art. 203, § 2º, CPC/2015. 5. A execução será extinta sempre que o executado obtiver, por qualquer meio, a supressão total da dívida (art. 924, CPC/2015), que ocorrerá com o reconhecimento de que não há obrigação a ser exigida, seja porque adimplido o débito, seja pelo reconhecimento de que ele não existe ou se extinguiu. 6. No sistema regido pelo NCPC, o recurso cabível da decisão que acolhe impugnação ao cumprimento de sentença e extingue a execução é a apelação. As decisões que acolherem parcialmente a impugnação ou a ela negarem provimento, por não acarretarem a extinção da fase executiva em andamento, tem natureza jurídica de decisão interlocutória, sendo o agravo de instrumento o recurso adequado ao seu enfrentamento. 7. Não evidenciado o caráter protelatório dos embargos de declaração, impõe-se a inaplicabilidade da multa prevista no § 2º do art. 1.026 do CPC/2015. Incidência da Súmula n. 98/STJ. 8. Recurso especial provido.

(STJ - REsp: 1698344 MG 2017/0231166-2, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 22.5.2018, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01.8.2018.) (Grifei.)

 

Questão que salta aos olhos é o fato de que, quanto a este feito, o ora recorrente já havia interposto recurso de agravo de instrumento em razão de indeferimento de anistia durante a fase executiva, processo AI n. 0600705-91.2019.6.21.0000, da relatoria do Desembargador André Luiz Planella Villarinho, julgado em 18.12.2019, com acórdão pelo desprovimento (ID 45139362, p. 1-9). A petição de agravo foi subscrita pelo mesmo advogado que firma o presente recurso inominado.

No caso dos autos, é certo que a decisão recorrida não é terminativa, sendo inviável a aplicação do princípio da fungibilidade recursal para reconhecer o recurso inominado como agravo de instrumento, uma vez que não se trata de hipótese de divergência jurisprudencial quanto ao recurso cabível, e sim de erro grosseiro na identificação do recurso a ser interposto, o qual, a toda evidência, era de conhecimento do recorrente.

Anoto que os arts. 265, 279 e 282 do Código Eleitoral, o enunciado da Súmula n. 71 do TSE e o art. 19 da Resolução TSE n. 23.478/16 são inaplicáveis ao feito, pois não tratam da fase de cumprimento de sentença. Ademais, o art. 15 do CPC e o parágrafo único do art. 2° da Resolução TSE n. 23.478/16 são expressos ao dispor sobre a aplicação supletiva e subsidiária do CPC aos feitos eleitorais.

De todo modo, é inegável haver incompatibilidade procedimental entre o recurso devido (agravo de instrumento) e o meio impugnativo escolhido (recurso inominado eleitoral).

O recurso inominado é o meio impugnativo de decisões prolatadas em feitos que versem sobre matéria exclusivamente eleitoral. Conforme leciona Zilio: “Dispõe o art. 265 do CE que ‘dos atos, resoluções ou despachos dos Juízes ou Juntas Eleitorais caberá recurso para o Tribunal Regional’. A regra estabelece o recurso cabível contra decisões dos juízes e juntas eleitorais. Por esse dispositivo, são atacáveis tanto as decisões judiciais de mérito como as terminativas do processo (com ou sem julgamento de mérito), mas não as decisões interlocutórias – que são irrecorríveis, embora não precluam” (ZILIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral. 9. ed. São Paulo: Editora JusPodivm, 2023, p. 849).

De fato, o art. 19 da Resolução TSE n. 23.478/19 estabelece a irrecorribilidade das decisões interlocutórias proferidas nos processos eleitorais: “Art. 19. As decisões interlocutórias ou sem caráter definitivo proferidas nos feitos eleitorais são irrecorríveis de imediato por não estarem sujeitas à preclusão, ficando os eventuais inconformismos para posterior manifestação em recurso contra a decisão definitiva de mérito”.

Ou seja, sequer é cabível, de acordo com as normas processuais eleitorais, a interposição de recurso inominado para atacar a decisão recorrida.

