REl - 0600055-76.2022.6.21.0020 - Voto Relator(a) - Sessão: 05/09/2023 às 14:00

VOTO

Da Admissibilidade

Verifica-se, nos termos do art. 51 da Resolução TSE n. 23.604/19, quanto à tempestividade, que o recurso eleitoral deve ser apresentado no prazo de 3 dias.

Com efeito, a sentença foi publicada no Diário da Justiça Eletrônico em 21.11.2022 (ID 45368430), e o recurso foi interposto em 25.11.2022 (45368432), após o término do prazo legal.

Observa-se, entretanto, consoante o recorrente destacou, em consulta aos expedientes do processo, por meio de acesso ao link https://pje1g.tse.jus.br/pje/Processo/ConsultaProcesso/Detalhe/listAutosDigitais.seam?idProcesso=2576835&ca=f0df4a7fbfd404133273cab41b6b886669b2cffcf5f1a63cb58a207d71089c6fd8b58c4868df1fdba44f22b76ea74330c8a44cf53ac0d91d, que o sistema indicou como prazo final para manifestação o dia 25.11.2022.

Dessa forma, embora seja ônus dos advogados a prática dos atos processuais segundo as formas e prazos previstos em lei, há, no art. 223, § 1º, do Código de Processo Civil, a possibilidade de a parte indicar motivo justo para o seu eventual descumprimento.

Com efeito, a falha induzida por informação equivocada prestada pelo sistema PJE (Processo Judicial Eletrônico), quando demonstrada de maneira efetiva (o que se constatou em razão de consulta realizada aos autos do processo), é justa causa para a prorrogação do prazo recursal.

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que o equívoco na indicação do término do prazo recursal contido em sistema eletrônico mantido pelo Tribunal não pode ser imputado ao recorrente:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO N. 3/STJ. RECURSO ESPECIAL. INTERPOSIÇÃO FORA DO PRAZO RECURSAL. ERRO DE INFORMAÇÃO PELO SISTEMA ELETRÔNICO DO TRIBUNAL. BOA-FÉ PROCESSUAL. DEVER DE COLABORAÇÃO DAS PARTES E DO JUIZ. TEMPESTIVIDADE. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PROVIDOS. 1. A embargante defende a tempestividade de recurso especial interposto fora de seu prazo. Para tanto, não destaca a ocorrência de feriado local ou ausência de expediente forense, mas equívoco na contagem do prazo pelo sistema oficial (PJe) do Tribunal de origem. 2. Não cabe às partes ou ao juiz modificar o prazo recursal, cuja natureza é peremptória. Porém, o caso dos autos não se trata de modificação voluntária do prazo recursal, mas sim de erro judiciário. 3. De fato, cabe ao procurador da parte diligenciar pela observância do prazo legal para a interposição do recurso. Porém, se todos os envolvidos no curso de um processo devem se comportar de boa-fé à luz do art. 5º do CPC/2015, o Poder Judiciário não se pode furtar dos erros procedimentais que deu causa. 4. O equívoco na indicação do término do prazo recursal contido no sistema eletrônico mantido exclusivamente pelo Tribunal não pode ser imputado ao recorrente. Afinal, o procurador da parte diligente tomará o cuidado de conferir o andamento procedimental determinado pelo Judiciário e irá cumprir às ordens por esse emanadas nos termos do art. 77, IV, do CPC/2015. 5. Portanto, o acórdão a quo deve ser reformado, pois conforme a Corte Especial já declarou: "A divulgação do andamento processual pelos Tribunais por meio da internet passou a representar a principal fonte de informação dos advogados em relação aos trâmites do feito. A jurisprudência deve acompanhar a realidade em que se insere, sendo impensável punir a parte que confiou nos dados assim fornecidos pelo próprio Judiciário" (REsp 1324432/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, DJe 10/5/2013). 6. Embargos de divergência providos.

(STJ - EREsp n. 1805589 MT 2019/0085169-5, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 18.11.2020, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 25.11.2020.)

 

No mesmo sentido, colaciono acórdão deste Tribunal:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. CARREATA. PRELIMINAR. INTEMPESTIVIDADE. AFASTADA. PRAZO INDICADO NO PJE. INDUÇÃO AO ERRO. CARREATAS A SEREM REALIZADAS NA MESMA DATA. READEQUAÇÃO DO HORÁRIO A FIM DE POSSIBILITAR ACONTECIMENTO DE AMBAS AS CARREATAS EM HORÁRIOS DISTINTOS. SOLUÇÃO DO JUÍZO A QUO QUE CONTEMPLA A PRIORIDADE INVOCADA. DESPROVIMENTO. 1. Recurso interposto contra decisão que reconheceu o direito de ambas as partes em realizar carreata no dia 14.11.2020, em horários distintos. 2. O procedimento adotado pelo cartório eleitoral induziu o advogado em erro, pois o PJe indicava ao advogado que o prazo para recurso encerraria em 03/11/2020, às 23:59:00, motivo pelo qual tenho como imperativo, em razão do princípio da boa fé, o reconhecimento excepcional da tempestividade do apelo. 3. A solução adotada no juízo a quo contemplou a prioridade invocada pelo requerente, assim como permitiu que os demais participantes do processo eleitoral também possam se valer dos meios de propaganda eleitoral na véspera da eleição, devendo a decisão ser mantida integralmente. 4. Desprovimento.