De se considerar que o art. 60 da Resolução TSE n. 23.604/19, vigente ao tempo da prolação da decisão impugnada, é expresso no sentido de que a execução dos débitos eleitorais é realizada por meio do procedimento de cumprimento de sentença previsto no Código de Processo Civil (CPC), circunstância mantida pelo art. 3o da Resolução TSE n. 23.709/22, atualmente em vigor.

Além disso, diferentemente do agravo de instrumento, que, na forma do art. 1.016 do CPC, é dirigido diretamente ao tribunal competente, por meio de petição com requisitos específicos, o recurso inominado deve ser interposto por petição devidamente fundamentada dirigida ao Juiz Eleitoral e, após as contrarrazões, a parte final do art. 267, § 6º, do Código Eleitoral dispõe que o Juiz Eleitoral poderá exercer o direito de retratação, decidindo se mantém ou reforma a sua decisão, ou remeter o recurso como inominado.

Tal forma de processamento é considerada pela doutrina e pela jurisprudência como um regime diferenciado dos recursos eleitorais em relação aos demais recursos previstos no ordenamento jurídico, o qual, segundo Zilio, “é justificado pelo interesse público que rege o processo eleitoral” (ZILIO. 2023, p. 850).

Como se vê, a incompatibilidade entre as modalidades recursais é manifesta.

Com esse entendimento, pela inviabilidade de aplicação do princípio da fungibilidade recursal para conhecer de recurso inominado como agravo de instrumento, cito os seguintes precedentes do TSE e deste TRE, merecendo registro o fato de que esta Corte analisou o tema recentemente, na sessão de 13.7.2023, nos autos do processo REl n. 0600372-96.2020.6.21.0100, da relatoria do ilustre Desembargador Voltaire de Lima Moraes:

RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. MULTA. PROPAGANDA IRREGULAR. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. RECURSO CABÍVEL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 367, IV, DO CÓDIGO ELEITORAL. ART. 1º DA LEI 6.830/80. FUNGIBILIDADE. INAPLICÁVEL. NEGATIVA DE SEGUIMENTO.

1. Autos recebidos no gabinete em 14/6/2017.

2. A teor do art. 367, IV, do Código Eleitoral, cobrança de crédito decorrente de multa eleitoral segue procedimento específico consubstanciado na Lei de Execução Fiscal (Lei 6.830/80).

3. De outra parte, o art. 1º da Lei 6.830/80 estabelece que suas disposições devem ser complementadas subsidiariamente pelo Código de Processo Civil.

4. No caso, cuidando-se de decisão interlocutória em fase de cumprimento de sentença (inadimplência de multa), dúvida não existe de que o agravo é o único recurso cabível, na linha da sistemática processual civil, constituindo erro grosseiro qualquer juízo contrário que remeta ao Código Eleitoral para admitir o manuseio de recurso inominado. Precedentes.

5. Nesse contexto, o princípio da fungibilidade não permite conhecer recurso inominado como agravo de instrumento, na linha do parecer da d. Procuradoria-Geral Eleitoral. Precedentes.

6. Recurso especial a que se nega seguimento.

(TSE - RESPE: 319420126150059 Queimadas/PB 91512016, Relator: Min. Antonio Herman De Vasconcellos E Benjamin, Data de Julgamento: 27.06.2017, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico - 02.08.2017 - Página 254-255.)

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA. VEREADORA. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. RECURSO ELEITORAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ERRO GROSSEIRO. NÃO CONHECIDO.

1. Insurgência contra decisão proferida pelo juízo a quo que indeferiu o pedido de parcelamento de débito fixado na sentença que a condenou a recolher valores ao Tesouro Nacional, em razão de irregularidades constatadas na prestação de contas eleitorais referente ao pleito de 2020.

2. Recurso eleitoral interposto contra decisão interlocutória proferida em sede de cumprimento de sentença, impugnável mediante agravo de instrumento, com base na aplicação subsidiária do art. 1.015, parágrafo único, do Código de Processo Civil. Erro grosseiro que impede a aplicação do princípio da fungibilidade recursal, impossibilitando o conhecimento do apelo.

3. Não conhecimento.
(TRE-RS, REl n. 0600372-96.2020.6.21.0100, Rel. Des. Voltaire de Lima Moraes, j. 13.7.2023, Publicação DJE 14.7.2023)

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO. INDEFERIDO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE RECONHECIMENTO DE ANISTIA PREVISTA NO ART. 55-D DA LEI N. 9.096/95. TRÂNSITO EM JULGADO. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA POR ESTE TRIBUNAL. DESPROVIMENTO.

1. Cabimento do recurso de agravo de instrumento contra decisões proferidas em sede de cumprimento de sentença, nos termos do disposto no parágrafo único do art. 1.015 do Código de Processo Civil. Nas ações de natureza cível, como é o caso dos autos, não se aplica o disposto no art. 19 da Resolução TSE n. 23.478/16, que trata da irrecorribilidade das decisões interlocutórias ou sem caráter definitivo proferidas nos feitos eleitorais.

2. Postulada a reforma da decisão que indeferiu o pedido de reconhecimento da anistia prevista no art. 55-D da Lei n. 9.096/95, incluído pela Lei n. 13.831/19, em face da condenação ao recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, por ocasião do cumprimento de sentença, movida pela União em desfavor do agravante.

3. Reconhecida, por este Tribunal, a inconstitucionalidade do aludido dispositivo, ao apreciar incidente de constitucionalidade arguido pela Procuradoria Regional Eleitoral. Ademais, a sentença que condenou o agravante à restituição de valores ao erário transitou em julgado, razão pela qual não seria alcançada pela regra do art. 55-D, conforme disposição expressa do art. 3º da Lei n. 13.831/19, sendo descabida a interpretação de que aludido trânsito se referiria a processos extintos.

4. Provimento negado.

(TRE-RS, Agravo de Instrumento AI n. 0600705-91.2019.6.21.0000, Rel. Des. Andre Luiz Planella Villarinho, j. 08.01.2020, Publicação PJe 21.01.2020.)

 

RECURSO INOMINADO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DESAPROVAÇÃO. LIQUIDAÇÃO DA SENTENÇA POR ARBITRAMENTO. RECURSO INCABÍVEL. ERRO GROSSEIRO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. NÃO CONHECIDO. O Código de Processo Civil, em seu art. 1.015, é expresso ao indicar o cabimento de agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário. Incabível a interposição de recurso inominado com base na aplicação do princípio da fungibilidade recursal. Não conhecimento.

(TRE-RS - RE: 1284 SÃO FRANCISCO DE ASSIS - RS, Relator: GERSON FISCHMANN, Data de Julgamento: 19.11.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 225, Data: 03.12.2019, Página 2.)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. DESAPROVAÇÃO. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DA SENTENÇA JULGADA IMPROCEDENTE. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO ACOLHIDA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ART. 1.015, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. PRECEDENTE. NÃO CONHECIDO. Preliminar acolhida. Consoante o disposto no art. 1.015, parágrafo único, do Código de Processo Civil, o agravo de instrumento é o recurso adequado para atacar decisão interlocutória na fase de cumprimento da sentença. Inaplicável o instituto da fungibilidade recursal à hipótese, devido à impossibilidade de conversão de recurso inominado, previsto no art. 265 do Código Eleitoral, em agravo de instrumento, apelo que possui endereçamento diverso, requisitos específicos e rito próprio. Não conhecimento.

(TRE-RS - RE: 3874 VENÂNCIO AIRES - RS, Relator: DR. SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Data de Julgamento: 21.08.2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 154, Data: 24.08.2018, Página 9.)

 

Por fim, os precedentes invocados pelo recorrente não se coadunam com a matéria vertida nos autos, pois não tratam de recurso interposto contra decisão interlocutória prolatada em processo de prestação de contas na fase de cumprimento de sentença.

De igual modo, os princípios da boa-fé, da razoabilidade e da celeridade processual não têm o condão de afastar o erro inescusável na interposição do recurso adequado.

DIANTE DO EXPOSTO, acolho a matéria preliminar e VOTO pelo não conhecimento do recurso, com fundamento no parágrafo único do art. 33 do Regimento Interno deste Tribunal.