(TRE-RS - RE n. 060051232 FELIZ - RS, Relator: ROBERTO CARVALHO FRAGA, Data de Julgamento: 13.11.2020, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data: 16.11.2020.)

 

Dessa forma, demonstrada de maneira efetiva a configuração da justa causa para a prorrogação do prazo recursal, conheço o recurso porque tempestivo e preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade.

 

Do Mérito

O MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (MDB) do Município de Erechim recorre da sentença proferida pelo Juízo da 020ª Zona Eleitoral que desaprovou as suas contas anuais, relativas ao exercício financeiro de 2021, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 1.810,00, em virtude do recebimento de recursos de origem não identificada, na forma prevista no art. 8º, § 10, em c/c o art. 14, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Conforme parecer técnico conclusivo (ID 45368414), foi apontada irregularidade consistente no recebimento de recursos de origem não identificada, no montante de R$ 1.810,00, por meio de depósito detectado, no extrato bancário, com o CNPJ do próprio partido político como depositante.

Nos termos do art. 7º da Resolução TSE n. 23.604/19, as contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador, quando pessoa física, ou do CNPJ, no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos:

Art. 7º As contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou do contribuinte ou no CNPJ, no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

§ 1º Para arrecadar recursos pela internet, o partido político deve tornar disponível mecanismo em página eletrônica que permita o uso de cartão de crédito, cartão de débito, emissão on-line de boleto bancário ou, ainda, convênios de débitos em conta, observados os seguintes requisitos:

I - identificação do doador pelo nome e pelo CPF;

II - emissão de recibo para cada doação auferida, dispensada a assinatura do doador;

§ 2º As doações por meio de cartão de crédito ou cartão de débito somente são admitidas quando realizadas pelo titular do cartão e deverão ser realizadas com a utilização de terminal de captura de transações.

§ 3º Eventuais estornos, desistências ou não confirmação da despesa do cartão devem ser informados pela respectiva administradora ao beneficiário e à Justiça Eleitoral.

§ 4º A emissão de boleto on-line deverá observar os seguintes requisitos:

I - somente o doador poderá figurar como pagador do boleto, devendo constar do boleto a identificação do seu nome e número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou, quando se tratar de partido político ou candidato, no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ);

II - somente o órgão do partido político poderá figurar como beneficiário, devendo constar do boleto o seu nome, endereço e número de inscrição no CNPJ;

III - deverão constar do boleto o valor do pagamento e a data de vencimento;

IV - o boleto bancário somente poderá ser pago até a data do seu vencimento, não sendo admitida a cobrança de juros ou multa por atraso, sem prejuízo de o doador solicitar a emissão de novo boleto; e

V - a quitação do boleto bancário não poderá ser realizada em espécie quando o seu valor for igual ou superior à R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos).

 

A infringência à norma impede o conhecimento da real origem dos valores recebidos, implicando a sua caracterização como de origem não identificada, na forma do art. 13, parágrafo único, inc. I, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 13. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, recursos de origem não identificada.

Parágrafo único. Constituem recursos de origem não identificada aqueles em que:

I - o nome ou a razão social, conforme o caso, ou a inscrição no CPF do doador ou do contribuinte ou no CNPJ, em se tratando de partidos políticos ou candidatos:

a) não tenham sido informados; ou

b) se informados, sejam inválidos, inexistentes, nulos, cancelados ou, por qualquer outra razão, não sejam identificados;

II - não haja correspondência entre o nome ou a razão social e a inscrição no CPF ou no CNPJ informado; e

...

 

O recorrente não esclareceu por qual motivo os depósitos estão identificados com o CNPJ do próprio partido político. Afirmou, entretanto, que por meio da juntada dos recibos eleitorais (ID 45368423, 45368424 e 45368425), emitidos para Diego de Souza, Paulo Fink e Zilmar Fardo, antes da prolação da sentença, a irregularidade estaria sanada.

Na esteira de julgados deste Tribunal, a alegação não socorre o recorrente, uma vez que as receitas financeiras recebidas em conta bancária devem ser identificadas com o CPF do doador, no caso de pessoas físicas. Ademais, não há nos autos documentação que poderia, eventualmente, corroborar a sua tese, como, por exemplo, extrato bancário da conta-corrente dos doadores contendo os lançamentos dos débitos correspondentes aos depósitos realizados na conta bancária do partido.

Importante referir, ainda, que os recibos emitidos, por si sós, não têm o condão de comprovar a origem do recurso, posto que produzidos unilateralmente pelo partido, tanto que a legislação exige que as doações de valores financeiros sejam efetuadas por meio de cheque cruzado ou transação bancária que identifiquem, obrigatoriamente, o CPF do doador ou contribuinte, nos termos do art. 8º, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Nessa linha, os seguintes julgados deste Tribunal:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DOAÇÃO DO DIRETÓRIO NACIONAL. DOADORES ORIGINÁRIOS NÃO IDENTIFICADOS. APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS UNILATERAIS. RECIBOS DE DOAÇÃO. LISTAGENS INTERNAS. CARACTERIZADA A IRREGULARIDADE. SUSPENSÃO DO REPASSE DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO PELO PRAZO DE QUATRO MESES. RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. PROVIMENTO NEGADO. 1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas de diretório municipal de partido político, referentes à movimentação financeira do exercício de 2019, determinando a suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo prazo de 4 (quatro) meses e o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, acrescidos de multa de 10%, corrigidos monetariamente, em virtude do recebimento de recursos de doações provenientes do diretório nacional, sem a identificação do doador originário. 2. Incontroverso o ingresso de receitas sem identificação dos doadores originários nos extratos bancários. Apresentação de documentos unilaterais relativos a recibos de doação emitidos pelo próprio partido, não gerados no momento do recebimento dos recursos e sim pouco antes da apresentação das contas, demonstrando que não são seguros e confiáveis para atestar a origem dos valores depositados na conta bancária da legenda. A juntada, ao recurso, de listagens internas da agremiação trazendo os nomes dos supostos doadores não sana a irregularidade, pois produzidas unilateralmente e fora do sistema bancário. 3. A falha apurada representa 100% dos recursos financeiros arrecadados no exercício 2019, sendo razoáveis, adequadas e proporcionais as sanções fixadas na sentença. Determinados a suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo prazo de 4 (quatro) meses e o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor da irregularidade, acrescido de multa de 10%, com atualização monetária e incidência de juros moratórios, conforme disposto no art. 18, inc. III, da Resolução TRE-RS n. 371/21. 4. Provimento negado.

(TRE/RS – RE n. 0600014-76 – Relator Des. Eleitoral Gerson Fischmann – Julgado sessão de 03.11.2021.)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS PARTIDÁRIA. EXERCÍCIO 2019. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RONI. DEPÓSITO BANCÁRIO. CNPJ DO PRÓPRIO PARTIDO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RESOLUÇÃO TSE N. 23.546/17. PERCENTUAL ELEVADO. VALOR ABSOLUTO IRRISÓRIO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. DESCABIMENTO DA MULTA. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Irresignação contra sentença que desaprovou a prestação de contas partidária em virtude do recebimento de recursos de origem não identificada. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional, acrescido de multa no percentual de 1%.

2. Aporte de recursos por meio de depósito detectado, no extrato bancário, com o CNPJ do próprio partido como depositante. Nos termos do art. 7º da Resolução TSE n. 23.546/17, as contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador, quando pessoa física, ou do CNPJ, no caso de valores provenientes de outro partido político ou de candidatos.

3. A infringência à norma impede o conhecimento da real origem das receitas, implicando a sua caracterização como de fonte não identificada, na forma do art. 13, parágrafo único, inc. I, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.546/17. Os valores recebidos sem a correta identificação dos doadores originários devem ser transferidos ao Tesouro Nacional, como definido no art. 14, caput, da citada resolução.

4. Ainda que equivalente a 23,08% dos recursos arrecadados pelo partido no exercício em exame, a importância glosada como de origem não identificada representa quantia irrisória, assim como o valor absoluto das contas despendido pela agremiação no curso do exercício, circunstância que autoriza a aprovação das contas com ressalvas, com fundamento nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

5. A aprovação com ressalvas das contas mostra-se incompatível com a incidência de multa, uma vez que, conforme esta Corte vem reiteradamente decidindo, o texto do art. 49 da Resolução TSE n. 23.546/17 prevê, de forma expressa, a desaprovação das contas como fato gerador da referida sanção.

6. Parcial provimento.

(REl n. 0600010-10.2020.6.21.0031, Relator: Desembargador Francisco José Moesch, sessão de 01.07.2021)

 

Dessa forma, impõe-se sejam considerados como de origem não identificada os recursos arrecadados no valor de R$ 1.810,00, com a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional, consoante definido no art. 14, caput, da multicitada Resolução.

 

Do julgamento das Contas

Assim, as irregularidades constatadas alcançam a quantia de R$ 1.810,00, que representa apenas 1,66% dos recursos arrecadados pelo partido no exercício de 2021 (R$ 108.561,95), autorizando a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas, conforme entendimento consolidado desta Corte.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo parcial provimento do recurso, apenas para aprovar com ressalvas as contas do Movimento Democrático Brasileiro (MDB) de Erechim, relativas ao exercício financeiro de 2021, mantendo a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 1.810,00.